Pedido de liberdade

Leia a íntegra do pedido de HC em favor de Oliveira Neves

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13 de dezembro de 2005, 15h39

O advogado Newton José de Oliveira Neves entrou com novo pedido de Habeas Corpus no Supremo Tribunal Federal. Ele alega que há excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal, já que está preso há mais de 160 dias, e pede que seja solto imediatamente.

Este é o segundo pedido de HC de Oliveira Neves entregue ao Supremo. Ele pretende responder em liberdade à acusação de sonegação fiscal e fraude aos direitos trabalhistas. O primeiro pedido foi entregue ao Supremo em outubro. Os dois foram impetrados contra decisão em caráter liminar do Superior Tribunal Justiça, que negou a suspensão da prisão preventiva. O relator dos pedidos é o ministro Carlos Velloso.

Nos pedidos, os advogados de Oliveira Neves, Carlos Ely Eluf, Décio Eduardo de Freitas Chaves Júnior e Melissa Pessotti Taveira Stefani alegam que não pode ser aplicada a Súmula 691 do Supremo neste caso, porque há ofensa ao princípio constitucional da presunção de inocência. Pela jurisprudência do tribunal, o STF não pode analisar pedido de liminar em Habeas Corpus contra liminar sobre o mesmo tema de outro tribunal superior.

Leia a íntegra do pedido de Habeas Corpus

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR MINISTRO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Os advogados CARLOS ELY ELUF, brasileiro, divorciado, inscrito na OAB/SP sob o nº 23.437, DÉCIO EDUARDO DE FREITAS CHAVES JÚNIOR, brasileiro, solteiro, inscrito na OAB/SP sob o n° 200.169 e MELISSA PESSOTTI TAVEIRA STEFANI, brasileira, casada, inscrita na OAB/SP sob o n° 189.871, todos com escritório na Avenida São Valério, n° 73, Cidade Jardim, São Paulo / SP, vêm, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento no artigo 5º, LXVIII, da Constituição Federal e artigo 647, 648, I e II do Código de Processo Penal, impetrar ordem de

HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE CONCESSÃO DE MEDIDA LIMINAR

em favor de NEWTON JOSÉ DE OLIVEIRA NEVES, brasileiro, divorciado, advogado, regularmente inscrito na OAB/SP sob o nº 68.650, contra decisão liminar (doc. fls.) proferida pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que, em expressa afronta à dispositivo legal vigente, consubstanciado no artigo 8º da Lei de nº 9.034/95, de forma equivocada, indeferiu o pedido de liminar do Habeas Corpus de nº 50.616, anteriormente impetrado em favor do ora Paciente perante aquele Excelso Tribunal, bem como contra decisão liminar (doc. fls.) proferida pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que, em expressa afronta à dispositivo legal vigente, consubstanciado no inciso V, do artigo 7º da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), de forma equivocada, indeferiu o pedido de liminar do Habeas Corpus de nº 50.090, anteriormente impetrado em favor do ora Paciente perante aquele Egrégio Tribunal.

A TÍTULO DE PROLEGÔMENOS DA PERSONALIDADE DO PACIENTE

O Paciente é advogado, regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Secção de São Paulo / SP, sob o n° 68.650 (doc. fls.), sendo militante no campo do Direito Tributário há mais de 20 (vinte anos) e titular da renomada Banca de Advocacia “Oliveira Neves e Associados”, não possuindo qualquer antecedente criminal ou fato desabonador de seu comportamento, consoante demonstram e comprovam as inclusas certidões de antecedentes criminais (doc. fls.), tendo sempre pautado as suas condutas profissionais e pessoais por ilibada ética e correção, sendo excelente pai de filhos bem criados e família exemplar.

Outrossim, esclarecemos à Vossas Excelências, que o Paciente, advogado formado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, especialista em Direito Empresarial, Tributário, Societário e Internacional, cuida-se de profissional no ramo do Direito com grande conceito entre seus pares, clientes, membros da Magistratura e na sociedade em geral, gozando de prestígio e credibilidade (doc. fls.).

Além destes notórios conhecimentos jurídicos e do brilhantismo profissional do Paciente, salientamos, neste diapasão, que o mesmo exerce cumulativamente a honrosa função de diretor presidente e supervisor cultural de Instituto Jurídico e Cultural, denominado Mission Desenvolvimento Profissional.

