Overdose de gasolina

Adulteração de combustível em favor do consumidor não é crime

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20 de janeiro de 2005, 13h21

Adulteração de combustível que não prejudica o consumidor, e sim o beneficia, não é crime de consumo. Com essa tese, os advogados Eduardo Mahon e Luis Vidal da Fonseca pretendem trancar ação penal ajuizada pelo Ministério Público contra o gerente de uma rede de combustíveis em Mato Grosso.

Os advogados entraram com Habeas Corpus na 4ª Vara Criminal de Cuiabá. Segundo o pedido, o dono encomendou da Agip Distribuidora combustível necessário para abastecer o posto. Por um equívoco, litros da gasolina aditivada foram misturados a mais ao tanque do álcool. Assim, o combustível ficou com 6% de gasolina no lugar dos 3% estabelecidos pela Agência Nacional do Petróleo (ANP).

A adulteração foi demonstrada durante fiscalização da ANP no posto. O Ministério Público entrou com uma ação penal contra o gerente por crime contra o consumo. Os advogados alegam que o combustível nem chegou a ser vendido.

Segundo eles, mesmo que a venda tivesse ocorrido, a adulteração terminou por ser benéfica ao consumidor. “Ocorreu a adição de um combustível com maior octanagem, qualidade e preço, a um de menor octanagem, qualidade e preço”, afirmam.

Mahon e Fonseca sustentam que “o comerciante que minora a qualidade do produto, sonega informações relevantes, escamoteia preços, vende produtos vencidos, adultera a qualidade, produtividade e substância — este merece a sanção legal de repressão penal”.

Mas, no caso concreto, “persistir neste processo penal contra-produtivo é tomar tempo e disposição da Justiça estadual que tem inúmeros bandidos perigosos para julgar. Não pode, nem deve o Ministério Público tomar o tempo de um magistrado que tem responsabilidade pelo status libertatis de centenas de cidadãos, com denúncias vazias, sem o mínimo lastro de justa causa”.

Leia o Habeas Corpus

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR-PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO.

Paciente: Antônio Eduardo Costa e Silva

Impetrado: MM. Juiz da 4ª Vara Criminal — Cbá.

EDUARDO MAHON, advogado, inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil — Seccional. MT sob o número 6363, com escritório indicado no timbre, nesta Capital, ao fim assinado e LUIS VIDAL DA FONSECA, advogado, OAB/MT 7727 vêm ambos, mui respeitosamente, impetrar em nome próprio:

ORDEM DE HABEAS CORPUS

c/c pedido de liminar initio litis para suspender temporariamente o interrogatório judicial

em favor de ANTONIO EDUARDO COSTA E SILVA, brasileiro, casado, empresário, RG xxx, SSP/MT e CPF xxx, com endereço `a Avenida xxx, nº xxx. Bairro xxx, em Cuiabá-MT, de conformidade com o at. 5º, inc. LXVIII, da Constituição Federal e Arts. 648, inc. I e 649, ambos do Codex Processual Penal, objetivando o trancamento da Ação Penal movida contra a sua pessoa, na E. 4 ª Vara Criminal de Cuiabá (Processo nº 099/2003), tendo em vista a FALTA DE JUSTA CAUSA para o seu prosseguimento, nos termos dos fatos, motivos e fundamentos expostos a seguir

I. BREVE EXÓRDIO SOBRE OS FATOS OCORRIDOS EM REVENDEDORA DE COMBUSTÍVEL: O MECÂNISMO DE FUNCIONAMENTO DE TANQUES.

Como é do conhecimento de Vossas Excelências, os postos de gasolina da capital têm bandeiras de distribuidoras e estas, por sua vez recebem combustível de fora do Estado de Mato Grosso, devidamente tributado, como é o caso. Aqui, trata-se de revenda de álcool e gasolina de AGIP DO BRASIL para MC POSTOS DE COMBUSTÍVEIS LTDA, funcionando com o Protocolo junto à Agência Nacional de Petróleo, mediante Ficha Cadastral de Posto Revendedor. Interessante anotar que, mesmo à vista óbvia da referida ficha cadastral, o Ministério Público afirmou que funcionava o estabelecimento de forma irregular. Ora, quem entende minimamente do comércio de combustíveis, sabe bem que a Ficha Cadastral de Posto Revendedor, por si só, é documento hábil a autorizar transações comerciais no que concerne à comercialização dos produtos, realidade básica infelizmente olvidada pelo órgão ministerial.

De propriedade de fato e de direito de MANOEL CORRÊA DE ALMEIDA FILHO e esposa, o Posto Santa Maria, nome de fantasia de MC POSTO DE COMBUSTÍVEIS LTDA, funcionava regularmente em 2000, conforme Contrato Particular do Ponto Comercial da AGIP DO BRASIL para a referida empresa, datado do mês de outubro de 2000. Como procuradores constituídos em 16 de Novembro de 2000, a Sra. Dalma Beatriz Monteiro Corrêa Costa e Silva e o acusado ora Paciente Antônio Eduardo Costa Silva, por procuração firmada junto ao tabelionato do 6º. Ofício da Cidade de Cuiabá, neste Estado, podendo responder por atos administrativos gerais em nome daquele proprietário procurador. Trata-se de prática costumeira daquele que têm investimentos diversificados, sobretudo delegar a administração de um empreendimento para que o genro e a filha o administrem, como se sucedeu efetivamente.


E, como compradora e revendedora de combustíveis, a MC POSTOS DE COMBUSTÍVEIS LTDA lidava com a gasolina, álcool anidro e hidrato, além de outros derivados de praxe em postos de gasolina e demais serviços consentâneos à atividade comercial. Nos dias 01 e 05 de outubro de 2001, AGIP DISTRIBUIDORA S.A, vendeu àquela empresa álcool comum, no valor de R$ 13.751,08 (treze mil, setecentos e cinqüenta e hum reais e oito centavos), perfazendo um total de combustível, conforme Notas Fiscais anexas.

Entretanto ocorreu acidente no interior da empresa a qual o acusado gerenciava, que foi o derrame de gasolina no tanque submerso daquele álcool comprado, já referido. Para que Vossas excelências tenham idéia, l minuto ou 60 segundos de descarga de combustível, já é tempo necessário ao sinistro, ocorrido de fato.

Constando o erro na descarga da gasolina, produto substancialmente mais valioso que o álcool, o funcionário Flávio Aparecido Ângelo, imediatamente parou a descarga de gasolina nos tanques já cheios. A Policia Fazendária, em procedimento investigatório acerca dos procedimentos tributários da empresa, nada constando de irregular no que tangencia débitos fiscais, procedeu à uma avaliação do Produto estocado no referido posto de combustível, encontrando 3% a mais de gasolina, no tanque de 15.000 (quinze mil) litros de álcool; assim sendo, e considerando abarrotado aquele tanque temos 450 litros de gasolina que extravasaram, naquela oportunidade de descarga retro-mencionada.

Remenda-se um parênteses relevante: a gasolina, desde a década de 70, jamais teve seu preço igualado com o álcool. Sempre e sempre, o álcool foi mais barato que a gasolina: a um, por suas propriedade comburentes inferiores; a dois, pelos sucessivos programas governamentais de subsídio ao produto nacional; a três, pela flutuação dos preços internacionais. Enfim, um comerciante que derramasse produto de melhor qualidade e de valor substancialmente superior, misturando-o a outro de qualidade e preço inferior, vendendo tudo a preço menor, seria considerado pouco inteligente, para se dizer o mínimo.

Dando seguimentos à narrativa fática, em depoimento prestado em sede indiciária, o acusado Antônio Eduardo Costa e Silva, ora Paciente, afirmou não ser proprietário do posto de gasolina Santa Maria, auxiliando apenas como gerente, juntamente com a sua esposa, filha do proprietário. Portanto, cuidavam ambos (mulher e marido) de patrimônio do sogro, empregando inclusive a cunhada do acusado. Tal assertiva corresponde plenamente à verdade, pela procuração que guardava o Paciente, sendo preposto-gerenciador da empresa em questão.

Encerrou o procedimento preliminar de investigação a Polícia Fazendária, remetendo cópias ao Ministério Público, que achou por bem ofertar denúncia por crime de adulteração de combustível, juntamente com falsidade ideológica.

E o mais interessante que nenhuma outra pessoa, nem a esposa, nem funcionários, nem o proprietário do referido posto de combustível foram, em concurso, denunciados pelo Parquet. Ora, não só afirmou o acusado não ser proprietário do empreendimento, como, de fato, não o é, conforme comprovam os documentos a respeito. É clara a teratologia — primeiro, porque se a propriedade oficial do posto era, na verdade, fachada e esta servia aos escusos objetivos de marido e mulher, pelo princípio da obrigatoriedade e indivisibilidade da ação penal, não deveria recair apenas sobre o Paciente o peso da acusação; segundo, por não ser fato típico, antijurídico e culpável O FATO DESCRITO de adicionar produto mais caro ao mais barato, o que é elementar, tratando-se de mera irregularidade (até recomendável ao consumidor, venhamos e convenhamos).

