De mão no bolso

Trabalhador revistado nu ganha indenização de R$ 13 mil

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31 de maio de 2005, 9h46

A transportadora de valores Transprev foi condenada a reparar um ex-empregado em R$ 13 mil por dano moral. Motivo: o ex-funcionário, que trabalhava como auxiliar de tesouraria, era obrigado a ficar totalmente nu para ser revistado. O trabalhador era colocado numa sala com paredes de vidro que proporcionava visão da revista para todas as pessoas que estivessem do lado fora.

A transportadora foi condenada pela 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo). Cabe recurso. Para os juízes, a revista pelo empregador não pode invadir a privacidade do trabalhador, pois são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas — direitos assegurados pela Constituição Federal.

O ex-empregado ajuizou a ação na 54ª Vara do Trabalho de São Paulo. Entre outras verbas, ele reclamava indenização pelo dano moral sofrido nas revistas íntimas. Para se defender, a Transprev alegou que a revista era um “meio inibitório” de eventuais furtos. De acordo com a empresa, o auxiliar de tesouraria aceitou ser submetido à prática. A informação é do TRT-SP.

A primeira instância negou a indenização. Entendeu que o empregado não comprovou o dano moral sofrido. Inconformado, ele recorreu ao TRT-SP. O relator do Recurso Ordinário, juiz Paulo Augusto Camara, considerou ser irrelevante o fato de o empregado ter concordado com a revista “uma vez que a coação econômica à qual está submetido no curso do contrato o pressiona a admitir atos patronais que podem ser considerados abusivos”.

Segundo o juiz, “o empregador detém o poder diretivo, que lhe permite traçar as diretrizes para o atingimento de suas metas. Todavia, esta prerrogativa não se sobrepõe jamais ao princípio da dignidade humana”.

O relator considerou ainda que a “a revista do empregado não pode resultar em injustificada invasão de privacidade, pois são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, direitos estes assegurados por norma de status constitucional (artigo 5º, inciso X da Constituição Federal de 1988)”, observou, acrescentando que “o constrangimento causado por uma nudez infligida por terceiro, como provado no caso sob exame, é patente e impõe a correspondente reparação à vítima”.

A decisão da 4ª Turma do TRT-SP foi unânime.

RO 01100.2004.054.02.00-6

Leia a íntegra do voto

PROCESSO TRT/SP Nº 01100.2004.054.02.00-6 – 4ª TURMA

RECURSO ORDINÁRIO DA 54ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO

RECORRENTE: GILSON ANTÔNIO DE OLIVEIRA

RECORRIDA: TRANSPEV TRASNPORTADORA DE VALORES E SEGURANÇA LTDA

Ementa: Dano moral configurado. Revista abusiva e vexatória. Nudez do empregado. É certo que o empregador detém o poder diretivo, que lhe permite traçar as diretrizes para o atingimento de suas metas. Todavia, esta prerrogativa não se sobrepõe jamais ao princípio da dignidade humana (valor humano). Os cuidados patronais pela preservação de seu patrimônio encontram limite intransponível nos direitos personalíssimos. A revista do empregado não pode resultar em injustificada invasão de privacidade, pois são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, direitos estes assegurados por norma de status constitucional (art. 5º, inc. X da Constituição Federal de 1988). A conduta do empregador que desborda dos limites da dignidade do homem configura procedimento vexatório e humilhante que impõe a indenização por danos morais ao trabalhador (art. 5º, inc. V, CFR/88).

A sentença de fl. 58/62, cujo relatório adoto, julgou parcialmente procedentes os pedidos.

Inconformado, recorre ordinariamente o reclamante, consoante razões de fl. 69/72, alegando, em síntese, equívoco na valoração do conjunto probatório e na aplicação do direito. Argumenta que faz jus à paga da extraordinária oriunda da supressão parcial do intervalo legal para refeição e descanso, a qual reputa demonstrada pela prova oral. No tocante à indenização decorrente do dano moral, assevera que há provas suficientes para demonstrar o fato, pois era submetido a revista íntima abusiva, já que tinha que despir o “macacão”, os chinelos e, posteriormente, passou a despir também a roupa íntima, ficando totalmente nu perante seguranças, num recinto exposto por um vidro, circunstâncias as quais adjetiva de humilhantes e vexatórias. Requer a reforma e a conseqüente ampliação do condenatório.

