Prisão de luxo

STJ decide que empresário continua preso em hotel 5 estrelas

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3 de julho de 2005, 8h52

O empresário Henry Maksoud, dono do hotel de luxo Maksoud Plaza, poderá continuar desfrutando do conforto de seu hotel enquanto cumpre as sucessivas prisões domiciliares que vêm sendo decretadas por conta de não pagamento de pensão alimentícia à sua ex-mulher, Ilde Maksoud. A decisão monocrática do ministro Humberto Gomes de Barros, do Superior Tribunal de Justiça, foi mantida após o julgamento de um recurso contra o Habeas Corpus que havia dado esse direito ao empresário.

A decisão, publicada na semana passada, destaca que tanto o STJ quanto o Supremo Tribunal Federal têm decidido, “reiteradamente que não cabe recurso contra decisão de relator que, em habeas corpus, defere ou indefere, fundamentadamente, o pedido de liminar”.

No Agravo Regimental apresentado por Ilde Maksoud, os advogados destacam que Henry Maksoud, apesar de alegar problemas de saúde para justificar a prisão domiciliar, tem, constantemente, participado de festas, concertos e viagens. Os advogados da ex-mulher ressaltam ainda que o empresário já acumula 16 execuções pelo não pagamento das pensões alimentícias.

No final do ano passado a revista Consultor Jurídico revelou a batalha judicial que Ilde e Henry Maksoud, hoje com 76 anos de idade, vêm travando. Até 2002, os pagamentos das pensões eram feitos de maneira informal. O problema começou quando a ex-mulher decidiu ir à Justiça para formalizar seu direito. O valor estipulado pelo juiz ficou em R$ 45 mil. Ocorre que Henry Maksoud nunca se conformou com o fato de sua ex-companheira tê-lo levado à Justiça e, desde então os pagamentos passaram a ser atrasados, o que gerou sucessivas decretações de prisão. Seus advogados argumentam que o valor de R$ 45 mil é exorbitante para o empresário, que atualmente enfrenta dificuldades financeiras.

Alegando sérios problemas de saúde – diabetes e câncer na bexiga – além da idade avançada, o empresário vem conseguindo cumprir as prisões em regime domiciliar, em seu caso, no hotel Maksoud Plaza.

No pedido de Habeas Corpus feito pelos advogados de Henry, o ministro Humberto Gomes de Barros, destaca que não vê irregularidade nos mandados de prisão. Na decisão, o ministro concedeu o HC no que se refere ao cumprimento da prisão domiciliar, dado o quadro clínico apresentado pela defesa de Henry Maksoud. O empresário, segundo seus advogados, “requer cuidados impossíveis de serem dados nos estabelecimentos prisionais”.

Apesar disso, o ministro reconhece que a permanência de Henry no hotel durante o período em que deve cumprir a prisão é difícil de ser controlada. “A melhor solução é o cumprimento da pena em regime domiciliar. É que na prática, isso não funciona. O Judiciário tem processos demais e juízes de menos. Não acredito que a demanda de processos dessa natureza que são distribuídos no Estado de São Paulo permita com que o magistrado acompanhe, de forma efetiva e eficaz, hipóteses como a do paciente”, reconhece.

Leia a íntegra do Agravo Regimental no HC

AgRg no HABEAS CORPUS Nº 44.580 – SP (2005/0090952-0)

RELATOR: MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS

AGRAVANTE: ILDE BIROSEL MAKSOUD

ADVOGADO: LUÍS FERNANDO P FRANCHINI E OUTROS

AGRAVADO: MÁRCIO MELLO CASADO E OUTROS

AGRAVADO: DÉCIMA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE: H M

DECISÃO

Agravo regimental, com pedido de reconsideração, interposto contra a decisão de fls. 410/413, que deferiu o pedido liminar no habeas corpus para que o paciente cumpra a prisão civil, por descumprimento de obrigação alimentar, em regime domiciliar.

A agravante sustenta, em suma, que:

a) o paciente valeu-se do seu suposto estado de saúde para pleitear a conversão em prisão domiciliar;

b) o paciente almeja a conversão das execuções ao rito do Art. 732 do CPC, com o que poderá protelar indefinidamente a satisfação do crédito;

c) a concessão liminar da prisão domiciliar adiantou ao paciente medida de cunho satisfativo, capaz de prejudicar o exame do mérito da ordem;

d) o paciente acumula dezesseis execuções de alimentos, somente realizando o pagamento ante a iminência da decretação da prisão civil;

e) o paciente tem freqüentado festas, concertos, viagens internacionais;

f) a prisão domiciliar não funciona em qualquer caso, criminal ou civil;

g) o paciente é detentor de diploma superior, assim, poderia ser determinado o seu recolhimento em prisão especial.

DECIDO:

Mantenho a decisão agravada que, motivadamente, entendeu recomendável o cumprimento da prisão civil em regime domiciliar.

