Eleições da OAB-SP

“Oposição Unida” deve dar lugar à “Advocacia Unida”

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8 de novembro de 2005, 11h16

Falta um ano para as eleições da OAB, a maior corporação de ofício da América Latina e, ao contrário do que dizem alguns, não parece ser “muito cedo” para falar do assunto. Sobre isso é melhor falar com clareza, com transparência, com antecedência, já que se trata de um evento de indiscutível importância para mais de meio milhão de profissionais de nível superior. Melhor antecipar o debate que engolir “pratos feitos”.

A largada já foi dada. No final de setembro, alguns advogados que se intitulam membros de uma tal “Oposição Unida” divulgaram “manifesto” que denominaram “O Desabafo e a Esperança de Mudança”, publicado aqui na Consultor Jurídico.

Logo depois, na abertura da 1ª Conferência Estadual dos Advogados, no Guarujá, o dr. Rubens Approbato Machado sugeriu a reeleição do dr. Luiz Flávio Borges D’Urso para a presidência da OAB-SP.

Também ouvi comentários sobre a possível candidatura do dr. Rui Celso Reali Fragoso, ex-presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo, à presidência da seccional paulista da OAB.

Por tudo isso, entendo que há um equívoco sobre o “muito cedo”, que pode representar para os advogados militantes uma verdadeira armadilha. Deixar assunto de tamanha importância para ser discutido em cima da hora viabiliza escolhas erradas, favorece a mediocridade incrustada no sistema de chapas e incentiva os conchavos políticos, que empurram a OAB para os sistemas medievais de escolha por apadrinhamentos, nepotismo e interesses mesquinhos, como, por exemplo, o loteamento da entidade entre grupelhos que vivem no passado.

Aquelas manifestações ou comentários sobre as eleições da OAB devem ser muito bem recebidos por todos os advogados verdadeiros, que vivem o cotidiano da profissão, pois representam o interesse de vários colegas pelo destino de nossa entidade.

Mais triste seria se ninguém se importasse com nossa entidade, como se ela fosse apenas uma repartição qualquer, um cartório, um órgão apenas de registro e fiscalização profissional, onde chapas únicas costumam predominar. A disputa na OAB é prova da sua indiscutível importância no cenário nacional.

Devemos nos lembrar, todavia, que a Advocacia é a profissão da Liberdade, da Igualdade e da Fraternidade.

De fato, não há Advocacia verdadeira onde não houver Liberdade e sempre que esta esteve ameaçada nossa entidade liderou as lutas pela sua reconquista, correndo riscos e enfrentando todos os adversários. Não é por acaso que a Constituição Federal reconhece nossa profissão como indispensável à administração da Justiça.

A Igualdade é outro elemento fundamental de nossa profissão. Todos os advogados são iguais perante o nosso Estatuto, que juramos respeitar e fazer cumprir. Por isso, soam ridículas as afirmações de alguns ignorantes que imaginam possa um advogado ser melhor que outro.

Um advogado muito antigo é apenas cronologicamente mais velho que um recém inscrito na OAB. O jovem que se inscreveu no ano 2001 poderá ser o nosso próximo presidente a partir de 2007.

Também é besteira imaginar que o nosso presidente deva ser um doutor ou professor, formado nesta ou naquela faculdade “tradicional”. Hoje a maioria dos advogados é formada em escolas novas, onde há muita gente talentosa, inteligente, criativa, séria, esforçada, que pode muito bem dirigir a OAB com eficiência e dedicação. E Democracia é o governo da maioria.

A Fraternidade, o último dos elementos que formam a OAB, talvez seja o mais importante. Indica que todos os advogados devem se considerar irmãos, pois todos fizemos o mesmo juramento na colação de grau e ao receber a carteira da OAB, todos vivemos os mesmos ideais, enfrentamos as mesmas dificuldades e lutamos as mesmas batalhas.

Os signatários do manifesto da “Oposição Unida” são homens de bem e provaram seu prestígio na última eleição, quando obtiveram a segunda colocação entre oito chapas, com cerca de 19% dos votos.

Além da chapa vitoriosa, do dr. D’Urso, os “situacionistas” estavam divididos em mais três grupos. Os candidatos Vitorino (17% dos votos) e Valter Uzzo (10%) eram diretores da OAB-SP, respectivamente tesoureiro e secretário-geral, enquanto Rosana (11%) era conselheira de grande destaque.

Portanto, do total de oito chapas, uma metade era da “oposição”, enquanto outra metade era de chapas encabeçadas por conselheiros, ou seja, da “situação”, que apenas representavam dissidências internas do mesmo grupo.

Os “situacionistas”, mesmo divididos, obtiveram 63,25% dos votos, enquanto o pessoal da “oposição”, inclusive a tal “Oposição Unida” (como se vê tão dividida quanto a “situação”), recebeu apenas 28,97%.

Isso deixa muito claro que em nenhum momento houve de verdade uma “oposição unida” e se todos os “oposicionistas” estivessem unidos, teriam menos de 1/3 dos votos. Portanto, ser da “oposição”, pura e simplesmente, não elege ninguém.

Aliás, devemos lamentar que o sistema atual ainda se baseie em chapas, viabilizando candidaturas sem nenhuma expressão, que podem apenas confundir os advogados não militantes, que representam cerca de metade dos inscritos.

Qualquer que seja o exame que se faça, fica claro que as eleições de 2003 representaram um marco importante na história da OAB paulista, pois significaram um enorme arejamento na entidade. Ficou evidente a opção dos advogados por lideranças mais comprometidas com o cotidiano da Profissão, com a militância.

