Imposto indevido

Não incide ISS sobre impressão de embalagem industrial

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7 de novembro de 2005, 10h27

Produtos que exigem serviços secundários de impressão gráfica em sua fabricação estão livres da incidência do ISS — Imposto sobre Serviço. A decisão é da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. A Turma acolheu recurso das Indústrias Klabin contra o município de Recife, que havia determinado a cobrança do ISS sobre a confecção de sacos personalizados.

A empresa entrou na Justiça para anular uma dívida fiscal. Na primeira instância, o pedido foi negado. O Tribunal de Justiça de Pernambuco manteve a sentença. Entendeu que a atividade de confecção de sacos com impressão gráfica personalizada está sujeita ao ISS, independentemente se eles são utilizados para a embalagem de produtos industrializados e destinados à comercialização.

O Tribunal de Justiça pernambucano aplicou ao caso a Súmula 156 do STJ. Segundo o texto, a prestação do serviço de composição gráfica, personalizada e sob encomenda, ainda que envolva fornecimento de mercadorias, está sujeita apenas ao ISS.

Inconformada, a empresa recorreu ao STJ, alegando, além de divergência jurisprudencial, violação dos artigos 46, parágrafo único, do Código Tributário Nacional; 3º, parágrafo único, da Lei 4.502/64; 2º e 3º do Regulamento do IPI, aprovado pelo Decreto 87.981/82 e 2º, V, do Convênio ICMS 66.

De acordo com a defesa das Indústrias Klabin, os precedentes invocados na decisão do TJ-PE envolviam atividades realizadas por empresas gráficas. Acrescentou, também, que o ISS não pode incidir sobre a produção e a circulação de produtos e mercadorias, pois estes não são considerados serviços.

“Destinando-se a serem utilizados pelos clientes da recorrente no acondicionamento dos produtos por eles fabricados e comercializados, não podem os sacos impressos, à evidência, ser considerados ‘impressos personalizados’, para fins de incidência tributária (estes, sim, destinados a uso próprio do adquirente, como ocorre, por exemplo, com os talonários de notas fiscais e os cartões de visitas)”, sustentou.

A 1ª Turma, por unanimidade, acolheu os argumentos. “A atividade de confecção de sacos para embalagens de mercadorias, prestada por empresa industrial, deve ser considerada, para efeitos fiscais, atividade de industrialização”, observou o ministro Teori Albino Zavascki, relator do processo no STJ.

“A inserção, no produto assim confeccionado, de impressões gráficas, contendo a identificação da mercadoria a ser embalada e o nome do seu fornecedor, é um elemento eventual, cuja importância pode ser mais ou menos significativa, mas é invariavelmente secundária no conjunto da operação”, acrescentou.

O relator enfatizou que a impressão de signo distintivo nos pacotes constitui mera etapa da industrialização, não representando serviço especificamente contratado. “Pode-se afirmar, portanto, sem contradizer a súmula, que a fabricação de produtos, ainda que envolva secundariamente serviços de impressão gráfica, não está sujeita ao ISS”, concluiu.

Resp725.246

Leia a íntegra da decisão

RECURSO ESPECIAL Nº 725.246 – PE (2005/0023177-2)

RECORRENTE : INDÚSTRIAS KLABIN S/A

RECORRENTE : INDÚSTRIAS KLABIN S/A

ADVOGADA : PATRÍCIA GUIMARÃES HERNANDEZ E OUTROS

RECORRIDO : MUNICÍPIO DO RECIFE

PROCURADOR : OSWALDO NAVES VIEIRA JUNIOR E OUTROS

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI (Relator): Trata-se de recurso especial (fls. 192-203) interposto com fundamento nas alíneas a e c do permissivo em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco que, em demanda visando à anulação de débito fiscal (ISS sobre “atividade de confecção de sacos personalizados”) manteve a sentença de improcedência do pedido, com base nos seguintes fundamentos: (a) a atividade de confecção de sacos com impressão gráfica personalizada amolda-se ao fato gerador do ISS, pouco importando “se esses sacos personalizados são utilizados para o acondicionamento de produtos industrializados pelos encomendantes, e comercializados a terceiros” (fl. 50); (b) aplica-se no caso a Súmula 156 do STJ (a prestação do serviço de composição gráfica, personalizada e sob encomenda, ainda que envolva fornecimento de mercadorias, está sujeita apenas ao ISS).

