Primeiro da fila

Honorário advocatício tem preferência em caso de falência

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1 de julho de 2005, 15h44

Os honorários advocatícios num processo de falência têm a mesma prioridade que os salários dos empregados. A decisão é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que entendeu que a verba pertence ao advogado, ainda que organizado como uma empresa jurídica, é sua fonte de sustento e tem, em qualquer caso, natureza alimentar.

Na ação, a 3ª Turma discutiu se os honorários advocatícios podem ser considerados de natureza alimentar e se essa característica seria suficiente para equipará-los aos créditos trabalhistas. Para a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, o artigo 102 da antiga da Lei de Falências “deixa claro que os honorários são dotados de privilégio, no juízo falimentar. Isso não se põe em dúvida”.

Segundo a ministra, o principal fundamento para deixar de reconhecer o caráter alimentar dos honorários é baseado na incerteza da verba, que depende do êxito da causa. No entanto, para Nancy, o precedente só pode ser usado em honorários de sucumbência, ao contrário dos honorários em questão, que foram contratados em valor fixo.

De acordo com a ministra, os honorários e o salário são figuras afins em natureza alimentar. Sendo assim, “o privilégio conferido pela Lei de Falência aos salários deve ser estendido também aos honorários, porque é exatamente isso que a Lei visa a proteger”.

S.A.

O entendimento desenvolvido pela 3ª Turma é valido também para sociedades de advogados. “Em nenhum momento a Lei 8.906/94 [que estabelece os honorários advocatícios] faz qualquer distinção entre pessoas físicas e jurídicas, no exercício da advocacia. A relação dos clientes não é estabelecida diretamente com a sociedade, mas, sempre, com os advogados que a compõem.”, afirmou.

No entendimento da ministra, não somente aos sócios, mas também os advogados empregados em um escritório têm direito, de maneira pessoal direta, aos honorários. Ou seja, por qualquer lado que se olhe a questão, a verba honorária pertence ao advogado, ainda que organizado em torno de uma pessoa jurídica.

Caso concreto

A 3ª Turma do STJ revogou decisão que determinou a devolução, pelo escritório Deschamp & Grützmacher, dos valores levantados num processo de falência da sociedade Moellmann Comercial.

O escritório teve habilitado crédito relativo a honorários advocatícios por ter prestado serviços à massa falida, enquanto estava em concordata. O juízo falimentar determinou a expedição de alvará em favor do escritório, para levantamento do débito, com base no artigo 102 do Decreto-Lei 7.661/1945.

O escritório de advocacia retirou o alvará e levantou a quantia que tinha direito. Contra essa decisão, o Ministério Público interpôs Agravo de Instrumento. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina acatou o pedido, considerando que os honorários advocatícios não se equiparam aos créditos trabalhistas.

O juízo falimentar, em atendimento a essa decisão, determinou a expedição de novo mandato para que o escritório restituísse os valores levantados no Banco do Estado de Santa Catarina, no prazo de 48 horas, sob pena de responsabilidade civil e criminal.

Essa decisão foi novamente impugnada com outro agravo, desta vez interposto pela sociedade de advogados. O Tribunal de Justiça estadual negou o recurso. O escritório então recorreu ao STJ. Alegou que os honorários advocatícios se caracterizam como verba alimentar e se equiparam ao salário.

Recurso Especial 566.190

Leia a íntegra da decisão

RECURSO ESPECIAL Nº 566.190 – SC (2003/0107363-5)

RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso especial interposto por Deschamps & Grützmacher Advogados Associados S/C contra acórdão exarado pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

Ação: nos autos da falência da sociedade empresária Moellmann Comercial S.A., a recorrente teve habilitado crédito relativo a honorários advocatícios devidos em razão da prestação de serviços à falida ainda em sede de concordata.

O Juízo falimentar determinou a expedição de alvará em favor da recorrente para o levantamento do crédito, ao fundamento de que possui privilégio especial equiparado aos constantes do art. 102, caput, do Decreto-lei 7.661/45, em razão do caráter alimentar que lhe é inerente.

