Dada a largada

Reforma sindical chega no Congresso já envolta em polêmica

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2 de março de 2005, 19h42

As propostas de aperfeiçoamento da estrutura sindical e das negociações coletivas de trabalho, que começam a ser discutidas, a partir desta quarta-feira (2/3), na Câmara dos Deputados, já chegaram envoltas em profunda polêmica. Não poderia ser diferente. Resultado de dois anos de discussões no Fórum Nacional do Trabalho — organismo tripartite com representação igualitária de empregados, empregadores e governo — as propostas visam mexer nas carcomidas regras que norteiam as relações trabalhistas e que datam da ditadura varguista da década de 30.

A polêmica vai se desenvolver por conta de pontos muito conservadores, para alguns setores, e outros com um sabor exagerado demais para a maioria dos trabalhadores. A começar pela timidez na aplicação das novas regras: as entidades de trabalhadores terão um prazo de três anos, prorrogáveis por mais dois, para se adaptarem. O prazo para as entidades de empregadores é mais generoso, podendo chegar a sete anos, computando-se a mesma prorrogação de dois anos.

O retardamento poderá significar um alívio para o bolso dos trabalhadores. Isto porque uma conta mais amarga poderá substituir o chamado Imposto Sindical, valor correspondente a um dia de trabalho, ou 3,3% do salário, que todos os empregados formais pagam anualmente para manter a estrutura sindical vigente.

Entrará em cena a Contribuição de Negociação Coletiva, cujo valor poderá corresponder a até 1% de toda a remuneração líquida dos trabalhadores auferida no ano anterior. O valor será estipulado em assembléia, de filiados e não filiados à entidade sindical, e não comportará oposição.

“Existem leis estáticas e leis de movimento. A futura lei é de movimento”, afirmou em entrevista à revista Consultor Jurídico, o advogado José Francisco Siqueira Neto, coordenador técnico do Fórum Nacional do Trabalho, responsável direto pela elaboração dos textos que os parlamentares irão analisar. Ou seja, para conter a eventual ganância de dirigentes sindicais, os trabalhadores das diversas categorias terão, é claro, que participar.

Mas também os dirigentes sindicais serão obrigados a se mobilizar buscando representar as suas respectivas categorias profissionais. Para isto, centrais sindicais, confederações, federações e sindicatos poderão contar com até 81 dirigentes titulares e suplentes, que terão estabilidade no emprego até um ano após o final de seus mandatos que serão de três anos — e os salários dos dirigentes que forem desligados da produção sairão dos cofres das entidades, salvo normas em contrário estabelecidas nos contratos coletivos.

Nos locais de trabalho as regras prevêem a eleição de um dirigente nas empresas com mais de 30 e até 80 empregados. O número de representantes cresce de acordo com a quantidade de trabalhadores empregados.

A legitimidade da representação das entidades, prevista no texto, assegura a manutenção da unicidade sindical. Para isto, os sindicatos existentes até a sanção da futura lei deverão comprovar filiação de 20% no mínimo dos trabalhadores da mesma atividade econômica no âmbito geográfico de sua representação.

Além disso, serão obrigados a adotar um estatuto padrão que será elaborado pelo futuro Conselho Nacional de Relações do Trabalho (CNRT) e aprovado pelo ministro do Trabalho e Emprego. Se um ano após a aprovação do estatuto padrão, a entidade não comprovar a representatividade exigida, o campo estará aberto para o estabelecimento da pluralidade sindical.

Essa nova regra vai causar polêmica em dois sentidos. Primeiro, porque, praticamente, a única das amarras que, depois da Constituição de 1988, ainda vincula os sindicatos ao estado, é a concessão da competência para o recolhimento do chamado Imposto Sindical. Voltará a caber ao estado, desse modo, a autorização para funcionamento das entidades sindicais.

Em segundo lugar, a exigência de comprovação de representatividade deverá colocar entre a cruz e a espada uma infinidade de sindicatos pouco ou nada representativos (o chamado sindicalismo amarelo) que figuram entre os cerca de 20 mil sindicatos hoje existentes no país.

A questão da representatividade também deverá colocar em “pé de guerra” diversos setores da estrutura sindical vigente. As regras dirigem-se para as grandes centrais sindicais. Entre outras exigências, para serem reconhecidas, elas deverão contar com a filiação de sindicatos com representatividade comprovada em pelo menos

18 estados nas cinco regiões do país.

As mesmas exigências são estabelecidas para o reconhecimento das confederações de trabalhadores, que também deverão comprovar a efetiva representatividade das federações e sindicatos filiados a elas. Como se sabe, muitas dessas confederações contam com a associação daqueles sindicatos pouco ou nada representativos.

No que se refere às negociações coletivas, os novos dispositivos não deverão provocar grandes polêmicas. O texto introduz conceitos modernos nas relações de trabalho, estabelecendo, por exemplo, a obrigatoriedade dos empregadores negociarem com os seus trabalhadores em greve. A recusa será considerada como prática anti-sindical podendo levar a Justiça a aplicar pesadas multas ao empregador. Da mesma forma, o ajuizamento de dissídios coletivo só será permitido se houver concordância entre as duas partes.

Os interesses dos diferentes setores, agora, desembocarão no Congresso Nacional. Um dos alvos do ataque será a qualidade da composição do Fórum Nacional do Trabalho: empregados e empregadores foram representados apenas pelas Centrais Sindicais e Confederações Empresariais, respectivamente. Também se pode prever uma intensa articulação de lobbies, entre eles os que irão batalhar, de gabinete em gabinete, a manutenção ou, pelo menos, um prazo maior para a regra de extinção do Imposto Sindical.

A questão é controvertida inclusive entre os participantes do Fórum Nacional do Trabalho. Para o presidente da Confederação Nacional da Indústria,Armando Monteiro, não deveria haver imposição da representação dos trabalhadores dentro das empresas. “Elas deveriam resultar da negociação”, ele defende. Para outro setores, a reforma, como está, dará muito poder para as centrais sindicais em detrimento dos sindicatos.

As maiores centrais sindicais estão de mãos dadas nesse embate. Um documento, firmado pelos presidentes da CUT, Luís Marinho, Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, e da Social Democracia Sindical (SDS), Emilson Simões de Moura, foi entregue ao presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, pedindo seu apoio para a reforma.”Essa estrutura sindical foi responsável pela criação de milhares de sindicatos pelo Brasil afora que não representam absolutamente ninguém e que têm somente o interesse de recolher o imposto sindical obrigatório”, afirma.

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