Nas mãos da Justiça

Juiz é quem dita as regras de buscas em escritórios

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27 de junho de 2005, 20h01

Os juízes são os responsáveis pelas invasões a escritórios de advocacia. O ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos nada pode fazer em relação a essas ordens judiciais porque seu poder é sobre a ação policial e, nesse quesito, ele já garantiu que vai tomar as providências. Bastos pensa em desenvolver um manual de cumprimento de mandados de busca e apreensão em escritórios de advocacia a ser observado pelos delegados e agentes da Polícia Federal.

Isso foi o que contou José Diogo Bastos Neto, presidente da Aasp — Associação dos Advogados de São Paulo, em entrevista à equipe da Consultor Jurídico na sede da revista. A Ordem dos Advogados do Brasil atribui ao ministro da Justiça a maior parte da responsabilidade pelas invasões da Polícia Federal nos escritórios de advocacia.

Para José Diogo, que é sobrinho de Bastos, “é uma grande injustiça considerá-lo inimigo da advocacia”. O advogado ressalta que a defesa não é feita “pelo grau de parentesco com ele, mas por fatos objetivos”. Ele lembrou que o ministro já foi presidente da OAB nos anos 80, defensor das prerrogativas, voz importante da sociedade civil e um dos grandes responsáveis pelo pedido de impeachment do presidente Collor.

O presidente da Aasp defende que um mandado de busca e apreensão tenha objeto certo, determinado e que haja relevância para que seja concedido. Para o advogado, cabe ao juiz fazer o controle da legalidade desses pedidos. José Diogo também criticou os projetos que criminalizam a violação de prerrogativas. Segundo ele, este crime já está previsto e a criação de uma nova lei seria “chover no molhado”.

No comando da entidade desde janeiro deste ano, o advogado já fez novos convênios, como com uma fornecedora de materiais para escritório que oferece mais de 15 mil itens com um desconto de 4% sobre cada produto para os 86 mil advogados associados à Aasp.

Participaram da entrevista o diretor de redação da ConJur Márcio Chaer, o editor executivo Maurício Cardoso e as repórteres Adriana Aguiar e Maria Fernanda.

Leia a entrevista

Conjur — A invasão dos escritórios de advocacia pela Polícia Federal, a partir de ordem judicial, é a grande preocupação classe atualmente. Como o senhor vê essa situação?

José Diogo — A associação está atenta desde o início a esses cumprimentos de mandado de busca e apreensão e a preocupação é muito grande. O que mais assusta é a forma como esses mandados de busca e apreensão vêm sendo deferidos. Recentemente, no cumprimento de mandado em um grande escritório aqui em São Paulo, tive a oportunidade de chegar no momento em que a Polícia Federal estava no local e tive acesso ao teor da ordem. Nesse caso específico, era um mandado de busca e apreensão deferido por um juiz substituto de Itaboraí, no Rio de Janeiro, para ser cumprido aqui em São Paulo, sem ter passado pelo tribunal daqui, ou seja, uma invasão de jurisdição. Esta ordem judicial permitia a busca e apreensão de todos os documentos, sem nominar qual seria o cliente investigado ou o advogado investigado. Um mandado genérico que determinava a apreensão de todos os documentos, arquivos de computador, correspondências abertas ou não, laptops, notebooks, enfim.

ConJur — E como foi executado o mandado?

José Diogo — O delegado que estava cumprindo a ordem queria levar todos os computadores do escritório. Ele tinha à mão um papel, como se fosse de padaria, sem assinatura, sem timbre, sem nada, mas com o nome do cliente e dos advogados que eram alvo da investigação. No fim, o que se acertou foi que os alvos principais eram dois advogados responsáveis por este cliente. Ele levou as duas máquinas desses advogados. Nós tentamos até argumentar se seria possível que ele fizesse um backup do que ele queria e deixasse a máquina, pois é um instrumento de trabalho. Mas no fim ele disse que tinha que levar para periciar e depois devolveria. Então, você imagina o transtorno de um advogado que de repente chega na sua sala de trabalho e está sem seu computador.

Conjur — Os mandados, além de genéricos, não são do estado de São Paulo?

