Males do cigarro

Justiça gaúcha se divide sobre culpa da indústria do fumo

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6 de junho de 2005, 14h19

A indústria do cigarro exerce uma atividade econômica legítima e por isso não pode ser responsabilizada pelos danos causados pelo fumo à saúde dos fumantes. A propaganda que associa o cigarro ao glamour e à virilidade induz em erro o consumidor a respeito da natureza e das conseqüências do produto que consome.

Estas duas teses, uma contra outra a favor da responsabilização da Souza Cruz pela doença e morte de um ex-fumante, dividem as opiniões dos desembargadores do 3º Grupo Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que julgam a ação. A votação está empatada em 3 a 3 e será desempatada pelo voto do desembargador Marco Aurélio dos Santos Caminha, 3º vice-presidente do TJ-RS.

O autor da ação ajuizou ação de indenização contra a Souza Cruz em 1996. Alegou que, por causa da publicidade abusiva e enganosa do cigarro foi levado a consumir um produto que não era seguro. Por isso, pediu indenização por perdas salariais, por despesas relativas à medicação e por dano moral, não inferior a R$ 100 mil. O ex-fumante era portador de enfisema pulmonar e morreu após um infarto do miocárdio.

Em contrapartida, a empresa argumentou que o consumo de cigarros não foi a única causa das doenças desenvolvidas. A primeira instância negou o pedido do ex-fumante.

Em julgamento ocorrido em junho de 2004, a 6ª Câmara Cível do TJ-RS acatou em parte o pedido do autor da ação, já morto. A Souza Cruz recorreu. Na sexta-feira (3/6), novo julgamento foi iniciado pelo 3ª Grupo Cível que só será concluído após o voto do 3º vice-presidente do TJ-RS.

Entendimento

Para o desembargador Leo Lima, relator no Grupo, “a imputação de ato ilícito é de ser desacolhida, por haver, da parte da empresa, apenas o exercício regular de um direito reconhecido, seja na produção e comercialização de cigarros, seja na publicidade de suas marcas, à luz do Código Civil então vigente”.

“Mesmo tratando-se de responsabilidade objetiva, pelo risco do empreendimento, não é de vingar a pretensão indenizatória — de um lado, por não se estar diante de situação de defeito ou vício do projeto, cujo risco à saúde, se existe, é inerente a dito produto, conforme prevê o artigo 8º do Código de Defesa do Consumidor”, continuou.

Por outro lado, concluiu, “não está presente o nexo de causalidade entre a atuação da Souza Cruz e o hábito de fumar do falecido autor, não se mostrando o tabagismo a causa necessária das doenças denunciadas: infarto do miocárdio e enfisema pulmonar”.

Os desembargadores Pedro Luiz Rodrigues Bossle e Cacildo de Andrade Xavier, que presidiu a sessão, votaram no mesmo sentido do relator.

Já o desembargador Umberto Guaspari Sudbrack votou em sentido diverso. Para ele, “em primeiro lugar, produziu-se prova, tendo a perícia positivado que a causa da moléstia do demandante foi o consumo do produto fabricado pelas demandadas”.

“Como se poderá dizer que a propaganda veiculada pelas rés — associando o cigarro, a beleza, a masculinidade, sensualidade, sucesso — não se subsume a uma publicidade ´capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços´?”, questionou o desembargador.

O desembargador Artur Arnildo Ludwig também votou negando provimento ao recurso da Souza Cruz. Ele entende que “estamos diante de responsabilidade do fornecedor de informar aos seus clientes os dados completos quanto à forma de utilização do produto, benefícios e riscos no seu uso, sendo questão inerente à sua atividade, a qual não pode ser dispensada”.

Para o desembargador Ludwig, “a prova dos autos traz à conclusão da existência do nexo causal entre a impropriedade para o consumo do produto oferecido pela ré e o dano causado pela utilização do cigarro ao autor, consubstanciado no desenvolvimento da doença, que veio a lhe ocasionar a morte”.

O desembargador Ubirajara Mach de Oliveira votou acompanhando os desembargadores Sudbrack e Ludwig. Para ele, o autor já estava viciado quando teve ciência dos malefícios do cigarro.

Processo 70011106655

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