Preço da bronca

Repreensão humilhante a empregado dá direito a indenização

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19 de maio de 2005, 11h46

A Justiça do Trabalho condenou o BankBoston a reparar um ex-empregado por ter divulgado que não cumpria as metas de produtividade estabelecidas pelo banco

A 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região entendeu que o trabalhador, vítima de fofocas dos colegas de trabalho, tem direito de ser indenizado por dano moral.

O valor da reparação, estipulado em R$ 55.205, deve buscar a compensação pela dor da vítima e impedir que este tipo de comportamento se repita, extrapolando os limites do profissionalismo e da urbanidade.

O ex-empregado, que atuava como gerente, ingressou com ação na 1ª Vara do Trabalho de São Paulo. Alegou que, por não ter atingido meta estipulada, foi vítima de discriminação e humilhação. Como prova, apresentou ata de uma reunião que qualificou sua performance como “lamentável”.

Sustentou que a reunião foi desnecessária e gerou humilhação, “pois também deu causa a fofocas e comentários entre os demais funcionários”. Segundo ele, a ata foi encaminhada a outros gerentes do banco. A informação é do TRT-SP.

O BankBoston negou as acusações. Afirmou que, depois da reunião, o gerente “foi tratado com normalidade”, e que as críticas foram apenas profissionais, não pessoais. A primeira instância acolheu a tese do banco e negou o pedido do ex-funcionário, por entender que ele não comprovou ter sofrido perseguição.

Inconformado, o ex-gerente recorreu ao TRT. O relator do Recurso Ordinário, juiz Paulo Augusto Camara, considerou que o prejuízo subjetivo imposto a um trabalhador, pelo empregador ou por seus representantes, extrapola o poder diretivo da empresa e impõe o correspondente reparo.

Uma testemunha no processo confirmou que o ex-empregado foi tratado de forma diferente pelo gerente-geral, que “passou a fazer críticas sobre o trabalho” do autor da ação, chamava sua atenção na frente dos demais funcionários e que “surgiram comentários” sobre o tratamento dado a ele pelo gerente-geral.

“A repreensão pública, assim considerada aquela perpetrada perante a coletividade de funcionários, quiçá subordinados do repreendido, realmente traz gravames profissionais e pessoais”, observou o juiz Camara.

Segundo ele, o empregador “deve tentar obter o melhor desempenho de seus colaboradores através de medidas legítimas e, em não logrando êxito, poderá utilizar a medida extrema, que é a substituição por outro profissional. Entretanto, deverá abster-se de condutas vexaminosas, pois o respeito à dignidade humana é o limite da ação”.

O relator entendeu que a indenização deve representar “impedimento à perpetuação de comportamentos tirânicos praticados por pessoas que extrapolam os limites do profissionalismo e da urbanidade. Disse também que “a reparação pecuniária tem por escopo a compensação pela dor da vítima, a busca da justa reparação”. Assim, condenou o BankBoston ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 55.205,00

RO 00092.2002.001.02.00-3

Leia a íntegra da decisão

PROCESSO TRT/SP N.º 00092.2002.001.02.00-3 – 4ª TURMA

RECURSO ORDINÁRIO DA 1ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO

RECORRENTE: AMAURI CHINCHO DOS SANTOS

RECORRIDA: BANKBOSTON BANCO MÚLTIPLO S/A

Ementa: Dano moral. Indenização. Dimensionamento.

É certo que a subjetividade que envolve a questão do dano moral dificulta a dimensão dos prejuízos oriundos da lesão sofrida. Todavia, não é permitido perder de vista a necessidade do ofendido, a capacidade patrimonial do ofensor e o princípio da razoabilidade. A indenização deve configurar impedimento à perpetuação de comportamentos tirânicos praticados por pessoas que extrapolam os limites do profissionalismo e da urbanidade, enquanto atuam como representantes do empregador. Como se não bastasse, a reparação pecuniária tem por escopo a compensação pela dor da vítima do dano moral, a busca da justa reparação.

A r. sentença de fls. 114/116, cujo relatório adoto, implementada pela decisão de fl. 127, proferida em sede de embargos declaratórios, julgou improcedente o pedido de indenização por dano moral.

Inconformado, recorre ordinariamente o reclamante consoante razões de fls. 132/141, alegando, em síntese, equívoco na valoração do conjunto probatório e na aplicação do direito, por entender que a prova oral confirma a discriminação e a humilhação às quais foi submetido. Aduz que a publicidade atribuída na reunião representada pelo documento de fl. 16 foi desnecessária e gera humilhação, pois também deu causa às “fofocas” e comentários entre os demais funcionários, o que desrespeitou sua integridade moral. Pugna pela reforma do julgado a quo e pela conseqüente procedência do pedido relativo ao dano moral.

Recurso tempestivo.

Custas oportunamente recolhidas (fl. 145).

Contra-razões às fls. 150/155.

O r. parecer da douta Procuradoria do Ministério Público do Trabalho, à fl. 156, em virtude da celeridade processual, não é circunstanciado, opinando aquele Órgão pelo prosseguimento do feito, sem prejuízo de futura manifestação.

É o relatório.

V O T O

Atendidos os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do recurso ordinário.

DO MÉRITO

Da indenização por danos morais

O reclamante, ora recorrente, insiste no pagamento de indenização decorrente do dano moral decorrente da situação vexatória e humilhante à qual teria sido submetido, por reputá-la demonstrada através da prova oral e do documento de fl. 16 .