José Diogo — Sim. Naquele dia saímos do escritório e fomos com um dos sócios diretamente para o Tribunal Regional Federal da 3ª Região e falamos com a corregedora Marli Ferreira. Ela disse que em São Paulo esse tipo de coisa não acontece, que existe uma certa orientação informal para que sejam adotados cuidados e cautelas quando se trata de busca e apreensão em escritórios de advocacia. E na verdade esse mandado específico veio de Itaboraí, no Rio. Há pouco mais de um mês veio um mandado do Sul. Então, em nenhum dos casos que conheço, o mandado veio da nossa jurisdição.

Conjur — De quem é o erro? Dos juízes que expedem os mandados, de quem pede ou de quem cumpre as ordens?

José Diogo — Evidentemente nós estamos falando de uma questão jurisdicional, mas isso tem ultrapassado muito esse limite, porque está se sistematizando, está havendo uma aproximação entre as autoridades que requerem e os juízes que concedem. Eu não posso deixar de verificar que os juízes são responsáveis pelo controle da legalidade das decisões. É compreensível que o Ministério Público ou a Polícia Federal peçam uma diligência ampla com busca e apreensão em um escritório de advocacia. Mas um mandado de busca e apreensão tem que ser por um objeto certo, determinado e que haja relevância para que seja concedido. E cabe ao juiz fazer o controle da legalidade desses pedidos.


Conjur — O controle deve ser do juiz?

José Diogo — Está se invertendo um princípio fundamental porque a acusação começa depois que eles pegam todos os arquivos e descobrem alguma coisa, daí começa a investigação. Se houver uma conscientização dos juízes, eventualmente uma sinalização do comando da Justiça sobre a inadequação desse tipo de ordem, isso tem possibilidade de voltar ao eixo e à legalidade. Uma outra face dessa questão é o cumprimento desses mandados, os chamados abusos. Como eu disse há pouco, nesse caso concreto e com esse mandado, se o delegado levasse o escritório inteiro ele estaria cumprindo uma ordem do juiz. Ele teve o bom senso de não fazer isso, mas estava autorizado. Quando se fala de abuso de policiais, estamos falando de delegados e agentes que chegam com metralhadora ou chegam às 6 horas da manhã num escritório.

Conjur — A Aasp chegou a procurar o ministro da Justiça para tratar desse assunto?

José Diogo — Há um mês tivemos reunião com o ministro da Justiça e as lideranças da classe. Participaram o presidente da OAB-SP [Luiz Flávio Borges D’Urso]; presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa [Dora Cavalcanti], advogados ilustres como o ex-presidente da OAB Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, Manuel Alceu Afonso Ferreira e Arnaldo Malheiros, além de representantes de grandes escritórios, inclusive de escritórios que tiveram ordem de busca e apreensão cumpridas. O ministro foi muito claro: “A Polícia Federal está sob meu comando. Então quero que vocês façam um esforço e me relatem os abusos. Eu fui advogado durante 40 anos, eu sei como essas coisas funcionam e não vou permitir abusos”. O ministro garantiu que “relatado o abuso, vou tomar as providências. Também estou pensando em normatizar os cumprimentos destes mandados no âmbito da PF. Ou seja, fazer um manual de cumprimento de mandados de busca e apreensão em escritórios de advocacia a ser observado pelos delegados e agentes da Polícia Federal”. Se conseguirmos que as ordens judiciais sejam sobre um objeto determinado, em cima de um fato relevante e que haja uma norma administrativa interna impondo limite ao cumprimento das ordens, a questão volta à normalidade. Quanto às ordens judiciais, o ministro esclareceu que a questão foge de seu alcance.

Conjur — Como é que o senhor vê o fato de lideranças da advocacia responsabilizarem o ministro Márcio Thomaz Bastos por truculências contra a advocacia?