A Exordial Acusatória está calcada em laudo técnico, comprovando o percentual de gasolina sobre o álcool, assim como nas declarações prestadas à Policia Fazendária de Mato Grosso, ofertando o Parquet suspensão condicional do processo ao co-réu José Arlindo por acreditar sua participação como de somenos importância, quer-se aqui ponderar sobre a ATIPICIDADE dos fatos descritos. Convém anotar que o co-réu do processo objurgado já foi beneficiado com ordem de habeas corpus por este mesmo Augusto Pretório Estadual, a fim de trancar seu processo.

DOS FATOS NARRADOS NA DENÚNCIA E DE SUA ATIPICIDADE VERIFICADA DE PLANO: TIPOS PENAIS INCONGRUENTES COM OS FATOS

O órgão ministerial narrou na peça vestibular acusatória, em resumo, a suposta “adulteração de combustível”, historiando o índice de 3% (três por cento) de gasolina, inserido em outro combustível, qual seja, o álcool. Remata a ilustre representante do Parquet Estadual afirmando que o Requerente, que figura como réu na presente ação penal, cometeu falsidade ideológica por narrar diversas vezes não ser o proprietário da distribuidora de combustíveis, e sim administrador-empregado. Daquela inicial, extrai-se:


“Desta forma, inobstante constar no cadastro da SEFAZ/MT e Junta Comercial/MT como sendo sócios proprietários da referida empresa os cidadãos MANOEL CORREA DE ALMEIDA FILHO e DALVA MONTEIRO CORRÊA, é incontroverso que a mesma pertence de fato ao Primeiro Denunciado — Antônio Eduardo Costa e Silva.

(…)

A adulteração restou constatada no dia 02/10/2001, através do serviço de fiscalização de Agência Nacional de Petróleo (ANP), nos termos do auto de infração, interdição, notificação e certidão lavrado, cujas cópias encontram-se juntadas às fls. 12/15.

A perícia realizada nas bombas de abastecimento do referido posto, constatou que o álcool etílico hidratado colocado à venda encontrava-se fora das especificações de qualidade do produto, isto é, com 06% (seis por cento) de gasolina, quando o máximo permitido era de 03% (três por cento) de gasolina.

(…)

Constatou-se, ainda, que o Posto Santa Maria da Fernando Correa não possuía registro de Revendedor Varejista junto à ANP. Fato demonstrado através do memorando n. 07/01/REG/FISC/ANP (fls.29/30)

Excelência, sabemos nós que a denúncia deve guardar estreita relação com a tipicidade delituosa para que se componha o quadro de justa causa a lastrear o mínimo acusatório, necessário ao ato do recebimento da denúncia. E esta correlação fática com o tipo descrito na diretiva penal, garante ao acusado, não só a previsibilidade de sua defesa (um dos pilares do devido processo penal), como também afasta o arbítrio acusatório. Deve o Ministério Público descrever fatos que sejam, prima facie, passíveis de punição. O processo penal guarda tônica diversa do processo civil, justamente pelo fato de que o magistrado não buscará saber do prejuízo havido, potencial ou iminente, mas apreciará, à evidência, o rol taxativo criminalizador descrito na lei, para processar um cidadão.

Neste caso, Excelência, acredita o Requerente ter exorbitado o Ministério Público. Deparando-se a delegada responsável pela fiscalização fazendária estadual com as notas fiscais da distribuidora de combustíveis em ordem, devidamente recolhidos os impostos respectivos, ainda na fonte, inspecionou não só os caminhões que lá despejavam combustível, mas os tanques subterrâneos, onde estes eram acondicionados.

Mediante laudo técnico, acostado ao processo por ocasião do oferecimento da denúncia, constatou-se a presença excessiva de gasolina no álcool, em 3% a mais do que os limites convencionados na Portaria ANP 116/118. Em declaração lançada em sede inquisitiva, o Requerente afirmou não ser o proprietário da referida distribuidora e sim um gerente-empregado, assim como sua esposa, porque ambos são parentes do proprietário, conforme demonstra o Contrato Social ora internado nos autos, assim como Certidão de Casamento e demais documentos apresentados.

O que se vê, Excelência? Os delitos definidos pela Lei 8176/91, por definição atentatórios contra a ordem econômica e economia popular, querem proteger o consumo de combustível de empresários-vilões que buscam adulterar combustível, locupletando-se sub-repticiamente. A mens lege, da citada legislação é coartar empresários que “hidratam” o combustível de forma artificial, em outras palavras, abaixam a qualidade de seu produto, em detrimento do preconizado pelos limites mínimos da Agência Nacional de Petróleo. Geralmente, o que se tem é a adição de água em álcool anidro e/ou gasolina, depreciando não só o valor do produto, mas o rendimento do próprio automóvel. Evidentemente, sem maiores elucubrações jurídicas, o CRIME CONTRA O CONSUMO AGRIDE O BEM JURÍDICO SOCIAL DA CREDIBILIDADE DO CIDADÃO-CONSUMIDOR em relação à qualidade de produtos expostos à venda, as condições de saúde e de segurança.

Trapacear, iludir, manipular, omitir são verbos comuns aos CRIMES CONTRA O CONSUMO. O comerciante que minora a qualidade do produto, sonega informações relevantes, escamoteia preços, vende produtos vencidos, adultera a qualidade, produtividade e substância — este merece a sanção legal de repressão penal.

E, antes de nos aprofundarmos em questões propriamente fáticas, a legislação que regula a matéria Lei 8176/91, dispõe claramente, em seu art. 1º, ser fato típico a aquisição, distribuição e revenda de combustível adulterado, numa clara alusão à distribuidores de combustível e não meros revendedores. Excelência, veio o álcool perfeito e retornou à origem para ser diluído e purificado, pela preocupação do acusado, com uma mera irregularidade. E mais, ao final do inciso I, do mesmo artigo, temos referência clara à LEI e não portarias da Agência Nacional de Petróleo. Como se trata de norma penal em branco, em sentido lato, jamais saberemos se QUALQUER ALTERAÇÃO EM COMBUSTÍVEL, AINDA QUE BENÉFICA, passa de mera irregularidade: onde é crime, onde é irregularidade? Excelência — bom senso — como se trata de CRIME CONTRA O CONSUMO, pressupõe-se que o consumidor será, concretamente, prejudicado pela ação criminosa do autor e não beneficiado!


Em adição de água no combustível, temos aí não apenas um delito especificamente contra o consumo e a economia popular, mas de forma transversa, em desfavor da ordem tributária, vez que a tributação do combustível pautou-se sobre o valor do produto em seu estado original, ainda não adulterado, e ao se estocar ou vender combustível “batizado”, até mesmo os tributos que seriam arrecadados pela venda são surrupiados dos cofres públicos. Desta forma, a mens lege da norma em questão quer preservar, antes de tudo, o padrão de qualidade do combustível que todos nós consumimos.

Eis a dicção legal:

LEI Nº 8.176, DE 8 DE FEVEREIRO DE 1991.

Art. 1° Constitui crime contra a ordem econômica:

I – adquirir, distribuir e revender derivados de petróleo, gás natural e suas frações recuperáveis, álcool etílico, hidratado carburante e demais combustíveis líquidos carburantes, em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei;

II – usar gás liqüefeito de petróleo em motores de qualquer espécie, saunas, caldeiras e aquecimento de piscinas, ou para fins automotivos, em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei.

Pena: detenção de um a cinco anos.

Art. 2° Constitui crime contra o patrimônio, na modalidade de usurpacão, produzir bens ou explorar matéria-prima pertencentes à União, sem autorização legal ou em desacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo.

Pena: detenção, de um a cinco anos e multa.

§ 1° Incorre na mesma pena aquele que, sem autorização legal, adquirir, transportar, industrializar, tiver consigo, consumir ou comercializar produtos ou matéria-prima, obtidos na forma prevista no caput deste artigo.

Excelência, é bem verdade que se trata de uma norma carente de técnica, vez que o inciso I do art. 1º, não especifica como o combustível será adulterado. Mas, pela leitura breve e de olhos desarmados, temos três constatações óbvias:

a) trata-se de crime doloso de dano (adquirir, distribuir e revender), diferentemente de crime de perigo, exigindo-se para a consumação a ciência prévia de que o combustível está de fato adulterado, ocasionando in concreto o dano para o consumidor, revendendo o produto “batizado”, de menor qualidade. Ademais, NÃO HOUVE REVENDA, podendo o Ministério Público, no máximo, denunciar o acusado por tentativa, ainda assim, figura atípica!