A pretensão merece acolhida.

Doutrina e jurisprudência atuais pontuam no sentido de que o prejuízo subjetivo imposto ao trabalhador, pelo empregador ou por seus prepostos, extrapolam o poder diretivo e impõem o correspondente reparo.

Arnaldo Süssekind, no artigo da Revista LTr de maio de 95, intitulado “Tutela da personalidade do trabalhador”, pontifica que “o quotidiano do contrato de trabalho, com o relacionamento pessoal entre o empregado e o empregador, ou aqueles a quem este delegou o poder de comando, possibilita, sem dúvida, o desrespeito dos direitos da personalidade por parte dos contratantes. De ambas as partes – convém enfatizar – embora o mais comum seja a violação da intimidade, da vida privada, da honra ou da imagem do trabalhador”.

É certo que as dores experimentadas em face de uma lesão ensejam a devida reparação. Parafraseando Valdir Florindo, in Dano moral e o Direito do Trabalho, dano moral é aquele dano decorrente de lesão à honra, que afeta a paz interior, cujo caráter é extrapatrimonial com reflexos no âmbito patrimonial.

A indenização decorrente da responsabilização por danos causados (materiais ou morais) pressupõe a existência concomitante do trinômio conduta (comissiva/omissiva), dano (resultado negativo) e nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o prejuízo.

Entretanto, imprescindível, para efeito de condenação, que a conduta lesiva seja robustamente demonstrada.

No caso sub judice, verifica-se que o recorrente logrou êxito no encargo probatório (artigos 818 da CLT e 333, inc. I do CPC), pois trouxe a Juízo nenhuma prova inequívoca, apta a comprovar as alegações iniciais.

Com efeito, a testemunha Luís Gilberto Braga Cherobin confirmou que “após o retorno do reclamante este passou a ser tratado de forma diferente pelo gerente geral, Sr. Edílson; que o Sr. Edílson passou a fazer críticas sobre o trabalho que o reclamante desenvolvia junto aos clientes; que o gerente geral, Sr. Edílson, chamava a atenção do reclamante na frente dos demais funcionários”; que “surgiram comentários” sobre esta forma de tratamento praticada pelo gerente geral contra o autor (fl. 59).

Não há contraprova patronal eficaz para elidir a validade do depoimento em apreço.

Pelo contrário, a testemunha convidada pelo banco demandado apenas afirmou que nunca presenciou comentários desagradáveis proferidos pelo gerente geral, Sr. Edílson e também que “não viu nenhuma mudança de comportamento do Sr. Edílson” (fl. 59).

As declarações da testemunha convidada pelo réu apenas relatam que o depoente não teria presenciado o gerente geral a criticar publicamente o autor. Todavia, não são robustas o suficiente para retirar o valor probante das declarações emanadas do Sr. Luiz Gilberto Braga Cherobin.

Como se não bastasse, o documento de fl. 16, demonstra que o multicitado gerente, Sr. Edílson, reputou de “lamentável” o desempenho do reclamante e passou a informação, com “aviso de recebimento” para, no mínimo, outros 8 (oito) gerentes, que rubricaram o recebimento das informações.

Ao contrário do que foi sentenciado, há provas eficientes para confirmar que o autor foi submetido a tratamento vexatório, especialmente se considerarmos sua função de “gerente de empresas” conforme depoimento da ré, à fl. 58 e da cópia da CTPS, à fl. 14. A repreensão pública, assim considerada aquele perpetrada perante a coletividade de funcionários, quiçá subordinados do repreendido, realmente traz gravames profissionais e pessoais.

Considerando que o empregador detém o poder diretivo, deve tentar obter o melhor desempenho de seus colaboradores através de medidas legítimas e, em não logrando êxito, poderá utilizar a medida extrema, que é a substituição por outro profissional. Entretanto, deverá abster-se de condutas vexaminosas, pois o respeito à dignidade humana é o limite da ação.

No presente caso, o relevante para o deslinde da questão é que há provas acerca da ofensa e do prejuízo causados ao trabalhador, motivo pelo qual merece acolhida a pretensão.

É certo que a subjetividade que envolve a questão do dano moral dificulta a dimensão dos prejuízos oriundos da lesão sofrida. Todavia, não é permitido perder de vista a necessidade do ofendido, a capacidade patrimonial do ofensor e o princípio da razoabilidade.

A indenização deve configurar impedimento à perpetuação de comportamentos tirânicos praticados por pessoas que extrapolam os limites do profissionalismo e da urbanidade, enquanto desempenham atuam como representantes do empregador. Como se não bastasse, a reparação pecuniária tem por escopo a compensação pela dor da vítima, a busca da justa reparação.

Nesse passo, dou provimento ao apelo para dimensionar a indenização decorrente do dano moral em R$ 55.260,00 (Cinqüenta e cinco mil, duzentos e sessenta reais).

Ante todo o exposto, conheço do recurso e, no mérito, dou-lhe provimento para julgar parcialmente procedente a reclamação trabalhista e condenar o reclamado a pagar ao obreiro indenização correspondente a R$ 55.260,00 (Cinqüenta e cinco mil, duzentos e sessenta reais). Custas, pelo demandado no importe de R$ 1.105,20 (Hum mil, cento e cinco reais e vinte centavos). Tudo nos termos da fundamentação.

PAULO AUGUSTO CAMARA

Juiz Relator

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