José Diogo — Na semana passada houve uma reunião do conselho da OAB paulista e esse assunto veio à baila. Rubens Approbato Machado trouxe uma proposta escrita e, resumindo, pediu um desagravo dos escritórios que tiveram seus mandados de busca e apreensão cumpridos, aos advogados em geral. Colocou como inimigos da advocacia o ministro Márcio Thomaz Bastos, a Polícia Federal e os juízes. Na ocasião tive a oportunidade de me manifestar, não pelo meu grau de parentesco com ele, mas por fatos objetivos. Disse até que eu tenho orgulho de três coisas na minha vida. O primeiro grande orgulho é ser advogado há mais de 20 anos, de viver da profissão e de ter aprendido com ela. O segundo grande orgulho é ser presidente da associação de advogados, que reúne mais de 80 mil advogados do estado. E o terceiro de ser sobrinho do ministro Márcio Thomaz Bastos. Na ocasião relembrei um pouco da história dele em prol da advocacia. Foi presidente da OAB-SP no início dos anos 80. Incansável defensor de prerrogativas e, principalmente, voz importante da sociedade civil naqueles anos difíceis. Foi presidente do Conselho Federal na época da constituinte, onde foi inserida a lei da inviolabilidade elevada ao grau condicional. Foi um dos grandes responsáveis pelo pedido de impeachment do Collor, que foi assinado na casa dele. Quando se iniciaram essas chamadas invasões ele prontamente recebeu toda a advocacia de São Paulo e estava aberto para receber todo tipo de reclamação de abuso. Então achei que seria uma grande injustiça considerá-lo inimigo da advocacia, como foi colocado pelo Approbato que, ao final, ainda pediu publicamente que ele renunciasse, pois não estava à altura do cargo. Essa questão assume um plano emocional, busca-se um culpado. É muito fácil encaminhar esse discurso para responsabilizar o ministro da Justiça, independentemente de quem seja, mas o que é preciso é de uma compreensão maior.

Conjur — O ministro não entende que está havendo abuso?

José Diogo — Quando falamos de abuso, é abuso no cumprimento de mandado. Ele é frontalmente contra e acha que se houver qualquer tipo de abuso ele deve ser prontamente comunicado. Ele tem uma estreita obediência à legalidade. Agora, eu não posso concordar com as afirmações feitas pelo Approbato. Por exemplo, essas ordens judiciais para cumprimento de busca e apreensão de forma genérica, ele acha que são normas ilegais, inconstitucionais, e que, portanto cabe resistência ao seu cumprimento. Eu acho que aí tem um ponto de discordância. Se a gente fala de democracia e Estado de Direito isso seria uma subversão. Então, a luta da classe dos advogados, que está unida, é contra esse tipo de abuso. De onde vêm o abuso? Vem das ordens judiciais genéricas e dos eventuais cumprimentos.


Conjur — Como o senhor vê o uso indiscriminado de algemas em pessoas que não resistiriam à prisão e não oferecem riscos aos policiais?

José Diogo — Já vi muitas vezes fotos e imagens de cidadãos que saem algemados, cobrindo a cara… Depois de divulgada a imagem, o dano causado se torna quase irrecuperável. Sou frontalmente contra. Um amigo e velho advogado criminal me contou que um cliente lhe disse: “Doutor, eu aceito tudo, agora se eu aparecer no Jornal Nacional acabou a minha vida”. Nós sabemos que depois de causado o dano é muito difícil de recuperar. Essa Operação Cevada, por exemplo, eu não quero entrar no mérito se é sonegação fiscal ou formação de quadrilha. Eu vi a foto dos diretores da empresa e várias gerações dos Schincariol saindo algemados. Eles não se recuperam mais.

Conjur — Em alguns casos notamos que a polícia já chegou no local acompanhada da imprensa. O que o senhor acha dessa atitude?

José Diogo — Essa é outra questão muito perigosa. A conselheira da Aasp, Flávia Rahal, advogada criminal, desenvolveu uma tese de mestrado sobre isso. Ela defende que há um relacionamento entre determinada parcela do Ministério Público, delegados de polícia e juízes com determinada parcela da imprensa. A expressão que ela usa é de simbiose, gerando uma combinação maligna que reflete no dano irreparável da imagem do cidadão. Eu tive uma experiência recente em um processo público. Advogo para um empresário de futebol que entrou contra um jornal esportivo. Eu entrei com a ação numa terça-feira e mandei um estagiário ver na quarta ou quinta se já tinha o despacho. Na quinta-feira o estagiário me disse que o processo estava com o juiz. Quando liguei o rádio, no mesmo dia, o jornalista Juca Kfouri já estava falando da ação contra o jornal no seu programa na CBN. No outro dia de manhã uma pessoa falou “parece que ele já decidiu”. Eu falei “pode até ser que tenha decidido, mas ontem às 5 da tarde eu deixei o processo com ele”. Novamente foi divulgado no programa do Juca. Ou seja, eu soube do andamento do processo pelo rádio. Enfim, esse é um exemplo pequeno, que não causou danos. Eu tinha um amigo que era advogado numa estatal aqui em São Paulo e soube que era réu numa Ação Civil Pública quando acordou de manhã e leu no Estadão. Esse é o perigo.

