Condenação trabalhista

Chamar empregados de burros e animais gera condenação por danos

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7 de fevereiro de 2005, 11h08

O trabalhador é sujeito e não objeto da relação contratual. Ele tem direito de preservar sua integridade física, intelectual e moral. Se a empresa submeter o empregado a tratamento injurioso e degradante, deve arcar com reparação por dano moral.

Assim entenderam os juízes da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo) no julgamento de um Recurso Ordinário. Com a decisão, a empresa Trans Expo Transportes foi condenada a pagar R$ 5.350 a um ex-empregado. De acordo com os autos, os empregados eram chamados publicamente de “burros” e “animais”, entre outras ofensas.

A empresa recorreu ao TRT-SP contra sentença da 5ª Vara do Trabalho de São Bernardo do Campo (SP), que condenou a Trans Expo, além de determinar o pagamento de outras verbas trabalhistas devidas. O ex-empregado, representado pela advogada Eliana Covizzi, alegou que o encarregado de empresa submetia seus subordinados a tratamento “injurioso e degradante”.

Ainda de acordo com a ação, os empregados eram transportados “como gado”, oito a dez trabalhadores, no espaço exíguo de um veículo de carga de pequeno porte, com capacidade máxima para cinco pessoas. Em seu recurso, a Trans Expo negou todas as afirmações do ex-empregado. Sustentou que sequer houve prova irrefutável de conduta ilícita do encarregado.

De acordo com o juiz Ricardo Artur Costa e Trigueiros, relator designado do Recurso Ordinário, as relações de trabalho devem pautar-se pelo respeito mútuo.

“O empregador além da obrigação de dar trabalho e de possibilitar ao empregado a execução normal da prestação de serviços, deve ainda, respeitar a honra, a reputação, a liberdade, a dignidade, e integridade física e moral de seu empregado, porquanto tratam-se de valores que compõem o patrimônio ideal da pessoa, assim conceituado o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico”, registrou a decisão.

Para o juiz Trigueiros, “o caráter continuado da tirania exercida pela empresa através de seu preposto, ainda que não configure o assédio moral, — porquanto ausentes o cerco e a discriminação vez que a prática atingia indistintamente todos os subordinados, caracteriza a gestão por injúria”.

O relator do recurso acrescentou que “alguns administradores manejam melhor o chicote que a carroça, submetendo o ambiente de trabalho ao império do medo”.

“Tendo ficado caracterizadas as humilhações e os maus tratos praticados por superior hierárquico, há que responder o empregador pela obrigação de indenizar os danos morais resultantes”, concluiu Trigueiros.

Por maioria de votos, a 4ª Turma acompanhou o voto do relator e condenou a Trans Expo ao pagamento de indenização de R$ 5.350 ao ex-empregado pelos danos morais sofridos.

RO 01925.2002.465.02.00-5

Leia a íntegra do voto do relator:

4ª TURMA

PROCESSO TRT/SP Nº 01925200246502005 (20030528083)

RECURSO: ORDINÁRIO

RECORRENTE: TRANS EXPO TRANSPORTES LTDA.

RECORRIDO: WALMIR FELIPE DOS SANTOS

ORIGEM: 05ª VT DE SÃO BERNARDO DO CAMPO

EMENTA: DANO MORAL. TRATAMENTO DEGRADANTE. DIREITO À INDENIZAÇÃO. Ainda que não configure assédio moral, porquanto ausentes o cerco e a discriminação, o caráter continuado das agressões praticadas pela empresa, através de preposto, caracteriza a gestão por injúria, que também importa indenização por dano moral. O fato de o tratamento despótico ser impor maior ritmo de trabalho e quebrar a capacidade de mobilizaçãodirigido a todos os empregados, sem qualquer distinção, não legitima a tirania patronal, incompatível com a dignidade da pessoa humana, com a valorização do trabalho e a função social da propriedade, asseguradas pela Constituição Federal (art. 1º, III e IV, art.5º, XIII, art. 170, caput e III).

