Pensão alimentícia

Empresário de São Paulo cumprirá prisão em casa

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13 de outubro de 2005, 21h23

O empresário paulista H.M. cumprirá em casa a prisão de 30 dias por não pagar pensão alimentícia. A decisão é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. O empresário é acusado de não pagar R$ 45 mil para a sua ex-mulher.

A Turma, no entanto, não acatou o argumento do empresário de que o decreto que determinou sua prisão era ilegal. Para o relator, ministro Humberto Gomes de Barros, H.M. está sujeito à prisão porque não cumpriu com as obrigações alimentares ajustadas, nem no processo de execução nem nos quatro outros contra ele movidos pela ex-mulher.

Ao conceder o Habeas Corpus ao empresário, o ministro argumentou que o Judiciário brasileiro tem processos demais e juízes de menos. Não é crível, por isso, que com a demanda de processos distribuídos no estado de São Paulo, os juízes possam acompanhar, de forma efetiva e eficaz, o tratamento de saúde de um paciente na prisão, principalmente num caso como esse, em que o apenado precisa de cuidados especiais por causa da idade e das doenças graves de que sofre.

Para o ministro Humberto Gomes de Barros, a prisão civil por descumprimento de obrigação alimentar não é uma sanção penal, mas uma medida coercitiva para compelir o devedor de alimentos a cumprir o que foi contratado. Segundo ele, não se pode admitir que determinadas pessoas, mesmo sendo devedoras contumazes de alimentos, submetam-se à prisão comum.

Segundo a decisão, se um condenado por crime que viola bens jurídicos de maior relevância penal, como, por exemplo, a vida, faz jus ao regime de prisão domiciliar quando presentes os requisitos da Lei de Execução Penal, não há como não conceder o mesmo benefício ao devedor de alimentos, acometido de moléstia grave e maior de 75 anos.

Por isso, embora em regra não se apliquem à hipótese de prisão civil as regras da Lei de Execuções Fiscais, em razão da idade avançada e dos sérios problemas de saúde que afetam o paciente, Barros concedeu o Habeas Corpus para assegurar ao empresário paulista o cumprimento da pena em regime domiciliar.

Acompanharam o entendimento do relator os ministros Ari Pargendler, Carlos Alberto Menezes Direito, Nancy Andrighi, e Castro Filho.

A ex-mulher I.B.M. moveu execução de alimentos contra H.M. para receber o pagamento da parcela de R$ 45 mil vencida em março de 2004. Ela afirmou que já havia movido outras quatro execuções para cobrar também os meses de dezembro de 2003, janeiro e fevereiro de 2004. Como a dívida não foi totalmente paga, o juiz da execução ordenou a prisão do paciente por três meses. O Tribunal de Justiça acolheu o agravo do empresário e reduziu a pena de prisão para 30 dias.

No pedido de Habeas Corpus ao STJ, o empresário argumentou que as suas empresas enfrentam grave crise financeira. Por isso, está impossibilitado de pagar a pensão. No pedido de prisão domiciliar, ele ainda alega que possui idade avançada — 76 anos — tem diabete e precisa fazer tratamento para câncer de bexiga, que não pode ser feito em qualquer estabelecimento prisional.

O STJ concedeu a liminar e a ex-mulher entrou com agravo regimental, pedindo a reconsideração da medida. Ela argumentou que o ex-marido apenas se vale do seu “suposto estado de saúde” para tentar se furtar ao pagamento de sua obrigação. I.B.M afirma que o empresário já acumula 16 execuções de alimentos e que só paga na iminência da decretação de sua prisão civil. Segundo ela, o estado de saúde de H.M. não o impede de freqüentar festas, concertos e viagens internacionais.

HC 44.753

Leia a íntegra da decisão

HABEAS CORPUS Nº 44.753 – SP (2005⁄0095017-8)

RELATÓRIO

MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS: MÁRCIO MELLO CASADO E OUTROS impetraram habeas corpus preventivo, em favor de H.M. que teme ser preso por descumprimento de obrigação alimentícia.

Aponta como autoridade coatora a Décima Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, nos autos do agravo de instrumento nº 366.692-4, oriundo da execução de alimentos nº 000.04.036491-7, determinou a prisão civil do paciente por trinta dias. Eis a ementa:

“Alimentos – Execução – Prisão decretada – Impossibilidade de pagamento não demonstrada – Alegada crise de empresas do casal não demonstrada plenamente – Uso de outros meios para pagamento que não se apresenta como impossível- Redução do prazo de prisão ao mínimo – Agravo parcialmente provido para reduzir o prazo da prisão.”(fl. 397, apenso I).

I.B.M. ex-esposa do paciente, promoveu execução de alimentos (Processo nº 000.04.036491-7) com fundamento no Art. 733 do CPC, pleiteando a parcela vencida em março de 2004, no valor de R$ 45.000,00. Afirmou que ajuizou ação cobrando, também, os meses de dezembro, janeiro, fevereiro de 2004, em razão da costumeira inadimplência do executado.