Conjur — O que o senhor acha de levar a questão das invasões para o Conselho Nacional de Justiça? Não existe o risco dos juízes do CNJ validarem essas ordens de busca e apreensão?

José Diogo — O CNJ é uma esperança para os advogados. Cada caso merece seu tratamento específico. Se ficar pensando nessa minoria de juízes, fecho minha gaveta e vou embora para casa. O conceito do Conselho é muito interessante. As pessoas que estão lá são pessoas responsáveis, que têm obrigações. A obrigação maior não é com o corporativismo, é com a obediência à lei, evitar abusos. O conselho, além da função correcional, tem uma função que muita gente se esquece, uma função relevante que é de planejamento, que é importante para dar efeito num prazo mais longo. Esse é um caso típico para o Conselho Nacional de Justiça estrear sua atuação inovadora, que possa sinalizar esperança para aqueles que muitas vezes buscaram as corregedorias e não encontraram respostas. É uma esperança muito grande.

Conjur — Críticos dizem que o CNJ não funcionará muito a favor dos interesses gerais da sociedade e do Judiciário por ter sido formado pela cúpula. e, portanto, atenderia aos interesses dessa classe. O que o senhor acha?

José Diogo — Não descarto a possibilidade. Para mim é um mistério. Eu sou muito esperançoso por um lado, no aspecto conceitual. A forma de escolha foi relativamente democrática, você vê que houve a participação das casas legislativas, em alguns órgãos como no Ministério Público e mesmo na OAB essa escolha teve disputa interna.

Conjur — O senhor não acha que a população deveria participar dessa escolha?

José Diogo — Essa era uma idéia inicial, que não vingou. Eu concordo que lá estão representados juízes da cúpula. Por exemplo, tinha um juiz criminal do Rio de Janeiro, de primeira instância, que era candidato e estava em campanha. Um juiz com obras, que trabalha. Tinha importante apoio dos setores mais progressistas. Esse talvez poderia ter sido representante mais perto da população do que um desembargador ou ministro do Supremo, que já tem um pouco mais de “juizite” como costumamos dizer.

Conjur — E as divergências com a escolha do Alexandre de Morais?

José Diogo — Alexandre de Morais foi um secretário de Justiça atuante, tem uma história, é um jovem e brilhante professor. O Alexandre tem uma carreira política promissora, tem menos de 40 anos e já foi promotor, professor, foi secretário de Justiça. Vamos ver a atuação dele no Conselho Nacional. É uma incógnita, a gente tem muita esperança. Vamos pensar na pior hipótese, que o Conselho Nacional de Justiça comece a encaminhar as suas decisões e o seu posicionamento para um lado que não atenda aos anseios de todos ou o propósito para o qual ele foi criado. A República está aberta, estamos num regime democrático onde pode haver críticas.


Conjur — O senhor acha que tem um papel importante essa questão disciplinar?

José Diogo — Pode ter. Conhecemos as corregedorias. Comecei a ler o livro do Frederico Vasconcelos: Os Juízes no Banco dos Réus. Ele inicia o livro com uma história muito conhecida de um desembargador em São Paulo. Ele teve uma conversa gravada na qual foi apanhado com a boca na botija e foi chamado para se apresentar no tribunal. Ligaram o gravador, mostraram a fita e falaram: “Você ouviu, agora queremos que peça a sua aposentadoria”. Isso é uma vergonha e não queremos que isso aconteça mais. O Conselho Nacional de Justiça talvez possa coibir ou inibir esse tipo de procedimento. O principal efeito é o simbólico, de sinalização. Todos têm esperança, espero que a instalação do Conselho incuta medo aos dirigentes de tribunais que tem esse tipo de comportamento.

Conjur — O que o senhor acha dos projetos de lei que pretendem criminalizar a violação de prerrogativas?

José Diogo — Na verdade eu não sou um especialista, não sou um criminalista. Já ouvi de alguns especialistas que o projeto é uma boa iniciativa. Mas esse tipo de crime já está previsto no tipo de abuso de autoridade, que fala da proteção de prerrogativas profissionais. A eventual adoção de uma lei extravagante como essa seria o popular “chover no molhado”. Eu não sei se na prática isso vai melhorar. Pelo que eu ouvi dos criminalistas, a legislação existente já é suficiente para punir condutas como essa.