b) a intenção legislativa é reprimir o agente que adquire (para o comércio), distribui ou revende combustível de qualidade duvidosa, abaixo das especificações da Agência Nacional de Petróleo, reguladora do setor. Excelência, eis aqui o espanto do Requerente, ao ver-se apontado pelo Ministério Público, por armazenar combustível de MAIOR QUALIDADE que o comum, achado em postos de gasolina tradicionais… Somou o réu água ao álcool ou gasolina, constantes dos tanques subterrâneos? Adicionou o mesmo álcool à gasolina, produto mais barato e hidratado, ao produto mais caro e já vistoriado? Não! O Parquet Estadual narrou fato que de forma alguma se constitui crime: a adição de um combustível com maior octanagem, qualidade e preço, a um de menor octanagem, qualidade e preço! Em outras palavras, narrou o órgão ministerial mera irregularidade, sanada por meio de uma limpeza ordenada de imediato (junto à AGIP), tomando-a como crime. Diríamos mais — se todo o automóvel movido a álcool circulasse com dose de gasolina superior aos limites governamentais, teríamos MENOS DESGASTE DO MOTOR, MAIOR EXPLOSÃO DE VELOCIDADE, MAIOR COMBUSTÃO DO PRODUTO, QUALIDADE NA QUEIMA DO COMBUSTIVEL. Só não há no mercado todas estas vantagens por uma razão muito simples: A GASOLINA TEM PREÇO SUBSTANCIALMENTE MAIOR DO QUE O ALCOOL. Ora, Excelência, onde já se viu um criminoso perder, dolosamente, dinheiro?! Será este o tipo perseguido pela legislação? “Adulterar” significa estar apenas fora das especificações técnicas, ou ao que nos parece, lograr vantagem econômica em detrimento da qualidade do consumo?!

c) a pena mínima do delito é de detenção de um ano, passível de suspensão condicional do processo, em respeito à Lei 9099/95. Da mesma forma, diga-se do art. 299 do Diploma Penal, que estabelece um mínimo de 1 ano, em reclusão. Excelência, pelo respeito ao bom direito e cuidando da hermenêutica sadia, consta no art. 299 do CP, o dolo específico do crime de falsidade: “com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante”. Será que o réu, reconhecendo-se gerente de posto de combustível, portanto assumindo a responsabilidade gerencial de atos administrativos em geral, não chamou a si a responsabilidade pelo que vendia?! Claro que sim! Ora, mesmo que o posto fosse dele, pessoalmente, assumindo os atos de gerência, ainda assim, responderia penalmente pelo eventual delito.


Dessa forma, não logrou vantagem alguma com tais declarações, que objetivamente NÃO SÃO FALSAS, E SIM VERDADEIRAS, POIS DE FATO O RÉU NUNCA FOI PROPRIETÁRIO DE POSTO DE COMBUSTÍVEL E SIM GERENTE-EMPREGADO, TAL QUAL SUA ESPOSA E CUNHADA, PARENTES DO PROPRIETÁRIO, CONFORME CONSTA NO CONTRATO SOCIAL DA EMPRESA.

Sabemos nós que ao se concatenar os fatos articulados pela exordial ministerial, temos superficialmente exsurgindo a ATIPICIDADE da conduta. Há que se interpretar a norma penal, de acordo com o mínimo de razoabilidade, qualidade que o E. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso costuma pautar-se. Adicionar produto muito mais caro e benéfico ao mais barato, certamente não é, nem de longe, a conduta reprimida pelo legislador. Da mesma forma, declarar informação que é verdadeira, conforme demonstrado pelo Contrato Social acostado, e ainda sendo falsa, mas sem auferir nenhuma vantagem, criar obrigação ou prejudicar direito, constitui-se igualmente CONDUTA ATÍPICA.

Sendo assim, persistir neste processo penal contra-produtivo é tomar tempo e disposição da Justiça Estadual que tem inúmeros bandidos perigosos para julgar. Não pode, nem deve o Ministério Público Estadual tomar o tempo de um magistrado que tem responsabilidade pelo status libertatis de centenas de cidadãos, com denúncias vazias, sem o mínimo lastro de justa causa.

Justa causa, como é sabido e ressabido por Vossa Excelência, é além de material probatório mínimo para a oferta da denúncia, como ser o fato narrado plausível, típico e congruente com a legislação. Deu-se no caso? Por evidência que a denúncia é estapafúrdia, tratando-se daquelas teratologias colecionáveis naquelas antologias jurídicas risíveis.

DA POSSIBILIDADE DE REVISÃO DA DECISÃO DE RECEBIMENTO DA DENÚNCIA PELA ATIPICIDADE DE CONDUTA: EXTINÇÃO DO PROCESSO

O magistrado não é escravo do dominus litis. É certo que a Constituição de 1988 outorgou ao Ministério Público a titularidade da ação penal pública e o fez fiscal da correta aplicação da lei. É certo também que a iniciativa acusatória, incluindo aí a capitulação legal, é de atribuição exclusiva do Parquet, conforma conta do art. 41 do Código de Processo Legal. Todavia, Excelência, queremos crer que o fiscal dos fiscais seja o juiz de direito. Afinal de contas: pode o magistrado, a qualquer tempo, depois de recebida a denúncia, reconsiderar o seu ato, por ver faltar uma das condições da ação penal? Vejamos o julgado abaixo:

RECURSO CRIMINAL Nº 037/91 — PE

DATA DE JULGAMENTO – 05/11/91

PUBLICAÇÃO (DJ) – 13/12/91

RIP: 9105032326

SEGUNDA TURMA

RELATOR: JUIZ NEREU SANTOS

EMENTA

PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. REJEIÇÃO DE DENÚNCIA ANTERIORMENTE RECEBIDA. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO EX OFFICIO DE HABEAS CORPUS PARA TRANCAMENTO DA AÇÃO.

I – Recebida a denúncia, não pode o juiz de primeiro grau, depois, vir a rejeitá-la.

II – Voto vencedor no sentido de que o Magistrado que depois vem a presidir o feito pode, de ofício, rever a decisão que recebeu a peça acusatória, para rejeitá-la, quando verifica que faltava uma das condições da ação, não se constituindo típica a conduta delituosa.

III – Concessão “ex officio” de habeas corpus para trancamento da ação penal porquanto atípica a conduta do réu.

IV – Apelo provido. Habeas corpus que se concede de ofício.

DECISÃO: POR MAIORIA.

No Codex Processual, está inserto no art. 43, a possibilidade do magistrado rejeitar a denúncia, de plano, por não serem os fatos descritos considerados típicos, face à legislação penal vigente. Da mesma forma, o art. 648 do CPP condiciona a ação penal à justa causa que é o mínimo fático-jurídico para lastrear a denúncia ministerial. Somando-se a isto, temos o art. 654, parágrafo 2º, daquele Diploma Processual, verberando pela possibilidade do magistrado reconhecer de ofício o constrangimento ilegal por qual passa o acusado. Ainda, já em sede de mérito, temos o art. 386, III, do CPP, que condiciona a absolvição pela atipicidade da conduta descrita. Não é por outra razão, Excelência, que acreditamos poder o julgador, a qualquer momento do processo penal, julgar antecipadamente a lide para declarar a ATIPICIDADE dos fatos narrados. Ora, se pode extinguir o processo, se pode declarar a prescrição, se pode rejeitar a denúncia, poderá com mais razão rever a decisão constrangedora.

Este Pretório Maior de Mato Grosso, ao deparar-se com conduta eminentemente atípica, sem se aprofundar em provas de maior cognição, já decidiu inúmeras vezes pelo trancamento de ações penais, conforme se vê:

HABEAS CORPUS – AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA – TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL – DENÚNCIA FORMULADA POR USO DE DOCUMENTO FALSO – FOTOCÓPIA SEM AUTENTICAÇÃO — ATIPICIDADE DA CONDUTA – COAÇÃO ILEGAL CARACTERIZADA – ORDEM CONCEDIDA. Cabe reconhecer a ausência de justa causa para trancar a ação penal por meio de habeas corpus, quando a denúncia foi formulada com fundamento em uso de documento falso por meio de fotocópia não autenticada, tratando-se, portanto, de conduta atípica.( hc38772)


E assim a jurisprudência vai se achegando e se conformando à doutrina, na mesma esteira de entendimento:

RECURSO CRIMINAL Nº 011/89 — PB

DATA DE JULGAMENTO – 14/03/90

PUBLICAÇÃO (DOE) – 25/04/90

RIP: 8905078117

SEGUNDA TURMA

RELATOR: JUIZ JOSÉ DELGADO

EMENTA

PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. NÃO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. CONDUTA ATÍPICA.

1 – A denúncia só merece recebimento quando, ao descrever, mesmo em tese, o cometimento de figura delituosa, se apóia em fatos capazes de configurarem a conduta criminosa apontada.

2 – Se as investigações policiais só apuraram ter a indiciada sido furtada de uma bolsa onde continha tickets do programa de leite, no momento em que visitava o túmulo de sua genitora, não há como elevar tais ocorrências à categoria de peculato culposo.

3 – Não recebimento de denúncia confirmado.

DECISÃO:POR UNANIMIDADE.

Assim sendo, a fim de evitar eventual recurso ou ação autônoma, preferiu o Requerente peticionar ao Juízo da 4ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá, por ser ele mesmo julgador arejado e calejado, para entender a situação insólita pela qual atravessa o réu neste processo. Tratava-se de elegância forense, imaginando que aquele inteligente e experimentado magistrado houvesse por bem fulminar aquele mal-ajambrado processo. Infelizmente, o entendimento que pode o juiz rever o ato do recebimento da denúncia não foi acompanhado pelo Juízo da 4ª Vara Criminal, tornando-se, em nosso entender, refém da tipificação ministerial. Alegou o Impetrado, por ocasião da petição ulterior da defesa:

Vistos e etc,

Antônio Eduardo Costa e Silva, através dos Drs. Eduardo Mahon e Luis Vidal da Fonseca, com petição às fls. 279/97, requer a reconsideração do ato de recebimento da denúncia, aduzindo que os fatos narrados na denúncia seriam atípicos ou caso não seja acolhido o seu pedido, a aplicação do instituto da suspensão condicional do processo, tomando por base a incidência isolada de cada um dos delitos que lhe foram atribuídos na denúncia.