No mais, o STJ e o STF, reiteradamente, vêm decidindo que não cabe recurso contra decisão de relator que, em habeas corpus, defere ou indefere, fundamentadamente, o pedido de liminar. Nesse sentido, dentre vários outros, os seguintes precedentes: HC 38.020/LAURITA; HC 27.258/CARVALHIDO; AgRg no HC 23.498/GALLOTTI; AgRg no HC 22.445/GONÇALVES; HC 73.917/CELSO DE MELLO; AgRg no HC 72.783/ILMAR GALVÃO; AgRg no HC 72.651/MOREIRA ALVES.


Ante o exposto, nego seguimento ao agravo regimental.

Como já foi decidido, solicitem-se informações. Após, vista ao Ministério Público Federal, com urgência.

Brasília (DF), 27 de junho de 2005.

MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS

Relator

Leia a íntegra do Hábeas Corpus concedido pelo STJ

HABEAS CORPUS Nº 44.580 – SP (2005/0090952-0)

RELATOR: MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS

IMPETRANTE: MÁRCIO MELLO CASADO E OUTROS

IMPETRADO: DÉCIMA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE: H M

DECISÃO

MÁRCIO MELLO CASADO E OUTROS impetraram habeas corpus preventivo, com pedido liminar, em favor de H.M. que teme ser preso por descumprimento de obrigação alimentícia.

Apontam como autoridade coatora a Décima Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, nos autos do Habeas Corpus 373.539-4/2-01, deu provimento a agravo regimental da alimentada, e determinou que o paciente cumpra prisão civil em estabelecimento prisional comum. Eis a ementa:

“AGRAVO REGIMENTAL – Decisão do 3º Vice-Presidente que concedeu liminar a fim de que, se concretizada a prisão civil do paciente, faça ele jus a prisão civil pelo cumprimento da prisão civil ou até o julgamento do mandamus – necessidade de pagamento da diferença da prestação alimentícia exigida para afastamento do decreto prisional onde o preso será mantido em lugar diferenciado, à vista do caráter civil da prisão – agravo provido.” (fl. 269).

Em 14/06/2004, I.B.M promoveu execução de alimentos com fundamento no Art. 733 do CPC, pleiteando a última prestação vencida (junho de 2004), processo nº 000.04.111.402-7. Afirmou que ajuizou ação cobrando, também, os meses de janeiro, fevereiro, março e abril de 2004, em razão da costumeira inadimplência do executado.

Como a pensão não foi paga, o Juiz de Direito ordenou a prisão do paciente por três meses (fls. 130). Houve pedido Habeas Corpus ao Tribunal de Justiça de São Paulo. Foi concedida liminar para garantir ao paciente o direito a prisão domiciliar (fl. 141).

A exeqüente interpôs agravo regimental contra tal decisão. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo deu provimento ao recurso e cassou a liminar, nesses termos:

“Assim e diante do comprovado fato de que mesmo sendo portador das moléstias suso referidas, está o paciente à frente de seus negócios de administração hoteleira, do que se depreende a sua não incapacitação física, e também do tratamento diferenciado da prisão civil por alimentos, que não impede que o paciente receba tratamento adequado com remoção, inclusive, de caráter ambulatorial, se necessário for….”.

(fls. 271/272)

Foi interposto recurso especial contra este acórdão.

Veio o presente pedido, onde os impetrantes sustentam, em suma, que:

a) houve cerceamento de defesa, na medida em que o paciente apresentou ampla justificativa da impossibilidade de pagamento da pensão exorbitante (R$ 45.000 – quarenta e cinco mil reais), mas o julgador não permitiu a realização de prova pericial e decretou a sua prisão.

b) o paciente tem idade avançada, é diabético mellitus e necessita de tratamento para tumor vesical (câncer de bexiga), o que requer cuidados especiais que não é possível de tratamento em estabelecimento prisional. Preenche, assim, dois dos requisitos do Art. 117 da Lei de Execuções Penais, para a concessão da prisão domiciliar.

c) não é verdade que o paciente teria escolhido cumprir a pena em ambiente de luxo. É que o local que ele cumpriu a pena que lhe foi imposta em outra execução, foi o indicado pela própria alimentada, só cumpriu a prisão no hotel por conta disso.

d) se o paciente tem o direito de cumprir a prisão em regime domiciliar, pouco importa o ambiente onde ela é cumprida, o legislador não fez qualquer previsão sobre como deve ser o ambiente.

e) o paciente não é incapacitado fisicamente para gerir seus negócios, que por sinal atravessa forte crise financeira. Somente não existe estabelecimento prisional no país, capaz de atender suas necessidades físicas decorrentes dos males que lhe acometem.

f) o STJ em casos excepcionais como o presente, tem aplicado o benefício da prisão domiciliar prevista na Lei de Execução Penal aos devedores de alimentos.