Conjur — Além dessa questão das invasões e das prerrogativas, que tem ocupado muito espaço na vida das entidades e dos advogados, quais seriam as outras questões da Aasp neste momento?

José Diogo — Além da face institucional, a Aasp tem um varejo muito importante e pouco conhecido. Em quase todas as reuniões do Conselho chegam queixas dos associados que dizem respeito ao juiz, ao delegado, ao promotor. São providências rápidas que se adotam. As reuniões do Conselho ocorrem às quartas-feiras. Se entrou reclamação na terça, a gente coloca na reunião na quarta e eu delibero na quinta. Dependendo da gravidade do caso, ou representamos, ou mandamos ofício para o juiz. Temos feito isso num volume cada vez maior.

Conjur — Quantos por mês?

José Diogo — Cada reunião são três, quatro casos que a gente representa. Quando a queixa não vem bem formulada, ou há algum fato que não fica muito claro, a gente converte em diligência. Tem um advogado que fica de plantão. Então ele vai conferir para saber se realmente houve o processo desse jeito, essa coisa toda, e depois o assunto volta e a gente toma as providências. Uma outra questão pela qual a gente tem se batido muito é o juiz não receber o advogado. Mandamos ofício para todos os desembargadores de São Paulo, todos os juízes federais, todos os juízes de primeira instância. Estamos compilando as respostas.

Conjur — Mas essa é uma briga antiga, não?

José Diogo — O STJ tinha uma tradição de receber advogados, só que está recrudescendo. Aqui, na primeira instância, é um verdadeiro inferno. Os juízes têm colocado placas nas portas dizendo que só despacham petições de urgência. Reportam-se ao artigo do Código de Processo Civil que fala de urgência. Mas não é só urgência, é relevância. O juiz é um funcionário público que é obrigado a receber o advogado. Está se estabelecendo uma verdadeira guerra entre advogados e juízes por conta disso. Eu fui falar com o desembargador Luiz Tâmbara [presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo]. Um grande foco de problemas é o Paulistão, [prédio do TJ na avenida Paulista] onde ficam os gabinetes dos desembargadores. Há alguns anos, quando era presidente da Aasp o Rogério Tucci, essa questão já estava em pauta e a gente foi fazer um estudo sobre as normas administrativas. Na época, acho que era o desembargador Márcio Bonilha no tribunal, vigorava uma norma administrativa que dizia que o gabinete da paulista era uma extensão da residência do desembargador, exatamente para impedir o acesso do advogado.

Conjur — Como tem sido a atuação da Aasp?

José Diogo — A associação tem feito muita força para criar uma gama de serviços de apoio ao advogado. Nesse ano já lançamos a Previdência, numa parceria com o HSBC. Depois de dois anos de negociação foi formatado um plano que é extremamente vantajoso. O foco é o advogado jovem e também o advogado que já tem plano de Previdência. Eles podem migrar para esse nosso plano que tem taxas muito melhores. Lançamos também o Aasp Suprimentos, uma parceria com a Gimba, que é uma grande fornecedora de materiais de escritório. Oferece 15 mil itens no seu catálogo, desde clips até computador. Tem capilaridade em todo o estado, de forma que todo advogado pode fazer a compra pela internet e receber a mercadoria no mesmo dia com um desconto de 4%. Quatro dias depois do lançamento houve quase R$ 100 mil em compras.


Conjur — A OAB-SP criou no começo desse ano o serviço de recortes pela internet que tradicionalmente era feito pela Aasp. Qual foi o impacto disso na Aasp?

José Diogo — A Aasp desde muito tem avisado que este é um serviço que tende a desaparecer, com a tecnologia avançada, com os tribunais disponibilizando as intimações para os advogados. Nossa meta é ampliar a gama de serviços, mas este serviço sempre foi o nosso carro chefe. Quando a Ordem lançou o seu serviço de recortes, em 31 de janeiro desse ano, quebrou um compromisso de 43 anos. Mas é um serviço totalmente diferente do nosso. Temos 300 funcionários trabalhando em três turnos, somos a única empresa que tem convênio com a Imprensa Oficial, temos o Diário da União e do Estado, e agora estamos ampliando com a Junta Comercial. É o resultado de 63 anos de aprimoramento. O serviço da Ordem é um serviço de busca por aproximação, só tem a Justiça do estado de São Paulo e o advogado recebe por similaridade.

Conjur — E quanto custa a mensalidade da Aasp?