Esclareça-se ainda à Vossas Excelências, que seja através de suas diversas obras literárias editadas ou mesmo através da prestação de serviços jurídicos aos seus inúmeros clientes, o Paciente sempre se pautou pela adoção e orientação de condutas integralmente previstas na legislação vigente, dentro da estrita legalidade, adotando opções de condutas tributárias através de formas mais benéficas e menos onerosas aos seus constituintes, sem, contudo, jamais arranhar a legislação vigente.

Acrescente-se por derradeiro, que é curial ser dever e função do advogado em geral, como múnus de sua função, como é o caso do ora Paciente, no estrito cumprimento de seu dever profissional, assim proceder, ou seja, zelar sempre pelo patrimônio de seus clientes, de acordo única e exclusivamente com as possibilidades que as normas legais estabelecidas assim permitam.


Conclui-se, pois, que o Paciente é pessoa voltada unicamente para seu trabalho, dotado de grande capacidade intelectual, profissional estudioso, dedicado e competente, exercendo a sua profissão com raro brilhantismo, por mais de longos 5 (cinco) lustros, possui domicílio e residência fixos, é homem trabalhador e pacífico, com ótimos antecedentes de vida pregressa, portanto, desde logo fica cristalino, que o mesmo não oferece qualquer perigo de dano à sociedade.

Efetuados estes esclarecimentos, a guisa de prolegômenos, passamos a análise dos fatos.

DA INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 691 DO STF

1. Primeiramente, cumpre esclarecer que o presente Habeas Corpus não se cuida de mero pleito contra indeferimento de liminares exaradas nos autos dos Habeas Corpus nº 50.616 e 50.090. Trata-se, sim, de contestar flagrantes nulidades por violações do artigo 8º da Lei nº 9.034/95, vez que o ora Paciente está preso preventivamente há mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias, sem que a instrução criminal tenha se encerrado, sendo que sequer foram ouvidas todas as testemunhas de acusação, violando-se assim, o princípio constitucional da presunção da inocência e o direito de ir e vir. Outra ilegalidade consiste na violação do artigo 7°, inciso V, da Lei Federal n° 8.906/94, Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, uma vez que o Paciente está custodiado no Ponto Zero, Rio de Janeiro/SP, local comprovadamente inadequado e incondizente com as prerrogativas conferidas aos advogados inscritos na OAB.

2. Portanto, Cultos Ministros, insta salientar que não é o caso de aplicação da Súmula n° 691 desta Suprema Corte de Justiça que preceitua o quanto segue: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão que, em habeas corpus requerido a Tribunal Superior, indefere a liminar.”

3. Destaca-se que, não obstante a discussão por este Egrégio Tribunal, a respeito do eventual cancelamento do mencionado verbete da referida Súmula, nos autos do HC no 85.185-1, de relatoria do Ministro Cezar Peluso, tal proposta foi rejeitada, mantendo-se, por conseguinte, a aplicação de seu conteúdo (Informativo no 396, 08 a 12/08/2005). Entretanto, a conclusão desta Suprema Corte foi de que o enunciado 691 não impede o conhecimento de habeas corpus, se evidenciado flagrante constrangimento ilegal.

4. Este é exatamente o caso do presente habeas corpus, que visa a correção de decisões proferidas pela Ministra Relatora nos autos dos mandamus n° 50.616 e 50.090, que indeferiu os pedidos de liminares, onde pleiteou-se a expedição de Alvará de Soltura em favor do Paciente, por estar o mesmo detido, preventivamente, de forma injustificada e infundada, há mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias, e em local inadequado e incondizente com as prerrogativas conferidas aos advogados, qual seja, de não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgada, senão em Sala de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela OAB, e, na sua falta, em prisão domiciliar, consoante a seguir restará integralmente comprovado.

5. Essa Suprema Corte vem decidindo, assim como o próprio STJ, que, em casos de flagrante ilegalidade, como no caso vertente, é de rigor que seja concedida ordem de habeas corpus impetrada contra decisão que indeferiu liminar pleiteada em outro remédio constitucional em instância inferior, senão vejamos:

“Assim, nos termos do que já decidido no AgRg no HC no 84.014 (Rel. Min. MARCO AURÉLIO), admite-se exceção ao enunciado da súmula 691, quando se trate de flagrante constrangimento ilegal, que é o caso. (cf. Medida Liminar concedida nos autos do Habeas Corpus no 85.185-1/SP, Relator o Ministro CEZAR PELUSO)

E no precedente mencionado decidiu-se que:

A Súmula do Supremo Tribunal Federal revela, como regra, o não-cabimento do habeas contra ato de relator que, em idêntica medida, haja implicado o indeferimento de liminar. A exceção corre à conta de flagrante constrangimento ilegal que, uma vez não verificado, impede a seqüência do habeas corpus. (Ag.Reg. no Habeas Corpus no 84.014, Rel. Min. MARCO AURÉLIO)

6. Acrescente-se, por oportuno, que afinando no mesmo diapasão, o STJ vem decidindo reiteradamente o quanto segue:

“HABEAS CORPUS” – Decreto de prisão – Pedido visando liminar negada em outro “habeas corpus” – Possibilidade, em caráter excepcional – Ilegalidade manifesta do ato coator – Medida concedida.

Ementa oficial: Pedido objetivando obtenção de liminar negada em outro Habeas Corpus. Possibilidade, em caráter excepcional, quando o ato coator apresenta manifesta ilegalidade, com efeitos danosos irreparáveis”. (HC 3.215-2-5ª Turma- J. 5.4.95-Rel. Min. ASSIS DE TOLEDO – DJU 29.5.95).


“Somente em situações excepcionais, demonstrativas de patente constrangimento ilegal, admite-se a concessão de habeas corpus contra decisão monocrática de relator que indefere liminar em outro habeas corpus”.(STJ – HC no 7.386/GO, DJ 22/2/99, Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO)

“Na via da excepcionalidade, admite-se habeas corpus contra decisão que indeferiu pedido liminar em writ impetrado perante o e. tribunal a quo, ainda não julgado. Em tais casos, o ato coator deve apresentar manifesta ilegalidade, com efeitos danosos irreparáveis (…)”. (STJ – HC no 26.659/CE, Rel. Min. JORGE SCARTEZZINI) No mesmo sentido (HC no 11.639-BA, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA).

“O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça têm compreensão assentada no sentido de não caber habeas corpus contra decisão que denega liminar, a não ser que reste demonstrada flagrante ilegalidade, o que não ocorre na espécie.” (enunciado 691 da Súmula do STF); (STJ – HC no 43606/PB, Rel. Min. HÉLIO QUAGLIA BARBOSA) Em idêntico sentido: AgRg no HC no 35.049/SP, Rel. Min. PAULO GALLOTTI.

“Não cabe habeas corpus contra indeferimento de liminar, a não ser que reste demonstrada flagrante ilegalidade no ato atacado, hipótese não verificada in casu, sob pena de indevida supressão de instância.” (STJ – HC no 34.386/SP, Rel. Min. GILSON DIPP)

“Não cabe habeas corpus para obter a concessão de liminar, negada em outra impetração, salvo flagrante ilegalidade ou decisão teratológica.” (STJ – AgRg no HC no 37.229/DF, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES)

“Em princípio, ressalvando manifesta ilegalidade, descabe o uso de habeas corpus para cassar indeferimento de liminar.” (STJ – HC no 34.509/RN, Rel. Min. FÉLIX FISCHER)

“Ressalvadas as hipóteses de flagrante ilegalidade, a jurisprudência desta Corte não conhece de Habeas Corpus manejado contra decisão denegatória de liminar em writ impetrado perante Tribunal a quo, sob pena de supressão de instância.” (STJ – HC no 26705/GO, Rel. Min. CÉSAR ASFOR ROCHA)

“Não cabe habeas corpus contra indeferimento de liminar, a não ser que reste demonstrada flagrante ilegalidade no ato atacado, hipótese não verificada in casu, sob pena de indevida supressão de instância.” (STJ – HC no 34.817/SP, Rel. Min. GILSON DIPP)

7. Cumpre salientar, no que tange à referida Súmula 691 do STF, que o estudioso professor LUIZ FLÁVIO GOMES, acerca do tema em pauta, assim lecionou:

“Em termos práticos ela significa o seguinte: se o relator, em algum tribunal superior (STJ ou STF), indefere liminar, ainda que se trate de uma flagrante ilegalidade, deveria o STF abster-se de conhecer eventual HC impetrado contra o indeferimento da liminar e, em conseqüência, da própria ilegalidade. Isso, em poucas palavras, significa evidente denegação de justiça. Convenhamos, o STF, como máximo intérprete da Constituição e última esperança do injustiçado, não pode prestar-se a tamanha insensibilidade. Parece, destarte, não haver dúvida que ele deve cancelar o enunciado da referida súmula, que não honra a sua história em matéria de tutela das liberdades fundamentais.

