Causa e efeito

Doença só garante estabilidade se relacionada com emprego

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21 de dezembro de 2005, 15h54

Trabalhador só tem direito à estabilidade por doença profissional se comprovar que a moléstia foi provocada diretamente pela atividade que desempenha na empresa. Com este entendimento, a 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo) negou indenização para um ex-empregado da Lorenzetti. O trabalhador alegou que passou a sofrer de hérnia de disco devido às condições do trabalho. Mais tarde descobriu-se que a doença estava relacionada com o fato de ele ser também praticante e professor de artes marciais.

O trabalhador ingressou com ação na 51ª Vara do Trabalho, reclamando que a empresa não respeitou a estabilidade provisória de 12 meses, assegurada ao empregado que sofre acidente de trabalho. O metalúrgico chegou a ser afastado pelo INSS. Em audiência, confessou que possuía uma academia de artes marciais e que dava aula de lutas.

Para ter direito à estabilidade, alegou que a doença foi provocada pelas “condições ergonômicas” no trabalho. Porém, laudo pericial juntado ao processo afirmou que a lesão na coluna não “guardava nexo com as atividades desenvolvidas na empresa”.

A primeira instância negou o pedido de estabilidade e o metalúrgico recorreu ao TRT paulista. A intenção era anular a sentença e obrigar o perito a prestar novos esclarecimentos. A 4ª Turma negou o pedido.

Segundo o juiz Ricardo Artur Costa e Trigueiros, relator do Recurso Ordinário no tribunal, a estabilidade provisória prevista no artigo 118, da Lei 8.213/91 (dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e), não está atrelada ao auxílio-doença acidentário, concedido pelo INSS.

De acordo com o relator, “o fato gerador da garantia é a ocorrência do acidente do trabalho ou da moléstia profissional, como assegura o artigo 20 da Lei 8.213/91, e não, o deferimento do benefício previdenciário, reconhecendo-se a partir daí a condição estabilitária, independentemente de percepção de auxílio-acidente”.

“Embora provado ser o reclamante portador de hérnia discal e ainda que seu trabalho fosse passível de produzir algum desconforto em razão das condições ergonômicas, tais circunstâncias não o tornaram incapacitado para o trabalho e nem levam ao estabelecimento de presunção quanto ao nexo causal”, observou ele.

O juiz ainda esclareceu que a perícia no processo indicou que o fator determinante da hérnia de disco foi a “atividade paralela de alto impacto” do metalúrgico.

RO 01592.2001.051.02.00-8

Leia a íntegra da decisão

4ª. TURMA

PROCESSO TRT/SP NO:01592.2001.051.02.00-8 (0037104.04)

RECURSO: RECURSO ORDINÁRIO

RECORRENTE: ADENILSON DURVAL DE PAULA

RECORRIDO: LORENZETTI S/A. IND. BRASILEIRAS ELETROMETALÚRGICAS

ORIGEM: 51ª VT DE SÃO PAULO

EMENTA: HÉRNIA DISCAL. PRÁTICA DE ARTES MARCIAIS PELO EMPREGADO. NEXO CAUSAL AFASTADO. Embora provado ser o reclamante portador de hérnia discal e ainda que seu trabalho fosse passível de produzir algum desconforto em razão das condições ergonômicas, tais circunstâncias não o tornaram incapacitado para o trabalho, e nem levam ao estabelecimento de presunção quanto ao nexo causal, mormente em face das novas conclusões da perícia, extraídas do depoimento pessoal do empregado no qual reconhece que se dedicava a atividade paralela de alto impacto, ministrando regularmente aulas de artes marciais em academia de sua propriedade, fora do expediente cumprido na empresa, sendo este o fator determinante da moléstia. Nessa moldura, em que a prova pericial não respalda a tese do reclamante, e verificando-se que o expert prestou todos os esclarecimentos necessários aos deslinde da questão, impossível acolher o pedido de declaração de nulidade da sentença.

Contra a respeitável sentença de fls.226/229, que julgou a reclamação procedente em parte, recorre ordinariamente o reclamante às fls. 237/243 perseguindo a nulidade da respeitável sentença a fim de que o perito preste novos esclarecimentos, vez que o laudo pericial está incompleto. No mérito, insurge-se quanto ao adicional noturno.

Contra-razões às fls.246/247.

Considerações do Digno representante do Ministério Público do Trabalho, fls. 249, quanto à inexistência de interesse público que justificasse sua intervenção.

É o relatório.

V O T O

Conheço porque presentes os pressupostos de admissibilidade.

DA ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO – NULIDADE

A nulidade da respeitável sentença ao direito de produção de prova não está configurada.

Entendo que o percebimento do benefício previdenciário não constitui fato gerador da estabilidade provisória, e sim, mera formalidade capaz de demonstrar a gravidade do dano causado ao laborista, em decorrência do infortúnio ocorrido no transcurso do trabalho, sendo este, sim, o fato determinante para que o trabalhador passe a gozar da tutela especial da garantia provisória de emprego.

Tanto é assim, que a norma legal é cristalina ao deduzir que a estabilidade em comento não deva estar atrelada à percepção do auxílio-doença acidentário decorrente.

Basta ver o que dispõe textualmente o artigo 118, da Lei nº 8.213/91, em prol dos trabalhadores vítimas de acidente do trabalho: “Art. 118. O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente”. (grifamos).

Aí está. A norma acima reproduzida explicita que o fato gerador da garantia é a ocorrência do acidente do trabalho ou da moléstia profissional, como assegura o artigo 20 da Lei 8.213/91, e não, o deferimento do benefício previdenciário, reconhecendo-se a partir daí a condição estabilitária, independentemente de percepção de auxílio-acidente.

