Perigo alviverde

Ministério Público pede a interdição do estádio do Palmeiras

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16 de março de 2005, 20h21

O Ministério Público não quer que os torcedores do Palmeiras continuem freqüentando o estádio de seu time, o Parque Antártica. Nada contra os palmeirenses. Apenas precaução e segurança. O promotor Carlos Alberto Amin Filho ajuizou Ação Civil Pública, nesta quarta-feira (16/3), pedindo que a Justiça impeça o Palmeiras de promover qualquer tipo de atividade em seu clube ou estádio até que se adapte às exigências do Corpo de Bombeiros e do Contru — Departamento de Controle do Uso de Imóveis, da prefeitura.

Segundo o MP, o sistema de segurança contra incêndios está inoperante, as saídas de emergência são deficientes e o clube armazena gás e líquidos inflamáveis de forma inadequada. Na ação, o promotor cita perícia técnica feita há pouco mais de um mês pelo Corpo de Bombeiros. Segundo o laudo, um incêndio no local pode se tornar incontrolável.

Consta da perícia que o sistema de alarmes do clube também não funciona e não cobre todos os setores do clube. Sobre os extintores de incêndio, a ação registra que “faltam vários destes, os quais foram retirados para revisão e não foram substituídos. Vários dos extintores existentes, porém, estão com carga vencida”.

O Corpo de bombeiros salientou que “a falta, inoperância ou má distribuição de tais extintores pode ser o diferencial entre a ocorrência de um pequeno ou de um grande incêndio”.

A respeito das saídas de emergência, a perícia demonstra que “nas arquibancadas do estádio, a sinalização se dá somente por setas, sem a imprescindível indicação de Saída de Emergência”. Além disso, aponta que nas arquibancadas não existem escadas com degraus adequados para o fluxo de pessoas. “Tal situação pode acarretar um grande número de quedas — e pisoteamento, acrescenta-se — em uma situação de pânico, em função da elevada altura do degrau da arquibancada (aproximadamente 40cms)”, registra o promotor.

Para completar o quadro, o MP sustenta que o clube guarda cilindros de gás de forma inadequada. “No setor de hidroterapia, localizado sob o campo de futebol (Departamento Médico) está instalada uma bateria para até cinco botijões de GLP do tipo P-13 (treze quilogramas), para aquecimento de uma piscina. O local, por ser subterrâneo e oferecer pouca ventilação, apresenta grande risco de explosão em caso de vazamento”.

O MP também afirma que a área do clube e do estádio, de cerca de 40 mil metros quadrados está em “situação de absoluta clandestinidade perante o Corpo de Bombeiros, já que só havia autorização para as atividades exercidas em cerca de 10 mil metros quadrados desta área, autorização esta expirada em fevereiro de 2002”.

Leia a íntegra da ação

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA CAPITAL – FORO CENTRAL

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, através de seu representante que esta subscreve, com fun¬damento nos arts. 1o., incisos III e IV, 5o. e 21 da Lei 7.347/85 (Lei de Ação Civil Pública), arts. 81, 82, 83, 110 e 117 da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), art. 25, IV, “a”, da Lei no. 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Mi¬nistério Público), arts. 127 e 129, in¬cisos II e III, da Consti¬tuição Federal, vem propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA com PEDIDO DE LIMINAR, pelo procedimento ordinário, em face de SOCIEDADE ESPORTIVA PALMEIRAS, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CPNJ/MF sob o no. 61.750.345/0001-57, com sede à R. Turiaçu, no. 1840, ou à Av. Francisco Matarazzo, no. 1705, ambos na Vila Pompéia, Lapa, nesta Capital, pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos.

I. DOS FATOS:

De acordo com o que foi apurado no procedimento averiguatório de no. 110/01, as dependências do clube e do estádio de propriedade da co-ré SOCIEDADE ESPORTIVA PALMEIRAS – doravante denominada simplesmente PALMEIRAS -, sitas à R. Turiaçu, no. 1840, ou à Av. Francisco Matarazzo, no. 1705, ambos na Vila Pompéia, Lapa, nesta Capital, encontram-se em situação de irregularidade e de grave risco, inviabilizando sua utilização pela população em geral, enquanto os citados fatores causadores de insegurança não forem eliminados.