Sintetizando o que Alberto Z. Toron já escreveu sobre o assunto (cf. site Consultor Jurídico – www.conjur.com.br), se o STF, bem como qualquer juiz, pode conhecer de qualquer ilegalidade e conceder de ofício habeas corpus, parece não haver nenhuma dúvida de que o enunciado da Súmula 691 é flagrantemente inconstitucional, porque contraria o princípio da inafastabilidade da jurisdição. A jurisdição é indeclinável, isto é, não pode ser negada. Havendo patente ilegalidade, como no caso acima descrito, cabe à Suprema Corte conhecer de eventual habeas corpus e corrigir a ilegalidade. O contrário disso significa negar a própria condição de juiz, assim como a missão constitucional da jurisdição, de corrigir desmandos e abusos.

(…)

Não pode nossa Suprema Corte ignorar que a garantia da jurisdição é a garantia das garantias (ou garantia de fechamento, como sublinha a doutrina espanhola – cf. PEÑA FREIRE, Antonio Manuel, La garantia en el Estado constitucional de derecho, Madrid: Trotta, 1997, p. 227 e ss.). A missão central do Poder Judiciário, nos dias atuais, já não é só a de resolver conflitos intersubjetivos, aplicando o direito ao caso concreto. Sua orientação principal está voltada para a tutela dos direitos e garantias fundamentais. Enquanto o legislativo está subordinado ao interesse da maioria, o Judiciário vive em função do direito, competindo-lhe precipuamente a correção dos desvios e ilegitimidades dos outros poderes ou dos demais órgãos do próprio Poder Judiciário. Deparando-se com flagrante ilegalidade, ainda que gerada a partir da negação de uma liminar por tribunal superior, não há dúvida que ele deve intervir, para afastar o constrangimento ilegal. A garantia da jurisdição, por isso mesmo, tem que ser efetiva. Não pode o STF, destarte, dentro do seu âmbito de competência, interpretar o ordenamento jurídico de modo restritivo em termos de tutela das liberdades. O juiz do terceiro milênio já não se submete a uma vinculação inarredável com o texto legal. Seu compromisso é com a Constituição e seus valores superiores. Se a justiça é o valor-meta de todo Estado Constitucional e Democrático de Direito, não pode o Judiciário inibir-se e anular-se diante de uma injustiça. O modelo liberal de jurisdição está ultrapassado. Do império da lei passamos para o império do direito. Da função corretiva dos abusos de outros poderes ou de outros órgãos jurisdicionais o STF não pode jamais abrir mão, sob pena de não cumprir sua missão constitucional”. (in “Quando há flagrante ilegalidade cabe HC contra o STJ que indeferira liminar em outro HC?”) (grifos nossos)


8. Não há que se falar que a concessão de medida liminar neste writ implicaria em “supressão de instância”, uma vez que, como bem salientado pelo conceituado jurista pátrio Alberto Zacharias Toron, que, em relevante e bastante esclarecedor artigo jurídico específico acerca do tema em pauta, assim elucidou:

“Haveria, em qualquer caso, ofensa à hierarquia dos tribunais ou as suas competências? A resposta, uma vez mais, veementemente, é negativa e pelo simples fato de que uma coisa é o julgamento da liminar e outra, como é cediço, o do processo devidamente instruído. Em ambos os casos, julgada e denegada a impetração pelo tribunal local ou regional, o de grau superior deverá julgar prejudicado o writ que recebera, pois agora a coação por ventura existente decorrerá da denegação da ordem e não mais do indeferimento da liminar. O raciocínio não muda se, por exemplo, o Tribunal Superior chegar até mesmo a conceder a ordem ratificando a liminar. É que a decisão colegiada está cingida aos termos de uma cognição provisória e mais limitada jungida à questão da liminar.

(…)

O STF vai apreciar, sem nenhum salto, tema que não decorre diretamente da decisão do juiz de primeiro grau, mas de ministro de Tribunal Superior que julga em nome do tribunal, como órgão fracionário, e que tem, em matéria de habeas corpus, por expressa disposição constitucional, seus atos diretamente debaixo da jurisdição da Suprema Corte (art. 102, I, letra i).