Todavia, em que pese o esforço de argumento do patrono do reclamante, na situação específica dos autos a prova produzida não demonstra que o autor seja vítima de doença profissional.

Conforme bem destacado pelo D. Juízo de origem o laudo pericial de fls.168/175, antes da audiência de instrução já consignara o seguinte: “A hérnia discal aparece após traumas mecânicos à coluna vertebral lombar, imediatamente ou depois de um certo tempo. O esforço brusco com o dorso em uma postura estranha e o erguimento com o tronco fletido são as causas precipitantes comumente reconhecidas. O defeito pode ocorrer imediatamente após a lesão ou depois de um intervalo de meses ou anos. (..) O professor C. Simonin complementa a assertiva anterior ao afirmar que a “hérnia discal aparece na idade média da vida, provocada por uma queda no chão, esforços violentos ou esforços menos violentos mas repetidos (microtraumatismo) que estabece progressivamente…”(..)”.

E no termo de audiência (fls. 195) se constata ter o reclamante afirmado, em depoimento pessoal que “(..) há cerca de dois anos o depoente possui uma academia; que quando é necessário realiza orientação de aluno na academia na parte de musculação e realiza exercícios de correção de coluna; que até o ano de 1999 dava aula de artes marciais(..)”(grifamos).

Diante das informações supracitadas, o expert às fls. 219/220, ressaltou que não tinha conhecimento que o autor ministrava aulas de artes marciais e esclareceu que “(..)Diante do fato acima trazido aos autos, de total desconhecimento por ocasião da apresentação do Laudo Médico Pericial por este perito, venho ratificar a conclusão do laudo anteriormente apresentado tendo em vista a hérnia discal aparecer após traumas mecânicos à coluna vertebral lombar, imediatamente ou depois de um certo tempo. Desse modo, vimos respeitosamente que: O reclamante é portador de lesões à nível de sua coluna lombar que não guarda nexo com as atividades desenvolvidas na empresa Reclamada.(..)”.

Embora provado ser o reclamante portador de hérnia discal e ainda que seu trabalho fosse passível de produzir algum desconforto em razão das condições ergonômicas, tais circunstâncias não o tornaram incapacitado para o trabalho e nem levam ao estabelecimento de presunção quanto ao nexo causal, mormente em face das novas conclusões da perícia, extraídas do reconhecimento pelo autor, em depoimento pessoal, de que se dedicava a atividade paralela de alto impacto, ministrando regularmente aulas de artes marciais em academia de sua propriedade, fora do expediente cumprido na empresa, sendo este o fator determinante da moléstia.

Nessa moldura, em que a prova pericial não respalda a tese do reclamante, e verificando-se que o expert prestou todos os esclarecimentos necessários aos deslinde da questão, torna-se impossível o pedido de declaração de nulidade da sentença.

Rejeito.

DO ADICIONAL NOTURNO

A questão sobre a qual se trava debate diz respeito á redução do adicional noturno realizada em 12/98, decorrente da alteração da cláusula 5ª da Convenção Coletiva da Categoria, que dispõe o seguinte, in verbis:

“A remuneração do trabalho noturno prestado entre 22h00 e 05h00 será acrescida do adicional de 35%(trinta e cinco por cento) sobre o valor da hora normal.

Parágrafo primeiro: “Para os empregados admitidos até 30.10.98 e que já trabalham em horário noturno perceberá, além do adicional noturno de 35% (trinta e cinco por cento) um prêmio de 15% (quinze por cento) sob a rubrica “prêmio” – cláusula nº 05 desta Convenção Coletiva de Trabalho”, incidente sobre a hora noturna trabalhada.

Parágrafo Segundo: Não farão jus ao prêmio estabelecido no parágrafo anterior, os empregados que, transferidos ao período diurno, não retornarem ao trabalho em horário noturno por no mínimo 4 (quatro) meses.

Parágrafo Terceiro: Com a concordância do trabalhador, estarão definitivamente isentos do pagamento do prêmio de 15% (quinze por cento) previsto no parágrafo primeiro acima, as empresas que – a) indenizarem com um salário nominal os empregados que diário e permanentemente estejam trabalhando a totalidade das horas noturnas; ou b) que indenizarem com um valor proporcional (base de cálculo igual a um salário nominal) a média dos últimos 6(seis) meses das horas habitualmente trabalhadas no horário noturno.”

Do exame da referida cláusula em questão e da prova produzida temos que a reclamada em 20/01/99, em consonância ao disposto no parágrafo terceiro indenizou seus funcionários, inclusive o autor, com o valor de um salário nominal, com a devida concordância desses, conforme se depreende do aditamento ao contrato de trabalho (doc. 02 do volume de documentos).

Nesse contexto, não há que se falar em violação ao disposto na Súmula 60 do C. TST, e tampouco ao disposto no artigo 7º, inciso XXXVI, da CF/88, vez que a norma coletiva é fonte autônoma de direito e sua interpretação se faz de forma restritiva, sendo certo que a recorrida cumpriu o instrumento negocial e deve ser prestigiada a autonomia privada coletiva.

Nessa moldura, mantenho a r.sentença de origem.

Do exposto, conheço do recurso ordinário interposto, rejeito a preliminar de nulidade e, no mérito, NEGO PROVIMENTO ao apelo na forma da fundamentação que integra e complementa este dispositivo, para manter a r. sentença de origem.

RICARDO ARTUR COSTA E TRIGUEIROS

Juiz Relator

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