DECIDO:

Não enxergo ilegalidade no decreto de prisão. O paciente não cumpriu com as obrigações alimentares ajustadas, quer no processo de execução que resultou no decreto prisional e em outros quatro exercidos pela alimentada. Os autos noticiam que ele já foi preso duas vezes por descumprimento de obrigação alimentar.

Acrescente-se que o habeas corpus, pelo seu caráter sumaríssimo, não é via adequada para constatar a impossibilidade financeira para o pagamento da dívida alimentar a que está obrigado o paciente, porque demanda necessário exame aprofundado de provas. É o que diz nossa jurisprudência: HC 22.876/DIREITO; HC 29443/BARROS MONTEIRO; HC 28.878/CÉSAR ROCHA e RHC 14.953/PÁDUA.


No mais, o STJ vem decidindo que cabe prisão civil do alimentante que deixa de pagar as três últimas prestações vencidas à data do mandado de citação e as vincendas durante o processo. A exemplo: HC 7.908/BARROS MONTEIRO; HC 9386/ZVEITER; RHC 11.288/SÁLVIO; HC 7.705/NAVES; RHC 14881/FERNANDO GONÇALVES e HC 24.114/NANCY.

De outra parte, a questão do regime de prisão a que foi submetido o paciente deve ser examinado.

A autoridade coatora entendeu que a idade do paciente e seu estado de saúde não impedem a decretação da custódia, cabendo ao juiz da causa acompanhar as circunstâncias do caso concreto, para estabelecer a melhor forma do cumprimento da prisão e eventual tratamento médico necessário ao paciente.

Não obstante à razoável solução apresentada pelo Tribunal Paulista, penso que a melhor solução é o cumprimento da pena em regime domiciliar. É que na prática, isso não funciona. O Judiciário tem processos demais e juízes de menos. Não acredito que a demanda de processos dessa natureza que são distribuídos no Estado de São Paulo permita com que o magistrado acompanhe, de forma efetiva e eficaz, hipóteses como a do paciente.

O paciente é acometido de doenças graves (diabete mellitus e câncer de bexiga), o que é agravado pela sua idade avançada (76 anos), o que requer cuidados impossíveis de serem dados nos estabelecimentos prisionais.

A decretação de prisão civil, não é uma sanção penal, mas uma medida coercitiva para compelir o devedor de alimentos a cumprir o avençado. O que não se admite, é que determinadas pessoas, no caso devedor de alimentos, em razão de idade avançada e acometidas de males sejam submetidas a estabelecimento prisional comum, quando o condenado por crime, por exemplo, contra a vida ou o patrimônio, quando preenche os requisitos da lei, fará jus ao regime de prisão domiciliar.

Em regra, não se aplicam as regras da Lei de Execuções Penais à prisão civil. O STJ, no entanto, vem admitindo, analisadas as circunstâncias excepcionais do caso concreto, formas alternativas para cumprimento da prisão civil. A exemplo, cito:

“HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL. OBRIGAÇÃO ALIMENTÍCIA. CUMPRIMENTO DA PENA. ESTABELECIMENTO PRISIONAL. REGIME SEMI-ABERTO. LEI DE EXECUÇÕES PENAIS. INAPLICABILIDADE. PRISÃO DOMICILIAR. IDADE AVANÇADA E SAÚDE PRECÁRIA.

– Em regra, não se aplicam as normas da Lei de Execuções Penais à prisão civil, vez que possuem fundamentos e natureza jurídica diversos.

– Em homenagem às circunstâncias do caso concreto, é possível a concessão de prisão domiciliar ao devedor de pensão alimentícia.”(HC 35.171/HUMBERTO); “Prisão civil. Regime aberto. O regime aberto não é incompatível com a prisão civil, podendo ser adotado se o recomendarem as circunstâncias do caso concreto, a serem prudentemente avaliadas pelo juiz.”(RESP 70.400/EDUARDO RIBEIRO); “Prisão civil. Prisão albergue. Prisão domiciliar.

1. A nova orientação da Corte em matéria de prisão civil recomenda a manutenção do regime prisional acolhido pelo Acórdão recorrido, assim a prisão albergue, e, na ausência desta, a prisão domiciliar, compatível o julgado com a prudente interpretação do art. 201 da Lei de Execuções Penais.

2. Recurso especial não conhecido.” (REsp 199.802/MENEZES DIREITO). Na hipótese dos autos, é recomendável, em razão da idade avançada e dos problemas de saúde, o cumprimento da pena em regime domiciliar.

Concedo liminarmente a ordem, apenas para determinar que o paciente cumpra a pena no regime domiciliar.

Comunique-se com urgência.

Solicite-se informações, após vista ao Ministério Público Federal.

Brasília (DF), 10 de junho de 2005.

MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS

Relator

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