Moralidade pública

Excessos cometidos pelo MP devem ser punidos penalmente

Autor

  • Ericson Meister Scorsim

    é advogado doutor em Direito pela USP autor do livro “Televisão Digital e Comunicação Social: aspectos regulatórios” e mantém o site www.tvdigital.adv.br

16 de fevereiro de 2005, 18h21

A Constituição brasileira de 1988 representa uma resposta para o passado arbitrário da administração pública, mas ao mesmo tempo uma proposta para o futuro da sociedade brasileira no sentido de correção das desigualdades sociais, de promoção dos direitos fundamentais e de consolidação da democracia. É a Constituição que contém as principais instituições republicanas brasileiras, e cuja força normativa depende da cultura jurídica presente no povo brasileiro.

Nesse contexto, foi catalogado o princípio da moralidade administrativa que vincula a atuação da administração pública. Ora, o administrador público deve exercer suas funções com base no interesse público e não com base em seus interesses particulares e sua vontade. Trata-se de um postulado da República brasileira que vincula os agentes públicos que desempenham funções administrativas, jurisdicionais e legislativas. Em defesa da moralidade administrativa, a Constituição previu que os atos de improbidade administrativa importarão em suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade dos bens e ressarcimento ao erário, conforme lei.

No plano infraconstitucional, a Lei nº 8.429/92 veio a disciplinar a ação judicial destinada ao combate dos atos de improbidade administrativa, praticados por agentes públicos ou por particulares, que importam em enriquecimento ilícito, causam prejuízo ao erário ou atentam contra os princípios da Administração Pública. E a aplicação da referida lei, por intermédio do Ministério Público, contribuiu — e muito — para a democracia brasileira. Com efeito, o controle efetuado pelo do Ministério Público dos atos praticados pela administração pública veio a sedimentar ainda mais a noção republicana em nossa jovem democracia.

Entretanto, a atuação isolada de alguns membros do Ministério Público representa um retrocesso em nossa histórica republicana, em particular quando acionam a mídia para exibir as suas ações, vindo a massacrar os direitos à honra, à imagem e ao bom nome (cite-se os casos Alceni Guerra, Ibsen Pinheiro, Escola Base de São Paulo, entre outros). De fato, sabe-se do ajuizamento de temerárias ações civis públicas contra os supostos atos de improbidade administrativa, despidas de indícios ou provas. Ocorre que essas ações temerárias são censuradas pela referida lei ao prever que a autoridade judicial deve extinguir o processo em sendo detectada a inadequação da ação de improbidade.

É que o legislador sabiamente identificou que nem todos os atos ilegais configuram improbidade administrativa. Uma ação de improbidade administrativa somente é adequada se for necessária e proporcional à defesa do interesse público. As ações temerárias são aquelas desnecessárias e desproporcionais à tutela do interesse público. Em alguns casos, a ação configura-se como uma medida necessária, entretanto, excessiva em face do interesse público, ou seja, a sua propositura pode causar mais danos que efetivamente proteger o interesse público.

Os excessos cometidos no ajuizamento dessas ações ensejam a responsabilidade civil, administrativa e penal, pois, como ensina Geraldo Ataliba: “Regime republicano é regime de responsabilidade. Os agentes públicos respondem pelos seus atos”. E, ainda conforme o mesmo autor, “as instituições republicanas foram engendradas para evitar abusos, para banir o despotismo e preservar o bem comum contra os arbítrios do homem. As instituições republicanas realizam de forma excelente o postulado impessoal do rule of law, o governo das leis, e não dos homens”. Enfim, o princípio republicano também rege a conduta dos membros do Ministério Público.

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