Realmente, segundo o mais recente trabalho de perícia técnica realizado pelo Corpo de Bombeiros no local acima especificado – datado de 11 de fevereiro de 2.005, e comunicado a este órgão ministerial em 25 do mês em questão, cf. fls. 433/440 -, diversos são os problemas que afetam as condições de segurança do referido clube e estádio, abrangendo seus respectivos sistemas de incêndio que se encontram inoperantes, assim como as deficientes saídas de emergência ali vistoriadas e, mesmo, o inadequado armazenamento de líquido ou gás inflamável.

Conforme o que se depreende do laudo técnico referido, o sistema de hidrantes das instalações verificadas encontram-se inoperantes, acarretando grave situação de risco em toda a edificação ali erguida. De fato, a bomba de incêndio é inoperante. Como o reservatório e a bomba de incêndio são subterrâneos, toda a rede de incêndio permanece seca e sem condições de uso. Praticamente todos os setores do clube são atendidos pelo sistema, por possuírem área construída acima de 750ms2. Ainda segundo os Bombeiros, os hidrantes são necessários para combate a focos de incêndios, quando o uso dos extintores portáteis não for suficiente. Assim, devido às deficiências apontadas quanto ao sistema de hidrantes, caracterizado está o risco de um incêndio no local se tornar incontrolável.


Ademais, a respeito do sistema de alarmes, afirmou o Corpo de Bombeiros que as duas centrais de alarme existentes, na secretaria e no salão de festas, não estão funcionando e não atendem a toda a edificação. Não há acionadores de alarme e sirenes em vários locais onde deveriam existir (junto aos hidrantes). Desta forma, o risco se caracteriza pela falta de sistema de alerta, o que prejudica a rápida identificação de um caso de incêndio, bem como deriva a insegurança da ineficácia do alarme aos usuários para que abandonem a edificação.

No que se refere ao sistema de iluminação de emergência, advertiu o Corpo de Bombeiros que o grupo motogerador não está funcionando e que não atende todas as áreas, sendo, inclusive, necessárias manobras para que o gerador atenda a um ou a outro setor. Também, afirmou que existem pontos de iluminação de emergência do tipo blocos autônomos, principalmente nos setores de eventos com público, porém sua distribuição necessita ser adequada de modo a atender aos critérios técnicos (distância entre pontos, saídas de emergência, corredores de circulação, mudanças de direção, etc.). Como salientou, o risco aqui se caracteriza pela necessidade de existir aclaramento suficiente em todos os setores quando da falta ou corte de energia elétrica, visando principalmente à fuga das pessoas e às operações de emergência por parte da brigada de incêndio e do próprio pessoal do corpo de Bombeiros.

Sobre os extintores de incêndio, asseverou o Corpo de Bombeiros que faltam vários destes, os quais foram retirados para revisão e não foram substituídos. Vários dos extintores existentes, porém, estão com carga vencida. A par disto, a distribuição dos mesmos precisa ser adequada de modo a atender critérios técnicos (área de cobertura, percurso máximo, diversificação, etc.). Salientou, por igual, que a falta, inoperância ou má distribuição de tais extintores pode ser o diferencial entre a ocorrência de um pequeno ou de um grande incêndio, já que constituem o sistema de proteção para princípios de incêndio, podendo ser utilizados por qualquer pessoa ou, preferencialmente, por integrantes de uma brigada de incêndio, evitando-se sua propagação.

A respeito das saídas de emergência o Corpo de Bombeiros asseverou que, nas arquibancadas do estádio, a sinalização se dá somente por setas, sem a imprescindível indicação de “Saída de Emergência”. Igualmente, alertou que, também nas arquibancadas, não existem escadas com degraus adequados para o fluxo ascendente e descendente de pessoas. Tal situação pode acarretar um grande número de quedas – e pisoteamento, acrescenta-se – em uma situação de pânico, em função da elevada altura do degrau da arquibancada (aproximadamente 40cms). As arquibancadas, por derradeiro, não estão fisicamente divididas em setores, de modo a orientar o público para a saída de emergência correspondente, dificultando a evacuação em caso de necessidade.