Às fls. 347 e 387, o MP opinou desfavoravelmente aos pedidos, alegando falta de amparo na legislação vigente.

Indefiro o item I da petição de fls. 279/97, uma vez que seu pedido não encontra amparo legal da legislação vigente, pois, já que não há previsão de pedido de reconsideração do ato de recebimento da denúncia.

Ainda para fins de complementação da matéria, considere-se que para o recebimento da denúncia, é indispensável que nela se descreva, ainda que sucintamente, o fato criminoso atribuído ao acusado, e no caso versando, está bem evidenciada a materialidade do delito, assim como, os suficientes indícios de autoria, visto que, os fatos narrados na denúncia, encontram indícios de amparo na prova documental e oral, razão pela qual foram suficientes para seu recebimento às fls. 210, devendo a ação penal seguir o curso previsto em lei.

Indefiro o pedido de suspensão condicional do processo, considerando que o acusado foi denunciado pela prática do art. 1º da Lei 8176/91 e art. 299 c/c 29 e 69, todos do CP, pois não é possível o respectivo benefício em concurso de crimes, quando a pena mínima cominada seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de 1 ano, o que é repelido pela jurisprudência e inclusive a matéria foi sumulada — Súmula 243 do STJ.

Designo para 26/04/2005 às 14hrs, o interrogatório.

Infelizmente, perdeu aquele brilhante magistrado de revisar antigas teorias processuais penais que vedam a revisão do ato de recebimento de denúncia. Excelência, com todas a vênias, é teratológica a negativa judicial pura e simples — isto porque tem o magistrado dever de apreciar, a qualquer tempo, pelo menos as condições de procedibilidade e punibilidade do fato descrito na inicial. Se verificar a prescrição, a atipicidade, o perdão, ou qualquer outro fenômeno que obste o prosseguimento da ação penal, este deverá ser anotado pelo juiz da causa, de oficio. Além desse fato, é tacanho o raciocínio que não poderá o juiz revisar o ato de recebimento de denúncia, já que não encontra amparo legal, uma vez que ao magistrado é conferido, por exemplo, o poder geral de cautela para conceder quaisquer medidas inominadas, não previstas expressamente pelo Codex Processual. Ora, vir a esquivar-se de cotejar o pedido por falta de previsão legal, inserta no CPP, é furtar-se ao mais nobre dever judicante.

No que concerne ao segundo pedido alternativo formulado pelo Paciente, qual seja, o de suspensão condicional do processo, temos para nós sua viabilidade. Calcado na melhor doutrina, temos que Ao editar o art. 98, I, da Constituição Federal, o constituinte prescreveu que os Juizados Especiais Criminais no Distrito Federal e nos Territórios deveriam ser criados por lei editada pela União, e nos Estados por lei estadual.


Também a lei estadual ficou encarregada de dispor sobre os sistemas desses Juizados, pontualmente em matéria organizacional, composição e competência, sendo que em relação a esta última Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho, Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flávio Gomes alertaram que a mesma não poderá ser ampliada para infrações que não forem de menor potencial ofensivo, definidas no art. 61.13

Em síntese, a Constituição Federal evidenciou que com a criação dos Juizados Especiais Criminais surgiram na nossa nova ordem penal as denominadas infrações penais de menor potencial ofensivo, permitindo à norma infraconstitucional a regulação da matéria.

Por exemplo, em relação ao procedimento determinou desde logo a Carta Maior que este seria sumaríssimo, e ao definir a questão da via impugnativa antecipou que a composição das turmas recursais que atuariam em segundo grau de jurisdição se daria por turma de juízes de primeiro grau, não havendo por essa razão ofensa ao duplo grau de jurisdição.

Quando a Constituição Federal utilizou-se da expressão “mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei”, apenas admitiu que a norma infraconstitucional fizesse uma prudente distribuição do exercício dos órgãos investidos de jurisdição com a necessária delimitação no que concerne ao processo em espécie.

Além disso o texto constitucional permitiu que a lei ordinária dispusesse sobre outras questões como a conciliação, a transação e o julgamento de recursos, além de poder definir objetivamente o que seria uma de infração penal de menor potencial ofensivo.

Note-se que a Constituição Federal, de forma deliberada, não deixou qualquer lacuna para que a competência constitucional ali definida pudesse ser prorrogada.

A esse respeito a mesma foi inflexível quanto a esfera de incidência de norma infraconstitucional, não dando azo para interferência de qualquer regra processual concernente à prorrogação da competência do Juizado Especial Criminal.

Vale relembrar que nas situações em que a Carta Maior autoriza a aplicação da norma infraconstitucional em matéria de prorrogação de competência esta assim procede no bojo do seu próprio texto tacitamente, como se percebe na competência do Tribunal do Júri e da Justiça Eleitoral;14 ou de forma expressa como nas hipóteses de julgamento de crimes de responsabilidade no que diz respeito à competência do Senado Federal.15

Aqueles que, data venia, afirmam que a causa genérica de aumento de pena prevista no art. 70 do Código Penal faz superar o limite da apenação definidor das infrações de menor potencial ofensivo (art. 61 da Lei nº 9.099/95), assim agem levando em consideração a pena final que deverá ser aplicada. Contudo percebemos que deixam de refletir com o juízo da culpabilidade sob o aspecto da negação legal da pluralidade de ações, por conseqüência, da diversidade de culpabilidade no sentido de beneficiar o réu, como foi a ratio do Código Penal.

De outra parte acreditamos que para se estabelecer o foro competente no caso de concurso ideal entre infrações de menor potencial ofensivo não pode o intérprete simplesmente levar em consideração regra de aplicação de pena.

Como afirma o Prof. Fernando Galvão da Rocha:

“No concurso formal é necessário realizar juízos da culpabilidade, distintos em relação a cada uma das infrações penais, e, em muitos casos concretos, é exatamente a variação da culpabilidade que possibilitará identificar a infração mais grave.

Percebe-se, assim, que a majoração de pena imposta pelo concurso formal não está vinculada às variações da culpabilidade do agente por fato determinado. Ao determinar a aplicação de apenas uma das penas que seriam cabíveis, o art. 70 do Código Penal estabelece modalidade de responsabilização mais favorável ao réu.

Colocando-se manifestamente em benefício do réu, o instituto do concurso formal impõe, através da causa de aumento, uma compensação, ainda que quantitativamente inferior, pela não aplicação das penas relativas à culpabilidade do agente nas demais infrações penais”.

Nesta orientação, imperturbável a lapidar exposição didática de Pedro Vergara:

“No concurso formal, não há unificação alguma de delitos: na hipótese, uma só conduta dá vida a várias espécies legais, que permanecem distintas, e que, como vários delitos, que são, devem ser imputados ao réu (cfr.Silvio Ranieri, Il reato complesso, 1940, Milão, pág.242; Florian, Trattato, I, págs.406 a 408).

Como diz Mezger — ‘A unidade jurídica da ação — no concurso formal — é constituída pela comissão de várias espécies legais’ (v.Strfrecht, vers. ital., pág. 478).

No concurso formal, não havendo unidade delituosa, também por força de lei, — os crimes são diversos, — mas a pena — embora agravada, — é uma só”.


Diante destas preleções é inevitável a conclusão de que para evitar-se um prejuízo ao réu, preservando-se a ratio do concurso ideal que foi erigido em seu favor, haverá o intérprete que compartilhar o juízo da culpabilidade das infrações penais, pois, do contrário, estar-se-ia negando ao acusado a possibilidade de valer-se das medidas despenalizadoras previstas na Lei nº 9.099/95, as quais lhe seriam mais favoráveis do que o reconhecimento puro e simples dos efeitos do concurso formal, sem dúvidas mais generosas as providências despenalizadoras.

Antes o que existia era uma ficção em indulgência ao réu, hoje, admitindo-se a continência e os efeitos do concurso formal, este instituto restará soerguido apenas para prejudicar-lhe.

Em resumo, se a exacerbação legal da básica no concurso formal de crimes hoje não leva em conta a culpabilidade do agente em relação a todos os delitos, como se conceberia ontologicamente (emergiria naturalmente caso não existisse a ficção do concurso formal), mas atua aquela por força de lei apenas em relação a um dos fatos-crime para fins de dosimetria da pena cabível à espécie ensejando uma apenação mais favorável ao réu, salta aos olhos que já estando em vigor a Lei nº 9.099/95, quando da prática de infrações penais de menor potencial ofensivo em concurso ideal, estará o intérprete afastando-se do espírito que moveu o legislador o qual editou uma nova ordem legal visando um modelo moderno de justiça criminal, consensual e despenalizadora, se, num disparate, definir como juiz competente o juízo comum, propiciando, destarte, ao réu, situação mais gravosa. Isso sob o pálio do concurso formal de crimes que sempre existiu para beneficiar o acusado.

