Exceção fundamentada

STF suspende quebra de sigilos decretada pela CPI dos Correios

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22 de dezembro de 2005, 19h02

Mais uma vez, por falta de fundamentação, o Supremo Tribunal Federal suspendeu quebra de sigilos bancário, fiscal e telefônico determinada pela CPMI dos Correios. A decisão é do ministro Marco Aurélio e favorece a empresa Orrini Administração de Documentos.

Ao conceder a liminar, o ministro Marco Aurélio observou que a quebra do sigilo é um ato de exceção. “Para tanto, é indispensável que o ato extremo se faça devidamente fundamentado.”

No pedido de Mandado de Segurança, a Orrini informou que exerce atividades de embalagem, estocagem, reprografia, impressão de documentos e comércio de artigos de papelaria e que a quebra dos sigilos se baseou apenas em “meras suposições”.

Leia a íntegra da decisão

DECISÃO

SIGILOS BANCÁRIO E FISCAL – QUEBRA – FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE – RELEVÂNCIA DA ARTICULAÇÃO – LIMINAR DEFERIDA. SIGILO TELEFÔNICO – INEXISTÊNCIA DE REQUERIMENTO – QUEBRA – RELEVÂNCIA DA ARTICULAÇÃO – LIMINAR DEFERIDA.

1. A impetrante busca demonstrar, na longa inicial de folha 2 a 28, acompanhada dos documentos de folha 29 a 411, não só o concurso do direito líquido e certo na espécie, como também o risco de se manter com plena eficácia o quadro. Em síntese, aponta que o requerimento que deu margem à quebra dos sigilos fiscal e bancário não se fez devidamente fundamentado e que não houve peça visando a alcançar a quebra do sigilo telefônico. Em relação à parte fiscal e bancária, o requerimento mostrar-se-ia vago, mencionando-se o fato de se tratar de contrato a envolver alta importância, não se contando com licitação, aludindo-se ainda ao que veiculado por Diretor Administrativo dos Correios, à possibilidade de a formalização dos ajustes haver resultado de indicação política, bem como ao que noticiado pela imprensa. No tocante ao sigilo telefônico, assevera a impetrante a inexistência de requerimento em tal sentido.

Citando precedentes desta Corte, pleiteia a concessão de medida acauteladora que suspenda a eficácia dos atos praticados pelo Presidente da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito – Correios objetivando o acesso aos dados referidos, vindo-se, alfim, a fulminar os atos atacados.

2. A regra é a intangibilidade dos dados, correndo à conta de exceção a quebra do sigilo. Para tanto, indispensável é que o ato extremo se faça devidamente fundamentado. Não é o que ocorre na espécie. Conforme salientado pela impetrante, a circunstância de se cuidar de contratos que deságüem na movimentação de vultosos valores não esteia, em si, a quebra dos sigilos, sob pena de se generalizar o fenômeno. Também não vinga o argumento concernente à falta de licitação. Possível vício há de ser apurado, não dependendo, em si, quer dos dados bancários, quer dos fiscais, quer dos ligados à telefonia. Da mesma maneira, denúncias genéricas, sem alusão a esta ou aquela empresa, formalizadas por ex-diretores dos Correios, são insuficientes a ter-se o que, se prevalecente a óptica, poderia implicar devassa relativamente a todas as empresas que hajam contratado com aquela empresa púbica. Não respalda essa quebra a possibilidade de os contratos resultarem de indicações políticas, nem o que publicado na imprensa sobre esquema de corrupção na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Reconheça-se – e isso é inafastável – contar as comissões parlamentares de inquérito com os poderes próprios à investigação, cujos parâmetros, entrementes, hão de ser respeitados, e aí surge a necessidade de atos de constrição, de atos que repercutam na privacidade de terceiros serem fundamentados de modo concreto, abandonando-se a simples capacidade intuitiva. A presunção deve estar voltada para o que normalmente acontece e não considerado o extravagante, o teratológico, ou seja, a postura que discrepe da ordem jurídica em vigor.

Registre-se, mais, que, tudo indica, o ofício endereçado à Anatel, visando à transferência do sigilo telefônico, decorreu da automaticidade, dada a forma linear que geralmente é adotada pelas comissões parlamentares de inquérito, alcançando não só a parte fiscal e bancária, como também a telefônica. É que o requerimento formalizado pelo relator da citada Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, deputado Osmar Serraglio, não abrangeu tal quebra. Confira-se com o que se contém às folhas 94 e 95.

Nunca é demais repetir que, em Direito, o meio justifica o fim, mas não este, aquele, devendo ser observada a organicidade que lhe é própria.

3. Defiro a liminar pleiteada para, até o julgamento final deste mandado de segurança, afastar a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico determinada pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito – Correios -, em relação à impetrante.

4. Com as homenagens de praxe, solicitem-se informações ao Presidente da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito – Correios, senador Delcídio Amaral.

5. Vindo ao processo o pronunciamento, colha-se a manifestação do Ministério Público.

6. Publique-se.

Brasília, 17 de dezembro de 2005.

Ministro MARCO AURÉLIO

Relator

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