Autor dos panfletos

Leia sentença da briga na eleição da OAB-RJ

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10 de outubro de 2005, 16h57

Não há dinheiro que pague, mas quem fere a integridade moral de uma pessoa, com intenção de prejudicar, deve reparar pelos danos causados. O entendimento é do juiz Renato Barbosa, da 15ª Vara Cível do Rio de Janeiro, que condenou o advogado Lauro Schuch a pagar indenização de R$ 50 mil ao presidente da OAB fluminense, Octavio Gomes.

Na última campanha para a presidência da Ordem, a chapa liderada por Schuch acusou Gomes de desviar recursos da Caarj — Caixa de Assistência dos Advogados do Rio de Janeiro. Panfletos com a acusação foram distribuídos pelos Correios, na porta do fórum da capital e nas seções de votação, durante a eleição da Ordem.

Otávio Gomes entrou com ação pedindo indenização por danos morais alegando que o advogado teria usado o nome da OAB e da Caarj para “manchar” a sua honra.

Lauro Schuch alegou que não foi o autor dos panfletos. Testemunhas ouvidas pelo juiz afirmaram que ele não só tinha conhecimento da elaboração dos textos por sua assessoria de marketing, como distribuiu pessoalmente os panfletos e não tomou qualquer iniciativa de inibir sua divulgação.

Para o juiz Renato Barbosa, não há nada que repare o dano moral sofrido por uma pessoa, “no dano moral, a reposição das coisas a seu estado anterior é impossível. Não há dinheiro que pague a reparação in totum.” E que, a integridade moral é assegurada pelo artigo 5º, incisos V e X na Constituição Federal de 1988. O artigo diz que a personalidade é um direito absoluto e a sua violação deve ser reparada.

A indenização, para Barbosa, deve ter um valor suficiente para reparar os danos causados “que possibilite ao lesado uma satisfação compensatória da sua dor íntima, causada pela agressão injusta do réu”, e ao mesmo tempo, para servir de lição para a pessoa que cometeu o ato ilícito

O objetivo da condenação, para o juiz, é coibir “práticas que agridam e violem direitos e, ainda e principalmente, a reputação do presidente (reeleito) da Ordem dos Advogados do Brasil, secional Rio de Janeiro”.

Além da indenização de R$ 50 mil, corrigidos monetariamente e acrescidos de juros legais a partir da citação até a data do pagamento, Lauro Schuch foi condenado a pagar as custas, despesas processuais e honorários advocatícios de 20% sobre o total da condenação.

Processo 2004.001.022184-4

Leia a íntegra da decisão:

COMARCA DA CAPITAL

JUÍZO DE DIREITO DA 15ª VARA CÍVEL

SENTENÇA

Processo nº 2004.001.022188-4

A: Octavio Augusto Brandão Gomes

R: Lauro Mario Perdigão Schuch

Trata o presente processo de Ação de Responsabilidade Civil, proposta por OCTAVIO AUGUSTO BRANDÃO GOMES, em face de LAURO MARIO PERDIGÃO SCHUCH, alegando, em síntese, que as partes foram concorrentes por ocasião das eleições para a diretoria da Ordem dos Advogados do Brasil, e, que o Réu, na condição de candidato distribuiu “panfletos”, inclusive aos jornais, imputando ao autor conduta desonesta, como desvio de dinheiro pertencente a CAARJ, afirmando ter sido criada uma CPI na Assembléia do Estado para apurar o fato.

Diante e tais fatos, invocando princípios e fundamentos de direito postula o autor indenização por danos morais.

A inicial veio acompanhada de documental, de fls. 16/47.

Regular e devidamente citado, o réu contesta, às fls. 56/58, alegando, em resumo, que não é o autor dos panfletos levados a públicos sobre a CPI e atuação do autor. Afirma ser notório e público o fato da criação da CPI, não só pela divulgação oficial, mas também, pela mídia, circunstâncias de que os promotores, da campanha do réu, jamais se valeram.

Em reconvenção alega que o autor teria se utilizado do nome da Ordem dos Advogados do Brasil e da CAARJ para manchar a honra do Reconvinte. Pugna por indenização por danos de morais.

Acompanham a contestação documental, de fls. 67/78.

Réplica, de Fls. 81/88, prestigiando a exordial e contestação à Reconvenção, onde alega o reconvindo que as ofensas veiculadas no panfleto, cuja autoria imputa ao Réu, atingiram a OAB e a CAARJ, que, em resposta, fizeram publicar a Nota oficial, que deu azo à Reconvenção, alegando ser a mesma, de responsabilidade daquelas Instituições.

Despacho, deste juízo, à fl. 94 para especificação de provas, com sua justificação, designando-se para o dia 7/01/05, às 14:00 horas, audiência de conciliação.

