Saúde garantida

Estado do Amapá tem de fornecer remédios a portadores do vírus HIV

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29 de janeiro de 2005, 13h10

O juiz Arthur Pinheiro Chaves, da 1ª Vara Federal do Amapá, concedeu liminar que obriga o estado a fornecer, durante um mês, quantidades suficientes dos medicamentos necessários aos portadores do HIV. Cabe recurso.

A decisão também determina que estejam disponíveis na rede de saúde pública o kit para o teste rápido de Aids em grávidas que não fizeram o pré-natal e a o leite NAN 1 para recém-nascidos. O juiz acolheu pedido feito pelo Ministério Público Federal do Amapá em Ação Cautelar Inominada.

Caso não seja cumprida a determinação, a será aplicada multa diária de R$ 10 mil ao secretário estadual de Saúde, que se reverterá em favor dos portadores do vírus HIV em tratamento na rede pública de saúde do Amapá.

Segundo o procurador da República José Cardoso Lopes, autor do pedido, não existe justificativa plausível para o não fornecimento de medicamentos aos portadores de HIV e do leite NAN 1 a crianças nascidas de mães infectadas. Ele informou que, de janeiro a novembro de 2004, o Ministério da Saúde repassou mais de R$ 310 mil para a conta estadual de incentivo ao Programa Nacional de HIV/Aids e outras DSTs.

Leia a íntegra da ação

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO AMAPÁ

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA 2ª VARA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO AMAPÁ

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador da República ao final assinado, no exercício de suas atribuições constitucionais, vem a Vossa Excelência, com fundamento no art. 4o da Lei nº 7.347/85 c/c artigo 5º , inciso V, alínea “a” da Lei Complementar nº 75/93, e artigos 129 e 196 da Constituição Federal, propor

AÇÃO CAUTELAR INOMINADA

com pedido de provimento liminar

em desfavor do ESTADO DO AMAPÁ (SECRETARIA DE SAÚDE DO ESTADO DO AMAPÁ/SECRETÁRIO DE SAÚDE DO ESTADO DO AMAPÁ), pessoa jurídica de direito público interno, CNPJ nº 00.394.577/0001-25, com endereço na Rua Eliezer Levy, esquina com Avenida FAB, nesta Capital, consoante as razões de fato e de direito que passa a expor:

I – DOS FATOS

O Ministério Público Federal ajuizou, no dia 07/12/04, ação cautelar inominada (2004.31.0.002624-9 – 2ª Vara ) em que pedia ao Estado do Amapá o fornecimento emergencial do medicamento Ciclosporina aos pacientes transplantados.

No dia 10 do mesmo mês e ano o MPF ajuizou outra ação cautelar (2004.31.00.002646-1 – 2ª Vara), visando o fornecimento, aos pacientes acometidos de câncer e necessitados de tratamento quimioterápico no Estado do Amapá de quantidade suficiente dos medicamentos necessários à quimioterapia.

Deferidas as liminares, o Estado do Amapá cumpriu a ordem judicial emanada.

Ocorre que, infelizmente, a situação calamitosa a que foi conduzida a saúde pública deste Estado por sua desastrosa gestão perdura em relação a todas as outras áreas, em especial àquela dos pacientes portadores do vírus HIV/Aids e dos filhos de mães portadoras.

Este Parquet foi procurado no dia 17 de janeiro do corrente, pelas senhoras ANARACY VALÉRIA ALMADA RODRIGUES e IVANEIDE FERREIRA DA COSTA, respectivamente paciente necessitada de tratamento no combate às “doenças oportunistas” advindas do vírus HIV e mãe de uma criança que necessita da fórmula infantil – leite NAN 1, e presidenta da Associação de Mulheres Amapaenses Posithivas – AMA+, as quais denunciaram que está em falta os medicamentos IMUNOGLOBULINA I. V. HUMANA, PREDNISONA, GANACLOVIR, ÁCIDO FOLÍRICO, SULFAMETOXAZOL+, TRIMETOPRIMA INJETÁVEL, ANFOTERICINA B e CLARITROMICINA, para combater as chamadas doenças oportunidades que acometem os portadores de HIV/AIDS; que na Maternidade de Macapá está em falta o kit para realização do teste rápido nas grávidas que não fizeram pré natal, a fim de detectar eventual soro positivo, e que não está sendo feita a regular distribuição do leite NAN 1- fórmula infantil, proveniente do Projeto Nascer às mães portadoras do vírus HIV (termos de declarações, em anexo).

As conseqüências da interrupção do referido tratamento para os pacientes que dele necessitam neste Estado são por demais perversas: diminuição da sobrevida e morte.

“A saúde é direito de todos e dever do Estado …” assevera o art. 196 da Constituição Federal. De outra banda, estabelece o art. 2º da Lei nº 8.080/90: “A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício”.