A recorrente retirou o alvará e levantou a quantia a que tinha direito.

Agravo de Instrumento na origem: o Ministério Público interpôs agravo de instrumento contra a decisão que autorizou a expedição do alvará, recurso ao qual o TJSC atribuiu efeito suspensivo, sob o fundamento de que os honorários advocatícios devidos não se equiparam aos créditos trabalhistas.

Em atendimento a essa decisão, o Juízo falimentar exarou outro despacho e determinou a expedição de novo mandado para que a recorrente restituísse os valores levantados junto ao Banco do Estado de Santa Catarina, no prazo de 48 horas, sob pena de responsabilidade civil e criminal. Essa decisão foi novamente impugnada mediante agravo de instrumento, desta vez interpostos pela sociedade de advogados.


Acórdão: a decisão do primeiro agravo de instrumento não é objeto deste recurso. A impugnação ora veiculada diz respeito apenas ao segundo agravo, a que o Tribunal de Justiça de Santa Catarina negou provimento por acórdão com a seguinte ementa:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO – Falência – Honorários advocatícios – Habilitação – Crédito privilegiado – Privilégio geral – Exegese do art. 24 do Estatuto da OAB c/c o art. 102, caput, do diploma falitário – Alvará judicial para o levantamento de valores a tal título – Revogação posterior ao despacho autorizatório – Devolução dos valores levantados – Decisão correta – Reclamo recursal desprovido.

O privilégio especial que cerca os créditos de natureza trabalhista, conforme previsto no art. 102, caput, da Lei de Quebras não se estende aos créditos decorrentes de honorários advocatícios. Ao art. 24 do Estatuto da OAB não pode ser conferida uma extensão nele não prevista expressamente, eis que referida disposição, ao emprestar ao crédito de honorários profissionais natureza privilegiada, refere-se a privilégio geral, enquadrável no art. 102, III, do diploma falitário. Honorário advocatícios não são confundíveis com salários. Salário é a remuneração paga, a qualquer título, pela prestação de serviços não eventuais, dentro de uma relação de subordinação àquele a quem são eles prestados, o que não ocorre referentemente aos profissionais liberais que executam serviços técnicos, em caráter eventual, sem qualquer subordinação hierárquica ao seu cliente.

Nesse passo, tratado o crédito vinculado à prestação de serviços advocatícios à empresa em regime falitário como se dotado de privilégio fosse ele o seu pagamento imediato, ainda que autorizado judicialmente não cria em favor do credor qualquer direito adquirido, o que impõe a obrigação da sua devolução pelo recebedor, mostrando-se incensurável a decisão que assim o determina. Essa restituição à massa falida impõe-se feita nas condições determinadas judicialmente, pena de responsabilização civil e criminal do credor”

Recurso Especial: foi interposto exclusivamente com fulcro no art. 105, inc. III, alínea “c” da Constituição Federal, sob a alegação de divergência jurisprudencial no tocante à interpretação do art. 24 da Lei 8.906/94.

Para demonstrar o dissídio, colaciona julgado do 1º TACSP no sentido de que os honorários advocatícios se caracterizam como verba alimentar e se equiparam a salário. A partir dessa consideração, a recorrente retira a conseqüência de que a verba honorária que levantou nos autos da falência da sociedade Moellmann Comercial S.A., deveria ter sido enquadrada nas hipóteses do caput do art. 102 da antiga Lei de Falências (DL nº 7.661/45), de forma que seria ilegal a determinação de devolução das quantias levantadas a esse título.

O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso especial na cota exarada às fls. 189.

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 566.190 – SC (2003/0107363-5)

RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI

VOTO

Para que seja decidida a presente demanda, é necessário definir duas questões: (a) se os honorários advocatícios podem, ou não, ser considerados verbas de natureza alimentar; e, caso positivo, (b) se tal característica seria suficiente para equipará-los aos créditos trabalhistas que, por força do disposto no art. 102, caput, da antiga Lei de Falências (DL nº 7.661/1945) são dotados de preferência absoluta no pagamento dos débitos em processo falimentar.