Com estas colocações, igualmente oportuno é o conselho do autor lusitano Borges Carneiro que em tais situações sempre recomendou: “Deve-se evitar a supersticiosa observância da lei que, olhando só a letra dela, destrói a sua intenção”.20

Ao lado das sustentações tecidas até este momento surge para aliar-se ao posicionamento ora defendido, ainda que utilizada outra argumentação, a doutrina de Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho, Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flávio Gomes, os quais também concluem que o acréscimo inerente ao concurso formal deve ser desconsiderado para fixação da competência no caso de concurso ideal. Vejamos:

“No tocante aos crimes continuados e à hipótese de concurso formal, não se deve considerar o acréscimo, mas somente o tempo de pena previsto para cada infração penal isoladamente, aplicando-se por analogia, na falta de disposição expressa, o art. 119 do Código Penal. Este determina que seja considerada a pena de cada infração isoladamente para ser verificada a ocorrência de extinção de punibilidade. Assim, se houver lesão corporal culposa em concurso formal porque, da ação delituosa, resultaram duas vítimas, incidirá a Lei 9.099/95, tendo-se em conta que, vista isoladamente, a infração cometida tem pena no máximo de um ano”.

Ora, Excelência, é no mínimo desproporcional que um réu primário e de bons antecedentes tenha uma pena mínima majorada, tudo para efeito de vedação da suspensão condicional do processo. E, ainda, poderá valer-se de outros institutos até mais benéficos como a permuta da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos ou ainda, obter suspensão condicional da pena. Ou seja, a inteligência do legislador que criar um SISTEMA PROCESSUAL, proporcional e razoável. Porque está a se impedir uma medida que, em tese, será concedida mais tarde?

Até mesmo o Superior Tribunal de Justiça, citado pelo Impetrado, mudou sua postura frente à promulgação da novel legislação regulamentadora dos Juizados Especiais. Há que se atualizar sobre o tema versado:

(STJ, RHC 12.033-MS, j. 13.08.02 — Rel. Min. Felix Fischer)

“E M E N T A: PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO DE HABEAS CORPUS. LEI Nº 9.099/95. LIMITE DE 01 (UM) ANO. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. MAJORANTE (CRIME CONTINUADO). LEI Nº 10.259/01. LIMITE DE 02 (DOIS) ANOS. SÚMULA 243/STJ.

I — Para verificação dos requisitos da suspensão condicional do processo (art. 89), a majorante do crime continuado deve ser computada.

II — “O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano.” Súmula 243/STJ.

III — A Lei nº 10.259/01, ao definir as infrações penais de menor potencial ofensivo, estabeleceu o limite de dois (2) anos para a pena mínima cominada. Daí que o artigo 61 da Lei nº 9.099/95 foi derrogado, sendo o limite de um (01) ano alterado para dois (dois) anos, o que não escapa do espírito da Súmula 243 desta Corte.


Recurso provido para afastar o limite de um (01) ano, e estabelecer o de dois (02) anos, para a concessão do benefício da suspensão condicional do processo”.

E, finalmente, o mestre Damásio de Jesus leciona, a respeito da incidência do favor processual (direito subjetivo público do acusado, na verdade), considerando o concurso e majorantes:

Nos termos do art. 89 da Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995 (Lei dos Juizados Especiais Criminais), é admissível a suspensão condicional do processo, que batizamos de “sursis processual”, nas hipóteses de pena mínima abstrata igual ou inferior a um ano de privação de liberdade.

Como deve ser considerada a pena mínima no caso de concurso de crimes (material, formal e delito continuado)?

Há três orientações:

1.ª — as infrações penais que compõem o concurso devem ser consideradas isoladamente, desprezando-se o acréscimo do concurso formal e do crime continuado: o Juiz deve apreciar a aplicação da medida em relação a cada crime. Assento legal: CP, art. 119; Súmula 497 do STF. Nesse sentido: ADA PELLEGRINI GRINOVER “et al.”, Juizados Especiais Criminais, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 3.ª ed., 1999, p. 254 e 256; DAMÁSIO E. DE JESUS, Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada, São Paulo, Editora Saraiva, 4.ª ed., 1997, p. 122 e 123;

2.ª — a expressão “pena mínima cominada” requer interpretação restritiva: no concurso de crimes, seja material (CP, art. 69), formal (art. 70) ou delito continuado (art. 71), as penas mínimas abstratas devem ser somadas, levando-se em conta o acréscimo (do concurso formal e do crime continuado; arts. 70 e 71). Nesse sentido: STJ, HC 9.066, 5.ª Turma, rel. Ministro Félix Fischer, DJU 14.6.99, p. 216; STJ, RHC 8.397, 6.ª Turma, rel. Ministro Vicente Leal, DJU 21.6.99, p. 202; STJ, HC 8.976, 5.ª Turma, rel. Ministro José Arnaldo, DJU 13.9.99, p. 78; STJ, HC 9.753, 5.ª Turma, rel. Ministro Édson Vidigal, DJU 13.9.99, p. 81. Nesse sentido, na doutrina: RENÉ ARIEL DOTTI, “Conceitos e distorções da Lei n. 9.099/95”, “in” Temas de Direito e Processo Penal, Juizados Especiais Criminais, org. Antônio Sérgio A. de Moraes Pitombo, São Paulo, Malheiros Editores, 1997, p. 47;

3.ª — se, com a causa de aumento, no caso do concurso formal e do crime continuado (CP, arts. 70 e 71), a pena mínima ultrapassa o limite legal, é inadmissível a medida. Nesse sentido: STF, HC 78.876, rel. Ministro Maurício Corrêa, DJU 28.5.99, p. 6 e 7; STJ RHC 8.093, 5ª Turma, rel. Ministro Gilson Dipp, DJU 17.5.99, p. 219; STJ, RHC 8.331, 5.ª Turma, rel. Ministro Gilson Dipp, DJU 17.5.99, p. 220.

Sustentamos nossa opinião. No que se refere à quantidade da pena mínima abstrata, não vemos como possam ser somadas as cominações para efeito de impedimento da medida. Cuida-se de instituto despenalizador, criado para beneficiar denunciados que apresentam condições pessoais favoráveis. Além disso, de ver-se o crime continuado: há a Súmula 497 do STF, recomendando a apreciação isolada de cada delito e o desprezo do acréscimo. Não se esqueça o art. 119 do CP, que pode ser aplicado por analogia, uma vez que o término da suspensão condicional do processo sem revogação enseja a extinção da punibilidade, segundo o qual as infrações em concurso merecem apreciação individual. Quanto ao argumento da quantidade de crimes (RT, 761:618), de observar-se que o art. 89, caput, da Lei n. 9.099/95, impõe como condição do sursis processual a presença dos requisitos de permissibilidade do sursis comum (CP, art. 77), dentre os quais se encontram as “circunstâncias” da prática do crime, subjetivas e objetivas, inserindo-se nestas a gravidade objetiva do fato, que poderia, pelo número de infrações em concurso, desautorizar a concessão. Nunca, porém, por causa da simples quantidade da soma das penas. Nesse sentido: ADA PELLEGRINI GRINOVER et al., Juizados Especiais Criminais, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 3.ª ed., 1999, p. 255.

Assim, diante da negativa judicial de se trancar o processo constrangedor, tem-se viável a impetração da presente garantia constitucional, levando às barras deste Tribunal de Justiça duas questões: a primeira — o bom senso, regra áurea para o bom julgar; a segunda — a liberdade do julgador.

Busca-se, desse modo, três alternativas viáveis e razoáveis: ou trancar o processo pela esquálida causa de origem — a descrição atípica prospectada da denúncia; ou afastar o delito de falsidade ideológica, por absurdo que se apresenta, já que o Paciente não foi e não é dono de posto de gasolina (!), ou aplicar o instituto da suspensão condicional do processo de forma individualizada.

DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS PARA TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL, POR VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO E DA LEGALIDADE OU DA RESERVA LEGAL, NO CASO CONCRETO, TRATANDO-SE A LEI Nº 8.176/91 DE NORMA PENAL EM BRANCO.


O preceito sancionador a ser aplicado ao Paciente é vago, impreciso e mal-formulado, consoante melhor técnica processual. Não se sabe se quem comete o crime é apenas o fornecedor, o distribuidor, o transportador ou o varejista. Não se sabe, igualmente, qual tipo de adulteração distingue-se de mera irregularidade.

Efetivamente, discorrendo sobre o, “principio da legalidade ou da Reserva legal e seus desdobramentos”, o Prof. FRANCISCO DE ASSIS TOLEDO, escrevia que, o “nullum crimen, nulla poena sine lege”, era expressão construída por Feuerbach, no começo do século XIX, segundo a qual nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma pena criminal por ser aplicada, sem que antes desse mesmo fato tenham sido instituídos por lei o tipo delitivo e a pena respectiva, constitui uma limitação ao poder estatal de interferir na esfera das liberdades individuais.

“Daí a sua inclusão, na Constituição Federal entre os direitos e garntias fundamentais, no art. 5º, XXXIX e XL”, “in verbis”; – “não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”, “a Lei penal, na retroagirá, salvo para beneficiar o réu” (in Princípios básicos de Direito Penal — 4ª ed. — 1.991 — pág.21).

