Resistência jurídica

Advogados preparam ações para resistir a invasões

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30 de junho de 2005, 21h43

Enquanto a Polícia Federal invadia dois escritórios de advocacia em São Paulo e um em Campinas, os advogados entravam em estado permanente de beligerância . Na tarde desta quinta-feira (29/6), horas depois da ação da PF, os integrantes da Comissão de Prerrogativas da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo reuniram-se para decidir quais as medidas a serem tomadas diante da situação. Até mesmo no Rio de Janeiro, onde nenhum escritório foi vítima de mandados de busca e apreensão até o momento, advogados estiveram reunidos para debater o tema e definir ações contra a prática policial.

Nos corredores da OAB-SP fala-se da decepção com a falta de intervenção do ministro da Justiça Marcio Thomaz Bastos para impedir as invasões. Como foi ex-presidente da Ordem, a expectativa era que ele se comovesse com a, segundo os integrantes da entidade, violação das prerrogativas dos advogados. “Não esperávamos e não esperamos [que Thomaz Bastos não tome nenhuma atitude para combater as ações]”, afirmou o presidente da seccional paulista da Ordem Luiz Flávio Borges D’Urso. “[O ministro] sabe exatamente as conseqüências dessa violência. Agora estamos apelando para o [seu] passado, para a sensibilidade que acreditamos tem com os advogados”.

Na ação desta quinta-feira, cinco advogados e um estagiário do escritório Oliveira Neves, inclusive o titular Newton José de Oliveira Neves, foram presos temporariamente. Os dez andares do escritório foram vasculhados por policiais, o prédio foi praticamente interditado e o trabalho de todos os seus advogados inviabilizado. Também foram invadidos os escritórios Alceu Proença, de Campinas (SP), e Aleixo Pereira, também de São Paulo.

De acordo com o presidente da Comissão de Prerrogativas da OAB-SP Mário de Oliveira cogita-se a possibilidade de ingresso no Supremo Tribunal Federal com interpelação por crime contra a honra por parte de Thomaz Bastos. A ação deve ser ajuizada pelo escritório Aleixo Pereira. Em conversa com D’Urso, na manhã desta quinta-feira, o ministro da Justiça teria afirmado que ao contrário das operações anteriores, no caso desta última os alvos dos mandados de apreensão e busca são os próprios advogados e não seus clientes.

“O ministro não é polícia nem é do Ministério Público. Queremos saber em que ele se baseou para dar tais declarações. Não há nada concreto contra o pessoal do Aleixo, por exemplo”, afirmou Oliveira. Além dos escritórios paulistanos, a Justiça também expediu um mandado de busca e apreensão contra um advogado de Piracicaba, que fez menção de sair da cidade para evitar ser preso, mas voltou atrás. Na última semana, a PF invadiu o escritório do advogado Luiz Olavo Baptista para colher indícios de crimes praticados pelos donos da Schincariol, cliente do escritório.

Segundo informações da Polícia Federal, os alvos da operação são pessoas e escritórios de advocacia ligados a um esquema de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e sonegação fiscal. Formalmente, haveria, no entanto, apenas a acusação contra Oliveira Neves. Procurado pela revista Consultor Jurídico, o advogado de Neves, José Roberto Leal, preferiu não se pronunciar. Limitou-se a dizer que as operações são “atos de prepotência desmedida”.

Em entrevista coletiva na sede da OAB, D’Urso voltou a repudiar a conduta da Polícia Federal e o teor dos mandados, segundo ele, de caráter genérico — não há menção ao que deve ser apreendido. Assim como na ordem expedida no caso da Schincariol, quando o escritório do advogado Luiz Olavo Baptista foi invadido, o mandado assinado pela juíza da 5ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro determina a apreensão de “documentos, papéis, inclusive títulos ao portador, ou quaisquer outros objetos que possam demonstrar a relação com a prática de atividades ilícitas em território nacional”.

Segundo o presidente da OAB-SP os mandados são ilegais e inconstitucionais já que não deixam explícito quais são os objetos de interesse da investigação, não contam com expedição de carta precatória, ou seja, não têm o crivo do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, órgão competente para autorizar o ato já que os escritórios são baseados em São Paulo. “Eles não só violam as prerrogativas dos advogados mas também o sigilo que deve ser garantido aos clientes e viola a segurança que deve existir entre o estado e o cidadão”, afirmou.

Como medidas para buscar coibir ações como a desta quinta, a OAB-SP irá se reunir com Thomaz Bastos para reivindicar a edição de portaria do Ministério da Justiça para regular as diligências da PF nos escritórios de advocacia. De acordo com D’Urso, há de se lembrar que a Constituição Brasileira, além de assegurar a inviolabilidade dos escritórios e arquivos dos advogados (em seu artigo 133), garante que todos os cidadãos devem ser tratados como inocentes até sua condenação (artigo 5º, inciso LVII).