A análise dessas questões deve ser feita tendo em vista o disposto no art. 100, §1º-A, da Constituição Federal, 24 do Estatuto da OAB (Lei nº 8.909/94) e, finalmente, 102 e respectivos incisos, da Lei de Falências (DL nº 7.661/45). Cada uma dessas normas dispõe o seguinte:

Constituição Federal:

Art. 100. À exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

(…)

§ 1º-A Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou invalidez, fundadas na responsabilidade civil, em virtude de sentença transitada em julgado. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 30, de 2000)

Estatuto da OAB

Art. 24. A decisão judicial que fixar ou arbitrar honorários e o contrato escrito que os estipular são títulos executivos e constituem crédito privilegiado na falência, concordata, concurso de credores, insolvência civil e liquidação extrajudicial.

(…)

Lei de Falências:

Art. 102. Ressalvada, a partir de 2 de janeiro de 1958, a preferência dos créditos dos empregados, por salários e indenizações trabalhistas, sobre cuja legitimidade não haja dúvida, ou, quando houver, em conformidade com a decisão que for proferida na Justiça do Trabalho, e, depois deles, a preferência dos credores por encargos ou dívidas da massa(art. 124), a classificação dos créditos, na falência, obedece à seguinte ordem:

I – créditos com direitos reais de garantia;

II – créditos com privilégio especial sobre determinados bens;

III – créditos com privilégio geral;

IV – créditos quirografários.


A leitura das disposições legais supra transcritas deixa claro que os honorários são dotados de privilégio, no juízo falimentar. Isso não se põe em dúvida. O que é necessário definir, todavia, é se sua alegada natureza alimentar teria o condão de deslocar essa verba da previsão contida no item III – privilégios gerais – para o caput do art. 102 da Lei de Falências, conferindo ao advogado o direito de recebê-la antes de qualquer outro credor da massa. É esse, portanto, o ponto que, precisamente, carece de definição.

I – Natureza alimentar dos honorários advocatícios

Conquanto a Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já tivesse se pacificado a respeito da natureza alimentícia dos honorários advocatícios (ROMS nº 12.059/RS, DJ de 9/12/2002; ROMS 1.392/SP, DJ de 8/5/1995), a introdução, pela Emenda Constitucional nº 30/2000, do §1-A do art. 100 da Constituição Federal reabriu a questão. Com efeito, em julgados mais recentes, tanto a primeira, como a segunda turma desta Corte, já se manifestaram no sentido de não conferir tal natureza a essas verbas (REsp nº 653.864/SP, DJ de 12/12/2004; ROMS nº 17.536/DF, DJ de 10/2/2004).

A discussão é travada mais freqüentemente por ocasião de decisões acerca da ordem dos precatórios expedidos em face da Fazenda Pública (que é, aliás, exatamente o assunto discutido nos precedentes trazidos pela recorrente para confronto). Portanto, é na Primeira e na Segunda Turmas deste Tribunal que os precedentes têm se formado.

Os acórdãos mais antigos, para fundamentar o entendimento de que tinham natureza alimentar os honorários, costumava mencionar o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, do RE nº 146.318-0, relatado pelo Ministro Carlos Velloso.

Esse julgado, acolhido à unanimidade pelos integrantes da Segunda Turma do STF, teve a seguinte ementa:

CONSTITUCIONAL. PRECATÓRIO. PAGAMENTO NA FORMA DO ART. 33, ADCT. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E PERICIAIS:

CARÁTER ALIMENTAR. ADCT, ART. 33.

I. Os honorários advocatícios e periciais têm natureza alimentar. Por isso, excluem-se da forma de pagamento preconizada no art.

33, ADCT.

II. R.E. não conhecido.

No corpo desse acórdão, o Pretório Excelso, para fundamentar o reconhecimento do caráter alimentar da verba honorária, menciona que “embora a honorária não tenha a natureza jurídica do salário, dele não se distingue em sua finalidade, que é a mesma. A honorária é, em suma, um salário ad honorem pela nobreza do serviço prestado. Tem, portanto, caráter alimentar, porque os profissionais liberais dele se utilizam para sua mantença e de seu escritório ou consultório”.