Tanto assim, que a chapa que ficou em terceiro lugar era presidida por um procurador do Estado que, embora seja de fato e de direito advogado, pertence a uma categoria que, infelizmente, esquece-se com freqüência do princípio da Igualdade, imaginando-se “mais importante” que seus colegas, apenas porque advogam para o Estado. Aliás, da forma como o Estado se comporta hoje, os nossos honrados colegas procuradores talvez estejam sofrendo pelo que não merecem, a exemplo do que ocorre com os que trabalham para certos criminosos.

Outrossim, apenas ter presidido o Instituto dos Advogados de São Paulo não é suficiente para qualificar alguém para comandar a OAB.

OAB-SP e Iasp são entidades completamente diferentes, com associados, finalidades e problemas que em nada se identificam. Tanto assim, que juízes, promotores e delegados também fazem parte do Iasp, uma entidade muito respeitada, mas que às vezes é criticada por promover solenidades onde magistrados recebem homenagens que, embora merecidas, nada representam de fato para a advocacia militante, esta que geralmente sequer é recebida nos gabinetes de alguns dos ilustres homenageados pelo Iasp.

Claro que não se discute o fato de que o dr. Rubens Approbato Machado, ex-presidente do Iasp, foi um dos melhores presidentes que a OAB já teve, mas isso não tem nada a ver com sua brilhante atuação naquela entidade, e sim decorre da sua efetiva militância há décadas na OAB-SP, especialmente quando presidiu, com enorme sabedoria e dedicação, a antiga Comissão de Ética e Disciplina. Mas passado é passado e quem vive disso é arqueólogo.

Também ninguém se qualifica para presidir a OAB porque um dia comandou a Associação dos Advogados, uma entidade que se destaca como prestadora de serviços, da mesma forma como o Iasp é uma espécie de “academia”, razão pela qual em ambas as entidades o ingresso de advogados é voluntário.

Presidir a OAB exige inteligência, garra, determinação, espírito de liderança e de sacrifício, qualidades que o dr. D’Urso já comprovou possuir. Por isso mesmo, no atual quadro, sua reeleição é altamente recomendável.

Todavia, é bom deixar claro que a tal “Oposição Unida”, incapaz de ganhar eleições, como os números já demonstraram, não é uma organização “demoníaca”, que devamos exorcizar da OAB, como se fosse composta de espíritos malignos.

Não cabe, em nossa profissão, imaginarmos que seja válida qualquer posição preconceituosa, qualquer maniqueísmo, como se estes ou aqueles advogados fossem uma espécie de “casta de intocáveis”.

Todas essas considerações são necessárias e pertinentes, para que possamos elaborar um processo eleitoral que se afaste dessas divisões ridículas, que só prejudicam a advocacia, que só servem para separar pessoas de bem, que deveriam permanecer unidas.

Já nos Lusíadas encontramos explicação para tantos choques entre os que deveriam se irmanar. No Canto IV vemos : “Ó glória de mandar, ó vã cobiça desta vaidade a quem chamamos fama”…

Essa é a mensagem: UNIÃO. Não uma “situação unida” ou uma “oposição unida”, mas uma ADVOCACIA UNIDA! Não uma união em torno de falsos líderes, que no mais das vezes lideram apenas seus familiares ou dependentes. Nem em torno de ilustres professores, mestres ou doutores que se imaginam a oitava maravilha da espécie humana, sempre querendo nos dar lições de Direito ou de jurisprudência, pois a OAB não precisa ir à escola, a não ser para ensinar.

A OAB também não precisa de “pavões” desejosos de exibir suas ricas plumagens. Nem de advogados que ocupem cargos na administração pública ou mesmo em instituições privadas, onde estão atrelados a hierarquias ou interesses que lhes retiram a independência e limitam a liberdade. Menos ainda de viver no passado, presa ao sistema de “currais eleitorais”, de ridículos “grotões” que nada significam neste novo milênio.

Uma entidade como a OAB-SP não merece ser submetida a experiências arriscadas. Provou-se, recentemente, que um mandato de três anos é muito longo quando mal conduzido. Por isso que uma reeleição é justa e pode ser perfeita para a entidade, quando trabalhos sérios estejam sendo bem desenvolvidos e não podem ser concluídos no mandato que, pela sua eficiência, seriedade e sobretudo lealdade, já se tornou curto demais.

Uma ampla composição dos bons pode evitar que no próximo Conselho permaneçam alguns maus, dos que sequer comparecem às reuniões, que usam a entidade para seus interesses pessoais ou mesmo para abrilhantar carreiras medíocres. Quando os bons se dividem, os maus se infiltram. E estes, infiltrados, podem comprometer aqueles.

Portanto, não é necessário apenas que os “situacionistas” permaneçam unidos, pois há entre eles alguns que precisam ser afastados, não só por serem maus, mas porque oriundos de processos eleitorais que não privilegiaram o mérito.

A OAB precisa e merece que as pessoas de bem que estão na tal “oposição unida”, deixem de lado a “glória de mandar”, a “vã cobiça desta vaidade a quem chamamos fama” e coloquem acima de tudo a entidade que já não é só a nossa própria casa, a nossa própria vida, mas também a de nossos filhos e até netos. Afinal, NÃO PRECISAMOS DE OPOSIÇÃO UNIDA, MAS DA ADVOCACIA UNIDA.

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