Federal x Estadual

Conamp repudia federalização do caso Dorothy Stang

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7 de março de 2005, 19h59

A verdadeira grave violação dos Direitos Humanos é a federalização das investigações do assassinato da missionária Dorothy Stang, pedida pelo procurador-geral da República Cláudio Fonteles. A afirmação é da Conamp — Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, que enviou nota em apoio à atuação do Ministério Público do Pará e em repúdio à transferência de competência.

Segundo a entidade, o artigo 109, parágrafo 5º da Constituição Federal, introduzido pela EC 45/04 (reforma do Judiciário) — dispositivo que embasa a federalização — é inconstitucional. Assim, a medida “viola os direitos e garantias fundamentais constitucionalmente previstos como cláusula pétrea”.

A federalização, diz a entidade, “fere a cláusula pétrea do Pacto Federativo por tratar-se de uma intervenção federal nos Estados e de forma branca, já que a verdadeira intervenção federal (artigo 36 da CF/88) impede votação de emenda constitucional” e “descriminação odiosa pois desconfia de instituições do Estado-membro (MPE e Justiça estadual)”.

Leia a íntegra da nota

A CONAMP (ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO) aprovou MOÇÃO EM APOIO A EFICIENTE ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO PARÁ, REPUDIANDO QUALQUER ATO DE DESLOCAMENTO DE COMPETÊNCIA PARA ESFERA FEDERAL POR ATO DO EXMO.SR. PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA.

A CONAMP entende que o artigo 109, § 5º da CF/88, introduzido pela EC 45/04(Reforma do Judiciário), é inconstitucional pelos seguintes motivos:

(1) A “FEDERALIZAÇÃO DOS CRIMES” é inconstitucional por ferir cláusula pétrea do juiz natural, eis que estabelecido por critério subjetivo (conceito de “violação de direitos humanos”) (cf. Ministro Celso de Melo, no HC 67.759/RJ);

(2) A “FEDERALIZAÇÃO DOS CRIMES” é inconstitucional por ferir cláusula pétrea do “Pacto Federativo”, eis que trata-se de uma “intervenção federal nos Estados” de “forma branca”, já que a verdadeira intervenção federal(artigo 36 da CF/88) impede votação de emenda constitucional;

(3) A “FEDERALIZAÇÃO DOS CRIMES” é inconstitucional por criar uma espécie oblíqua de “Chefia do PGR sobre os PGJ’s”, lembrando que a figura é o retorno com outro rótulo da antiga avocatória, abolida pela legislação, sendo que consagra o Estado unitário ao invés do Estado Federado(aliás, o próprio nome do instituto já mostra o equívoco do assunto), já que não se está “federalizando” e sim unificando tudo para União;

(4) A “FEDERALIZAÇÃO DOS CRIMES” gera “descriminação odiosa” pois desconfia de instituições do Estado-membro (MPE e Justiça Estadual), quando o critério é meramente de competência;

(5) A “FEDERALIZAÇÃO DOS CRIMES” é figura totalmente desnecessária no Estado democrático de Direito, eis que existem instrumentos já consagrados como:

5.1 – “federalização (leia-se – unificação) das investigações”(a Polícia Federal pelo artigo 144, parágrafo primeiro da CF/88 com regulamentação da Lei 10.446/02, artigo 1, III já consagra a atuação da milícia federal em casos de violação de direitos humanos);

5.2 – desaforamento no rito do Júri, onde os jurados sejam suspeitos ou comprometidos (artigo 424 do CPP) ou na Justiça Castrense (artigo 109 do CPPM).

Aliás, o caso “Dorothy”, missionária assassinada no Pará é doloso contra a vida, como tantos outros delitos que ofendem tratados e nestes casos, quem julga são membros do povo, seja no Tribunal do Júri Estadual ou Federal, o que prova a inconstitucionalidade da norma por retirar do Tribunal do Júri local o princípio da imediatidade e identidade física, por critério subjetivo, além de ofender a própria ampla defesa, eis que com o “sensacionalismo da mídia”, muitos casos podem levar ao “pré-julgamento”.

5.3 –Intervenção federal no Estado-membro, quando a gravidade do assunto comprometer todas autoridades locais/Estadual na omissão de violação de tratados internacionais – artigo 36 da CF/88.

Quanto a isto, antes mesmo do massacre de Eldorado de Carajás e da morte da missionária, o culto PGR à época, Dr. Aristides Junqueira, ajuizou no STF intervenção federal no Pará e o STF negou.

Se existe “federalização das investigações”, “desaforamento no Júri” e “intervenção federal nos Estados”, qual o papel da “federalização dos crimes”? Qual hipótese realmente poderia justificar uma violação do promotor e juiz natural como esta, fora dos casos já previstos ?

(6) A “FEDERALIZAÇÃO DOS CRIMES” é inconstitucional por violar a ampla defesa, eis que a mídia, com a federalização, pode provocar o “pré-julgamento” do caso, o que demonstra um aparente “Tribunal de Exceção”, já que o juiz natural encontra-se completamente comprometido com um critério subjetivo feito por apenas uma única pessoa;

(7) A “FEDERALIZAÇÃO DOS CRIMES” é inconstitucional pela ausência de contraditório com o Procurador-Geral de Justiça do Estado, que sequer será respeitado como Chefe do MPE, eis que basta o PGR, que não é Chefe do MPE, desejar a suscitação e o STJ concordar que tudo estará comprometido, inclusive “causas cíveis”, eis que a CF/88 não fala de “causas criminais”, de sorte que pode haver comprometimento político com a medida em total desrespeito a regras objetivas e prévias de competência para evitar Tribunal de Exceção;

(8) A “FEDERALIZAÇÃO DOS CRIMES” é inconstitucional porque resulta na quebra da razoável duração do processo(nova redação do artigo 5º, LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação), eis que cabendo Recurso Extraordinário da “federalização” dos crimes(ou “das causas”) pelos advogados do réu ou mesmo pelo PGJ do Estado questionado, o processo demorará até julgamento no órgão competente, podendo, em crimes de penas relativamente médias, ensejar prescrição.

Porém, apesar do Ministro da Justiça, Dr. Márcio Thomas Bastos e ainda o Presidente do STJ, Dr. Édson Vidgal, terem se posicionados contrários à medida no caso da missionária Dorothy, no Pará, o Exmo. Dr. Cláudio Fontelles insiste neste absurdo jurídico, leia-se, deslocar o julgamento do Júri Estadual para colocar no Júri Federal, sendo que quem julga É O POVO e não um juiz federal, leia-se, quem julga é quem não tem noção em Direito.

O argumento que as autoridades Estaduais do Pará não tomaram providências é sofisma, eis que Autoridades Federais também foram avisadas e quedaram-se inertes, conforme noticiado também pela imprensa.

Por todo o exposto, a CONAMP REPUDIA O DESLOCAMENTO DO JUIZ E PROMOTOR NATURAL DO FATO, ESTUDANDO O AJUIZAMENTO DE ADIN NO STF CONTRA A VERDADEIRA “GRAVE VIOLAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS”, QUAL SEJA, A “FEDERALIZAÇÃO DOS CRIMES” (VIOLA OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS CONSTITUCIONALMENTE PREVISTOS COMO CLÁUSULA PÉTREA).

BRASÍLIA, 07 DE MARÇO DE 2005

João de Deus Duarte Rocha

Presidente da Conamp

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