A reabertura da discussão no âmbito do STJ deu-se porque o §1º-A do artigo 100, agora, enumera de maneira expressa as verbas que podem ser consideradas de caráter alimentar, mencionando “salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou invalidez, fundadas na responsabilidade civil, em virtude de sentença transitada em julgado”.

Honorários, como se vê, não estão incluídos nesse rol.

O principal fundamento dos acórdãos que deixaram de reconhecer o caráter alimentar para os honorários, conforme se extrai do voto proferido pelo Ministro Luiz Fux no ROMS nº 17.536/DF (DJ de 3/5/2004), é o de que essas verbas, por configurarem retribuição aleatória e incerta – dependente do êxito da causa – “não podem ser considerados da mesma categoria dos alimentos necessarium vitae previstos na Carta Magna” (ROMS 17.536, supracitado).

Ou seja, o foco desses precedentes são os honorários de sucumbência, justamente porquanto é só nessas situações que o recebimento dessas quantias é aleatório. A hipótese dos autos, porém, é de honorários contratados em valor fixo. Tais hipóteses não foram contempladas nos precedentes e, mais que isso, foram ressalvadas de maneira expressa no voto proferido pelo Ministro Luiz Fux no ROMS nº 17.536 (DJ de 3/5/2004), verbis:

“Prima facie, mister distinguir a natureza dos honorários decorrentes da sucumbência daqueles resultantes do contrato firmado entre o advogado e a parte a qual patrocina. Deveras, a verba decorrente dos honorários de sucumbência – cuja retribuição é aleatória e incerta – dependente do êxito da parte a qual patrocina, não podem ser considerados da mesma categoria dos alimentos necessarium vitae previstos na Carta Magna.

Sobre o tema destaque-se, pela juridicidade de suas razões, os fundamentos desenvolvidos pelo Ministro Sydney Sanches, no voto condutor do RE 143.802-9/SP, litteris:

(…)

‘Os honorários advocatícios da sucumbência não tem, data venia, o caráter alimentar. É certo que esse caráter deve ser conferido àquela verba resultante de contrato firmado entre o advogado e a parte, no momento do patrocínio. Desse numerário, efetivamente retira o patrono seu sustento. É diversa da verba decorrente da sucumbência, da qual o advogado não pode sem sempre dispor ou contar como certa.’ (grifos nossos)


Ou seja, o que se vê é que o movimento recém iniciado no sentido da mudança do posicionamento desta Corte não se aplica ao caso concreto. Para o caso dos autos – honorários contratados por valor fixo – ainda vigora o entendimento de que deve ser-lhe conferida natureza alimentar.

b) Da equiparação dos honorários aos salários mencionados no art. 102 da antiga Lei de Falências.

Definida a natureza alimentar dos honorários advocatícios, resta saber se essa definição, isoladamente, é suficiente para enquadrá-los no privilégio absoluto conferido aos salários pelo caput do art. 102, da antiga Lei de Falências.

A análise meramente literal do dispositivo de lei, naturalmente, levaria à conclusão de que somente os salários, stricto sensu, são passíveis da proteção absoluta. Todavia, uma reflexão um pouco mais detida leva a conclusão oposta. As proteções conferidas ao salário, como a que ora se comenta, não foram estabelecidas pela lei de maneira meramente dogmática. Há, naturalmente, uma finalidade que a norma pretende atingir.

No caso em tela, essa finalidade é garantir ao trabalhador que, na medida do possível, receba seus proventos, e, conseqüentemente, tenha garantida sua sobrevivência e a de sua família. Vale dizer: é o caráter alimentar do salário que justifica a proteção que a lei lhe concede. Tanto que o princípio da intangibilidade dos salários, cujo corolário é a impenhorabilidade dessa verba, comporta a expressa exceção fixada pelo artigo 649, inciso IV do Código de Processo Civil, para prestações de natureza alimentícia. Esse é o fundamento da proteção legal ao salário.