No que tange ao armazenamento de líquido ou de gás inflamável, o Corpo de Bombeiros verificou que há um grande cilindro horizontal de GLP (gás liqüefeito de petróleo) desativado, porém com resíduos de gás e cuja cerca de isolamento encontra-se danificada, possibilitando acesso indevido. No mesmo local situam-se os medidores de gás natural (COMGÁS), atualmente em uso. Tal situação oferece risco por possibilitar que pessoas não qualificadas adentrem ao local.

No setor de hidroterapia, localizado sob o campo de futebol (Departamento Médico) está instalada uma bateria para até cinco botijões de GLP do tipo P-13 (treze quilogramas), para aquecimento de uma piscina. O local, por ser subterrâneo e oferecer pouca ventilação, apresenta grande risco de explosividade em caso de vazamento.

Finalmente, reportou-se que a lanchonete situada próxima do restaurante utiliza-se de dois botijões de GLP (P-13), para uso em fogão e forno semi-industrial, o que não é permitido pela legislação, que só autoriza tal uso para cocção doméstica. Os botijões encontram-se em ambiente fechado e ligados aos equipamentos por mangueiras plásticas. O local possui grande afluxo de público por estar localizado nas proximidades da entrada principal do clube.

Como conclusão, afirma o Corpo de Bombeiros que, para que a regularização das edificações que compõem o clube e o estádio de futebol possa ocorrer perante a instituição citada, devem ser tomadas providências para aprovação de projeto substitutivo junto aos Bombeiros. Após sua aprovação, devem ser instalados os sistemas de proteção e de combate a incêndio de acordo com o projeto em questão e solicitada vistoria técnica junto à divisão competente. Somente após tais providências serem tomadas, depois da situação de risco ser eliminada e da aprovação ser obtida, assim como após as respectivas vistorias confirmarem a correção do que realizado em face do aprovado, o clube e o estádio poderão ser liberados para a utilização do público.


A propósito, cumpre esclarecer que toda a área edificada do clube e do estádio – a qual conta com cerca de 40.000ms2 (na realidade, 39.931,98ms2) -, encontra-se em situação de absoluta clandestinidade perante o Corpo de Bombeiros, já que só havia autorização para as atividades exercidas em cerca de 10.000ms2 (na verdade, 10.139ms2) desta área, autorização esta expirada em fevereiro de 2.002. Apesar de instado a regularizar sua situação perante os Bombeiros, o requerido PALMEIRAS, desde o ano de 2.001, mantém em seu poder o necessário projeto substitutivo de no. 34/01, onde “comunique-se” foi expedido pela instituição militar, sem qualquer atendimento por parte do réu, que prefere se manter na clandestinidade apesar de conhecer o grave risco a que expõe a vida e a saúde de seus associados, visitantes e torcedores que comparecem às dependências objeto da presente demanda.

Em complemento às graves denúncias de risco realizadas pelo Corpo de Bombeiros, recente relatório atualizado de vistoria feita no local por CONTRU (Departamento de Controle do Uso de Imóveis, órgão da Secretaria Municipal da Habitação e Desenvolvimento Urbano de São Paulo) – datado de outubro de 2.004 -, reforça a comprovação das irregularidades observadas e dos riscos existentes (cf. fls. 336 e ss.).

Neste sentido, cumpre ressaltar a falta de degraus intermediários facilitadores de escape em caso de evacuação necessária e urgente do estádio (cf. fls. 350 e 351); a existência de espaço com largura inferior a 50cms nas arquibancadas, o que gera um maior adensamento da ocupação e uma maior dificuldade de escape em caso de pânico (cf. fl. 353); a ausência de corrimãos, auxiliares da fuga, evitando desequilíbrios, quedas e pisoteamento em caso de escape emergencial (cf. fls. 354, 355, 361, 362, 366 e 428), o que também pode ocorrer face à constatação de degraus em leque nas escadas (cf. fl. 360); o grave fato de existirem portões no estádio que abrem no contrafluxo, dificultando ou impedindo a evasão em situações emergenciais (cf. fls. 357 e 358); falta de sinalização de equipamentos de combate a incêndio (cf. fls. 421 e 422), o que inviabiliza sua adequada utilização em caso de necessidade; e infiltração em juntas de dilatação do estádio (cf. fl. 424), que podem ser indicador de ruína futura do prédio. Finalmente, impôs o CONTRU administrativamente ao PALMEIRAS a lotação máxima de 29.876 pessoas, o que, por questão de segurança, deverá ser respeitado (cf. fls. 145 e 155).

II. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DA PRESENTE AÇÃO:

Como se deduz da narração dos fatos, através da presente demanda procura-se tutelar as medidas de segurança que deveriam estar presentes no imóvel objeto da ação, o qual, apesar de particular, encontra-se aberto à freqüência coletiva, necessitando atender às condições mínimas de segurança de seus usuários e freqüentadores.

No dizer de Hely Lopes Meirelles, em seu “Direito Municipal Brasileiro”, Malheiros, 7ª ed., p. 365, “as medidas de segurança se concretizam em inspeções permanentes dos locais e recintos de freqüência pública; na obrigatoriedade de saídas de emergência, na exigência de equipamentos contra incêndio; na limitação de lotação e demais providências que visem à incolumidade e ao conforto dos freqüentadores em geral”.

Na realidade, trata-se de impor ao proprietário responsável mais do que a execução das medidas de segurança exigidas pelos órgãos competentes do Município e do Estado. Trata-se de ação que visa garantir o efetivo respeito ao direito à segurança, consagrado expressamente na Constituição Federal, em seus artigos 5o e 6o. Segurança esta que, além do sentido de prevenção do crime, exprime-se em uma expectativa de incolumidade física necessária para o pleno desenvolvimento das funções urbanas típicas (habitar, recrear, circular e trabalhar), e que deve estar presente nas edificações como as que são objeto da presente demanda, mais ainda que abertas à frequentação pública.

Assim é que o referido art. 5º da Carta Magna, em seu “caput” e em seu inciso XXIII, por um lado, disciplina o citado direito à segurança e a reportada garantia fundamental à vida. E, por outro, tutela a função social inerente às cidades bem como às propriedades que a compõem, as quais, necessariamente, devem garantir a seus usuários a segurança mínima constitucionalmente exigida, sob pena de configurarem abusividade no exercício do domínio por parte de seus proprietários (a propósito, cf. art. 187 do Novo Código Civil Brasileiro). Vejamos:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:


(…)

XXIII – a propriedade atenderá a sua função social.

A citada Constituição da República, em seu art. 182, esclarece melhor o que pretende assegurar com a referida função social da propriedade, garantidora que é do respeito ao direito humano à vida e à saúde, vinculando-a à observância dos ditames dos Planos Diretores:

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.

(…)

Par. 2º – A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no Plano Diretor.

A Constituição Estadual também constitui resguardo ao principio da segurança quando observa:

Art. 180. No estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano, o Estado e os Municípios assegurarão:

I – o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e a garantia do bem estar de seus habitantes;

(…)

V- a observância das normas urbanísticas, de segurança, higiene e qualidade de vida.

A Lei Orgânica do Município não foge ao assunto quando coloca a questão do risco ora tratado em sua órbita de atuação, impondo a adoção de medidas que previnam sua efetiva ocorrência, sujeitando a realização de obras, o exercício de atividades e a prestação de serviços à observância do Plano Diretor mencionado, assim como à prévia aprovação da Municipalidade:

Art 156. A realização de obras, a instalação de atividades e a prestação de serviços por órgãos públicos municipais, estaduais ou federais, e entidades particulares não poderão contrariar as diretrizes do Plano Diretor e dependerão de prévia aprovação do Município, atendidos seus interesses e conveniências.

O PDE – Plano Diretor Estratégico (Lei Municipal no. 13.430/02), sempre citado como determinante da função social das propriedades, e como fonte de garantia à vida e à segurança da população – plano este que é determinante para agentes privados, cf. art. 2º, “caput”, do próprio PDE -, dispõe:

Art. 11. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, no mínimo, os seguintes requisitos:

(…)

IV – a compatibilidade do uso da propriedade com a segurança, bem-estar e saúde de seus usuários e vizinhos.