Nas razões do especial, alega-se, além de divergência jurisprudencial, violação aos artigos 46, parágrafo único, do CTN; 3º, parágrafo único, da Lei 4.502/64; 2º e 3º do Regulamento do IPI, aprovado pelo Decreto 87.981/82, e 2º, V, do Convênio ICMS nº 66, à consideração de que (a) os precedentes invocados no aresto atacado envolviam atividades realizadas por empresas gráficas, que prestam tais serviços a seus clientes, sob encomenda e personalizados; (b) o serviço prestado pela ora recorrente é de confecção de sacos de papel para acondicionamento de mercadorias a serem vendidas por seus clientes a terceiros, o que enseja a incidência do IPI e do ICMS, mas não do ISS; (c) o ISS não pode incidir sobre a produção e a circulação de produtos e mercadorias, pois estes não são considerados serviços; (d) “destinando-se a serem utilizados pelos clientes da recorrente no acondicionamento dos produtos por eles fabricados e comercializados, não podem os sacos impressos, à evidência, ser considerados ‘impressos personalizados’, para fins de incidência tributária (estes, sim, destinados a uso próprio do adquirente, como ocorre, por exemplo, com os talonários de notas fiscais e os cartões de visitas), mostrando-se cristalina, portanto, a sua não-sujeição ao ISS” (fl. 198); (e) “a recorrente beneficia a matéria-prima adquirida, produzindo os sacos, e posteriormente, os vende aos seus clientes, estampando, eventualmente, dados no referido produto a pedido de seu cliente, o que, de forma alguma, tem o condão de descaracterizar a operação de industrialização e de venda da mercadoria” (fl. 199).


Em contra-razões a este recurso (fls. 223-226), sustenta o recorrido (a) falta de prequestionamento e (b) não comprovação do direito local invocado.

É o relatório.

EMENTA

TRIBUTÁRIO. ISS. CONFECÇÃO DE SACOS DE PAPEL COM IMPRESSÃO GRÁFICA PERSONALIZADA. ATIVIDADE PREPONDERANTEMENTE INDUSTRIAL. SÚMULA 156 DO STJ. NÃO INCIDÊNCIA.

1. A atividade de confecção de sacos para embalagens de mercadorias, prestada por empresa industrial, deve ser considerada, para efeitos fiscais, atividade de industrialização. A inserção, no produto assim confeccionado, de impressões gráficas, contendo a identificação da mercadoria a ser embalada e o nome do seu fornecedor, é um elemento eventual, cuja importância pode ser mais ou menos significativa, mas é invariavelmente secundária no conjunto da operação.

2. A súmula 156 do STJ, segundo a qual “a prestação de serviço de composição gráfica, personalizada e sob encomenda, ainda que envolva fornecimento de mercadorias, esta sujeita, apenas, ao ISS”, tem por pressuposto, conforme evidenciam os precedentes que a sustentam, que os serviços de impressão gráfica sejam preponderantes na operação considerada. Pode-se afirmar, portanto, sem contradizer à súmula, que a fabricação de produtos, ainda que envolva secundariamente serviços de impressão gráfica, não está sujeita ao ISS.

3. Recurso especial a que se dá provimento.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI (Relator):

1. A matéria está devidamente prequestionada, estando o debate centrado na identificação da natureza do fato descrito no auto de infração: se é fato gerador de ISS ou de outro tributo (ICMS, IPI), tema que envolve interpretação e aplicação de normativos federais, e não locais.

O recurso atende assim aos requisitos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

2. A origem da controvérsia é o auto de infração 56969, lavrado pela Prefeitura Municipal do Recife, fundado na seguinte justificativa: “Deixou de recolher o ISS pertinente a sua atividade de confecção de sacos personalizados para diversos clientes, de forma que a sua produção basicamente é por encomenda e sempre com a identificação do produto e do encomendante (da Bates S/A.); a impressão feita em rotativa; a matriz com os dizeres é produzido pelo contribuinte ou recebido do cliente ou encomendado a terceiros (clicheria). (…) Impressões reproduzidas em offset variam de cores e são impressas no momento da confecção da sacaria.