À fl.97, realizou-se audiência conciliatória, frustrada a conciliação, deferindo-se prova oral, com o depoimento pessoal do réu, oitiva de testemunhas, bem como, prova documental suplementar, designada, a audiência de instrução e julgamento, para 17/05/05/, às 16:00 horas.

Audiência de instrução e julgamento, à fl. 112, baldada, mais uma vez, a proposta conciliatória, abrindo mão à parte autora, do depoimento pessoal do réu, deferido por este Juiz. Cinco testemunhas foram ouvidas, fls. 113/121, determinando-se a vinda de memoriais, no prazo de 15 (quinze) dias sucessivos, entregues em 30/06/2005.


Memoriais do autor, fls. 136/143, do réu, fls. 144/154.

É O RELATÓRIO. DECIDO.

Só se cogita a responsabilidade civil onde houver violação de um dever jurídico em razão de uma conduta humana, e um dano, nascendo em conseqüência o dever de repará-lo. Pode haver dano sem responsabilidade civil, quando presente um fato que a exclua, como por exemplo, a força maior ou o caso fortuito. Mas não há responsabilidade civil sem dano.

Consignado que a pretensão do autor baseia-se em possível ato ilícito praticado pelo requerido, temos que a hipótese em análise refere-se à responsabilidade extracontratual por ter como causa geradora uma obrigação imposta por lei.

Continuando, versa a questão sobre responsabilidade subjetiva, onde a culpa, segundo a teoria clássica, vem a ser o seu principal requisito.

Nosso Código filiou-se à teoria subjetiva ao exigir a culpa como fundamento para a obrigação de reparar o dano, devendo ser entendido a palavra culpa, em sentido amplo, abrangendo não só a culpa, stricto sensu, como também o dolo.

Assim, conclui-se que no ato ilícito, fato gerador da responsabilidade civil, existe um elemento formal, que é violação do dever jurídico mediante conduta voluntária; um elemento subjetivo, que pode ser o dolo ou a culpa; e, ainda, um elemento causal-material, que é o dano e a respectiva relação de causalidade.

Todos esses requisitos estão previstos no Código Civil, artigos 186 e 927.

Assim, no mesmo instante em que alguém viola o direito de outro, mediante conduta culposa, causando-lhe um dano, configura-se ilícito, nascendo o dever de repará-lo.

Deve-se verificar se no caso apresentado, estão presentes os requisitos ensejadores da responsabilidade civil subjetiva e extracontratual prevista no dispositivo legal já mencionado.

Assim, cabe verificar-se, no caso concreto, o agente agiu com culpa analisando as provas trazidas.

Na presente demanda a prova testemunhal, da mesma forma que a documental, confirmam a culpa do autor em relação à circulação de panfletos imputando conduta desonrosa ao Réu, senão vejamos:

A testemunha SILVIO ALVES DA CRUZ, de fls. 113:

“… que o documento de fls. 40 foi amplamente distribuído, em especial na área trabalhista, onde o depoente milita: que os panfletos foram distribuídos por diversos advogados integrantes da chapa do Dr. Lauro Schuch… que recebeu panfletos mostrados às fls. 36/37, onde conta a foto do réu; que por diversas vezes o requerido estava junto no momento da distribuição dos panfletos…que inclusive no dia da própria eleição o requerido estava distribuindo panfletos; que, houve um comentário por parte dos advogados, com relação ao termo constante no panfleto “propinoduto”; que propinoduto era o termo pejorativo usado a determinados fiscais no desvio de dinheiro público; que mesmo após as eleições os comentários continuaram, gerando inclusive dúvida sobre a honra do autor, quando se comentou “onde há fumaça há fogo”…”

A testemunha PAULO SÉRGIO RAMOS BARBOZA, de fls. 115:

“…. foi o autor do requerimento para a instalação de CPI visando apuração de denúncias do desvio de recurso na CAARJ; que dita CPI até a presente data está aguardando a liberação da presidência para início dos trabalhos; que concomitantemente ao requerimento é comum na “Casa”, também o Projeto de Resolução:…. que, a criação da CPI foi publicada no DO Legislativo; que reconhece os fatos divulgados pela imprensa às fls. 77/78; que não tem conhecimento se o réu teve alguma participação quanto às denúncias noticiadas às fls. 77/78, junto à Assembléia….. que a expressão “propinoduto” não fez parte do seu projeto de resolução….”

A testemunha ORQUINÉZIO DE OLIVEIRA, fls. 115, em seu depoimento afirma que:

” que recebeu os panfletos mostrados nos autos, através do correio e diretamente distribuídos nas ruas da cidade: que a distribuição se deu em época de campanha e que os candidatos estavam diretamente envolvidos na distribuição do seu material de campanha; que a matéria causou “reboliço” na classe, principalmente porque o réu fez parte da administração como conselheiro, na gestão do autor, tendo, inclusive, participado na aprovação das contas; que a divulgação no jornal de maior audiência “O GLOBO”, realmente maculou a imagem do autor… que a época da campanha exercia o cargo de conselheiro federal, e o conselho aprovou as contas da CAARJ….”

