Tempo remunerado

Motorista particular tem direito a horas extras, decide Justiça.

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5 de fevereiro de 2005, 8h20

Motorista particular tem direito a horas extras. A decisão é da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (Brasília). A Turma concedeu horas extras a um motorista que prestava serviços para uma família. Cabe recurso.

O relator do processo, juiz Antonio Umberto de Souza Júnior, considerou que as partes podem acordar tudo o que não é vedado em lei (artigo 104, inciso II, do Código Civil), tendo a obrigação de cumprir. As informações são do site Espaço Vital.

O contrato de trabalho do motorista estabelecia jornada de 44 horas semanais. O empregador alegou que o horário estabelecido no contrato deveria ser observado durante o período de experiência. Para o juiz, as condições prorrogadas por prazo indeterminado na relação de emprego perduraram por tempo superior ao estabelecido pelas partes.

Processo nº 00793-2004-016-10-00-0-ROPS

Leia o acórdão

TIPO ROPS – RECURSO ORDINÁRIO RITO SUMARÍSSIMO

AUTUAÇÃO 18/11/2004

DISTRIBUIÇÃO 19/11/2004

JUIZ RELATOR ANTONIO UMBERTO DE SOUZA JÚNIOR

PROC. ORIGEM 00793-2004-016-10-00-0 BRASÍLIA/DF

RECORRENTE MARÇAL DE ASSIS BRASIL NETO

RECORRIDO ANTÔNIO CARDOSO DOS SANTOS

Processo 00793-2004-016-10-00-0 – ROPS

Voto do Juiz ANTONIO UMBERTO DE SOUZA JÚNIOR

E M E N T A

EMPREGADO DOMÉSTICO. HORAS EXTRAS. LIMITE DE JORNADA EXPRESSAMENTE CONTRATADO. DEFERIMENTO. O art. 7º, parágrafo único, da Carta Magna elenca os direitos sociais dos trabalhadores urbanos e rurais extensivos aos empregados domésticos, não estando dentre eles a limitação da jornada semanal de trabalho. Contudo, podendo as partes avençar tudo aquilo que não é vedado em lei (Cód. Civil/1916, art. 82; Cód. Civil/2002, art. 104, II) e tendo em vista a obrigação de observar-se que o avençado pelas partes deve ser cumprido – pacta sunt servanda – não há como negar-se ao autor a pretensão de recebimento de horas extras porque estabelecido, em contrato celebrado livremente entre ele e o reclamado, o horário de trabalho que deveria ser cumprido. CONFISSÃO. INTERPRETAÇÃO RESTRITA. Não correspondendo a confissão judicial real, via de regra, à integra do interrogatório, os termos da declaração da parte confitente devem ser tomados sem alargamento de sentido ou alcance. Recurso conhecido e parcialmente provido.

R E L A T Ó R I O

A Exma. Juíza Substituta Solange Barbuscia de Cerqueira Godoy, em exercício na MM. 16ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, julgou procedentes em parte os pedidos elencados na exordial, para condenar o reclamado ao pagamento de quatro horas extras semanais, no período de fevereiro/2004 a junho/2004, observado o salário de R$300,00, o divisor 220 e o adicional de 50% decorrente da jornada pactuada (fls. 105/109). Embargos declaratórios (fls. 110/112), desprovidos (fls. 113/114). Recorre o reclamado, insurgindo-se quanto à sua condenação ao pagamento de horas extras, posto ser empregador doméstico (fls. 116/122). Contra-razões apresentadas (fls. 127/129). Dispensada a remessa ao Ministério Público do Trabalho (art. 102, do RI). É o relatório.

V O T O

ADMISSIBILIDADE Recurso ordinário e contra-razões tempestivos e regulares: conheço-os. MÉRITO EMPREGADO DOMÉSTICO. HORAS EXTRAS. Aponta a inicial que o reclamante foi contratado para exercer a função de motorista, com jornada de trabalho especial, qual seja, de 44 horas semanais e fruição de intervalo de 1h30m para refeição e descanso.

Em contestação o reclamado asseverou que, em sendo a profissão de motorista considerada doméstico, não está garantido ao empregado o direito à percepção de horas extras e repouso para refeição e descanso. A r. sentença, apesar de reconhecer que o art. 7º, parágrafo único, da Constituição Federal, não estendeu ao empregado doméstico a limitação de jornada prevista no inciso XIII do mesmo dispositivo, pontuou que, no caso dos autos, as partes celebraram contrato de emprego pelo qual foi limitada a jornada de trabalho a 44 horas semanais, assim como a fruição de intervalo de 1h30m para refeição e descanso. Insurge-se o recorrente quanto à sua condenação ao pagamento de horas extras por ser empregador doméstico e por entender que o horário estipulado no contrato de trabalho deveria ser obedecido apenas no prazo de vigência do contrato de experiência.