O trabalhador é sujeito e não objeto da relação contratual, e tem direito a preservar sua integridade física, intelectual e moral, em face do poder diretivo do empregador. A subordinação no contrato de trabalho não compreende portanto, a pessoa do empregado, mas tão-somente a sua atividade laborativa, esta sim submetida de forma limitada e sob ressalvas, ao jus variandi. Comprovado que o encarregado submetia o reclamante e seus colegas a tratamento injurioso e degradante, chamando-os publicamente de “burros”, “animais”, dirigindo-lhes gestos agressivos, peitando-os, ameaçando-os fisicamente e trasladando-os de forma cruel para os locais de trabalho, comprimidos como gado no espaço exíguo de um veículo de carga de pequeno porte, resta configurado gravíssimo atentado à dignidade dos trabalhadores, ensejador da indenização por dano moral (art. 5º V e X, CF; 186 e 927 do NCC).

VOTO DIVERGENTE

Adoto o relatório do voto da Ilustre Relatora originária, nos seguintes termos:

“Recurso Ordinário da reclamada às fls. 145/159, em face da r. sentença de fls. 137/141, cujo relatório adoto e que julgou PROCEDENTE EM PARTE a presente reclamação trabalhista, asseverando que não houve elementos probatórios tendentes a corroborar a tese exordial de que o reclamante tenha iniciado seu labor na época anterior ao registro, requerendo o não reconhecimento do liame empregatício nesse período. Sustenta, ainda, que a ruptura contratual operou-se por justa causa em face da configuração do abandono de emprego, acrescentando que, caso não seja acolhida a mencionada tese, o fato da empresa não ter depositado o FGTS nos primeiros dias da relação de emprego e o irregular pagamento das horas extras não dão azo a rescisão indireta do contrato de trabalho, requerendo o reconhecimento da dispensa imotivada e a exclusão da multa pelo atraso no adimplemento das verbas rescisórias.


Entende também que o reclamante não faz jus ao pagamento das horas extras e seus reflexos, em face da existência de acordo de compensação, no qual a jornada diária era acumulada e posteriormente transformada em folgas compensatórias. Caso seja mantida essa condenação, pretende seja arbitrada a quantidade de horas suplementares, considerando-se os eventos/feiras nos quais o autor efetivamente se ativou. Requer a exclusão da condenação no pagamento da indenização por danos morais, haja vista que sequer houve prova irrefutável da conduta ilícita do ofensor do reclamante, ou seja, do representante legal da reclamada. Por corolário, alegou que houve afronta ao disposto no artigo 460 do CPC, tendo em vista que o MM. Juízo de primeiro grau condenou a reclamada no adimplemento da multa pelo descumprimento da norma coletiva da categoria profissional a que pertence o reclamante, sem que tenha havido pedido expresso no particular e sem examinar a questão da indenização por ele postulada no importe de R$ 90,00 decorrente da omissão da empresa em incluí-lo no convênio médico concedido pela cláusula 46ª da convenção coletiva.

Depósito recursal às fls.160/161 e custas processuais às fls. 162.

Contra-razões do reclamante às fls. 165/169.

A D. Procuradoria do Trabalho opina às fls.170 pela desnecessidade da emissão de parecer circunstanciado.

É o RELATÓRIO.”

V O T O

Acompanho o entendimento da ilustre Relatora originária, quanto ao cabimento do apelo e nos tópicos abaixo transcritos, que passam a integrar o presente:

Conheço, eis que presentes os pressupostos legais de admissibilidade.

MÉRITO

RECONHECIMENTO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO DO PERÍODO ANTERIOR AO REGISTRO

A recorrente pretende seja afastado o reconhecimento do liame empregatício do período anterior ao registro na CTPS do autor, haja vista a inexistência de prova robusta quanto ao labor nesse interregno. Na inicial, o reclamante afirmou que iniciou seu labor para a reclamada em 11/03/02, na função de operador de empilhadeira (fls.03- último parágrafo).