Esta atividade se não propriamente caracteriza como serviços gráficos a estes se assemelham, como composição gráfica. Desta forma, apesar do resultado final ser um produto industrial, é fato gerador do campo de incidência do ISS” (fls. 17 e 17v.).

Quanto à matéria de fato, portanto, não há controvérsia: a atividade desenvolvida pela recorrente tem como resultado final um “produto industrial”, mas nele está também inserido um elemento resultante atividade de impressão gráfica, que é a identificação do produto a ser embalado e do nome do seu fornecedor. O que se questiona é se nesse fato há ou não configuração de fato gerador de ISS.

3. À época do auto de infração questionado nos autos o tema estava disciplinado no art. 8º do DL 406/68:

Art 8º O imposto, de competência dos Municípios, sobre serviços de qualquer natureza, tem como fato gerador a prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço constante da lista anexa. § 1º Os serviços incluídos na lista ficam sujeitos apenas ao imposto previsto neste artigo, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadoria. § 2º Os serviços não especificados na lista e cuja prestação envolva o fornecimento de mercadorias ficam sujeitos ao imposto de circulação de mercadorias.

O fato gerador do tributo dizia respeito, portanto, aos serviços constantes da lista anexa a esse Decreto, dentre os quais se encontram, como previsto em seu item 77, a de “composição gráfica, fotocomposição, clicheria, zincografia, litografia e fotolitografia”. Tal dispositivo foi revogado pela LC 116/03, que dispõe em seu art. 1º:

Art. 1º O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.

A lista a que se refere esse dispositivo manteve, em seu item 13.05, a mesma redação da

lista anterior, fazendo incidir a exação ao citado serviço de “composição gráfica, fotocomposição, clicheria, zincografia, litografia e fotolitografia”.

4. A questão se resolve, no meu entender, levando em consideração a natureza da atividade preponderante empregada na operação como um todo (não confundir com a “atividade preponderante do prestador”, referida na parte final do art. 1º da LC 116/03). Nos casos em que a operação envolver atividade mista, o que se levará em conta, para efeito de definição do tributo incidente (ISS ou IPI ou ICMS) é a atividade contratada e prestada em caráter preponderante. A simples prestação de serviço de composição gráfica, por si só, não induz certeza sobre a incidência de ISS. Não fosse assim, chegaríamos ao absurdo de entender que o ISS incide até em atividade industrial em que o produto industrializado simplesmente traga – como comumente ocorre – a impressão gráfica de sua marca, da sua fórmula, do nome do fabricante, e assim por diante. Ora, a recorrente produz sacos de papel, e nessa condição é que celebra operações com seus clientes. Trata-se, portanto, de atividade com caráter preponderantemente industrial. O próprio auto de infração, de certo modo, reconhece essa circunstância, ao referir que o produto final é industrial. A inserção de serviços gráficos pode integrar (e, no caso específico do auto de infração questionado, integrou) o produto fabricado, mas como um elemento eventual, cuja importância relativa pode ter maior ou menor significado na composição definitiva (dependendo do interesse do cliente), mas é invariavelmente um elemento secundário em face do conjunto da operação contratada.


5. A doutrina abona esse critério. Leia-se o que, a propósito, escreveu Sacha Calmon Navarro Coelho:

“O prestar serviços, em determinadas configurações, envolve fricções em áreas próximas do ICMS e do IPI. Assim, a oficina que conserta o carro, o caminhão, o trator, a geladeira, o televisor, as máquinas em geral, freqüentemente utiliza peças prontas (que são mercadorias). Todavia, o dar a peça é acessório. O prestador não se propõe a vender a peça e realizar o serviço, mas a “consertar”, implicando a utilização das peças. Predomina o serviço. O mesmo se pode dizer do fornecimento de comida e bebidas em restaurantes, bares e similares. O usuário não contrata a compra de uma garrafa de whisky, de carnes, legumes e iguarias. Propõe ao prestador que lhe sirva uma dose de bebida, em copo adequado, com gelo e ou soda, e um prato preparado com esmero e sabor. Contrata serviço (facere) e não uma venda (dare). (…) Quando compro um televisor (mercadoria), posso exigir que seja limpo, sintonizado e que um técnico o instale e o ponha em funcionamento. Aí a predominância é dar o televisor em troca do preço (compra e venda). Os serviços são acessórios. Se mando fazer uma cortina, sob especificação, com indicação do tecido ou do estilo, estou contratando um serviço e não uma cortina pronta. Mas posso comprar um tapete, ou vidros, ou janelas e contratar o serviço de instalação (facere). Às vezes, um industrial manda usinar uma peça para utilizá-la no artefato que industrializa. Contrata um serviço, mas serviço industrial, que se integra no processo de fabricação do produto final”. (Curso de Direito Tributário Brasileiro, Forense, 7ª edição, p. 431)