A Súmula neste último caso, pesa dizê-lo, não poderia ir contra a expressa previsão constitucional e vedar a impetração de habeas contra a denegação da liminar. E, tampouco, se a impetração fosse decorrente de uma sucessão de negativas de liminares iniciada pelo relator no tribunal local ou regional. É que, primeiramente, não está em jogo diretamente a decisão do juiz de primeiro grau, mas a do relator no tribunal. Depois, não vedando a Constituição o manejo do habeas corpus contra o indeferimento da liminar, soa especioso que, pela via exegética, se queira restringir o alcance da tutela da liberdade do cidadão. Ainda mais quando está em foco o acerto ou desacerto da concessão da liminar que, pode, embora raro, encontrar no Pretório Excelso guarida sem que, como visto, se atinja ou se restrinja a competência do tribunal inferior quanto ao julgamento do mérito da ação constitucional ou, por outra, se fira a autoridade da decisão do Supremo Tribunal Federal nos limites do que decidiu”. (“A súmula 691 do Supremo Tribunal Federal e o amesquinhamento da garantia do Habeas Corpus”) (grifamos)

9. Portanto, Cultos Ministros, conclui-se de forma inconteste, que diante da farta e esclarecedora doutrina e jurisprudência acima colacionadas, não se aplica no caso vertente, a súmula 691 desta Egrégia Corte, já que o Paciente está sofrendo evidente constrangimento ilegal, pois, está tendo privado seu direito à locomoção, direito este assegurado constitucionalmente (art. 5º, inc. XV). Neste sentido é a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

“Não pode o Judiciário assenhorar-se das prerrogativas do Legislativo, criando novas formas inibidoras ao direito de ir e vir, sem a devida fundamentação e forma prescrita em Lei” (STJ – 6ª T. – RHC nº 1.944/SP-Rel. Min. Pedro Acioli).

10. Insta ainda, por derradeiro, ressaltar que, em recentíssima decisão deste Egrégio Supremo Tribunal Federal, proferida no final de outubro de 2005, em caso análogo ao presente, mais precisamente nos autos do HC atuado sob o nº 86.864, impetrado em favor de Flávio Maluf, contra indeferimento de pleito liminar formulado em mandamus impetrado no STJ, esta Augusta Corte conheceu do remédio heróico e concedeu liminar para colocar em liberdade o aludido empresário, tendo o eminente e culto Ministro Relator Carlos Velloso, em brilhante voto, peculiar ao seu elevado saber jurídico, abrandado a súmula 691 do STF, diante da flagrante ilegalidade da prisão do referido Paciente, já que seu direito de ir e vir, bem como sua liberdade de locomoção encontravam-se cerceados, exatamente como ocorre no caso do ora Paciente, consoante a seguir será demonstrado e comprovado.

11. Superada a questão da inaplicabilidade da Súmula 691 do STF no caso in concreto, passamos a analisar as questões do manifesto constrangimento ilegal que está sofrendo o Paciente, em razão do descumprimento do já especificado artigo 8º da Lei nº 9.034/95, que determina que o prazo de 81 (oitenta e um) dias para o encerramento da instrução criminal quando o acusado estiver preso, bem como o desrespeito à prerrogativa que é conferida ao Paciente, por Lei Especial n° 8.096/94, artigo 7°, inciso V.

DOS FATOS

12. Na data de 13 de junho de 2005, o órgão Ministerial Federal ofereceu denúncia (doc. fls.) em desfavor de onze Co-Réus, dentre eles, o Paciente, por supostamente estar o mesmo envolvido em esquemas de práticas criminosas, utilizando-se de empresas de “fachada”, constituídas no Brasil e no Uruguai, com o objetivo de transferir bens e propriedades, visando-se uma “proteção patrimonial”, que supostamente teria causado prejuízos aos cofres públicos e a terceiros.


13. Em razão das supostas condutas ilícitas acima mencionadas, o Parquet Federal imputou ao Paciente a pretensa prática dos delitos consubstanciados no artigo 299 do Código Penal, por 25 vezes; no artigo 1°, I, da Lei n° 8137/90, por 7 vezes; no artigo 2°, I, da Lei n° 8137/90, por 15 vezes; no artigo 22 da Lei n° 7492/86, por 2 vezes; no artigo 22, § único, 2ª parte da Lei 7492/86, por 1 vez, artigo 337 A do Código Penal, artigo 1°, §º 2°, II da Lei 9613/98; delito de gestão fraudulenta de instituições financeiras, prática de delito de frustração a direitos trabalhistas, tudo com a incidência do disposto no artigo 62, I do Código Penal.