A própria reclamada, na defesa, alegou que o reclamante prestou-lhe serviços esporádicos, no período de 11/03/02 a 30/06/02, invertendo o onus probandi, a teor do disposto no artigo 818 da CLT combinado com o inciso II do artigo 333 do CPC, encargo do qual não se desvencilhou a contento, pois o documento de fls.16, não impugnado, revela que o reclamante realizou o exame admissional em 31/05/02 e o depoimento de suas testemunhas são insuficientes para provar a eventualidade da prestação de serviços no mencionado período.

Por tais razões, impõe-se a manutenção da r. sentença de primeiro grau, no particular.

RUPTURA CONTRATUAL – JUSTA CAUSA – RESCISÃO INDIRETA

A reclamada pretende seja reconhecida a justa causa por abandono de emprego, requerendo seja afastada a rescisão indireta do contrato de trabalho, em virtude dos motivos ensejadores (falta de depósito do FGTS do período inicial do pacto laboral e o adimplemento irregular das horas extras trabalhadas) serem insuficientes para a configuração da justa causa do empregador, sustentando que a ruptura contratual operou-se de forma imotivada.

Não merece acolhida o inconformismo. Para a caracterização do abandono de emprego é necessário que haja faltas ao serviço durante certo período (elemento objetivo), além de se verificar a clara intenção do empregado de não mais retornar ao serviço (elemento subjetivo).

O fato do empregado não atender a comunicação postal enviada pelo empregador solicitando seu retorno ao serviço, sob pena de caracterização da justa-causa, não revela o ânimo do obreiro em abandonar o emprego, pois é certo que ingressou com a presente reclamatória, tendo postulado rescisão indireta do contrato de trabalho e, também, compareceu ao Núcleo Intersindical de Conciliação Prévia, como comprova o documento carreado às fls. 41 dos autos.

Assim, como bem fundamentou o MM. Juízo de primeiro grau, a recorrente não conseguiu comprovar o propalado abandono de emprego.

Nesse sentido, por qualquer ângulo que se examine a questão e ante a ausência dos elementos configuradores, não há como se reconhecer a justa causa em tela.

Também não há como agasalhar o pretendido reconhecimento da rescisão imotivada, porque as três testemunhas do reclamante foram unânimes em asseverar que o Sr. Rui, sócio da reclamada, tratava com rigor excessivo seus funcionários, dentre os quais se inclui o reclamante, pressionando-os e humilhando-os no desempenho de suas funções (v. fls. 134/136) e configurando a rescisão indireta do contrato de trabalho, preconizada pela alínea “e” do artigo 483 da CLT.

Além disso, somente a primeira testemunha da reclamada afirmou, no seu depoimento, às fls. 133, ter o reclamante reagido de força agressiva e ameaçadora ao seu empregador no ato da ruptura contratual (dia 12/08/02), razão pela qual torna-se insustentável a tese da defesa, sobretudo porque a citada testemunha não trabalhava no mesmo local do autor, uma vez que desempenha suas atividades no escritório da empresa.


Ante tais fundamentos, impõe-se a manutenção do r. julgado de primeira instância, inclusive com relação ao adimplemento da multa prevista no artigo 477 da CLT.

HORAS EXTRAS, ADICIONAL NOTURNO E SEUS REFLEXOS

Entende a recorrente ser indevida sua condenação no adimplemento das horas suplementares e seus reflexos, alegando haver acordo de compensação de horas, no qual a jornada diária era acumulada e posteriormente transformada em folgas compensatórias.

Razão assiste à recorrente. Na inicial, o reclamante afirmou ter laborado, em março de 2002, das 6h às 20h, durante 17 dias e das 6h às 23h, por três dias, tendo folgado nos dias 18 e 19 (2ª e 3ª feira); em abril, das 6h às 19h, em média, com folga nos dias 02 a 04 ( 3ª a 5ª feira); em maio, das 5h30 às 20h, em média, tendo folgado nos dias 06 e 07 (2ª e 3ª feira), 30 e 31 (5ª e 6ª feira); em junho, das 5h30 às 21h, até o dia 20, sendo que no dia 21(6ªfeira), laborou das 17h até 21h30 do dia seguinte (sábado) e do dia 23 a 28, laborou das 5h30 às 18h; em julho, das 8h às 18h, em média, sendo que no dia 30 iniciou seu serviço às 5h30 e saiu às 21h e no dia 31, das 5h30 às 18h do dia seguinte; em agosto, das 8h às 18h nos dias 07 a 09 e das 5h30 às 22h30 no dia 03, com folga nos dias 04 a 06 (domingo, 2ª e 3ª feira), tendo usufruído sempre do intervalo de quinze minutos para refeição e descanso (v.fls. 04/05).