Assim, embora o § 1º do art. 8º do Decreto-Lei 406/88 preveja que os serviços incluídos na lista anexa ficam sujeitos apenas ao ISS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadoria, não se pode perder de vista que o objeto da contratação deve ter sido o serviço, o fazer, e não o dar. No caso, é evidente que os recorrentes estavam obrigados a dar bens, e não a prestar um serviço. A impressão de signo distintivo nos pacotes representa mera etapa da industrialização, não representando serviço especificamente contratado.

6. Há, é certo, a súmula 156 do STJ, segundo a qual “a prestação de serviço de composição gráfica, personalizada e sob encomenda, ainda que envolva fornecimento de mercadorias, esta sujeita, apenas, ao ISS”. Todavia, seu enunciado não é incompatível com o entendimento ora defendido. Pelo contrário: também essa súmula tem como pressuposto que os serviços de impressão gráfica sejam preponderantes. Aliás, nos precedentes que deram origem à edição da súmula 156, estavam envolvidas, em todos eles, contribuintes cujas atividades eram de produção gráfica: no REsp 1.235 (DJ de 16.09.91), a Palmares Impressora Litográfica Ltda.; no REsp 5.808-0 (DJ de 17.12.92) a Magno Print Autoadesivos Ltda.; no REsp 18.992-0 (DJ de 10.10.94), a Indústria Gráfica Domus Ltda.; no REsp 33.414 (DJ de 19.12.94), as Indústrias Gráficas Massioli Ltda.; no REsp 37.548-7 (DJ de 11.10.93) a Riberplex Serviços Gráficos Ltda.; no REsp 44.892-1 (DJ de 22.05.95), a Gegraf Indústria Gráfica Geral S/A; e no REsp 61.914-9 (DJ de 22.05.95), a Sasun Indústria de Produtos Termo Transferíveis Ltda., fornecedora, segundo o acórdão, de “estampas adesivas”.

7. Pode-se afirmar, portanto, sem contradizer a súmula, que a fabricação de produtos, ainda que envolva secundariamente serviços de impressão gráfica, não está sujeita ao ISS.

Reconhece-se que a questão não está bem definida no STJ. Há, com efeito, precedentes que infirmam o entendimento aqui sustentado, como se pode verificar, por exemplo, do Ag.Rg. no Agravo de Instrumento 454.156-SP, 2ª Turma, Min. João Otávio de Noronha (DJ de 03/05/2004), com a seguinte ementa:

“TRIBUTÁRIO. EMBALAGEM PERSONALIZADA DE PRODUTOS. SERVIÇO DE COMPOSIÇÃO GRÁFICA. INCIDÊNCIA DO ISS.

1. É iterativa a orientação desta Corte no sentido de que os impressos encomendados e personalizados, como rótulos, embalagens e etiquetas, consistindo em serviços de composição gráfica, estão sujeitos ao ISS, e não ao ICMS.

2. Agravo regimental provido para conhecer do agravo de instrumento e dar provimento ao recurso especial.”

Mas há também precedentes em outro sentido, como o do Resp 470577/SP, da mesma 2ª Turma, Min. Eliana Calmon, DJ de 28.06.2004, com a seguinte ementa:

“TRIBUTÁRIO. ICMS. MATERIAL DE EMBALAGEM CONFECCIONADA COM PRODUTOS METÁLICOS E ACABAMENTO GRÁFICO.

1. As embalagens fabricadas pela empresa são de material metálico, com acabamento gráfico, preponderando a utilização do produto metálico sobre o material gráfico, o que a faz contribuinte do ICMS.

2. É irrelevante para o exame da incidência do imposto, se ICMS ou ISS, o fato de serem as embalagens feitas sob encomenda.

3. Recurso especial desprovido.”

7. Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para julgar procedente o pedido, invertidos os ônus sucumbenciais fixados na sentença. É o voto.

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