Por sua vez, – expondo sobre a “inconstitucionalidade da integração de lei penal em branco por norma infralegal” -, o renomado Prof. FÁBIO KONDER COMPARATO manifesta-se no sentido de que, “o princípio cardeal do direito de punir — não há crime sem prévia definição por lei — seria obviamente abandonado, se se aceitasse que à lei penal bastaria cominar a pena, deixando-se a competência de definição do delito, ou de acabamento do tipo, a quem não é legislador” ( in Direito Público — pág. 270)” Logo, a conduta tida por criminosa, enquadrada pelas normas decorrentes de decreto ou portaria é atípica” (pág. 91).

E, por outro lado, “quando a conduta praticada pelo agente econômico no segmento, não enquadra-se na Lei n º 8.176/91, mas, não pode haver a incidência da Lei penal geral, que ficou afastada pelo princípio da especialidade” (pág. 91).

Efetivamente, como também elucida “o Direito Penal desenvolve-se na plataforma da estrita legalidade, de maneira que não há crime sem lei anterior que defina, conforme inciso XXXIX, do art. 5º, da Constituição Federal”, “o que não pode ser confundido com decreto ou portaria” (idem).

Como ensinava o mestre HELNO FRAGOSO, “as disposições que completam as leis em branco integram o conteúdo de fato da conduta incriminada e sua alteração representa uma nova colaboração jurídica do mesmo” (in Lições, pág. 106).

“Porque se fala em devido processo?”, indaga o Prof. ADAUTO SUANNES (in fundamentos éticos do devido processo penal — ed. 1999 — pág. 147). E como responde, “simplesmente por que as cláusulas que o caracterizam dever ser obrigatoriamente observadas, não pelo réu, mas pelo Estado, na pessoa de quem o representa no processo, para que o julgamento do réu, seja um flair trail” (idem)

E, segundo o referido autor, é do mestre PONTES DE MIRANDA a sutil distinção entre representar e presentear — “no primeiro caso, alguém substitui outrem e age em seu nome; no segundo caso, a pessoa física faz estar presente no mundo físico, por ficção jurídica, a própria pessoa coletiva ou moral — O juiz representa o Estado no Processo, naquilo que o Estado se propôs: assegurar aos jurisdicionados um fair trail” (ibidem).

Ainda para o Prof. ASSIS TOLEDO, “problemas particulares de direito intertemporal, vigência intertemporal e a norma penal em branco, denominam-se normas penais em branco aquelas que estabelecem a cominação penal, ou seja, a sanção penal, mas remetem a complementação da descrição da conduta proibida para outras normais legais”. (ob.cit — págs. 42/43)

Seguindo a orientação do Prof. MAURÍCIO RIBEIRO ANTÔNIO LOPES, discorrendo sobre “o devido processo legal e o Direito Penal, como é cediço, os princípios constitucionais do processo sempre foram estudados prioritariamente aos do Direito Penal, o que apenas corrobora outra conclusão, qual seja, a de que a discussão das questões formais têm preponderado em relação às discussões que versem sobre questões materiais” (in Direito Penal, Estado e Constituição — ed. 1973, pág. 39)

Com efeito, inserido no sistema do devido processo legal, desde sua fonte primária na Magna Charta Libertarum de 1215, na Inglaterra, verificou-se que as regras tradicionalmente respeitadas, diziam respeito, é verdade, na sua marioria a questões de índole meramente processual e, de forma marcante, às relativas ao exercício do direito de defesa.

Para o Prof. CELSO DELMANTO, de há muitos, “leis em branco, são assim chamadas as leis que não possuem definição integral, necessitando ser complementadas por outras leis, decretos ou portarias. Costumam ser divididas em a) homogêneas (ou normas em branco em sentido lato), quando são complementadas por normas originadas da mesma fonte ou órgão; b) heterogêneas (ou normas em branco em sentido estrito), quando seu complemento provém de fonte ou órgão diverso” (in Código Penal Comentado — 2ª ed. 1998 — pág. 09).


Atualmente, o Prof. DAMÁSIO DE JESUS fala que, “normas penais em branco são as de definição típica, integradas por outra norma e assim, analisando a norma penal em branco, chegamos a conclusão de ser constituída de duas partes, a primeira é a disposição a ser completada; a segunda é o complemento” (in Código Penal Comentado, ed. 1989, pág. 10). O prof. MAGALHÃES NORONHA já sustentava que existem leis completas ou incompletas — “aquelas, contendo o preceito e sanção integrais, as segundas, necessitando de complemento, por ser o preceito indeterminado ou genérico” (in Direito Penal — 1º Vol — Introdução e Parte Geral — 10ª ed., 1973 — pág. 47).

Segundo o Prof. RICARDO HANSSON SAYEG, “o trecho do tipo “em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei, o qual faz a norma penal corresponder em branco, não autoriza o seu preenchimento pelos tão comuns Decreto e Portarias ministeriais ou da ANP, que regulam a indústria do petróleo”. (in Aspectos contratuais da exclusividade no fornecimento de combustíveis automotivos — Ed. Edipro — 1ª ed. — 2002 — pág. 90).

“É, a lei nº 8.176/91 tipicifa como crime contra a ordem econômica, em seu artigo 1º, inciso I, a conduta de adquirir, distribuir e revender derivados de petróleo, em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei” (idem).

Para o Prof. WILIAM WANDERLEY JORGE, “A lei penal em branco, é “chamada também de composição incompleta pois necessita, Existente de complementação de a outra, disposição legal, existente de futura” ( in Curso de Direito Penal — vol. I — Parte Geral — 6ª ed. — 1.986 — pág. 147)”Com efeito, aqui, “aplica-se o artigo 12, do código Penal, que trata da legislação especial, vez que o artigo 6º, da Lei nº 8.176/91, revoga genericamente as disposições em contrário, de modo que as regras gerais não podem ser aplicadas aos fatos incriminados pela referida Lei Especial, pois, houve disposição legislativa de modo diverso”(pág. 91).

DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS, PARA TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL, POR VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO E, DA LEGALIDADE E DA TAXATIVIDADE, NO CASO CONCRETO, TRATANDO A LEI N º 8.176/91 DE REDAÇÃO CONFUSA E AMBÍGUA:

Conforme a lição do Prof. HELENO FRAGOSO, finalmente, atinge o princípio da legalidade a incriminação vaga e indeterminada de certos fatos, deixando incerta a esfera da licitude e comprometendo, desta forma, a segurança jurídica do cidadão” (in Lições de Direito Penal — A nova Parte Geral — 7ª ed. — 1.985 — pág. 96).

“É este um aspecto novo do velho princípio, que pode ser formalmente observado, com a existência de uma lei prévia, mas, violada na substância, com a indeterminação da conduta delituosa”(idem)*.

“A incriminação vaga a indeterminada faz com que, em realidade, não haja lei definindo como delituosa certa conduta, pois, entrega, em última análise, a identificação do fato punível ao arbitro do julgador”.

Efetivamente, – conforme o ensinamento do mestre SEBASTIAN SOLER, invocado por HELENO FRAGOSO -, “a só existência da lei prévia não basta, esta lei deve reunir certos caracteres: – deve ser concretamente definitória de uma ação; deve traçar uma figura cerrada em si mesma, por força da qual se conheça, não somente qual é a conduta compreendida Senão também qual é a não compr3eendida” (pág.96).

Para o Prof. ASSIS TOLEDO, reportando-se à “concepção atual, mais ou menos cristalizada na doutrina”, com MAURACH e JESCHECK, “presentemente, essa concepção é obtida no quadro da denominada função de garantia da lei penal”, que provoca o desdobramento do princípio em exame em quatro outros princípios”, entre eles, o da “lex certa”, ou seja o da “proibição de leis penais indeterminadas” (ob.idem).

Daí a necessidade imperiosa e inafastável da “lex certa”. — “a existência de lei certa diz com a clareza dos tipos, que não devem deixar margens a dúvidas, nem abusar de normas muito gerais ou tipos incriminares genéricos, vazios” para que a lei penal possa desempenhar função pedagógica e motivar o comportamento humano, necessita ser fácilmente acessível a todos, não só aos juristas” (pág. 29). Por igual, também nos dias de hoje, o Prof. ALBERTO SILVA FRANCO, adverte que, “a técnica legislativa de formar tipos, utilizando-se de cláusulas gerais, é de todo incompatível com o Estado de Direito”, “o princípio da legalidade implica que, o fato constitutivo do delito se mostre de modo diferenciado, isto é, exige que, a lei enuncie mediante a indicação dos diversos caracteres da conduta delituosa a matéria de proibição, a fim de que, os limites entre o lícito e o ilícito não fiquem à mercê da decisão judicial”.-

Eis que “do contrário, o legislador nada mais faria do que transferir sua incumbência ao juiz, sobrecarregando-o com tarefas que não lhe são a feitas porque próprias do Poder Legislativo” (in Temas de Direito Penal — ed. 1.86 — pág.4) —


Outrossim para o Prof. PAULO JOSÉ DA COSRA JUNIOR, “a fórmula do FEUERBACH (nullun crimen, nulla poena sine lege”) “consagrada, pelo inciso XXXIX, do artigo 5º, da Constituição vigente (não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem révia cominação llegal”), desdobr-se nos seguinte princípios, entre outros: – o princípio da legalidade “(ou da reserva legal), que só aceita como fonte de direito a norma e o principio da taxatividade do tipo”, onde o “legislador deverá evitar normas de conteúdo vago e indefinido, ou mesmo a flexibilidade que possa levar a uma indeterminação da norma penal” (in Direito penal objetivo — 1ª ed. — 1.989 — págs. ¾).