A testemunha ALOYSIO AUGUSTO PAZ DE LIMA MARTINS, em seu depoimento de fls. 117/118, informa que:

“….. que o réu sempre teve conhecimento das matérias a serem divulgadas, não podendo precisar os seus termos; que no caso concreto da matéria relacionada ao processo; que o réu tinha conhecimento da CPI e da divulgação na campanha desses fatos; que o depoente participou e aprovou juntamente com outros colegas a divulgação da matéria…. que o Dr. Lauro não estava presente na reunião que aprovou a divulgação da nota, mas sabia que a mesma seria divulgada…”


No mesmo sentido a testemunha de fls. 120, SIDNEY LIMEIRA SANCHES:

” …. que o Réu tomou conhecimento da matéria a ser publicada e ficou a cargo de uma assessoria de imprensa uma campanha de marketing da associação…. que o réu tinha conhecimento da elaboração dos textos através da associação, que autorizou aos marketeiros na sua elaboração; que após tomar conhecimento da divulgação o réu não tomou nenhuma medida contrária a elaboração, quer com relação aos marketeiros, quer com relação a associação…..”

Desta forma, indene de dúvidas, a culpa do Réu, enseja indenização pelos danos causados.

A integridade moral da pessoa é assegurada na Constituição Federal de 1988, pela norma do artigo 5º, incisos V e X, como direito absoluto da personalidade, cuja violação é proibida pela ordem jurídica civil, importando no dever de reparação. No dano moral, a reposição das coisas a seu estado anterior é impossível. Não há dinheiro que pague a reparação in totum. Por isso, a reparação, em tais casos, assenta-se no pagamento de uma soma pecuniária, arbitrada pelo Juiz, segundo os princípios de Eqüidade e Justiça, que possibilite ao lesado uma satisfação compensatória da sua dor íntima, causada pela agressão injusta do Réu, uma vez que não existe um critério legal estabelecido para essa liquidação.

Uma vez reconhecidos os fatos geradores do dano, que aqui restaram patenteados, passa-se à questão do arbitramento desse dano. De acordo com o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, adiante transcrito:

Na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível sócio-econômico dos autores, e, ainda, ao porte da empresa recorrida, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso” (Recurso Especial 135202/SP, Quarta Turma do STJ, julgado em 19/05/98).

Assim, atento ao que dos autos constam e as peculiaridades do caso, a indenização deve ser fixada em valor suficiente para minimizar o sofrimento suportado pelos Autores e representar verdadeira sanção civil, desestimuladora de repetição de fatos semelhantes.

A indenização, não deve servir de meio de locupletamento indevido dos lesados. Todavia, não deve ser insignificante, considerando-se a situação econômica do ofensor, eis que não pode constituir em estímulo à manutenção de práticas que agridam e violem direitos, e, ainda e principalmente, a reputação do autor, presidente (reeleito) da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Rio de Janeiro.

Desta forma, atento ao princípio da proporcionalidade e da lógica razoável, e tendo em vista as circunstâncias do dano, sua gravidade e repercussão, considero razoável a fixação do dano moral no valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais).

No que tange à Reconvenção, embora se possa qualificar de elegante, tal qual afirma o Reconvindo, a Nota Oficial, foi difundida pela ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL E CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS ADVOGADOS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, que possuem personalidade jurídica própria, diversa da pessoa do Reconvindo.

Logo não se pode imputar a OCTAVIO AUGUSTO BRANDÃO GOMES, a responsabilidade da Nota publicada pela OAB/RJ e pela CAARJ.

Assim, ausentes requisitos da Responsabilidade Civil, a Reconvenção, não merece acolhida.

ISTO POSTO, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO veiculado na Ação de Responsabilidade Civil e IMPROCEDENTE o pedido veiculado na Reconvenção. Condeno o Réu, LAURO MARIO PERDIGÃO SCHUCH, a pagar ao Autor OCTAVIO AUGUSTO BRANDÃO GOMES indenização por danos morais, no valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), corrigidos monetariamente e acrescidos de juros legais, a contar da citação até a data do efetivo pagamento.

Deixo de conceder o pedido da alínea “a”, fls. 14 (publicação da sentença), em razão do disposto no artigo 29 § 3º da Lei 5.250/67.

Condeno ainda o Réu, ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em 20% sobre o total da condenação.

Ao trânsito, dê-se baixa e arquivem-se.

PRI

Rio de Janeiro, 27 de setembro de 2005.

Juiz RENATO RICARDO BARBOSA

Titular da 15ª Vara Cível da Comarca da Capital

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