O presidente da entidade também afirmou que a OAB-SP ingressará com uma Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental no Supremo Tribunal Federal e com um Mandado de Segurança Coletivo Preventivo junto ao TRF- 3, com o objetivo de impedir que ordens judiciais de outros pontos do país sejam cumpridas sem a carta precatória do tribunal.

No plano Legislativo, tramita na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados um projeto de lei que regulamenta os mandados de busca e apreensão, restringindo-os somente aos casos em que o advogado é investigado.

Em nota para a imprensa, a Aasp — Associação dos Advogados de São Paulo informou que marcou reunião com o presidente do Superior Tribunal de Justiça, Edson Vidigal, no próximo dia 7, para discutir o tema. Para o presidente da entidade, José Diogo Bastos Neto, “os pedidos de busca e apreensão formulados pela Polícia Federal ou mesmo pelo Ministério Público devem ser sobre objetos determinados, justificando a justa razão do pedido, com aferição jurisdicional do cabimento, seguindo-se o cumprimento da ordem sem abusos, preservando as garantias individuais dos envolvidos”.

Leia a íntegra do Mandado de Busca

QUINTA VARA FEDERAL CRIMINAL

Av. Venezuela, nº 134 – 3º andar – Praça Mauá – Centro

Busca e apreensão nº 2005.51.01.503930-0

MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO

MBA. 0042.000031-3/2005

NA FORMA ABAIXO:

A DOUTORA ANA PAULA RODRIGUES MATHIAS, JUÍZA FEDERAL SUBSTITUTA DA QUINTA VARA CRIMINAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO DE JANEIRO, POR NOMEAÇÃO NA FORMA DA LEI E NO USO DE SUAS ATRIBUIÇÕES

Manda a autoridade policial competente, a quem for o presente mandado distribuído, expedido nos autos da Busca e Apreensão nº 2005.51.01.503930-0, que em seu cumprimento se dirija ao ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA OLIVEIRA NEVES, localizado na ALAMEDA SANTOS, Nº 2400, JARDIM PAULISTA, SÃO PAULO/SP, a fim de que, em face da decisão proferida por este juízo, em atendimento a representação da Autoridade Policial, proceda a BUSCA A APREENSÃO com a finalidade de apreender documentos, papéis, inclusives títulos do portador, ou quaisquer outros objetos que possam demonstrar a relação cm a prática de atividades ilícitas em território nacional, a ser realizada NO PRAZO DE 15 (quinze) dias a contar da entrega do presente mandado à autoridade policial, sendo desnecessária a obtenção de decisão judicial do local da diligência determinando o cumprimento da presente medida, com a observância das seguintes cautelas: 1) O mandado deve ser cumprido apenas durante o dia, nos termos do art. 5°, inciso XI da Constituição Federal; 2) A Polícia deverá agir com a maior discrição possível, isso por estar exatamente empreendendo atividade de polícia de investigação, onde o sigilo é imprescindível; 3) Deverão ser observados todos os direitos constitucionais e legais no cumprimento deste mandado de Busca e Apreensão; 4) Fica autorizado, se necessário, arrombamento, utilizando-se de todos os meios legais para a fiel execução deste mandado; 5) Ficam autorizados os servidores da Receita Federal a acompanharem e auxiliarem na realização da presente diligência; 6) Fica autorizado o acesso aos dados contidos nas memórias de computadores, servidores, provedores e telefones existentes nos imóveis, sendo apreendido o material pertinente à investigação, inclusive os computadores e mídias. DADO E PASSADO nesta cidade do Rio de Janeiros, aos dezessete dias do mês de junho do ano dois mil e cinco. Eu, …. Marcos Vinícius da Vinha Rodrigues, Técnico Judiciário, digitei. E eu, …. Luciane Campos lIma Correa, Diretora da Secretaria da Quinta Vara Federal Criminal, conferiu e subscreve.

ANA PAULA RODRIGUES MATHIAS

Juíza Federal Substituta

5ª Vara Criminal – Especializada no julgamento dos crimes de lavagem de dinheiro e contra o Sistema Financeiro Nacional

Leia a íntegra da nota oficial da OAB-SP

Mais uma vez escritórios de advocacia foram invadidos e advogados presos sob acusação de envolvimento com clientes, que teriam participação em diferentes delitos. É preciso ficar claro que a Advocacia de São Paulo repudia essas operações lastreadas em mandados judiciais de busca e apreensão genéricos, oriundos de outros Estados, sem a respectiva expedição de carta precatória.

A OAB-SP designou integrantes da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB-SP, única e exclusivamente, para prestar assistência aos advogados que tiveram seus escritórios invadidos e aos que foram presos, reagindo em defesa das prerrogativas profissionais. Portanto, esses representantes da OAB-SP não estão acompanhando diligências da Operação Monte Éden, a pedido da Polícia Federal, porque, em momento algum, a Ordem vai coonestar com esse tipo de operação, que considera eivada de ilegalidades e uma afronta à cidadania.