Recurso tempestivo. Preparo desnecessário.

Contra-razões às fl. 80/92.

Desnecessário o parecer da D. Procuradoria do Ministério Público do Trabalho em face do Provimento 1/2005 da Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

Conheço do recurso, uma vez que presentes os pressupostos legais de admissibilidade.

Das horas extras – supressão do intervalo legal para refeição e descanso

O recorrente insiste no pagamento das extraordinárias oriundas da irregularidade na concessão do intervalo alimentar, com fulcro no art. 71, § 4º da CLT.

Sem razão, todavia.

O obreiro não logrou êxito na prova do fato constitutivo do direito, pois não trouxe elementos probatórios robustos para corroborar suas alegações.

O depoimento da testemunha convidada não lhe socorre, neste aspecto, pois a mesma declarou que dispunha do mesmo horário de intervalo que o reclamante, sendo que usufruíam de 15/20 minutos de intervalo, mas 2 (duas) vezes por semana podiam gozar de 1 (uma) hora.

A discrepância entre os depoimentos impede a acolhida do pedido, conforme bem sentenciado na origem.

Nego provimento.

Da indenização decorrente do dano moral

O reclamante, ora recorrente, insiste no pagamento de indenização por dano moral decorrente da revista íntima a qual reputa humilhante e vexatória.

A pretensão merece prosperar.

De início, registro que a própria ré admite, na contestação de fl. 51, que a revista pessoal era imposta como “meio inibitório” de eventuais furtos que poderiam ser cometidos pelos trabalhadores e descreve, com detalhes, o desnudamento do empregado perante um vigilante.

Como se não bastasse, a análise da prova oral revela que os empregados da recorrida eram submetidos a revista abusiva, nas quais o autor era obrigado a ficar nu perante um vigilante, acompanhado ou não de supervisores, em um recinto no qual havia um vidro, que por sua vez, permitia que pessoas do lado de fora visualizassem o empregado revistado “até a cintura” (fl. 26).

O constrangimento causado por uma nudez infligida por terceiro, como provado no caso sob exame, é patente e impõe a correspondente reparação à vítima.

Senão, vejamos.

A indenização decorrente da responsabilização por danos causados (materiais ou morais) pressupõe a existência concomitante do trinômio conduta (comissiva/omissiva), dano (resultado negativo) e nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o prejuízo. Esta é a premissa segundo a qual o Direito, em sua dimensão corretiva ou punitiva, entrega à vítima uma reparação pelo quê lhe foi subtraído.

No presente caso, está evidenciado o procedimento vexatório, pois além do constrangimento causado pela nudez, ainda soma-se a insegurança proporcionada pelo vidro, que permitia a terceiros observarem o constrangedor procedimento.

Irrelevante que o obreiro tenha concordado, tacitamente, ao ato da revista, conforme defendido pela ré, à fl. 51, uma vez que a coação econômica à qual está submetido no curso do contrato o pressiona a admitir atos patronais que podem ser considerados abusivos.

É certo que o empregador detém o poder diretivo, que lhe permite traçar as diretrizes para o atingimento de suas metas. Todavia, esta prerrogativa não se sobrepõe jamais ao princípio da dignidade humana (valor humano).

Os cuidados patronais pela preservação de seu patrimônio encontram limite intransponível nos direitos personalíssimos.

A revista do empregado não pode resultar em injustificada invasão de privacidade, pois são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, direitos estes assegurados por norma de status constitucional (art. 5º, inc. X da Constituição Federal de 1988).

A conduta do empregador que desborda dos limites da dignidade configura procedimento vexatório e humilhante que impõe a indenização por danos morais ao trabalhador (art. 5º, inc. V, CFR/88).

Nesse passo, reformo o decidido para acolher o pedido e condenar a recorrida a pagar ao recorrente indenização por dano moral correspondente a R$ 13.000,00 (Treze mil reais).

Ante o exposto, conheço do recurso, e no mérito, DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO para condenar a reclamada a pagar indenização por dano moral no importe de R$ 13.000,00 (Treze mil reais). Custas no importe de R$ 460,00, calculadas sobre o valor da condenação, redimensionado para R$ 23.000,00. Mantenho, quanto ao remanescente, a r. sentença combatida. Tudo nos termos da fundamentação.

PAULO AUGUSTO CAMARA

Juiz Relator

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