Art. 76. São objetivos da Política de Urbanização e Uso do Solo:

(…)

XIV- coibir e rever a prática de construção e uso irregular das edificações, revendo e simplificando a legislação, e implantar sistema eficaz de fiscalização.

Em resumo do acima exposto, pode-se salientar que o exercício da propriedade e a garantia à vida e à segurança da pessoa humana são fatores que se encontram absolutamente interligados e interdependentes, não se admitindo desta forma propriedades – ou cidades – que atendam a sua função social sem que garantam o direito à segurança de seus usuários e que assegurem aos mesmos suas vidas.

Ademais, deve ser ressaltado que o proprietário do imóvel em questão – inseguro, ameaçador da vida e descumpridor de sua função social -, por sua omissão voluntária e negligência, está a cometer ato ilícito (cf. art. 186 do Novo Código Civil), ameaçando de dano a incolumidade física de seus freqüentadores, o que não mais deve prosseguir, tonando-se responsável pela reparação dos danos e do risco por si causados (cf. art. 927 e parágrafo único do citado Estatuto Civil).

Igualmente, não se pode deixar de relembrar que, além das normas acima citadas, outras mais específicas ainda vêm sendo violadas pela conduta omissa e negligente do proprietário ora requerido.

De modo a que se verifique tais outras violações à legislação pertinente que rege as medidas de segurança de atendimento necessário por parte dos responsáveis por imóveis abertos à freqüência pública, deve ser frisado o disposto na Lei Estadual no. 684/75 e em seu Decreto regulamentador, o Decreto Estadual de no. 46.076/01.

O art. 3º da Lei assim disciplina:

Art. 3º Os Municípios se obrigarão a autorizar o órgão competente do Corpo de Bombeiros, da Polícia Militar, a pronunciar-se nos processos referentes à aprovação de projetos e à concessão de alvarás para construção, reforma ou conservação de imóveis, os quais, à exceção dos que se destinarem às residências unifamiliares, somente serão aprovados ou expedidos se verificada pelo órgão, a fiel observância das normas técnicas de prevenção e segurança contra incêndios.

Par. Único – A autorização de que trata este artigo é extensiva à vistoria para a concessão de alvará de “habite-se” e de funcionamento, bem assim à verificação da efetiva observância das normas técnicas.


Como se depreende da leitura de tal norma, o pronunciamento favorável do Corpo de Bombeiros é absolutamente indispensável a que se obtenha a pertinente autorização para exercer atividades nas edificações que não sejam de destinação residencial unifamiliar, assim como é indispensável ao regular e legal exercício de atividades a observância às normas técnicas de prevenção e segurança contra incêndios.

Por seu turno, o Decreto Estadual no. 46.076/01, que regulamenta a obtenção de tal pronunciamento favorável do Corpo de Bombeiros, disciplina a competência da corporação militar para a regulamentação, análise e vistoria das medidas de segurança contra incêndios (especialmente, arts. 4o e 5º). Igualmente, para que seja atendida a missão institucional de segurança contra incêndio, o Decreto em questão impõe aos Bombeiros a função de expedir o necessário AVCB – Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros, documento emitido por tal instituição que certifica que, durante a vistoria realizada, a edificação possuía plenas condições de segurança contra incêndio, previstas pela legislação e constantes no processo competente, estabelecendo um período de revalidação (cf. arts. 3º, VIII, e 7º, VII), o que é emitido ao final do procedimento administrativo devidamente regulamentado pelo art. 8o e ss. do Decreto citado.

Isto importa em dizer que, para o regular exercício de atividades no imóvel objeto da presente demanda, deveria o proprietário ter providenciado o necessário pronunciamento favorável do Corpo de Bombeiros, o que corresponde ao citado AVCB. Contudo, em frontal desrespeito à legislação referida acima, não se providenciou o atendimento às exigências feitas, deixando-se de obter o AVCB exigido e exercendo-se as atividades no local em completa clandestinidade. Assim agindo, voluntariamente omisso e negligente o proprietário, é o mesmo responsável pela tomada das providências cabíveis à adequação da edificação sujeita a risco (inclusive mediante a concretização das medidas de segurança contra incêndio expressamente referidas no art. 23 da legislação sob análise), a teor do que estatui o art. 17, II, do Decreto correspondente:

Art. 17. Nas edificações e áreas de risco já construídas é de inteira responsabilidade do proprietário ou do responsável pelo uso, a qualquer título:

(…)

II – tomar as providências cabíveis para a adequação da edificação e áreas de risco às exigências deste Regulamento, quando necessário.