José Diogo — Se o advogado optar por receber as publicações apenas por meio eletrônico paga R$ 31. Se optar por receber no papel, em casa, R$ 39. Essa mensalidade engloba as publicações, o boletim, o site, o seguro de vida, essas parcerias. Eu tenho um estudo que coloca todo o serviço que prestamos e a economia que se faz, caso fosse procurar um serviço à parte. Então, assim, bem singelo e bem econômico, a tabela comparativa mostra uma economia de R$ 20. Nosso serviço é subsidiado e o custo-benefício é excepcional. Só que existem advogados para os quais o pagamento de R$ 39 faz diferença. O serviço da OAB foi lançado em 31 de janeiro. Em fevereiro e março tivemos uma pequena perda e a partir daí tivemos a recuperação. Nós tivemos um crescimento anual médio de quatro a cinco mil novos associados nos últimos anos. Essa perda de fevereiro e março já foi superada. Hoje temos cerca de 83 mil associados.

Conjur — A Aasp faz a divulgação de seus serviços? Onde?

José Diogo — A Aasp tem desenvolvido um trabalho e tentado se mostrar um pouco mais, porque ela é uma grande desconhecida. Poucos sabem o que ela representa, sua dimensão. Nós começamos um trabalho desde o ano passado que se chama a “Aasp nas Faculdades”. Sempre temos um conselheiro para falar com os alunos do quinto ano de Direito, os nossos potenciais clientes, gente que vai se formar. No ano passado fomos à USP, à FMU, acho que três faculdades. Divulgamos o departamento cultural. Esse ano estamos fazendo em 60 faculdades, em São Paulo e no interior. Também estamos fazendo a “Faculdade na Aasp”. A gente leva os alunos para conhecer a associação.

Conjur — Já que estamos fazendo a comparação de serviços prestados aos advogados, o que o senhor achou dessa nova carteira do advogado?

José Diogo — Agora é uma carteirinha, igual à do meu clube. Quando foi lançada, ela custou R$ 40 e o Approbato era presidente do Conselho Federal. Aí começamos a receber uma enxurrada de reclamações pelo preço e pela renovação de três em três anos. O Approbato foi ao Conselho da Ordem explicar que grande parte desse custo era da Casa da Moeda. Eu não lembro exatamente os percentuais, mas algo em torno de 70% do preço da carteira era para o serviço da Casa da Moeda. O resto era custo administrativo. Então ele disse que isso não reverteria em nada para a Ordem. Eles tinham uma alternativa que seria fazer o cartão com chip, que não precisaria ser trocado a cada três anos, mas seria muito mais caro. A intenção desse recadastramento, na minha opinião, foi que a Ordem, em São Paulo, tinha quase 50% de inadimplência. Naquele momento ela conseguiu recuperar as dívidas, mas hoje a inadimplência está novamente em 40%.

Conjur — Mas com a informatização, finalmente os advogados saberão quantos são e o perfil da classe por sexo, idade, etc. É importante pagar por isso, não?

José Diogo — Eu acho que a Ordem tem um problema crônico. Tornou-se uma grande administradora de imóveis. Ou seja, em qualquer subseção hoje você tem uma sede própria, uma casa alugada, um imóvel que gera custo de administração, de pessoal, e às vezes para nada. Uma vez eu estive em Ribeirão Preto, não sei se vocês conhecem a Casa do Advogado de lá, chama José de Castro Rizo. É um clube de um quarteirão que tem piscina, campo de futebol, churrasqueira… Nas vezes em que eu fui lá, estava absolutamente vazio. É um clube sem sócio, advogado… É um custo enorme de manutenção, segurança, que leva grande parte da receita da Ordem. Nós falamos um pouco sobre a receita da Ordem, o quanto tem que ver com a Receita Federal, quanto tem de repassar para a Caixa de Assistência, a folha de pagamento de 1.300 funcionários. Eu acho, sob uma visão empresarial, um Titanic, mas é uma realidade que está aí. Eu não coloco a culpa em ninguém pessoalmente, mas isso foi resultado de um acúmulo de favores políticos, porque a gente sabe como funciona a campanha da OAB. Ela se tornou, então, uma grande administradora de imóveis e esse é um fato que precisa ser repensado. É uma decisão drástica, mas eu acho que qualquer administrador que assuma a Ordem tem de pensar numa solução, porque, se continuar assim, fica cada vez mais agravada a situação.

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