“Dessa forma, necessário é que o legislador estabeleça taxativamente no tipo aquilo que é penalmente lícito e aquilo que é ilícito”(pág.4);”a norma, para que possa converter-se numa proibição comando, tutelando com eficiência bens interesses nela contidos, haverá de ser determinada, taxativa, dotada de contornos claros e precisos.”(pág.4); e,”somente assim poderá ser evitado o arbitro judicial e satisfeitas as exigências de certeza do Direito” (idem).

No mesmo rumo, até a melhor jurisprudência: “Sempre que foram estabelecidas pelo legislador “margens extremamente largas dentro das quais autoriza a atuação do Juiz”, a segurança de cada cidadão estará em jogo, pois,ao invés do desejado e discreto arbítrio judicial, indispensável à individualização da pena, instaura-se o regime da arbitrariedade judicial, onde um quadro de inúmeras opções despropositadas encontra forma de expressão” (Jutacrim 45/29).

Ainda para o Prof. PAULO JOSÉ DA COSTA JUNIOR, como “conseqüências” do princípio da legalidade, entre outras, “não se admite a retroatividade da lei penal” e

“não se admite, ainda, a incriminação indeterminada e vaga de certos fatos, comprometendo a certeza do Direito”(in Curso de Direito Penal Vol. 1 — Parte geral — ed. 1.991 — pág.27)

Reportando-se ao “desleixo” e “inaptidão legislativa penal”, em seus “comentários à Lei nº 8.176/91, o Prof. DIONISIO GARCIA realça que, a aludida Lei “trouxe figuras incriminadoras do objetividade jurídica relacionada com o interesse da ordem econômica”, e, “ao mesmo tempo cuidou do sistema de estoque de combustíveis (RT676/400); mais uma vez, o legislador mostrou uma mistura de desleixo com aptidão técnica — legislativa”, na linha de uma série de equívocos”; “lastima-se a chance perdida de agregar os tipos que cria ao estatuto anterior (Lei nº 8.137/90), o que facilitaria o conhecimento e aplicação das normas relativas aos crimes contra a ordem econômica”, mas o descuido, até aí, encontra-se incipiente” (Revista dos Tribunais — vol. 676, pág.601).

Observa-se, também “em face do caráter estrito do Direito Penal, que se a lei visou tutelar a ordem econômica, o complemento dessa norma penal em branco há que se referir à uma preocupação da mesma natureza, não bastando que haja, v.g., desrespeito à uma norma de segurança ou de saúde, que pode eventualmente configurar outro delito”(pág.402).

“Mas, o descuido, até aí, encontra-se incipiente” e “revela-se mais pelo primeiro tipo, que diz: – art. 1º – Constitui crime contra a ordem econômica: I — Adquirir…..(pág.401). Ora, “adquirir, significa obter, conseguir, alcançar…”, “distribuir, significa dar, entregar…, “revender, significa tornar a vender”. “Está claro, que, os verbos do tipo refletem comportamentos distintos, a indicar — por uma questão lógica que se cuida de crime de ação múltipla.” “In obstante, o legislador jungiu os verbos entre si com a conjunção aditiva “e”, ao invés — como lhe cumpria — da conjunção alternativa “ou”, que, secular e universalmente, se emprega frente a tipos que referem-se à várias modalidades de ação”

Daí a indagação imperiosa e inafastável: – “a adequação típica dar-se-á com a segurança de um só dos verbos ou haverá a necessidade da realização dos três?”. “Esse primeiro parâmetro, agregado ao padrão da reserva legal, indica que a redação é defeituosa, porque deveria ressalvar o uso de gás nos motores, apenas quando houvesse autorização legal”. “Dizer em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei” é, no mínimo, desconhecer igualmente a tradição que foi referendada. “O preceito em branco é permanente mas seu complemento é mutante, posterior e excepcional, porque indispensável ao regular funcionamento do sistema nacional de abastecimento de combustíveis”. “E, as normas administrativas vigentes revelaram-se insuficientes”.

“A regra da restituição infralegal deve ser circunstancial, sob pena de ferir, aliás, a própria Ordem Econômica, cujo um dos parâmetros é a defesa do consumidor (art. 170, V, da CF).


Segundo o Prof. FERNANDO CAPEZ quando à ‘TAXATIVIDADE’ e a ‘’’DESCRIÇÃO GENÉRICA’, “a reserva legal impõe também que a descrição da conduta criminosa seja detalhada e específica, não se coadunando com tipos genéricos, demasiadamente abrangentes (in Curso de Direito Penal — vol. 1 — Parte Geral — ed. 2.000 — pág.34).

“É, o deletério processo de generalização estabelece-se com a utilização de expressões vagas e sentido equívoco, capazes de alcançar qualquer comportamento humano, e, por conseguinte, aptas a promover a mais completa subversão no sistema de garantias de legalidade.” (idem). “De nada adiantaria exigir a prévia definição da conduta na lei, se fosse permitida a utilização de termos muito amplos”; “a garantia, nesses casos, seria meramente formal, pois, como tudo pode ser enquadrado na definição legal, a insegurança jurídica e social, seria tão grande, como se lei nenhuma existisse”. (idem) —

De acordo com o Prof. WILIAN WANDERLEY JORGE, quanto ao “princípio da anterioridade da lei penal, da “legalidade” ou da “reserva legal”, “ainda decorre como conseqüência da sua “adoção”, entre nós obrigatoriedade de que o fato constitutivo “do delito apreça descrito na lei, de modo exaustivo” (ob.cit,pág.130)-

“Isto é, exige-se que, a lei emanada do parlamento descreva, mediante a indicação dos diversos caracteres da conduta delitiva, a matéria de proibição, a fim de que os limites entre o lícito e ilícito não fiquem à mercê da decisão”.(idem)

“Caso contrário, o legislador nada mais faria do que transferir sua missão ao juiz, sobrecarregando-o com tarefas que não lhe incubem, por serem próprias do Legislativo”.”E, uma transferência dessa índole pressuporia não apenas uma transgressão evidente ao princípio da legalidade, senão também, – como adverte BAUMANN, uma grave contradição do princípio da separação dos poderes, características do estado de Direito, na esteira do ensinamento de GONZALES RODRIGUES MOURULLO’.

Como observa validamente o Prof. DIONÍSIO GARCIA, ainda quanto a lei nº 8.176/91, a “pena”, é de “detenção de um a cinco anos”, e, “também o preceito sancionador merece crítica”.(in Comentários — pág.40l). —

“Como se vê, olvidou da sanção pecuniária, que é da tradição com crimes contra a ordem econômica (ef. Crimes ains do CP. Títulos III e IV e Lei 8.137/90), para não dizer que se ignorou o crescente entendimento de que seriam delitos que devem ser combatidos com multas pecuniárias e nada mais” (idem).

“Como aponta NILO BATISTA, a subsidiariedade, do Direito Penal, que presupõe sua fragmentariedade, deriva de sua consideração como remédio sancionador extremo, que deve portanto ser ministrado apenas quando qualquer outro se revele inficiente” (ib idem).

– E, “sua intervenção se dá unicamente, quando fracassem as demais barreiras protetoras do bem jurídico, cassam as demais barreiras protetoras do bem jurídico, predispostas por outros ramos do Direito”.-

– Também como ensinava MAURACH, “não se justifica aplicar um recurso mais grave, quando se justifica aplicar um recurso mais grave, quando se tem o mesmo resultado, através de um mais suave” — (pág 401).

Por igual, observa ROXIM que, a utilização do Direito Penal, onde bastem outros procedimentos mais suaves para preservar ou restaurar a ordem jurídica, não dispõe da legitimação da necessidade social e pertube a paz jurídica’ (Cf. Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro, Ed. Revan 0 1990, pág. 87).-

Daí, “in casu”, a necessidade de ser cumprido fielmente o “princípio da taxatividade”.

DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS, POR FALTA DE JUSTA CAUSA, NO CASO CONCRETO;:

É possível trancar a presente ação penal? Por evidência que sim! Ainda preliminarmente, conforme é sabido, “dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal”, e, esta assim será considerada quando “não houver justa causa” (CPP – 647 e 648, inc. I).

Daí a orientação do Prof. JÚLIO FABRINI MIRABETE, segundo o que, “dispõe o art. 648 a respeito das hipóteses em que é cabível o hábeas corpus, por haver constrangimento ilegal à liberdade de locomoção; em primeiro lugar, que a coação é ilegal, quando não houver justa causa” (inc.I) — (in proc. Penal — ed. Pág.704).

