Estilhaços do mensalão

Leia a carta de despedida de Genoino ao deixar direção do PT

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9 de julho de 2005, 17h30

O presidente nacional do PT, José Genoino, anunciou neste sábado (9/7), no início da reunião do Diretório Nacional do partido, seu afastamento da presidência da legenda. Genoino disse que toma a decisão em função da preservação dos “valores, que estão acima de nossas carreiras e da personalidade” de cada petista.

Na terça-feira (5/7), também deixaram seus cargos o secretário de Finanças do PT, Delúbio Soares, e o secretário-geral do partido, Silvio Pereira. O afastamento de Genoino se dá depois da prisão de José Adalberto Vieira da Silva, no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, que tentava embarcar para Fortaleza com R$ 200 mil em uma mala e US$ 100 mil nas calças. Vieira da Silva é assessor parlamentar do irmão de Genoino, o deputado estadual cearense José Nobre Guimarães, também do PT.

O afastamento de Genoino é a terceira baixa da cúpula do partido depois que o deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) fez a acusação de que o PT pagava mesada de R$ 30 mil a deputados da base aliada do governo federal em troca de apoio na aprovação de projetos.

Em nota à imprensa, José Genoino afirmou que, agora, é necessário buscar a repactuação interna da legenda. “Sempre encarei a presidência do PT como uma missão delegada a mim, pois meu projeto passava bem distante da presidência do PT”. E fez questão de frisar que “o PT não compra, nem paga deputado”.

Leia a íntegra da nota de Genoino

Declaração política

Eu quero comunicar aos filiados do PT, aos eleitores, a todos que apóiam o governo Lula, e comunicar ao povo brasileiro que, nesse momento, eu entrego o cargo de presidente do PT ao Diretório Nacional, numa licença da condição de presidente do PT.

Ao tomar esta decisão, sempre dissemos, ao longo desse processo, que existem dois valores que estão acima de nossas carreiras e de nossas personalidades: é o PT enquanto partido estratégico. É o projeto de esquerda e de um partido, que se referencia nos valores generosos do socialismo humanista e democrático. Um partido pluralista, de militantes de massa, que tem que estar acima de nossas pretensões.

Em segundo lugar, a importância estratégica do governo do presidente Lula, da sua liderança como promotor das mudanças que estão em curso no país e do seu papel como liderança no cenário mundial.

Diante desses dois valores essenciais, os dirigentes do PT e eu, como presidente do partido, tenho que colocar as minhas pretensões, as minhas opções, em segundo plano, em segundo lugar.

Por isso, nesses dias, consultando as lideranças do partido e suas forças políticas, e diante da grande responsabilidade que o PT tem nesse momento, para enfrentar essa crise, superá-la, ser um partido fundamental na viabilização das mudanças do governo Lula, e buscar a nossa repactuação interna e com a nossa base social e política, eu considero, e informei isso ao Diretório Nacional, que não deveria continuar presidindo o PT. Portanto, eu entreguei o meu cargo de presidente do PT ao Diretório Nacional.

Faço isso com o sentimento de dever cumprido nesses trinta meses em que estive na presidência do PT. Porque sempre encarei a presidência do PT como uma missão. Eu já disse isso, várias vezes, que essa missão me foi delegada porque, na verdade, o meu projeto passava bem distante de presidir o PT.

Hoje, conversando no Diretório Nacional — e muitos aqui me conhecem —, eu me lembrei de que, em vinte anos como deputado federal, era aquilo que fazia o lado poético e romântico da política. Às vezes, a gente convive com o lado duro, que é este momento que nós estamos vivendo. Não é a primeira vez que eu vivo o lado duro da política.

Neste processo, eu agradeço a todos os companheiros da Executiva Nacional e do Diretório Nacional, com o sentimento de que, na condução do partido, nós certamente cometemos falhas, erros, equívocos e procedimentos, mas nós, no PT, não praticamos irregularidades, não praticamos nenhum ato ilícito. O PT não compra, nem paga deputado. O PT faz da política esse lado de busca da libertação, de busca de consciências e vontades para mudar esse país.

Nós estamos vivendo um momento difícil e, nesse momento difícil, a soma de energias é muito importante para a repactuação do partido. Eu não poderia ser obstáculo para essa repactuação do partido, de uma nova direção executiva, de uma disputa no processo interno de eleição direta, que vai revigorar este partido.

A divisão entre nós é de idéias, é de táticas e de estratégias, não é entre bons e maus. Nós somos militantes com história, com tradição, com representatividade, e reconheço isso em todas as correntes internas do PT, mesmo aquelas em que tenho maiores divergências.

Este projeto é grande, é generoso, é pluralista. Muitas vezes, ele desafiou os analistas. Eu acho que nós vamos, mais uma vez, desafiar os analistas e dar a volta por cima desse momento difícil que nós estamos vivendo.

Por isso, eu quero agradecer a todos vocês, a todas vocês [dirigindo-se aos jornalistas], nesse processo de debate, de crise, de entrevista. Vocês sabem como é que eu me relaciono com a imprensa. Tenho feito um esforço muito grande para ter esse relacionamento republicano e democrático. Às vezes, me expondo muito, porque vocês têm meu telefone e ligam diretamente para mim. Mas eu quero agradecer a vocês e pedir desculpas à imprensa, se em algum desses momentos, eu não atendi devidamente a vocês, jornalistas. Como eu tenho essa relação muito direta, eu quero deixar isso claro.

E para concluir essa declaração, eu entendo que nós temos muitos desafios pela frente e vamos vencê-los. Certamente, esta reunião do Diretório Nacional será histórica. Nesse momento de dificuldade – e eu digo para vocês: de dor -, quero dizer que recebi do Diretório Nacional, na forma de gestos, na forma de semblantes, na forma até de lágrimas, este sentimento indestrutível que une homens e mulheres num projeto coletivo.

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