14. Posteriormente, na data de 30 de junho de 2005, o Paciente foi preso temporariamente (doc. fls.), em razão de mandado de prisão (doc. fls.) expedido face ao decreto prisional (doc. fls.) determinada pela MM. Juíza da 5ª Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro, nos autos da Ação Cautelar de Busca e Apreensão registrada naquele D. Juízo de Direito sob o nº 2005.51.01.503930-0, apensada aos autos principais da Ação Penal originária registrada sob o nº 2004.51.01.530151-8, onde o Paciente figurou como Co-Réu, sendo que, posteriormente, o aludido processo criminal veio a ser desmembrado exclusivamente em relação ao Paciente, tendo sido autuado sob o nº 2005.51.01.517854-3, sendo que ambas as Ações Penais e a Ação Cautelar supramencionada se encontram em curso perante a referida 5ª Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro.

15. Vencido o prazo da prisão temporária, a MM. Juíza da 5ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro houve por bem decretar a prisão preventiva do Paciente, tendo sido expedido contra si mandado de prisão preventiva (doc. fls.), expedido em cumprimento ao decreto prisional cautelar (doc. fls.), data maxima vênia, fundamentado de maneira ilegal e evasiva, tendo sido posteriormente recebida a supramencionada denúncia Ministerial (doc. fls.), razão pela qual permanece o Paciente, indevidamente, até a presente data, recolhido na carceragem da Polinter, Ponto Zero, localizada no subúrbio de Campo Grande, na capital do Rio de Janeiro, cumprindo o Paciente, nesta data, mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias de custódia decorrente do aludido mandado.

DA FLAGRANTE NULIDADE ADVINDA DO INTOLERÁVEL E CONTRA LEGEM EXCESSO DE PRAZO PARA O ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL DA AÇÃO PENAL EM QUE FIGURA O PACIENTE COMO RÉU

16. Estabelece o artigo 8º da Lei nº 9.034/95 que o prazo para encerramento da instrução criminal será de 81 (oitenta e um) dias, quando o Paciente estiver preso, e de 120 (cento e vinte) dias, quando solto, dispositivo legal este que é corroborado pelo entendimento doutrinário e jurisprudencial dominante, conforme a seguir será explicitado.

17. Esclareça-se, ainda, que se tratando de crimes federais, o prazo para o encerramento da instrução criminal pode ser de até 96 (noventa e seis) dias, em ações penais na esfera da Justiça Federal. Todavia, de qualquer ângulo ou análise legal, o prazo em que o Paciente se encontra encarcerado, mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias, extrapola em muito o determinado pela legislação processual penal vigente, ou seja, o dobro do prazo legal previsto, constituindo uma antecipação de execução penal de uma sentença condenatória que sequer lhe foi imposta.

18. Segundo nos ensina o professor Rogério Lauria Tucci, em sua obra “Devido Processo Legal e Tutela Jurisdicional, Ed. Revista dos Tribunais, 1993, p. 105/106”, a fixação de prazo para o término da instrução criminal, quando o Paciente encontrar-se preso, decorre do basilar princípio constitucional do “devido processo legal”, através do qual todos os cidadãos têm direito de serem processados e julgados dentro do prazo que determina a legislação vigente, configurando-se constrangimento ilegal a manutenção da prisão cautelar quando houver extrapolação deste prazo, exatamente como ocorre no caso vertente. Vejamos:

“À falta de uma definição legal precisa sobre os prazos de duração da prisão cautelar e de encerramento do processo comum, e considerando que, por razões de ordem pública, convém, aos sujeitos processuais, o rápido desfecho da ação penal, principalmente ao Paciente preso em virtude da excepcionalidade do título que sacrifica a sua liberdade, incumbiu-se a jurisprudência de estabelecer um parâmetro temporal para tentar equilibrar, de forma justa, as duas situações, e tomou por base a seqüência das atividades processuais a serem realizadas nos limites de tempo estabelecidos no Código de Processo Penal, concluindo que o desfecho do processo comum em que o Paciente estivesse preso cautelarmente deveria ocorrer em 81 dias, com a entrega da prestação jurisdicional. Essa construção decorre do necessário respeito à garantia constitucional do devido processo legal (CF, art. 5°, inciso LIV), que tem como um dos seus significados “o direito ao processo sem dilações indevidas”, como corolário do processo legal, assegurado ao membro da comunhão social por norma de aplicação imediata.” (grifamos).