A reclamada, na defesa, alegou que o reclamante cumpria a seguinte jornada de trabalho: das 8h às 18h, de segunda quinta-feira e das 8h às 17h, de segunda a quinta-feira, sempre com intervalo de uma hora intrajornada, em razão do acordo de prorrogação e compensação de horas assinado pelas partes e da cláusula 8ª da Convenção Coletiva (fls.55).

As testemunhas das partes foram categóricas ao afirmarem que a jornada laboral se estendia após às 20h nos dias em que havia feiras ou eventos, que se realizavam, em média, duas vezes por mês, quando usufruíam de folgas compensatórias, sendo que nos demais dias o horário contratual era observado, exceto com relação ao intervalo intrajornada, que era usufruído no próprio local de serviço, sempre em tempo inferior a uma hora.

Quanto ao intervalo intrajornada, também prospera seu inconformismo, haja vista que as três testemunhas da reclamada foram unânimes em afirmar, no depoimento, que o horário de uma hora para refeição era usufruído pelos funcionários da empresa, inclusive nas ferias e eventos (fls. 133/134).

Ressalto que o depoimento das testemunhas do reclamante, ante sua contrariedade, não se presta para elidir a oitiva das testemunhas da reclamada, já que a primeira asseverou que não gozavam do intervalo de uma hora para refeição ( v.fls. 134 – in fine); a segunda afirmou que gastavam um tempo mínimo para refeição, nas feiras e usufruíam do intervalo, fora dos eventos (v.fls.135) e a terceira disse que, nas feiras, almoçavam e voltavam a trabalhar e, fora dos eventos, às vezes tinham intervalo para refeição (v.fls.135- in fine).

Há acordo de compensação de horas coligido às fls. 79, devidamente assinado pelas partes e não infirmado por prova em contrário, e banco de horas às fls.113 (v. cláusula 8ª do instrumento normativo), de forma que o reclamante provou que se ativou em jornada suplementar somente nos dias em que houve feiras ou eventos, as quais eram compensadas com dias de folga, conforme o próprio reclamante afirmou na inicial (fls.04/05), sendo indevido pagamento das horas suplementares, adicional noturno e seus reflexos.

Ainda, cabe argumentar que o autor, na inicial, consignou sua jornada laboral (fls.04 e 05), não ratificada em depoimento pessoal (v.fls. 132), em total contradição à narrativa inicial, concretizando o seu descrédito em prol da resistência apresentada na tese defensória.

Dessa forma, reformo a r. sentença de primeiro grau para excluir da condenação as horas extras, o adicional noturno e seus respectivos reflexos.

DANO MORAL

A recorrente pretende a exclusão da condenação no pagamento da indenização por danos morais, haja vista que sequer houve prova irrefutável da conduta ilícita do ofensor do reclamante, ou seja, do representante legal da reclamada.

Neste tópico divirjo da ilustre Relatora originária.

As relações de trabalho devem pautar-se pela respeitabilidade mútua, face ao caráter sinalagmático da contratação, impondo aos contratantes reciprocidade de direitos e obrigações. Assim, o empregador além da obrigação de dar trabalho e de possibilitar ao empregado a execução normal da prestação de serviços, deve ainda, respeitar a honra, a reputação, a liberdade, a dignidade, e integridade física e moral de seu empregado, porquanto tratam-se de valores que compõem o patrimônio ideal da pessoa, assim conceituado o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico.


Tais valores foram objeto de preocupação do legislador constituinte de 1.988 que lhes deu status de princípio constitucional, assegurando o direito à indenização pelo dano material e moral decorrente de sua violação (CF, art.5º,V e X).

