Exigências arbitrárias

Poder público joga contra atividade empresarial

Autor

  • Renato Poltronieri

    é advogado de Demarest e Almeida Advogados especialista em Direito Público mestre em Direito Constitucional Político e Econômico e doutorando em Direito pela PUC de São Paulo.

29 de junho de 2005, 19h17

A Constituição Federal, em seu artigo 170, estipula que a atividade econômica deve ser incentivada e estimulada pelo Poder Público, estruturando-se sobre alguns princípios fundamentais como a livre iniciativa, a valorização do trabalho humano, o pleno uso da propriedade privada, a livre concorrência, dentre outros.

Nesse contexto, tem-se constitucionalizado a proteção do livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, seguindo as normas reguladoras de cada atividade e operação.

É este o sentido da obrigação estipulada ao Estado para que, como agente normativo e regulador da atividade econômica, atue como um fiscal e planejador das atividades privadas relacionadas à produção de riqueza, contudo, rigorosamente dentro dos limites da lei. Em geral, cabe à Administração Pública praticar os atos para o qual determina a norma.

Esses preceitos estão fartamente registrados na atual Constituição, bem como firmemente difundidos na doutrina jurídica no tocante à formação e atuação do Estado e sua estrutura de operação por meio da Administração Pública. O administrador, consubstanciado na figura do funcionário que representa o Poder Público, é mandatário da população e executor do interesse público. A máquina administrativa existe para servir, não para ser servida.

A Administração Pública não possui vida própria, depende de seus mantenedores: o povo em geral. Qual a razão de estar se implementando uma atuação desmedida e desproporcional das funções administrativas? O que justifica a máquina (Administração Pública), criada para servir, consumir mais recursos para manter sua estrutura do que para prestar os serviços públicos a que está obrigada?

Esses desvios de função, generalizados e banalizados pelo Poder Público, se comprovam, por exemplo, pelas sanções administrativas que o Estado deseja aplicar sem que haja previsão legal. Ainda que de maneira lenta e tímida, segundo alguns doutrinadores, nosso Supremo Tribunal tem firmado entendimento por meio de súmulas que é inadmissível a interdição de estabelecimento, a apreensão de mercadorias, ou omissão ou negação de prestação de serviço público, como meio coercitivo para a cobrança de tributo.

Com efeito, a Administração Pública recebe “Poder” para atuar, mas somente o recebe pelo “Dever” de agir. Este “Dever de Agir” é inerente ao administrador público. Nesse sentido é que a omissão ou recusa da Administração Pública, quando obrigada a atender ao administrado, caracteriza-se como desvio de função, e está sujeita a ser remediada pelo Judiciário.

Como exemplo atual dessa ação ilegal e arbitrária do Poder Público, que vem se instalando em todas as esferas da Administração, especialmente na área tributária, o STF decidiu que a Administração não pode impedir uma atividade empresarial ou profissional alegando débito tributário do contribuinte. Por sua natureza, a decisão, que corrobora o que a lei já estipula, é válida para as esferas municipal, estadual e federal.

O objeto da decisão versava sobre a arbitrária e ilegal exigência da prévia satisfação de débito tributário como requisito inafastável à concessão de autorização para a impressão de documentos fiscais, notadamente de notas fiscais para as mais diversas atividades econômicas relacionadas à indústria, ao comércio e à prestação de serviços.

Assim, o tema é relevante para se examinar a forma de atuação do Poder Público, bem como a legalidade de seus atos. A confirmação de que não há possibilidade moral ou jurídica de o Poder Público impor restrições ou obrigações acessórias à livre iniciativa e plena atividade econômica, nos termos da lei, para obrigar o contribuinte a pagar tributo, representa uma vitória do administrado diante da criatura que ele próprio constituiu para atender aos interesses gerais da comunidade e fazer valer o respeito às leis, mas que tenta criar vida própria, atentando contra seus criadores.

Posto em destaque a ilegitimidade constitucional e o abuso de poder na exigência pela Administração Pública de prévio recolhimento de tributo, excessivamente instituídos e imoralmente utilizados, como requisito necessário para que atenda ao administrado-contribuinte, cabe aos empresários em geral contestarem firmemente qualquer tipo de ato administrativo que atente contra os princípios fundamentais da livre iniciativa, da valorização do trabalho humano, do pleno uso da propriedade privada, da livre concorrência e, especialmente, o da legalidade administrativa.

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    é advogado de Demarest e Almeida Advogados, especialista em Direito Público, mestre em Direito Constitucional, Político e Econômico, e doutorando em Direito pela PUC de São Paulo.

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