É lastimável que necessite o Ministério Público Federal vir, mais uma vez, perante Vossa Excelência requerer algo tão comezinho, tão básico: o mínimo de respeito do Estado pela vida e saúde humanas. Entretanto, Excelência, é o que se pode e se deve fazer por ora. Na ação principal buscaremos tutelar de forma conjuntural o acesso minimamente decente aos serviços públicos de saúde.

Nem se busque alegar falta de recursos, posto que os há. De janeiro a novembro do ano de 2004, foram repassados pelo Ministério da Saúde ao Estado do Amapá nada menos que R$ 310.954,23 (trezentos e dez mil, novecentos e cinqüenta e quatro reais e vinte e três centavos) exclusivamente para a rubrica “Incentivo Programa Nacional de HIV/Aids e outras DST” (vide planilha, em anexo), rubrica esta que alberga os medicamentos necessários ao combate das infecções oportunistas dos pacientes com hiv, a fórmula infantil do leite NAN 1 e o kit para realização do teste rápido.

Por que então os pacientes não dispõe do tratamento? Não há justificativa plausível, tampouco podem os doentes bancar com suas vidas a espera de uma. Impõe-se ao Estado-Juiz de modo coercitivo garantir que se obedeçam a Constituição e a Lei e se preservem vidas.

II – DO FUNDAMENTO JURÍDICO

Dentre as atribuições do Ministério Público previstas no artigo 129 da Constituição Federal, está a função institucional de “zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia”.

Também na Constituição da República, em seu art. 196, a previsão de que “A Saúde é direito de todos e dever do Estado”.

Por sua vez, consoante o disposto no artigo 5º, inciso V, alínea “a” da Lei Complementar nº 75/93, é função institucional do Ministério Público da União ” zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos da União e dos serviços de relevância pública quanto aos direitos assegurados na Constituição Federal relativos às ações e aos serviços de saúde e à educação”.

Exsurge cristalino, na espécie, o interesse da União, haja vista que envolvida encontra-se a aplicação de recursos federais repassados ao Estado do Amapá, o que por conseguinte, nos termos do art. 109, inciso I, da CF/88, estabelece a competência da Justiça Federal para processar e julgar o presente feito e legitima a atuação do Ministério Público Federal no mesmo.

III – DA AÇÃO PRINCIPAL

O Ministério público federal PROMOVERÁ no prazo legal Ação Civil Púbica tendo por objeto a regularização do fornecimento de medicamentos para combater as chamadas doenças oportunidades que acometem os portadores de HIV/AIDS; do kit para realização do teste rápido nas grávidas que não fizeram pré natal, a fim de detectar eventual soro positivo, e a regular distribuição do leite NAN 1- fórmula infantil, proveniente do Projeto Nascer às mães portadoras do vírus HIV, atendidos pela rede pública de saúde do Estado do Amapá.

IV – DO PEDIDO LIMINAR

Isto posto, e face à urgência do provimento que ora se pleiteia, requer o Ministério Público Federal seja o Estado do Amapá, através da Secretaria Estadual de Saúde e sob responsabilidade solidária e pessoal do senhor Secretário de Saúde do Estado, inaudita altera pars, compelido a fornecer aos pacientes portadores do vírus HIV e necessitados de tratamento no Estado do Amapá, no prazo de 24 horas, quantidade suficiente dos medicamentos necessários ao combate das doenças oportunistas advindas do vírus HIV, entre os quais todos aqueles que acabamos de nos referir, para o tratamento durante um mês; disponibilização do kit para o teste rápido na Maternidade de Macapá e fornecimento da fórmula infantil – leite NAN 1 aos filhos não infectados por mãe portadora do vírus, em especial a Srª. ANARACY VALÉRIA ALMADA RODRIGUES, sob pena do pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por dia de inadimplemento da obrigação de fazer requerida.

V – DO PEDIDO PRINCIPAL

Diante do exposto, requer o MPF seja o provimento liminar confirmado no julgamento do mérito, para que o réu promova o fornecimento gratuito dos medicamentos necessários ao tratamento no combate das doenças oportunistas advindas do vírus HIV; disponibilização do kit para o teste rápido na Maternidade de Macapá e fornecimento da fórmula infantil – leite NAN 1 aos filhos não infectados por mãe portadora do vírus aos pacientes do Estado do Amapá em quantidade suficiente para um mês.

VI – DOS REQUERIMENTOS E PROTESTO DE PROVAS

Requer o Ministério Público Federal, ainda, a CITAÇÃO dos requeridos para que, querendo, contestem a ação, no prazo legal, sob pena de ser aplicada a pena de confesso e declarada a revelia dos mesmos.

Protesta-se provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos, em especial através dos documentos ora anexados e pelo depoimento das testemunhas oportunamente arroladas.

Dá-se à causa o valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

Macapá (AP), ___ de janeiro de 2005.

JOSÉ CARDOSO LOPES

Procurador da República

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