Portanto, sempre que o trabalhador, em razão do contrato de trabalho, por ação ou omissão do empregador ou de seus prepostos, sofrer lesão à sua honra, ofensa que lhe cause um mal ou dor (sentimental ou física) causando-lhe abalo na personalidade, terá o direito de exigir reparação por danos morais e materiais decorrentes.

Nesse sentido dispõem os artigos 186 e 927 do Código Civil de 2002 (correspondente ao artigo 159 do Código Civil de 1916).

In casu, o autor demonstrou as alegadas humilhações, na medida em que comprovou com suas testemunhas as atitudes desrespeitosas de seu superior hierárquico, que o submetia bem como a seus colegas, a tratamento injurioso e degradante, chamando-os publicamente de “burros”, “animais” e outras ofensas verbais, além de dirigir-lhes gestos agressivos, peitá-los e ameaçá-los fisicamente. Ademais, trasladava-os de forma cruel para os locais de trabalho, comprimindo como gado, oito a dez trabalhadores, no espaço exíguo de uma FIORINO, conhecido veículo de carga de pequeno porte, com capacidade máxima para cinco pessoas.

É o que se extrai da prova oral coligida.

Vejamos: – a Primeira testemunha do autor – Sr. Eduardo – declarou que “(..)o Sr. Rui tratava todos os empregados de forma agressiva, chamando-os de burros, irresponsáveis(..)”. A Segunda testemunha, Sr. Vicente – confirmou que “(..) o Sr. Rui tratava os empregados de forma desrespeitosa, chamando-os de burros, animais, entre outras ofensas; eram carregadas em 8 ou 10 pessoas dentro da *mesma fiorino para montagens; o Sr. Rui também peitava os funcionários, agindo de forma agressiva e ameaçava-os fisicamente(..) não era necessário que o empregado desse causa para ser destratado pelo Sr. Rui.(..)”. Terceira testemunha , Sr. João, “(..) era comum o tratamento desrespeitoso do Sr. Rui para com os empregados, tanto no vocabulário, quanto nos gestos; costumava peitar os funcionários, embora não tenha agredido ninguém fisicamente; o tratamento mencionado era feito publicamente; eram transportados para as feiras, de Fiorino, cerca de 10 empregados; (..)”.

O caráter continuado da tirania exercida pela empresa através de seu preposto, ainda que não configure o assédio moral, – porquanto ausentes o cerco e a discriminação vez que a prática atingia indistintamente todos os subordinados, caracteriza a gestão por injúria, a que alude MARIE-FRANCE HIRIGOYEN (in “Mal-Estar no Trabalho – Redefinindo o Assédio Moral”, Bertrand Brasil, pág. 28):

“Denominamos gestão por injúria o tipo de comportamento despótico de certos administradores, despreparados, que submetem os empregados a uma pressão terrível ou os tratam com violência, injuriando-os ou insultando-os, com total falta de respeito. (…) Quer tais dirigentes estejam ou não conscientes da brutalidade de suas ofensas, seu comportamento é indigno e inadmissível. Só uma ação coletiva pode dar fim a ele. Uma reação conjunta, o quanto antes, por parte dos trabalhadores para denunciar tais práticas escravagistas.”

Com efeito, alguns administradores manejam melhor o chicote que a carroça, submetendo o ambiente de trabalho ao império do medo. Nesse sentido retomamos as oportunas reflexões da psiquiatra francesa (M-F Hirigoyen, op. cit. pág. 43):

“Com o fantasma do desemprego, que persiste apesar da retomada do crescimento econômico, e o aumento das pressões psicológicas relacionadas aos novos métodos de gestão, o medo se tornou um componente determinante no trabalho. Fica escondido no fundo da mente de um sem número de empregados, mesmo que não ousem tocar nesse assunto”.

