Audiência via satélite

Advogados repudiam interrogatórios por videoconferência

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7 de janeiro de 2005, 19h25

A lei que autoriza o governo paulista a usar equipamentos de videoconferência para interrogar detentos é o mais recente ponto de polêmica no meio jurídico.

Defendido pelo governo do estado como instrumento eficaz, econômico e seguro de realizar interrogatórios e audiências com presos que estão encarcerados em cidades distantes da capital, o uso da videoconferência para essa finalidade ganhou o repúdio dos advogados de São Paulo.

Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo, Luiz Flávio Borges D’Urso, a medida é ilegal. “Somos contra. Se a dificuldade é a escolta e os perigos que ela oferece, podemos mudar isso fazendo com que o juiz vá até a unidade prisional para interrogar o detento”, sugere.

D’Urso, no entanto, diz acreditar que o diálogo com o governador Geraldo Alckmin levará a uma solução pacífica para o tema. “Estamos conversando com o secretário de Segurança Pública [Saulo de Castro Abreu Filho], já falamos com o secretário Nagashi Furukawa [Administração Penitenciária] e a posição tem sido de diálogo. Mas não descartamos buscar medidas judiciais, caso seja necessário”, afirma o presidente da OAB paulista. “Temos esperança de que prevaleça o bom senso e a própria lei”, completa.

O presidente da OAB de São Paulo defende o uso da tecnologia a serviço da Justiça. Mas sugere que o uso de equipamentos de videoconferência só aconteça no caso de colher o depoimento de testemunhas de antecedentes. “Quando vai se interrogar uma testemunha que só vai confirmar se conhece ou não o réu e falar sobre o comportamento dele, a videoconferência não traz prejuízos. Mas no caso do réu, o interrogatório é o único momento em que ele fica de frente para o juiz. A lei estabelece a necessidade da presença física”, ressalta.

A proposta é repelida também pelo advogado criminalista José Luís de Oliveira Lima. “Acho que é um absurdo. Imagine que o detento tenha sofrido algum problema de maus tratos. Como ele vai relatar isso à autoridade judicial e depois voltar ao cárcere estando distante do juiz?”, questiona.

Para ele, o advogado também fica impossibilitado de exercer plenamente seu trabalho, à medida em que pode não ter condições de estar junto do réu no instante do interrogatório à distância. “Isso fere o direito à ampla defesa”, comenta.

O advogado é duro quanto à adoção do modelo, que não é utilizado em nenhuma outra parte do país. “Preso não é cobaia para participar de experiências. É um ser humano”.

De acordo com a lei assinada pelo governador Geraldo Alckmin e publicada no Diário Oficial do Estado desta quinta-feira (6/1), o Executivo estadual tem 90 dias para regulamentar a lei, de autoria do deputado Edson Gomes (PFL).

O início

Indiferente às críticas, o governo de São Paulo prepara a estrutura operacional para viabilizar a realização das audiências à distância com os presos. De acordo com uma nota distribuída à imprensa pela Secretaria de Administração Penitenciária do estado, serão instalados, inicialmente, 12 equipamentos de videoconferência: seis no Fórum Criminal da Barra Funda, cinco em Centros de Detenção Provisória na Capital e Grande São Paulo e um no Centro de Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes.

A primeira etapa para a instalação do sistema já foi cumprida com a contratação da Prodesp (Empresa de Processamento de Dados do Estado de São Paulo) para a integração dos serviços. Agora o governo deve contratar, por meio de pregão, uma empresa que implantará os equipamentos e fornecerá o serviço. Até março deste ano o sistema já deverá estar funcionando.

Para a secretaria de Administração Penitenciária, o uso da videoconferência nos interrogatórios evitará os riscos de fugas e resgates durante a escolta de presos e ainda ajudará a dar maior agilidade aos processos.

Leia a íntegra da lei

LEI Nº 11.819, DE 5 DE JANEIRO DE 2005

(Projeto de lei nº 704/2001, do deputado Edson Gomes)

Dispõe sobre a implantação de aparelhos de videoconferência para interrogatório e audiências de presos à distância

O GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO:

Faço saber que a Assembléia Legislativa decreta e eu promulgo a seguinte lei:

Art. 1º. Nos procedimentos judiciais destinados ao interrogatório e à audiência de presos, poderão ser utilizados aparelhos de videoconferência, com o objetivo de tornar mais célere o trâmite processual, observadas as garantias constitucionais.

Art. 2º. O Poder Executivo regulamentará esta lei no prazo de 90 (noventa) dias, contados a partir da sua publicação.

Art. 3º. As despesas decorrentes da execução desta lei correrão à conta das dotações orçamentárias próprias, suplementadas se necessário.

Art. 4º. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Palácio dos Bandeirantes, 5 de janeiro de 2005

GERALDO ALCKMIN

Nagashi Furukawa

Secretário da Administração Penitenciária

Arnaldo Madeira

Secretário-Chefe da Casa Civil

(Publicada na Assessoria Técnico-Legislativa, aos 5 de janeiro de 2005.)

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