Aliás, o art. 18 do Decreto Estadual sob análise dispõe também que:

Art. 18. O proprietário do imóvel ou o responsável pelo uso obrigam-se a manter as medidas de segurança contra incêndio em condições de utilização, providenciando sua adequada manutenção sob pena de cassação do AVCB, independentemente das responsabilidades civis e penais cabíveis.

A propósito, não é em sentido diverso a mais recente legislação, de que é exemplo o renomado “Estatuto do Torcedor” (Lei no. 10.671/03), que, em seus arts. 13, “caput”, e 14, preceitua:

Art. 13. O torcedor tem direito a segurança nos locais onde são realizados os eventos esportivos antes, durante e após a realização das partidas.

Art. 14. Sem prejuízo do disposto nos arts. 12 a 14 da Lei no. 8.078, de 11 de setembro de 1990, a responsabilidade pela segurança do torcedor em evento esportivo é da entidade de prática desportiva detentora do mando do jogo e de seus dirigentes, que deverão.

A acrescentar ao já verificado, cumpre chamar a atenção para o disposto na legislação municipal que rege a atividade fiscalizatória do CONTRU, especialmente o contido no Decreto Municipal no. 27.820/89, o qual regulamenta a atuação de tal órgão no controle e na fiscalização relativos á segurança de uso de estádios, ginásios esportivos e similares, arts. 1º. (que trata da competência de CONTRU para o exercício de tal poder de polícia), 2º., incisos I (que cuida da competência deste órgão para a fixação da lotação máxima permitida), II (que cuida de igual competência para a imposição de observância e adequação de corrimãos, assim como de alambrados, cercas e outros elementos que constituam obstrução ou risco em caso de pânico, e de rotas de circulação e saídas), III (que cuida da competência para impor a observância a sinalização facilmente identificável para rotas de circulação e saídas, bem como para equipamentos de prevenção e combate a incêndio e pânico), IV e V (para exigir instalação de fonte alternativa de energia, assim como instalações elétricas de acordo com as normas técnicas da ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas). Igualmente, para o disposto nos arts. 5º e 6º do decreto citado, que exigem, para o exercício de atividades no local de reuniões sob análise, de Laudo Técnico de Segurança e Alvará de Funcionamento ou Auto de Regularização pertinente. E, por derradeiro, para o disposto no art. 7º. Do decreto em questão que, taxativamente, assevera:


Art. 7º. O desatendimento de qualquer exigência feita pelo CONTRU baseada na legislação de segurança em vigor ensejará a imediata interdição do local.

III- DA MEDIDA LIMINAR:

Além do poder geral cautelar que a lei processual lhe confere (CPC, arts. 798 e 799), o Código de Defesa do Consumidor, dispensando pedido do autor e excepcionando, assim, o princípio dispositivo, autoriza o Magistrado a antecipar o provimento final, liminarmente, e a determinar de imediato medidas satisfativas ou que assegurem o resultado prático da obrigação a ser cumprida (art. 84).

Esta regra é aplicável a qualquer ação ci¬vil pública que tenha por objeto a defesa de interesse difuso, coletivo ou individual homogêneo (art. 21, da Lei de Ação Ci¬vil Pública, com a re¬dação dada pelo art. 117, do Código de Defesa do Consumidor). E o Código de Processo Civil, inovando no processo de conhecimento, alberga a tutela antecipatória do provimento principal (art. 461, par. 3o., do C.P.C.).

No presente caso, é imperiosa a concessão de medida liminar com esse conteúdo tutelar preventivo, já que estão perfeitamente caracterizados os seus pressupostos, consistentes no “fumus boni juris” e no “periculum in mora”.