O tratamento injurioso e cruel, em muitos casos, corresponde a uma lógica perversa de gestão voltada para os interesses da produção e do mercado. Acreditam algumas empresas que agindo dessa forma conseguirão eliminar indesejadas resistências, quebrar a capacidade de organização e de luta dos trabalhadores, submetendo-os a um ritmo de atividade desejado, com vistas a propiciar elevação dos níveis de competitividade e lucratividade. O fato de o tratamento despótico ser impor maior ritmo de trabalho e quebrar a capacidade de mobilizaçãodirigido a todos os empregados de uma mesma empresa, sem qualquer distinção, não legitima a tirania patronal, incompatível com a dignidade da pessoa do trabalhador, com a valorização do trabalho humano e a função social da propriedade, asseguradas pela Constituição Federal (art. 1º, III e IV, art.5º, XIII, art. 170, caput e III).

Com efeito, o trabalhador é sujeito e não objeto da relação contratual, e tem direito a preservar sua integridade física, intelectual e moral, em face do poder diretivo do empregador. A subordinação no contrato de trabalho não compreende portanto, a pessoa do empregado, mas tão-somente a sua atividade laborativa, esta sim submetida de forma limitada e sob ressalvas, ao jus variandi.

Nesse sentido é a melhor jurisprudência, in verbis:

“DANOS MORAIS. CABIMENTO. O poder potestativo do empregador não o autoriza agir com tratamento desumano, sujeitando o empregado a humilhações, vexames e violências verbais ou físicas. Tais atitudes cedem lugar a indenização por dano moral.”TRIBUNAL: 19ª Região, DECISÃO: 12 02 2004, TIPO: RO NUM: 00696-2003-003-19-00-0 ANO: 2003, REGIÃO: 3ª VARA DO TRABALHO DE MACEIÓ – ALNÚMERO ÚNICO PROC: RO – 00696-2003-003-19-00-0, RECURSO ORDINÁRIO, TURMA: TP – TRIBUNAL PLENO, DOE/AL DATA:23-02-2004, PARTES:RECORRENTE (S): EMANUEL BARROS DOS SANTOS (MACEIÓ MÓVEIS); RECORRIDO (S): HERMANN DE BRITO PRADO, RELATOR JUIZ PEDRO INÁCIO, REVISOR JUIZ REVISOR ANTÔNIO CATÃO.

Ex positis, tendo ficado caracterizadas as humilhações e os maus tratos praticados por superior hierárquico, há que responder o empregador pela obrigação de indenizar os danos morais resultantes, nos termos da r. decisão de origem que ora se prestigia.

Mantenho.

CONVÉNIO MÉDICO – MULTA NORMATIVA- JULGAMENTO EXTRA PETITA

A reclamada alegou que houve afronta ao disposto no artigo 460 do CPC, tendo em vista que o MM. Juízo de primeiro grau condenou-a no adimplemento da multa pelo descumprimento da norma coletiva da categoria profissional a que pertence o reclamante, sem que tenha havido pedido expresso no particular e sem examinar a questão da indenização por ele postulada no importe de R$ 90,00 decorrente da omissão da empresa em incluí-lo no convênio médico concedido pela cláusula 46ª da convenção coletiva.

Primeiramente, cumpre esclarecer que não se trata in casu de julgamento extra petita, eis que a ausência de causa de pedir importa em irregularidade processual.

De fato, o item VII da r. sentença de primeiro grau, às fls. 140, violou o disposto no artigo 460 do CPC.

O recorrido, na exordial, postulou o pagamento da importância de R$ 15,00 por mês, quantia esta que incumbia à reclamada arcar caso o valor do convênio médico fosse superior, durante todo o contrato de trabalho, com fulcro na cláusula 46ª da norma convenção coletiva coligida aos autos, nada mencionando a respeito da multa convencional (v.fls.11 – alínea “f” e fls. 12), sendo que a condenação da reclamada no adimplemento da mencionada multa representa ofensa aos limites da litiscontestatio.

Assim, ausente a causa petendi, impõe reformar a r. sentença recorrida no particular para excluir da condenação o pagamento da multa normativa.

DO EXPOSTO, conheço do recurso ordinário interposto e, no mérito, DOU PROVIMENTO PARCIAL ao apelo para excluir da condenação a) horas extras, adicional noturno e seus respectivos reflexos; b) multa normativa, nos termos da fundamentação supra, mantendo, no mais, a r. sentença recorrida.

RICARDO ARTUR COSTA E TRIGUEIROS

Relator Designado

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