A melhor idade

Maluf se livra de processo por ter mais de 70 anos

Autor

17 de maio de 2005, 14h07

O ex-prefeito Paulo Salim Maluf (PP) se livrou de eventual pena de três a cinco anos de cadeia, além do pagamento de multa, por ter mais de 70 anos. A sentença foi da juíza Isaura Cristina Barreira, da 23ª Vara Criminal da Capital paulista, ao julgar denúncia onde Maluf e seu ex-secretário de Esportes, Ivo Kesselring Carotini, são acusados de contratar, sem licitação, a TV Globo para transmitir a 1ª Maratona de São Paulo.

Em 1995, quando era prefeito paulistano, Maluf criou a Maratona de São Paulo, cujo circuito passava por algumas de suas principais obras viárias, entre elas o túnel Ayrton Senna. Na época, a Secretaria Municipal de Esportes contratou sem licitação a TV Globo para transmitir a maratona.

A juíza não acolheu os argumentos do Ministério Público, que insistia na condenação. Para a magistrada a punibilidade contra Maluf foi extinta em razão da prescrição. No caso, ela ocorreria em 12 anos. Como o ex-prefeito tem mais de 70 anos foi beneficiado pelo prazo que caiu para a metade (seis anos).

“São reduzidos da metade os prazos de prescrição quando o criminoso era ao tempo do crime, menor de 21 anos, ou na data da sentença, maior de 70”, reza o artigo 115 do Código Penal.

No caso de Ivo Carotini a juíza o absolveu por falta de provas. A magistrada entendeu as provas arroladas “não são suficientes” para concluir que o ex-secretário de Esportes tenha agido dolosa ou ao menos culposamente. Insatisfeita, a defesa vai recorrer da sentença ao Tribunal de Justiça, alegando a tese da inexistência de crime.

O argumento da defesa – a cargo do advogado Luiz Carlos de Arruda Camargo – é o de que ao assumir o cargo de secretário, Carotini encontrou o processo de contratação da TV Globo praticamente concluído. Antes de assumir a pasta de Esportes, Carotini foi coordenador do programa Bairro a Bairro – uma espécie de governo itinerante da administração Paulo Maluf.

Ao declarar extinta a punibilidade de Maluf, a juíza entendeu que a data para a contagem do tempo de prescrição seria a do recebimento da denúncia pelo TJ. Para ela, como o recebimento da denúncia já transcorreu até agora mais de seis anos, o tempo já é suficiente para considerar a prescrição, que, para o crime tipificado na contratação de serviço público sem licitação, seria de 12 anos.

“Isto porque o réu ostenta mais de setenta anos de idade, permissivo para que o prazo de doze anos (artigo 109) seja computado pela metade (artigo 115), o que representaria seis anos para se ter o delito como prescrito, caso fosse aplicada a pena no máximo legal”, justificou a juíza.

“Sendo assim, cabível a prescrição da pretensão punitiva, por ter fluído o lapso temporal previsto em lei, julgando-se extinta a punibilidade do réu Paulo Maluf e colocando fim ao processo de conhecimento”, completou a magistrada.

Foro privilegiado

O crime aconteceu em 15 de agosto de 1995. O Ministério Público denunciou Maluf em 7 de outubro de 1998, perante o Tribunal de Justiça de São Paulo, porque, na época, ele tinha direito a foro privilegiado (foro especial por prerrogativa de função).

Em 13 de agosto de 2003, o Órgão Especial do TJ, por votação unânime, declarou inconstitucional o parágrafo 1º do artigo 84, do Código de Processo Penal, determinando a remessa à primeira instância de processos envolvendo ex-autoridades.

O foro privilegiado nada mais é do que a necessidade de determinadas autoridades serem julgadas originariamente por Tribunais Superiores em vez de se submeterem à competência de um juiz de primeira instância, tanto no que toca a matéria penal quanto a cível e a administrativa.

Foi instituído em 1964, com a edição da Súmula nº 394 do STF que estendeu o foro privilegiado na esfera penal para os crimes cometidos durante o exercício funcional, ainda que o inquérito ou ação penal viesse a ser instaurados posteriormente à cessação daquele exercício.

Em 1999, com os processos contra ex-autoridades se avolumando em seus gabinetes e pressionados pela nova ordem constitucional, os ministros do STF decidiram revogar a Súmula 394.

Mas, em tese, o instituto jurídico do foro especial por prerrogativa de função voltou a vigorar para ex-ocupantes de cargos públicos importantes (como ex-presidentes, ex-senadores, ex-deputados, ex-juizes, ex-promotores, ex-prefeitos) por força da Lei n.º 10.628/02, editada pelo governo Fernando Henrique Cardoso, que modificou o artigo 84 do Código de Processo Penal.

Ação por improbidade

Neste caso da contratação, sem licitação, da TV Globo pela Prefeitura de São Paulo, Maluf responde a outras duas ações. Na primeira, uma ação popular movida por parlamentares do PT, o ex-prefeito e a emissora de televisão foram condenados em primeira instância a devolver aos cofres públicos R$ 1,2 milhão. Os valores deveriam ser corrigidos desde 1995. A condenação foi confirmada pelo TJ de São Paulo e, depois, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Na segunda, uma ação civil pública, Maluf e Ivo Carotini tiveram seus direitos políticos suspensos pelo prazo de cinco anos e foram proibidos de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais e creditícios, pelo prazo de cinco anos. Os dois ainda foram condenados ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano (1,3 milhão).

A TV Globo foi proibida de contratar com o poder público e receber benefícios ou incentivos fiscais e de créditos pelo prazo de cinco anos. A sentença, de 16 de fevereiro do ano passado, é do juiz Valter Alexandre Mena, da 3ª Vara da Fazenda Pública. As partes apelaram ao Tribunal de Justiça, mas o recurso sequer foi distribuído.

A Justiça considerou que Maluf deveria ter aberto concorrência pública para a organização e transmissão do evento. Porém, a administração Maluf fechou acordo de exclusividade com a Rede Globo.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!