E, – como completa, – “trata-se, portanto, da ausência do fumus boni júris para a prisão, Inquérito ou Ação Penal, e, não se trata de saber se a coação é justa ou injusta, o que só se decide na sentença, após regular instrução, mas, se o constrangimento é ou não legal´(idem).

Por outro lado, a justa causa resulta do conjunto de elementos probatórios razoáveis sobre a existência do crime e da autoria, – afirma o Prof. VICENTE GRECO FILHO (in Manual de Proc. Penal — ed. 11991 — pág.82). —


Do mesmo modo, – como orienta-nos o Prof. DAMÁSIO E. DE JESUS -, “em sede de Habeas corpus, sob fundamento de divórcio entre a imputação fática e os elementos de convicção, ou, quando a desconformidade for incontroversa, translúcida e evidente” (in Cód de Proc Penal Anotado — 4ª ed. — pág. 401).

No mesmo rumo, é a melhor jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça: –

“Pode-se afirmar que o caso típico de ausência de justa causa é a falta de criminalidade do fato ou fatos imputados ao agente” 9STF-RT 430/459). —

“É possível o seu trancamento, por falta de justa causa, quando os elementos indiciários coligidos no Inquérito não possam ser tipificados em dispositivos da Lei Penal” 9STF — RT 559/4113).-

“Em sede de hábeas corpus, o fundamento da falta da justa causa é acolhível para o trancamento, quando reconhecida de imediato a ausência de tipicidade penal do fato, ou quando a inocência do acusado ressalta evidente e

incontestável nos autos” STF — RHF nº 64.275 — 6 — SP — Rel. Min. Célio Borja — RT 613/421).

“O Hábeas Corpus” permite o exame da prova unitária e convergente, que não deixa alternativa à convicção do julgador, pois, sem esse exame dela, seria impossível o julgamento, por exemplo, da falta que, no entanto, é caso legal de “hábeas corpus” STF — HC nº 59.259-7 1ª Turma — Rel. Min. CLÓVIS RAMALHETE — DJU 26.03.1982 — P.2561 — e Ver. De D.PPenal e Criminologia — vol 32 — pág. 130).

“A fundamentação de inexistência de justa causa, se presta à concessão do remédio heróico quando nem mesmo em tese, o fato constitui” STJ — DJU 30.8.93 — pág 17.305 e 668/334).

“Quando o fato não constitue crime ou quando evidente que o paciente não praticou o delito, é possível o trancamento, por “habes corpus” STJ — JSTJ 171/330).

“Justifica-se a concessão do “writ” requerido sob a alegação de falta de justa causa, se nem mesmo em tese, o fato imputado constitue crime” STJ — JSTJ 33/341). —

“Evidencia a atipicidade de conduta, impede reconhecer a falta de justa causa para a persecução criminal” 9STJ — RSTJ 27/118). —

“O trancamento é viável, desde a verificação de incontroversa prova da atipicidade do fato” 9STJ — JSTJ 48/309).-

Ainda recentemente; constitucional e Processo Penal” — Recurso de Habeas Corpus” — Trancamento de Ação Penal Fatos Atípicos –Exame de prova — 1.0 “hábeas corpus” é o instituto tutelador da liberdade. — No seu exame, o Juiz não pode criar obstáculos tais, que venham a formar letra morta a garantia constitucional. — 2. Recursos conhecido e provido, eis que, evidente a atipicidade dos fatos imputados ao paciente STJ — RHC nº 758 — CE 5ª T. — julg. 17 — 10 — 90 — Rel. Min. Costa Lima DJU 5 — 11 — 90 e RT 662/339) — pode ser reconhecida, na via eleita, quando, de pronto, evidenciar-se a atipicidade do fato, a ausência de indícios a fundamentarem a acusação, ou, ainda, a fundamentação da punibilidade” (STJ — RHC nº 13.312/SP — Rel. Min. GILSON DIPP — DJU 27.08.2001 — pág.357).

“Hábeas Corpus — Ausência de justa causa — Atipicidade da conduta – O trancamento, medida de execução, é cabível nas hipóteses em que se demonstrar, na luz da evidência, “primus sictus oculi” a exclusão da autoria, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade” (STJ — RHC nº 10.690/SP — Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO — DJUU 24.09.2001 — pág.342).

Também nos Tribunais dos Estados: –

“O exame do mérito da acusação só tem lugar quando manifesta a inexistência de crime ou injusta a causa em que se funda o procedimento” TSJP — RT 442/290). —

“A pretendida falta de justa causa para o procedimento só se caracteriza, para justificar seu trancamento quando o fato descrito na denúncia não constitue crime em tese” (TJSP — RJTJSP 41/319). —

“O hábeas corpus é r3emédio idôneo para examinar tese estritamente jurídica (a que determinada ação descrita no procedimento não constitui crime) (Tacrim — Jutacrim 62/38l). —

AÇÃO PENAL – Justa Causa — Apreciação pretendida em “hábeas Corpus” — Admissibilidade em : Ordem concedida — Trancamento do feito” (RRT 644/272). —

HABEAS CORPUS — Trancamento justa causa – Apreciação pretendida em “habeas corpus”, visando o seu trancamento — medida excepcional, somente cabível e admissível, quando verificada, desde logo, a clamorosa atipicidade do fato” (Rel. do Jarbas Mazzoni — TJSP — RT 649/267). –

“Ação Penal — Justa Causa — Exame pretendido em “habeas corpus” — Admissibilidade — (RT 685/318). —

E, aplicável como luva, ao caso concreto: –

“Ação penal — Trancamento por falta de justa causa — Admissibilidade — A alegação de ausência de justa causa, para o prosseguimento do feito, deve ser reconhecida quando, – sem a necessidade de exame aprofundado e valorativo dos fatos, indícios e provas, – restar inequivocamente demonstrada, pela impetração, a atipicidade flagrante do fato” (STJ — RHC nº. 9.770 — SP — Rel. Min. GILSON DIPP — in DJU 11.12.2000 E. rt 789/558). —


Habeas corpus — exame da prova — o exame da prova, – que é inviável em sede de “hábeas corpus” -, é o que exige o cotejo de prova, para calorá-la e dimensiona-la, mas não, aquele que diz respeito à sua interpretação, para aferir-se de seu alcance, quando a prova se apresenta única e incontroversa” (TJRS — HC nº. 7000 — 1349009 — Rel. Dês. LUIS CAARLOS ÁVILA DE CARVALHO LEITE — 21.09.2000 — Boletim IBCCrim — Jurisprudência — nº. 119 Outubro/2002 — pág. 651). —

Por igual sorte, no E. Tribunal Mato-Grossense:

“Admite-se o trancamento, pela via do hábeas corpus, quando à primeira vista pode-se constatar o não envolvimento do réu, ou, ainda, se não constitue crime o fato narrado na denúncia”. — (TMT — RT 536/384). —

“Concede-se a ordem para trancar o procedimento, quando os fatos narrados são atípicos”(TJMT — RT 548/383).

É a hipótese presente, sem qualquer dúvida a respeito. Criminalizar mera irregularidade e culpabilizar revendedor por adicionar produto superior e mais caro ao mais barato é, concretamente, constranger ilegalmente o cidadão, fato autorizador para buscarem os Impetrantes fazer retornar o processo às balizas da razoabilidade mínima.

DA FORMULAÇÃO DOS PEDIDOS

Ante ao exposto, considerando a formulação do writ of mandamus em bases claras, visíveis e prescindíveis de maior aprofundamento probatório, requerem os Impetrantes:

1 — Seja deferida medida liminar de urgência a fim de SUSPENDER PROVISORIAMENTE O INTERROGATÓRIO DO PACIENTE em 26/04/1005, enquanto não for transitado e julgado o mérito do presente remédio heróico, sendo que o primeiro ato jurisdicional objetivamente constrangerá aquele que nenhum crime praticou e, a qualquer tempo, poderá ser remarcado, sem prejuízo para a realização da melhor Justiça;

2 — Frente às fotocópias de todas as peças concernentes ao procedimento, incluindo aí denúncia e decisão interlocutória da lavra do MM Juiz de Direito da 4ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá, indeferindo pedido de revisão do ato de recebimento de denúncia, seja DISPENSADA A COLHEITA DE INFORMAÇÕES DO JUÍZO A QUO e aberta oportunidade para parecer ministerial, tudo em nome da celeridade que o rito sumaríssimo exige;

3 — Seja preliminarmente conhecido e, no mérito, provido o presente habeas corpus, a fim de trancar o procedimento criminal que corre em desfavor do Paciente, por absoluta falta de tipicidade das condutas descritas por aquela promotora de justiça de 1ª instância.

4 — Na hipótese menos favorável ao acusado, ora Paciente, seja excluídos os crimes de falsidade ideológica (totalmente inviáveis pela absoluta atipicidade), e proporcionada assim a suspensão condicional do processo, levando em conta apenas o delito restante.

Termo em que

Pede e Espera Deferimento.

Cuiabá, 04 de Janeiro de 2005.

EDUARDO MAHON

OAB/MT 6363

LUIS VIDAL DA FONSECA

OAB/MT383 (original) MT/ 7727(atual)

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