Oscilação de energia

Fornecedor de energia responde por danos causados a usuário

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10 de outubro de 2005, 18h32

Concessionária de serviço público responde objetivamente pelos danos que causa, bastando ao consumidor lesado comprovar os danos. Com base neste entendimento a Justiça gaúcha condenou a RGE — Rio Grande Energia a pagar indenização de R$ 3 mil por oscilação de energia elétrica que causou a queima de equipamento de uma joalheria da cidade de Guaporé, Rio Grande do Sul.

A decisão é da 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (leia a íntegra ao final da reportagem). Cabe recurso.

A Rio Grande Energia recorreu ao Tribunal de Justiça gaúcho contra decisão de primeira instância. A RGE sustentou a ausência do dever de indenizar por inexistir nexo de causalidade entre o dano e o fornecimento de energia. Alegou também que não foram detectados problemas na rede elétrica na data do acidente e que não existiu qualquer reclamação por parte de outros clientes.

Para o relator do recurso, desembargador Paulo Roberto Lessa Franz, o autor da ação “comprovou os prejuízos decorrentes da queima de seus equipamentos e a relação de causa e efeito entre este evento danoso e a falha no fornecimento de energia”.

Por isso, ficou “caracterizada a falha da ré na prestação de serviço”. O desembargador aplicou ao caso o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor — “os fornecedores respondem, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados a consumidores por defeitos relativos aos serviços prestados”, conclui.

Acompanharam o voto do relator os desembargadores Paulo Antônio Kretzmann e Luiz Ary Vessini de Lima.

Processo 70012584330

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. QUEIMA DE EQUIPAMENTOS ELETRÕNICOS. OSCILAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. JUÍZO DE PROCEDÊNCIA MANTIDO.

É cediço que, sendo a empresa demandada concessionária de serviço público, responde objetivamente, a teor do art. 37, § 6º da Constituição Federal, pelos danos que, na consecução de seu mister, por ação ou omissão, houver dado causa, bastando à vítima a comprovação do evento lesivo e do nexo etiológico entre este e a conduta do agente. Hipótese em que, comprovados pela demandante, através de prova testemunhal, tais pressupostos, é de ser mantido o juízo de procedência da ação.

APELAÇÃO IMPROVIDA.

APELAÇÃO CÍVEL — DÉCIMA CÂMARA CÍVEL

Nº 70012584330 — COMARCA DE GUAPORÉ

RIO GRANDE ENERGIA S.A. — APELANTE

CHISTE JOIAS LTDA — APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. PAULO ANTÔNIO KRETZMANN (PRESIDENTE E REVISOR) E DES. LUIZ ARY VESSINI DE LIMA.

Porto Alegre, 15 de setembro de 2005.

DES. PAULO ROBERTO LESSA FRANZ,

Relator.

RELATÓRIO

DES. PAULO ROBERTO LESSA FRANZ (RELATOR)

Adoto o relatório da sentença (fls. 73/74), aditando-o nos termos que seguem:

Sentenciando, a magistrada singular julgou procedente a ação para condenar a requerida a pagar à autora indenização no valor de R$ 3.001,00 (três mil e um reais), corrigido monetariamente pelo IGP-M, a partir de 10.10.2002, e juros moratórios de 6% ao ano, a fluírem da citação (fls. 73/79).

Inconformada, a demandada interpôs recurso de apelação (fls. 82/88), sustentando a ausência do dever de indenizar ante a inexistência de ato ilícito e de nexo de causalidade entre o dano e o fornecimento de energia. Ponderou que os documentos juntados à contestação indicam que, na data referida pelo autor, não foi detectado qualquer problema na rede elétrica que atende a unidade consumidora da postulante, inexistindo reclamação por parte de outros clientes. Referiu que incube à parte autora a comprovação dos prejuízos suportados. Pediu a reforma integral da decisão fustigada, julgando-se improcedente a ação.

Contra-arrazoou a demandante às fls. 92/94.

Subiram os autos a esta Corte, vindo conclusos.

É o relatório.

VOTOS

DES. PAULO ROBERTO LESSA FRANZ (RELATOR)

Eminentes Colegas!

Versa o presente feito acerca de ação de indenização por danos materiais, suportados pela empresa autora em razão de falha na prestação de serviço pela ré, ocorrida em 10.10.2002, consistente em quedas, oscilações e sobrecarga de energia elétrica que danificaram os equipamentos de propriedade da postulante, listados no item 2 da inicial (fl. 03).

A sentença foi de procedência da ação. Daí a irresignação manejada pela requerida, a qual não merece prosperar.