19. Destarte, de acordo com entendimento predominante da jurisprudência de nossos Tribunais e da legislação vigente, o prazo para o término da instrução criminal é de 81 (oitenta e um) dias, na hipótese de encontrar-se o Paciente preso, ou mesmo de 96 (noventa e seis), contados a partir do efetivo cumprimento do mandado de prisão, nos termos do artigo 8º, da Lei n° 9.034, de 03 de Maio de 1.995, c/c o artigo 10, do Código Penal, norma legal esta que vem sendo desrespeitada, vez que o Paciente, por estar preso há muito mais tempo, o dobro, do que determina a legislação vigente, vem suportando um intolerável constrangimento ilegal, que constitui verdadeiro cumprimento antecipado de pena, que sequer lhe foi imposta, perpetuando sua custódia preventiva, que deveria possuir natureza nitidamente provisória e isto não está ocorrendo em relação ao Paciente.

DA EXPRESSA FALTA DE RAZOABILIDADE PARA DILAÇÃO – 160 (CENTO E SESSENTA) DIAS – DO PRAZO PROCESSUAL PARA ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL

20. No caso em espécie, insta salientar que não deve prevalecer o deturpado entendimento de que o prazo para encerramento da instrução criminal não se afere por critério meramente matemático, devendo ser levado em consideração, face ao princípio da razoabilidade, a complexidade dos fatos, bem como a quantidade de acusados, argumentos estes inaplicáveis ao caso vertente, senão vejamos, Cultos Ministros:

21. A somatória dos prazos processuais penais até o encerramento da instrução criminal, é legalmente prevista na norma jurídica acima invocada, que é taxativa ao afirmar e estabelecer que se tratando de réu preso, o prazo para encerramento da instrução criminal será de 81 (oitenta e um) dias, ou mesmo 96 (noventa e seis) dias, não prevendo a legislação nenhuma exceção, ou seja, não abrindo margem o legislador para dilação deste interregno temporal, nem mesmo quando a ação penal for complexa, o que não é o caso, ou possuir, no seu pólo passivo, diversos Co-Réus, o que também não verifica in casu, cabendo ao Estado-Juiz cumprir, rigorosamente, o ordenamento jurídico atinente, não sendo plausível estender-se por intoleráveis 160 (CENTO E SESSENTA) dias, ou seja, o dobro do prazo estabelecido pela legislação atinente.

22. Nesta vereda, no tocante ao princípio da razoabilidade, invocado por ocasião da supramencionada decisão denegatória, há que se esclarecer que este princípio deve atuar em favor do acusado e não contra o mesmo, como equivocadamente ocorrera no caso vertente.

23. Afinando no mesmo diapasão, qual seja; que o princípio da razoabilidade milita em favor do Réu, oportuno se faz ressaltar recente matéria jornalística jurídica, veiculada no link de notícias do sítio do Excelso Superior Tribunal de Justiça, na data de 24 de novembro de 2005, intitulada de “prisão cautelar não pode ser por tempo indeterminado: princípio da razoabilidade é em favor do réu”, oportunidade em que se aponta o atual posicionamento daquele Egrégio Tribunal, que através de sua Quinta Turma, assim se posicionou acerca do tema ora em comento, vejamos:

“A prisão cautelar não pode perdurar por tempo indeterminado, sem que esteja demonstrada a sua necessidade, devendo o princípio da razoabilidade, na hipótese, atuar em favor do réu. A conclusão é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao reconhecer excesso de prazo (…)

O ministro determinou, então, expedição de Alvará de Soltura. “Constitui constrangimento ilegal a demora injustificável para a prolação da sentença, quando encerrada a instrução criminal,estando o réu preso cautelarmente”, considerou o relator. “O princípio da razoabilidade, na hipótese, milita em favor do réu, uma vez que a prisão cautelar não pode perdurar por tempo indeterminado, sem que esteja demonstrada a sua necessidade”, acrescentou.

Para o relator, nada pode justificar a permanência de uma pessoa na prisão, sem culpa formada, quando configurado excesso sem razão no tempo de sua prisão. “No caso, não parece aceitável manter a custódia cautelar do paciente, que já ultrapassa um ano, sem que a defesa tenha dado causa a essa demora indiscutivelmente excessiva”, observou. (…)

“Não é possível, sob a sua orientação, dilatar excessivamente o prazo para sentenciar, sem que tal seja imputável ao denunciado, máxime após a superveniência do inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal, oriunda da EC 45/05, que preconiza, como garantia fundamental, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”, acrescentou o ministro. “Pelo exposto, concedo a ordem impetrada, por força da excessiva e injustificada demora na prolação da sentença, que não pode ser atribuída à defesa”, concluiu o ministro Arnaldo Esteves Lima.”