Como a dívida não totalmente foi paga, o Juiz da execução ordenou a prisão do paciente por três meses (fl. 345, apenso I).

Expediu-se o respectivo mandado de prisão, que teve o cumprimento suspenso até o julgamento do agravo de instrumento interposto (fls. 348, apenso I, 357⁄368).

Enquanto aguardava-se o julgamento do agravo de instrumento, impetrou-se habeas corpus preventivo junto ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (fls. 372⁄383, apenso I). A ordem foi denegada (fls. 346⁄347).

O agravo de instrumento foi provido apenas para reduzir o prazo da prisão para trinta dias (fls. 397⁄400, apenso I).

Determinou-se a expedição de mandado de prisão, em 14⁄6⁄2005 (fl. 410, apenso I).

Veio a presente pedido de habeas corpus, onde o impetrante sustenta, em suma, que:

a) as empresas pertencentes ao paciente enfrentam grave crise financeira, o que impossibilita o pagamento da exorbitante de pensão alimentícia, fixada em R$ 45.000,00.

b) o paciente tem idade avançada (76 anos), é diabético mellitus e necessita de tratamento para tumor vesical (câncer de bexiga), o que requer cuidados especiais, impossíveis de serem prestados em estabelecimento prisional. Preenche, assim, dois dos requisitos do Art. 117 da Lei de Execuções Penais, para a concessão da prisão domiciliar.

c) o STJ em casos excepcionais como o presente, tem aplicado o benefício da prisão domiciliar prevista na Lei de Execução Penal aos devedores de alimentos, desde que atendidos determinados os requisitos da lei.

Deferi liminarmente a ordem, apenas para determinar que o paciente cumpra a pena no regime domiciliar (fls. 104⁄106)

I. B. M. interpôs agravo regimental, pedindo reconsideração, para que se determine que o paciente cumpra a prisão civil em regime fechado. Sustentou, em suma, que:

a) o paciente valeu-se do seu suposto estado de saúde, para pleitear a conversão em prisão domiciliar;

b) o paciente almeja a conversão das execuções ao rito do Art. 732 do CPC, com o que poderá protelar, indefinidamente, a satisfação do crédito;

c) a concessão liminar da prisão domiciliar adiantou ao paciente medida de cunho satisfativo, capaz de prejudicar o exame do mérito da ordem;

d) o paciente acumula dezesseis execuções de alimentos, somente realizando o pagamento ante a iminência da decretação da prisão civil;

e) o estado de saúde do paciente não o impede de freqüentar festas, concertos, e viagens internacionais;

f) a prisão domiciliar não funciona em qualquer caso, criminal ou civil;

g) o paciente é detentor de diploma superior, assim, poderia ser recolhido a prisão especial.

Neguei seguimento ao agravo regimental porque o STJ e o STF, reiteradamente, vem decidindo que não cabe recurso contra decisão de relator que, em habeas corpus, defere ou indefere , fundamentadamente, o pedido de liminar.

Citei os seguintes precedentes: HC 38.020⁄LAURITA; HC 27.258⁄CARVALHIDO; AgRg no HC 23.498⁄GALLOTTI; AgRg no HC 22.445⁄GONÇALVES; HC 73.917⁄CELSO DE MELLO; AgRg no HC 72.783⁄ILMAR GALVÃO e, AgRg no HC 72.651⁄MOREIRA ALVES.

Recebi as informações, em 08 de julho de 2005 (fls. 170⁄176).

O Ministério Público Federal, em parecer lançado pelo e. Subprocurador-Geral da República, Dr. Maurício de Paula Cardoso, opinou no sentido de se julgar prejudicada a ordem, por perda de seu objeto. É que o paciente conseguiu no STJ, no julgamento do HC 44.580, na sessão do dia 09.08.2005, o direito de cumprir a pena em regime domiciliar (fls. 189⁄191).

Houve interposição de novo agravo regimental.

HABEAS CORPUS Nº 44.753 – SP (2005⁄0095017-8)

HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL. DEVEDOR DE ALIMENTOS. MAIOR DE 75 ANOS E ACOMETIDO DE MOLÉSTIAS GRAVES. APLICAÇÃO EXCEPCIONAL DE NORMAS DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL.

– É legal a prisão civil de devedor de alimentos, em ação de execução contra si proposta, quando se visa ao recebimento das últimas três parcelas vencidas à data do mandado de citação, mais as que vencerem no curso do processo. Precedentes.

– Em regra, não se aplicam as normas da Lei de Execuções Penais à prisão civil, vez que possuem fundamentos e natureza jurídica diversos.

– Em homenagem às circunstâncias do caso concreto, é possível a concessão de prisão domiciliar ao devedor de pensão alimentícia.

VOTO

MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): Não enxergo ilegalidade no decreto de prisão. O paciente não cumpriu com as obrigações alimentares ajustadas, quer no processo de execução que resultou no decreto prisional, quer em outros quatro exercidos pela alimentada.

Os autos noticiam que ele já foi preso duas vezes por descumprimento de obrigação alimentar. Trata-se de devedor contumaz de alimentos.

