Poder de decisão

Juízes de primeiro grau querem participar do orçamento

Autor

24 de dezembro de 2005, 6h00

Pesquisa feita pela cientista política Maria Tereza Sadek revelou que a maioria dos juízes brasileiros gostariam de participar diretamente na destinação dos recursos financeiros do Judiciário. Nada menos que 72% dos juízes ouvidos na pesquisa, encomendada pela AMB – Associação dos magistrados Brasileiros reivindicaram o direito de pariticpar da discussão do orçamento dos tribunais.

Participar na elaboração do orçamento do tribunal parece uma utopia para a juíza Maria Lúcia Pizzotti do Fórum Central de São Paulo. Hoje essa é uma prerrogativa dos tribunais estaduais que não parecem dispostos a abrir mão dela.

“Mas, quem conhece melhor as necessidades da gestão do que aquele que está lidando no dia-a-dia da vida forense?”, questiona a juíza. Para Maria Lúcia ninguém melhor que o juiz da primeira instância. Ela defende a participação da primeira instância por meio de uma comissão, que deveria ser eleita para representar a classe junto ao tribunal.

O orçamento está no centro de qualquer discussão sobre o funcionamento da Justiça. E antes mesmo da discussão sobre os métodos de elaboração do orçamento, existe uma questão ainda mais crucial que é a da autonomia sobre o orçamento. A Emenda Constitucional 45, a chamada reforma do Judiciário, estabelece que os recursos gerados pela Justiça devem permanecer no Judiciário. Mas alguns estados, como São Paulo, não acataram ainda esta determinação e a competência para concentrar e destinar os recursos da Justiça continua nas mãos do Executivo.

O desembargador Carlos Teixeira Leite Filho, do Tribunal de Justiça de São Paulo, concorda com a participação dos juízes da primeira instância na elaboração do orçamento, informando e mostrando ao tribunal suas necessidades e carência. “A primeira instância está mais próxima das questões locais. Sabe das carências nas instalações, mão-de-obra e instrumentos de trabalho”, afirma o desembargador.

Para o juiz José Tadeu Picolo Zanoni, da 1ª Vara de Cotia (SP), a participação dos juízes no orçamento do tribunal, significa introduzir democracia onde não há.

Revela, ainda, a pesquisa da cientista política, que nem todos os juízes de primeiro grau concordam com a sua participação na definição do orçamento. Entre contrários e indiferentes à participação estão 20% dos juízes. A pesquisa mostra também que os juízes mais favoráveis a opinar no orçamento são os da região Norte, seguida da Nordeste, ficando por último a região Sudeste.

Súmula vinculante

A pesquisa, de 84 páginas, divulgada recentemente no site da AMB revela a opinião dos juízes em outras questões em pauta nas rodas da categoria. Uma delas é sobre a instituição da súmula vinculante para decisões do Superior Tribunal de Justiça e Tribunal Superior do Trabalho. Dos 3.258 juízes que participaram da pesquisa, 75% se mostraram favoráveis.

O resultado é uma surpresa quando se lembra da forte oposição da classe quando se discutiu na reforma do Judiciário a súmula vinculante para decisões do Supremo Tribunal Federal.

Se a juíza Maria Lúcia Pizzotti pudesse escolher, a súmula vinculante sometne seria aplicada na Justiça do Trabalho. “A matéria trabalhista é muito repetitiva e não apresenta muitas hipóteses para os casos delimitados na CLT”, justifica. A juíza acredita que a súmula vinculante no TST daria mais segurança ao trabalhador e ao empregador. “O Brasil está vendo a remessa da CLT ao lixo. Com a súmula poderia haver mais segurança”, afirma.

Maria Lúcia não concorda com a súmula para o Supremo, que ela caracteriza como um tribunal de tendência mais política do que jurídica. “Para questões que não dependem de interpretação cabe a súmula vinculante, como em casos envolvendo a Lei dos Crimes Hediondos, que não cabe interpretação. Toda norma que deixa margem de interpretação não deveria ser sumulada”, afirma a juíza. Para Maria Lúcia, a reforma do Judiciário deveria definir quais questões podem ou não ser sumuladas.

Participação política

Na pesquisa de Maria Tereza Sadek, 86% dos juízes entrevistados se mostraram contra a participação político-partidária de magistrados. O tema ganha relevância, quando circulam notícias das pretensões políticas de ilustres figuras do Judiciário, como o presidente do STF, Nelson Jobim, provoável futuro candidato à presidência da República, ou do presidente do STJ, Edson Vidigal.

A mistura de Justiça e Política é repudiada pela sociedade em geral e pela comunidade jurídica em particular, como provam os números da pesquisa da AMB. Por uma razão muito simples, como defende o desembargador Carlos Teixeira Leite Filho, do TJ paulista: a independência necessária ao exercício da magistratura é incompatível com qualquer vinculação político partidária.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!