A plausibilidade do direito é manifesta, tendo em vista o dever do proprietário de afastar o risco de sua propriedade, assim como o fato de tal situação ter se constituído em decorrência de gritante omissão no atendimento das exigências formuladas por CONTRU (Departamento de Controle do Uso de Imóveis, órgão da Secretaria Municipal da Habitação e Desenvolvimento Urbano de São Paulo) e pelo Corpo de Bombeiros. Ademais, a comunidade de usuários – associados, visitantes e freqüentadores em geral do estádio – das dependências afetadas pelo risco, que tem o direito indisponível à existência e à segurança de sua integridade física, está cor¬rendo sério – e diário – risco, especialmente de ser vitimada por incêndios ou explosões, e de não poder escapar adequada e rapidamente das dependências em casos de tais riscos se configurarem concretamente, o que demonstra quanto perigo há na demora em seu afastamento.

IV – DOS PEDIDOS:

I. Diante do exposto, o autor requer, sob pena de multa diária, que se sugere seja de R$ 100.000,00 (cem mil reais), destinada a recolhimento ao Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados (Decreto Estadual no. 27.070/87; art. 13 da Lei no. 7.347/85), na conta corrente no. 13.00074-5, da agência 0935-1, da Agência do Banco Nossa Caixa S/A, sem prejuízo da responsabilização da pessoa desidiosa pelo crime de desobediência e de periclitação à vida, a concessão de LIMINAR para:

I.A. Determinar à ré SOCIEDADE ESPORTIVA PALMEIRAS que cesse imediata e completamente as atividades exercidas diretamente, ou por intermédio de terceiros, em todo o imóvel objeto da presente demanda, composto pelos terrenos e pelas diversas construções que compõem o clube e o estádio sitos à R. Turiaçu, no. 1840, ou à Av. Francisco Matarazzo, no. 1705, ambos na Vila Pompéia, Lapa, nesta Capital, até que as situações caracterizadoras de risco à vida e à saúde dos usuários de tais dependências tenham sido devidamente eliminadas e até que tenham sido tais dependências devidamente regularizadas junto ao CONTRU (Departamento de Controle do Uso de Imóveis, órgão da Secretaria Municipal da Habitação e Desenvolvimento Urbano de São Paulo) e ao Corpo de Bombeiros, o que se dará mediante a expedição das competentes autorizações expedidas por tais órgãos para o normal exercício de atividades no local (Laudo Técnico e Alvará de Funcionamento ou Auto de Regularização, expedidos pelo CONTRU, assim como AVCB – Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros, ou aprovações assemelhadas), e que deverão ser devidamente comprovadas em Juízo.

I.B. Determinar à ré SOCIEDADE ESPORTIVA PALMEIRAS que exiba em Juízo o Projeto Substitutivo de no. 34/01 em trâmite no Corpo de Bombeiros – mas sob o poder físico da requerida – de modo a que possa ser verificada a integralidade das pendências apontadas pela instituição militar como de necessário atendimento pela requerida para a regularização do imóvel objeto da presente demanda.

II. Por igual, a PROCEDÊNCIA da ação, condenando-se a ré SOCIEDADE ESPORTIVA PALMEIRAS, em caráter de definitividade – e sob pena de multa diária, que se sugere seja de R$ 100.000,00 (cem mil reais), destinada a recolhimento ao Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados (Decreto Estadual no. 27.070/87; art. 13 da Lei no. 7.347/85), na conta corrente no. 13.00074-5, da agência 0935-1, da Agência do Banco Nossa Caixa S/A, sem prejuízo da responsabilização da pessoa desidiosa pelo crime de de¬sobediência e de periclitação à vida, a cessar imediata e completamente as atividades exercidas diretamente, ou por intermédio de terceiros, em todo o imóvel objeto da presente demanda, composto pelos terrenos e pelas diversas construções que compõem o clube e o estádio de futebol sitos à R. Turiaçu, no. 1840, ou à Av. Francisco Matarazzo, no. 1705, ambos na Vila Pompéia, Lapa, nesta Capital, até que as situações caracterizadoras de risco à vida e à saúde dos usuários de tais dependências tenham sido devidamente eliminadas e até que tenham sido tais dependências devidamente regularizadas junto ao CONTRU (Departamento de Controle do Uso de Imóveis, órgão da Secretaria Municipal da Habitação e Desenvolvimento Urbano de São Paulo) e ao Corpo de Bombeiros, o que se dará mediante a expedição das competentes autorizações por tais órgãos para o normal exercício de atividades no local (Laudo Técnico e Alvará de Funcionamento ou Auto de Regularização, expedido pelo CONTRU, assim como AVCB – Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros, ou aprovações assemelhadas), e que deverão ser devidamente comprovadas em Juízo.