Acrescente-se que o habeas corpus, pelo seu caráter sumaríssimo, não é via adequada para analisar a impossibilidade financeira para o pagamento da dívida alimentar a que está obrigado o paciente, porque demanda o exame aprofundado de provas. É o que diz nossa jurisprudência: HC 22.876⁄DIREITO; HC 29443⁄BARROS MONTEIRO; HC 28.878⁄CÉSAR ROCHA e RHC 14.953⁄PÁDUA, entre outros.


No mais, o STJ vem decidindo que cabe prisão civil do alimentante que deixa de pagar as três últimas prestações vencidas à data do mandado de citação e as vincendas durante o processo. A exemplo, dentre outros: HC 7.908⁄BARROS MONTEIRO; HC 9386⁄ZVEITER; RHC 11.288⁄SÁLVIO; HC 7.705⁄NAVES; RHC 14881⁄FERNANDO GONÇALVES e HC 24.114⁄NANCY.

De outra parte, a questão do regime de prisão a que foi submetido o paciente deve ser examinado.

A autoridade coatora entendeu que a idade do paciente e seu estado de saúde não impedem a decretação da custódia em estabelecimento prisional comum, cabendo ao juiz da causa acompanhar as circunstâncias do caso concreto, para estabelecer a melhor forma do cumprimento da prisão e eventual tratamento médico necessário ao paciente.

Embora seja razoável a solução apresentada pelo Tribunal Paulista, penso que a melhor solução é o cumprimento da pena em regime domiciliar. É que na prática, a solução apresentada não funciona.

O Judiciário tem processos demais e Juízes de menos. Não acredito que a demanda de processos dessa natureza que são distribuídos no Estado de São Paulo permita com que os magistrados acompanhem, de forma efetiva e eficaz, hipóteses especiais como a do ora paciente.

O paciente é acometido de doenças graves (diabete mellitus e câncer de bexiga), o que é agravado pela sua idade avançada (76 anos). Requer cuidados especiais, impossíveis de serem dados nos estabelecimentos prisionais. Não estou supondo ou inventando, essa é a realidade do país.

A prisão civil por descumprimento de obrigação alimentar, não é uma sanção penal, mas uma medida coercitiva para compelir o devedor de alimentos a cumprir o avençado. Existindo motivos relevantes para a conversão do regime, o alimentante deve cumprir a pena em estabelecimento que possibilite o seu tratamento ambulatorial.

O que não se admite, é que determinadas pessoas, ainda que sejam devedoras contumazes de alimentos, submetam-se à prisão comum. Idade avançada e saúde precária devem ser levadas em conta.

Ora, se o condenado por crime que viola bens jurídicos de maior relevância penal, por exemplo, a vida, quando preencher os requisitos da Lei de Execução Penal, fará jus ao regime de prisão domiciliar, não vejo porque não conceder o mesmo benefício para o devedor de alimentos, acometido de moléstia grave e maior de 75 anos de idade.

É fato que a Lei de Execuções Penais apenas admite a prisão domiciliar quando se tratar de réu inserido no regime prisional aberto. Excepcionalmente, o STJ tem entendido ser possível a concessão do benefício, no caso de regime prisional diverso do aberto, se o tratamento médico necessário não puder ser ministrado no presídio em que se encontra o apenado. Neste sentido: HC 31011 e 20.690⁄FÉLIX FISCHER; RHC 14.211⁄MEDINA, HC 28.588⁄LAURITA.

Em regra, não se aplicam as regras da Lei de Execuções Penais à prisão civil. O STJ, no entanto, vem admitindo, analisadas as circunstâncias excepcionais do caso concreto, formas alternativas para cumprimento da prisão civil. A exemplo, cito:

“- Em regra, não se aplicam as normas da Lei de Execuções Penais à prisão civil, vez que possuem fundamentos e natureza jurídica diversos.

– Em homenagem às circunstâncias do caso concreto, é possível a concessão de prisão domiciliar ao devedor de pensão alimentícia.”(HC 35.171⁄HUMBERTO);

“Prisão civil. Regime aberto. O regime aberto não é incompatível com a prisão civil, podendo ser adotado se o recomendarem as circunstâncias do caso concreto, a serem prudentemente avaliadas pelo juiz.”(REsp 70.400⁄EDUARDO RIBEIRO);

“Prisão civil. Prisão albergue. Prisão domiciliar.

1. A nova orientação da Corte em matéria de prisão civil recomenda a manutenção do regime prisional acolhido pelo Acórdão recorrido, assim a prisão albergue, e, na ausência desta, a prisão domiciliar, compatível o julgado com a prudente interpretação do art. 201 da Lei de Execuções Penais.

2. Recurso especial não conhecido.” (REsp 199.802⁄MENEZES DIREITO).

Na hipótese dos autos, penso que é recomendável, em razão da idade avançada e dos problemas de saúde que afetam o paciente, o cumprimento da pena em regime domiciliar.

Concedo a ordem, apenas para determinar o cumprimento da prisão civil em regime domiciliar.

Prejudicado o exame do outro agravo regimental interposto.

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