Ora, se do caráter alimentício também estão revestidos os honorários, não vejo motivo pelo qual não se deveria estender também a eles a proteção legal. Note-se que, aqui, não estou a dizer que honorários e salários são figuras idênticas.

Salário, nos termos dos arts 457 e 458 da CLT, é a remuneração paga pelo empregador ao empregado (pessoa física), como remuneração pela prestação de serviços no âmbito de uma relação de emprego. A figura do salário é específica, e para sua caracterização devem estar presentes os requisitos do artigo 2º da CLT. O que afirmo, em vez disso, é que na natureza alimentar, e somente nela, as figuras são afins.

Ora, se são figuras afins em sua natureza alimentar, o privilégio conferido pela Lei de Falências aos salários deve ser estendido também aos honorários, porquanto é exatamente isso que a Lei visa a proteger. Interpreta-se, portanto, o caput do art. 103 de maneira extensiva, atribuindo-lhe o significado amplo de remuneração.

c) Da pessoa jurídica

O raciocínio desenvolvido acima não é alterado pelo fato de a verba honorária ora discutida ter sido recebida por uma sociedade de advogados. Em primeiro lugar, não é inusitado que a natureza alimentar seja reconhecida à receita de uma pessoa jurídica, do que é exemplo a remuneração recebida por representantes comerciais, equiparada às indenizações trabalhistas (Lei nº 4.886/65, art. 44), não obstante os representantes comerciais possam se organizar em torno de uma sociedade (art. 1º).

Em segundo lugar, a sociedade de advogados é organizada de maneira muito peculiar pela Lei nº 8.906/94, que dispõe ser vedada a adoção de forma ou característica mercantil, a participação de quaisquer pessoas que não exerçam a atividade de advogados (art. 16) e determina a responsabilidade ilimitada de todos os sócios perante os respectivos clientes pela ação ou omissão no exercício da advocacia (art. 17). Ou seja: trata-se de uma sociedade de pessoas, e não de capital, cujo único objeto possível é o exercício da atividade advocatícia.

Ora, se os débitos de uma sociedade de advogados podem ser estendidos a seus sócios, temos inevitavelmente uma confusão de patrimônios entre eles e a sociedade. Não vejo motivos para que tal confusão não seja estendida também às receitas do escritório, mormente tendo em vista que tais receitas serão provenientes de uma única atividade – a advocatícia -, cuja remuneração é, ordinariamente, considerada de caráter alimentar.

Vale acrescentar ainda que em nenhum momento a Lei nº 8.906/94 faz qualquer distinção entre pessoas físicas ou jurídicas, no exercício da advocacia. O tratamento dado ao exercício dessa atividade é sempre pessoal. A relação dos clientes não é estabelecida diretamente com a sociedade, mas, sempre, com os advogados que a compõem. Tanto que, tratando da representação do cliente em juízo, a Lei dispõe que “as procurações devem ser outorgadas individualmente aos advogados e indicar a sociedade de que façam parte” (art. 15, §3º).

Essa pessoalidade se reflete nos honorários. Não somente os sócios, mas também os advogados empregados em um escritório têm direito, de maneira pessoal e direta, aos honorários advocatícios. A esse respeito, a Lei dispõe, em seu art. 21, § único, que “os honorários de sucumbência, percebidos por advogado empregado de sociedade de advogados são partilhados entre ele e a empregadora, na forma estabelecida em acordo”.

Ou seja, por qualquer lado que se olhe a questão, salta aos olhos que a verba honorária pertence ao advogado, ainda que organizado em torno de uma pessoa jurídica. É sua fonte de sustento e tem, em qualquer caso, natureza alimentar. Forte em tais razões, conheço e dou provimento ao recurso, para o fim de revogar a decisão que determinou a devolução, pelos recorrentes, do valor por eles levantados nos autos da falência da sociedade Moellmann Comercial S.A.

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