III. Ademais, sob as penas da multa diária cima sugerida, a PROCEDÊNCIA da ação, condenando-se a ré SOCIEDADE ESPORTIVA PALMEIRAS ao pagamento das custas e demais despesas processuais, a obrigação de fazer consistente na realização efetiva das obras, intervenções e atuações necessárias à integral eliminação do risco à vida e à saúde dos usuários das dependências do imóvel objeto da presente demanda, exigidas por CONTRU (Departamento de Controle do Uso de Imóveis, órgão da Secretaria Municipal da Habitação e Desenvolvimento Urbano de São Paulo) e pelo Corpo de Bombeiros, dentro de prazo que V. Exa. julgar suficiente, mas que se sugere não exceda a 1 (um) ano.

IV. Ainda, e sob as penas da multa diária supra sugerida, a PROCEDÊNCIA da ação, condenando-se a ré SOCIEDADE ESPORTIVA PALMEIRAS a obrigação de fazer consistente em regularizar devidamente junto ao CONTRU (Departamento de Controle do Uso de Imóveis, órgão da Secretaria Municipal da Habitação e Desenvolvimento Urbano de São Paulo) e ao Corpo de Bombeiros, o imóvel objeto da presente demanda, dentro de prazo que V. Exa. julgar suficiente, mas que se sugere não exceda a 1 (um) ano, o que se dará mediante o atendimento às exigências formuladas por tais órgãos e a expedição das competentes autorizações para o normal exercício de atividades no local (Laudo Técnico e Alvará de Funcionamento ou Auto de Regularização, expedido pelo CONTRU, assim como AVCB – Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros, ou aprovações assemelhadas).

V. Também sob as penas da multa diária supra sugerida, a PROCEDÊNCIA da ação, condenando-se a ré SOCIEDADE ESPORTIVA PALMEIRAS a obrigação de fazer consistente em manter as medidas de segurança impostas pelo CONTRU (Departamento de Controle do Uso de Imóveis, órgão da Secretaria Municipal da Habitação e Desenvolvimento Urbano de São Paulo) e pelo Corpo de Bombeiros em adequadas condições de utilização, com plena segurança aos usuários das dependências objeto da presente demanda, sempre que exigido for pelos órgãos municipal e estadual acima referidos, dentro do prazo fixado pelos mesmos administrativamente.

VI. Por derradeiro, sob as penas da multa diária supra sugerida, a PROCEDÊNCIA da ação, condenando-se a ré SOCIEDADE ESPORTIVA PALMEIRAS a obrigação de fazer consistente em respeitar a lotação máxima permitida para o estádio de futebol fixada pelo CONTRU (Departamento de Controle do Uso de Imóveis, órgão da Secretaria Municipal da Habitação e Desenvolvimento Urbano de São Paulo), que é, atualmente, de 29.876 pessoas.

Requer, mais:

1) a citação da ré, por Oficial de Justiça (com a faculdade do art. 172, par. 2o., do C.P.C.), para oferecer resposta no prazo legal, advertindo-o dos efeitos da revelia;

2) a produção de todas as provas admitidas em Direito, notada¬mente documentos, depoimento pessoal do representante da ré, sob pena de confissão, oitiva de testemunhas, reali¬zação de perícias e inspeções judiciais;

3) a dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros encargos (Lei 7.347/85, art. 18; C.D.C., art. 87);

4) as intimações do autor, dos atos e termos pro¬cessuais, na forma da lei, ou seja, à R. Riachuelo, no. 115, 1º. Andar, sala 115, Centro, nesta Capital (art. 236, par. 2o., do CPC), mediante entrega dos autos (art. 41, IV, da Lei 8.625, de 12/02/93 – Lei Orgânica Federal do Minis¬tério Público).

Valor da causa: R$ 100.000.000,00.

São Paulo, 16 de março de 2.005.

Carlos Alberto Amin Filho

Promotor de Justiça

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