Fator Bali

Leia o relatório da Embaixada brasileira sobre o atentado em Bali

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2 de outubro de 2005, 16h12

A revista Consultor Jurídico publica na íntegra o informe que chegou na manhã deste domingo ao Itamaraty, vindo da Embaixada brasileira, em Jacarta. O documento dá conta dos bastidores geopolíticos sobre o atentado ocorrido na ilha de Bali, na Indonésia: no sábado, três bombas explodiram em restaurantes lotados. 25 pessoas morreram e 102 foram feridas.

As três bombas, explodidas simultaneamente, foram instaladas há quase três anos desde que homens da Al Qaeda explodiram dois clubes noturnos em Bali, quando morreram 202 pessoas. O relatório traz recomendações, inclusive e sobretudo para o caso de haver brasileiros entre os mortos e feridos.

Até o momento, ao que se sabe, nenhum grupo reivindicou a autoria do atentado. “No entanto” — diz o relatório — “o método utilizado aponta mais uma vez para a Jemaa Islâmia, grupo radical afiliado à Al Qaeda, cujo objetivo último é a fundação de um Estado islâmico unificado no Sudeste Asiático, formado pela Indonésia, Malásia, Brunei, parte das Filipinas e sul da Tailândia”.

O informe aponta ainda que o governo indonésio vem combatendo radicais terroristas desde o primeiro atentado em Bali, ocorrido há três anos, em outubro de 2002.

Leia a íntegra do relatório

Conforme já noticiado pela mídia em geral, ocorreram na noite de ontem, 1/10, três explosões de bombas na ilha de Bali. Duas na praia de Jimbaran, visando dois movimentados restaurantes ao ar livre, e outra num restaurante da zona central de Kuta, maior ponto de concentração dos turistas na ilha, ao lado de um grande shopping center. Sobre o assunto, transmiti minuta de nota à imprensa, à meia-noite de ontem, diretamente ao plantão do Gabinete.

2. Segundo as últimas informações, colhidas na madrugada de hoje, subiu de 22 para 25 o número de mortos e dobrou para cem o número de feridos, atendidos nos dois principais hospitais de Denpasar, capital da ilha. As vítimas são indonésias em sua maioria. Dentre os estrangeiros encontram-se, até agora, australianos, norte-americanos, japoneses e coreanos. Tratando-se de explosivos, a identificação completa dos mortos poderá demorar vários dias.

3. Nenhum brasileiro foi, até o momento, encontrado entre os mortos e feridos. A esse respeito, estou mantendo contato permanente com o Cônsul Honorário em Bali, Senhor Renato Vianna, o qual está, por seu turno, em contato com a polícia, os hospitais e os colegas do corpo consular local. Segundo ele, o perfil predominante do turista brasileiro que se dirige a Bali (jovem, surfista, morador dos países vizinhos, estacionando em praias mais calmas e afastadas) caracteriza-o como menos provável freqüentador dos locais atingidos – muito movimentados, preferidos por famílias, pessoas de faixa etária média mais alta e orçamento mais confortável.

4. De toda forma, permanece o alto risco e o alerta máximo para nossos nacionais, uma vez que outros explosivos foram encontrados pela polícia nas praias e outros locais de maior concentração de pessoas. Por esse motivo, solicitei ao Senhor Cônsul Honorário que afixe aviso nos hotéis e hospedarias com maior clientela brasileira, recomendando-lhes: a) que entrem imediatamente em contato com suas famílias; b) que procurem deixar a ilha o quanto antes; c) para os que permanecerem, que saiam, quando for o caso, de Kuta e suas adjacências, buscando outras localidades mais ao norte da ilha; d) que evitem movimentar-se e dirigir-se a locais de concentração de público; c) que os que não tenham podido contactar suas famílias reportem sua situação ao setor consular da Embaixada ou o Consul Honorário. Atendendo a chamadas telefônicas desta madrugada, da parte de familiares de turistas brasileiros (jovens estudantes na Austrália), pessoalmente localizei ou encaminhei a localização de alguns deles, concentrados, como se esperava, na praia de Padang, distante do burburinho e favorável à prática do surf.

5. Não houve até agora comunicado público dos autores do atentado. No entanto, o método utilizado aponta, mais uma vez para a Jemaa Islâmia, grupo radical afiliado à Al Qaeda, cujo objetivo último é a fundação de um Estado islâmico unificado no Sudeste Asiático, formado pela Indonésia, Malásia, Brunei, parte das Filipinas e sul da Tailândia. O Presidente Susilo Yudhoyono – que deslocou-se para Bali a fim de supervisionar pessoalmente os socorros e investigações – informou que, segundo a Inteligência indonésia, os autores do atentado estariam articulados com núcleos de terroristas localizados na Malásia e nas Filipinas.

6. A perseguição aos radicais islâmicos com potencial terrorista, na Indonésia, tem sido intensa e decidida, apesar do permanente cuidado do governo em, combatendo-os, não suscetibilizar o segmento mais devoto, porém ordeiro, da comunidade islâmica. O porta-voz da Chancelaria indonésia emitiu veemente condenação ao atentado e – tendo em conta a comprovada moderação religiosa da sociedade indonésia – pediu à comunidade internacional compreensão ante o ocorrido e apoio para a guerra ao terrorismo. Esta, com efeito, vem sendo empreendida pelo governo indonésio a partir do primeiro atentado em Bali, ocorrido há três anos, em outubro de 2002. Por seu turno, o Presidente Yudhoyono e o Vice-Presidente Yusuf Kalla prometeram caçar e punir os criminosos, como foi feito com quase todos os autores dos atentados de Bali em 2002 e do Hotel Marriott de Jacarta em 2003.

7. Não apenas o Governo indonésio abomina o terrorismo, pelas conseqüências políticas e econômicas (com a destruição do turismo) que acarreta ao país, mas também, recorde-se, a população de Bali que, salvo pela afluente mão-de-obra javanesa, é esmagadoramente hinduísta e não muçulmana. Daí o socorro e a solidariedade às vítimas – assim como a tentativa de proteção aos visitantes – maciçamente prestados pelos habitantes da ilha.

8. Além do óbvio intento de desestabilização política, uma segunda leitura para o atentado é a aproximação do Ramadã, mês de jejum e resguardo religioso, que deverá iniciar-se no próximo dia 5. O ato pode ser visto como uma advertência a que os profanos abstenham-se das diversões (devassidão, na perspectiva oposta) amplamente oferecidas pela ilha de Bali. Nesse sentido entendo, caberia igualmente, nas comunicações à imprensa, conscientizar os potenciais turistas brasileiros nesta zona, do risco adicional que representam, durante este mês lunar (5 de outubro a 2 de novembro), a freqüentação de locais de diversão, o consumo de álcool e a exposição corporal.

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