Diante da gravidade da situação, a OAB-SP considera emergencial a edição de Portaria do Ministério da Justiça, regulando as diligências da Polícia Federal nos escritórios de advogados para fazer cessar os abusos, conforme prometido pelo ministro Márcio Thomaz Bastos, em reunião realizada com representantes da Advocacia, no dia 9 de maio último, no gabinete da Presidência da República, em São Paulo.

Torna-se, igualmente, urgente uma posição firme da Justiça Federal, no sentido de evitar a expedição de mandados judiciais de busca e apreensão genéricos em escritórios de advogados, que não são alvos de qualquer investigação ou acusação. Mais uma vez relembramos que a Constituição Brasileira, além de assegurar a inviolabilidade dos escritórios e arquivos dos advogados (Art.133), preconiza o princípio da presunção de inocência (Art.5, LVII), de modo a garantir a todos os cidadãos, mesmo àqueles sob os quais recaiam suspeitas, que deverão ser tratados como inocentes até sua condenação.

A OAB-SP — juntamente com a Associação dos Advogados de São Paulo (AASP); o Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP); o Centro de Estudos de Sociedades de Advogados (CESA); o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), dentre outras entidades co-irmãs — tem atuado firmemente contra esses abusos em três frentes: política, judicial e legislativa.

No âmbito político, tem intensificado as gestões junto aos dirigentes da Política Federal, Ministério da Justiça e Justiça Federal. No plano Judiciário, promoveu representação ao Conselho Nacional de Justiça, realizada pelo conselheiro federal por São Paulo, Alberto Zacharias Toron, e prepara uma Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental para ingresso no STF, através do Conselho Federal da OAB, para provocar uma manifestação da Alta Corte do País sobre o problema. Também ultima Mandado de Segurança Coletivo Preventivo junto ao TRF- 3, objetivando impedir o cumprimento de ordens judiciais emanadas de outros pontos do país, sem a respectiva carta precatória.

No plano Legislativo, a OAB-SP já havia formulado proposta de criminalização da violação às prerrogativas profissionais, cujo projeto de lei, já apresentado, encontra-se na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados; bem como de apoiamento ao projeto que regulamenta as buscas e apreensões, restringido-as somente aos casos em que o advogado é o investigado. Quando o advogado tem suas prerrogativas profissionais violadas, ele perde a condição ideal de defender seu cliente e isso atinge, ao mesmo tempo, o direito constitucional à ampla defesa e a própria Justiça.

Diante da continuidade das invasões de escritórios, a OAB-SP promoverá no dia 8 de julho, às 10 horas, na Praça da Sé, ATO PÚBLICO DE REPÚDIO contra essas invasões. A Advocacia paulista pretende demonstrar nessa manifestação que está unida, que repudia toda e qualquer forma de arbitrariedade, desagravando os colegas advogados vitimados por essas ilegalidades e prisões.

São Paulo, 30 de junho de 2005.

Luiz Flávio Borges D´Urso

Presidente da OAB SP

Leia a íntegra da nota da AASP

A Associação dos Advogados de São Paulo – AASP tem adotado todas as medidas cabíveis visando evitar abusos na concessão e cumprimento das ordens de busca e apreensão em escritórios de advocacia; contudo, estas continuam sendo determinadas pelo Poder Judiciário sem observância dos requisitos legais aplicáveis.

A AASP, que já participou de reunião com o Ministro da Justiça postulando regramento na requisição e cumprimento destas medidas pela Polícia Federal, visitou a Desembargadora Federal Diva Malerbi, Presidente do TRF da 3ª Região e a Desembargadora Federal Marli Ferreira, Corregedora; marcou ontem, 30/6, reunião com o Presidente do STJ, Ministro Edson Vidigal, para a próxima quinta-feira, dia 7 de julho. No encontro, os diretores da AASP pretendem mostrar a Sua Excelência que as buscas e apreensões apresentam um conjunto de desacertos capaz de gerar resultados contrários às normas legais e constitucionais em vigor.

“A meu ver, os pedidos de busca e apreensão formulados pela Polícia Federal ou mesmo pelo Ministério Público devem ser sobre objetos determinados, justificando a justa razão do pedido, com aferição jurisdicional do cabimento, seguindo-se o cumprimento da ordem sem abusos, preservando as garantias individuais dos envolvidos. É nosso papel tomar medidas responsáveis e efetivas visando coibir os abusos que vêm ocorrendo”, afirma José Diogo Bastos Neto, Presidente da AASP.

A AASP convidará as demais entidades representativas dos advogados paulistas (OAB-SP e Instituto dos Advogados de São Paulo, entre outras) para juntas participarem do encontro com o Presidente do STJ.

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