Caso mantida a condenação em horas extras, pretende que sejam excluídas as referentes ao mês de fevereiro/2004, posto que a sobrejornada decorreu da necessidade do obreiro, duas vezes por semana, levar o filho do recorrente à Universidade de Brasília e por ter o semestre letivo daquela instituição iniciado em 15.3.2004. Apesar de restar assente na Constituição, na legislação vigente, na doutrina, assim como na jurisprudência que o empregado doméstico não faz jus ao recebimento de horas extras, o caso sub judice deve ser analisado mais acuradamente, face às suas peculiaridades. Através do “Contrato de Experiência” firmado pelas partes, datado de 28.8.2001, perante duas testemunhas, restou assim acordado:

“5. A jornada de trabalho do EMPREGADO será de até 44 (quarenta e quatro) horas semanais, de segunda-feira ao sábado, com descanso semanal remunerado aos domingos, podendo compensar possíveis e eventuais sobrejornadas no curso da própria semana, com intervalo de 1:30 horas para refeição e descanso e observando a escala de honorários anexa.”O art. 7º, parágrafo único, da Carta Magna não elencou dentre os direitos dos trabalhadores domésticos a limitação da jornada semanal de trabalho. Contudo, podendo as partes avençar tudo aquilo que não é vedado em lei (Cód. Civil, art. 82; Cód. Civil/2002, art. 104, II) e tendo em vista a obrigação de observar-se que o avençado pelas partes deve ser cumprido – pacta sunt servanda – não há como negar-se ao autor a pretensão de recebimento de horas extras porque estabelecido, em contrato celebrado livremente entre ele e o reclamado, o horário de trabalho que deveria ser cumprido.

Também não prospera a alegação recursal de que o horário estabelecido no contrato em comento deveria ser observado somente quanto ao prazo do contrato de experiência porque não foi isso que restou consignado no referido instrumento, além do que perdurou a relação por prazo superior ao estabelecido pelas partes, restando prorrogadas as condições originais do pacto, só que por prazo indeterminado (Cód. Civil/1916, art. 1.195). Não merece acolhida tampouco a alegação de que as 4 horas tidas como excedentes deviam compensar o trabalho aos sábados, inexistente, porque o documento de fl. 35, trazido pelo recorrente, indica o oposto: trabalho habitual aos sábados.

No entanto, quanto ao pleito recursal sucessivo para que se excluam as horas extras deferidas para o mês de fevereiro/2004, tenho que assiste razão, em parte, ao reclamado. De fato, de seu interrogatório não é possível inferir o trabalho ao longo do mês de fevereiro/2004, mas apenas a partir do final daquele mês (fl. 103). Não correspondendo a confissão judicial real, via de regra, à integra do interrogatório, os termos da declaração da parte confitente devem ser tomados sem alargamento de sentido ou alcance.

Daí porque, adequando a condenação aos limitados contornos da confissão, reformo pontualmente a r. sentença para reduzir a 4 horas extras o total de horas extraordinárias referente a fevereiro/2004, número arbitrado em consideração à asserção patronal de que o horário obreiro foi alterado no fim de fevereiro/2004. A invocação de calendário da UnB, divulgado na internet, choca-se com o teor da confissão, além de constituir circunstância nova insuscetível de conhecimento nesta altura do processo.

Portanto, dou parcial provimento ao recurso patronal para reduzir o número de horas extras em fevereiro/2004 para 4, ao todo, restando intacta a r. sentença quanto ao período remanescente em que houve a condenação. CONCLUSÃO Isto posto, conheço o recurso e, no mérito, dou-lhe parcial provimento para reduzir, no mês de fevereiro/2004, a 4 o total de horas extras a que foi condenado o reclamado. Tudo nos termos da fundamentação. É o voto.

Por tais fundamentos, ACORDAM os Juízes da Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região, em sessão realizada na data e nos termos da respectiva certidão de julgamento: aprovar o relatório, conhecer o recurso e, no mérito, dar-lhe parcial provimento para reduzir, no mês de fevereiro/2004, a 4 o total de horas extras a que foi condenado o reclamado. Redimensiona-se para R$ 190,00 o valor da condenação, sem alterar o valor das custas por estar dentro do mínimo legal (IN 3/93).

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