É cediço que, sendo a empresa demandada concessionária de serviço público, responde objetivamente, a teor do art. 37, § 6º da Constituição Federal, pelos danos que, na consecução de seu mister, por ação ou omissão, houver dado causa, bastando à vítima a comprovação do evento lesivo e do nexo etiológico entre este e a conduta do agente.

Nesse norte, já se manifestou este Órgão Fracionário:

“APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. RGE. Responde a concessionária do serviço público de fornecimento de energia elétrica pelo defeito na prestação. Tal acarreta a responsabilidade objetiva, calcada na Teoria do Risco Administrativo. Exegese do art. 37, § 6º da C.F. Dano emergente e nexo causal devidamente demonstrados. Indenização devida. Lucro cessante e dano moral. Indemonstrados. NEGADO PROVIMENTO AO APELO E AO RECURSO ADESIVO”. (Apelação Cível Nº 70010312296, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ary Vessini de Lima, Julgado em 10/03/2005)

No corpo do voto-condutor deste aresto, as causas de exclusão do nexo causal e a aplicabilidade, ao concreto, das normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor foram, com propriedade, analisadas pelo insigne Des. Luiz Ary Vessini de Lima, merecendo, pois, transcrição:

“Tal responsabilidade, somente existe quando houver relação de causa e efeito. Essa relação, portanto, é afastada, quando o dano decorrer de fato exclusivo da vítima, caso fortuito ou força maior, e quando o fato for atribuído a terceiro.Tais fatores, em se verificando, excluem o nexo causal.

No caso telado, não se verifica a ocorrência de nenhuma causa acima exposta, portanto, acertada a decisão a quo, que concluiu pela existência do liame subjetivo.

Nesse sentido, presentes os três elementos da responsabilidade civil, ou seja, o dano, a conduta ilícita e o nexo, patente é o dever de indenizar.

Ainda, se não bastasse a atribuição da responsabilidade da ré pelo risco administrativo, é de ressaltar, que o fornecimento de energia elétrica é serviço (CDC, 3º, § 2º) essencial e que, portanto, há de ser contínuo (CDC, 22, caput).

Caracterizada, portanto, a falha da ré, na prestação de serviço, é caso também de aplicação do art. 14, do CDC (Lei 8078/90), segundo o qual os fornecedores respondem, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados a consumidores por defeitos relativos aos serviços prestados, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos” (grifei).

No caso sob comento, tenho que, diversamente do esposado pela recorrente, a suplicante comprovou os prejuízos decorrentes da queima de seus equipamentos de informática e a relação de causa e efeito entre este evento danoso e a falha no fornecimento de energia.

Isso porque, conquanto na “Lista de Interrupção por Circuito”, juntada à fl. 36, inexista referência a defeito na transmissão de energia elétrica, em 10.10.2002, na rede que atende a unidade consumidora da postulante, tal constatação não se presta a elidir a pretensão indenizatória, pois, além de elaborado de forma unilateral pela concessionária, vem infirmado pelas declarações do técnico em informática MICHEL ZANATTA.

Tal testemunha, cujo relato sequer fora impugnado pela ré, confirmou que a queima dos aparelhos decorreu da oscilação de energia elétrica:

“(…) presta assistência técnica para a autora, no ramo de computação. Foi fazer atendimento na empresa autora, sendo que lá chegou e notou que as máquinas estavam desligadas, sendo que o depoente verificou a tensão da tomada com o altímetro, verificando que a energia oscilava, chegando até a 300 w e 320w. Havendo picos de oscilação de energia. Os equipamentos então foram levados para a oficina, sendo que apresentavam cheiro de queimado. (…). Tendo em vista que são equipamentos sensíveis o depoente afirma que o estrago se deu em função da oscilação de energia. Era feita revisão regular dos equipamentos, sendo que inclusive tinha contrato com a empresa para prestação de serviço. (…) A rede de energia interna da empresa é normal”. (fl. 63, grifei).

Assim, comprovado o dano e ausente a demonstração pela ré de qualquer causa excludente do liame causal entre aquele e o defeito na prestação do serviço público essencial de fornecimento de energia elétrica, é de ser mantido incólume a sentença vergastada por seus próprios e jurídicos fundamentos.

Por todo o exposto, VOTO no sentido de NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

DES. PAULO ANTÔNIO KRETZMANN (PRESIDENTE E REVISOR) — De acordo.

DES. LUIZ ARY VESSINI DE LIMA — De acordo.

DES. PAULO ANTÔNIO KRETZMANN — Presidente – Apelação Cível nº 70012584330, Comarca de Guaporé: “NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME.”

Julgador(a) de 1º Grau: CRISTINA LOHMANN

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