24. Verifica-se, no caso sub examine, que estando o Paciente preso preventivamente há muito mais tempo do que determina a legislação processual penal, há o expresso descumprimento do prazo legal para o encerramento da instrução criminal, caracterizando-se, assim, intolerável constrangimento ilegal, que enseja a imediata revogação da custódia cautelar, com a conseqüente expedição de Alvará de Soltura em favor do Paciente, o que, certamente, será observado e concedido por Vossas Excelências, por ser medida de justiça.

25. Portanto, não há qualquer razoabilidade para que se possa manter a prisão preventiva do Paciente, que está preso há mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias, nas instalações da carceragem do Ponto Zero, localizada no subúrbio de Campo Grande, Rio de Janeiro/RJ, sem que até o presente momento, sequer, tenha se encerrado a instrução criminal, vez que ainda resta a oitiva da última testemunha de acusação, a única que ainda não foi ouvida, tratando-se a mesma de Delegado de Polícia Federal, ou seja, pela honrosa função que exerce, obviamente, cuida-se de testemunha rigorosamente insusceptível de qualquer espécie de coação ou influência malévola.

26. Ademais, no presente caso, não existe qualquer justificativa plausível que permita a manutenção da prisão preventiva do Paciente, bem como que se admita a extrapolação do prazo legal para o término da instrução criminal, aqui INTOLERÁVEL, pois, não se vislumbra sequer o encerramento da instrução criminal, vez que até a presente data, consoante acima descrito, apenas sete das oito testemunhas de acusação prestaram depoimento em Juízo, sendo que cumpre esclarecer que a única testemunha de acusação que ainda não foi ouvida, acima especificada, muito embora tenha sido devidamente intimado para a realização daquele ato processual, simplesmente, não compareceu em Juízo na data designada para seu depoimento, fato este que acarretou ainda mais prejuízos de ordem processual ao Paciente.

27. A prisão preventiva tem caráter excepcional, é medida extrema que implica sacrifício à liberdade individual, concebida com cautela à luz do princípio constitucional da inocência presumida e deve fundar-se em razões objetivas, demonstrativas da existência de motivos concretos susceptíveis de outorgar sua imposição, requisitos estes que, comprovadamente, não se encontram presentes no caso em pauta, caracterizando-se, destarte, uma flagrante violação ao consagrado e basilar direito constitucional de ir e vir do Paciente, já que o mesmo se encontra custodiado, repita-se, há mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias, ou seja, o dobro do prazo legalmente previsto para o encerramento da instrução criminal.

28. No caso vertente, não foram ao menos preenchidos os requisitos legais necessários à decretação / manutenção da prisão preventiva do Paciente, previstos no artigo 312 do Diploma Processual Penal, ferindo-se, dessa forma, o basilar princípio constitucional da presunção da inocência, consubstanciado no artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal e no tratado de Direito Internacional denominado Pacto / Convenção de San José da Costa Rica, da qual o nosso país é membro signatário, bem com o direito constitucional de ir e vir.

29. Para que seja decretada a prisão preventiva de qualquer indivíduo, se exige concreta motivação, com base em fatos que efetivamente justifiquem a excepcionalidade da medida, atendendo-se aos termos do artigo 312 do CPP e da jurisprudência dominante, o que, jamais ocorreu no caso em tela, uma vez que o decreto de prisão preventiva foi, demasiadamente, evasivo e sem qualquer fundamentação.

30. O r. despacho que decretou a prisão preventiva do Paciente, absolutamente, não se ateve aos exigíveis e imprescindíveis requisitos legais, previstos no artigo 312 do Diploma Processual Penal, que determina, expressamente, que apenas deverá ser decretada e mantida a prisão preventiva do acusado que esteja agredindo a ordem pública ou ordem econômica, impedindo a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, o que não é, em absoluto, o que se verifica no caso em pauta.

31. Primeiramente, no que se refere aos pressupostos atinentes à ordem pública e econômica, esclareça-se que a simples repercussão do fato, por maior que seja, não se constitui legalmente em motivo suficiente para a decretação da custódia, vez que se torna justificável apenas se o acusado é dotado de periculosidade, na perseverança da prática delituosa, o que, absolutamente, não se aplica in casu, vez que o Paciente é, comprovadamente, pessoa de conduta pacífica e ilibada, sem nenhum antecedente criminal de qualquer espécie, de ótimos antecedentes, honesto, trabalhador e pai de família e filhos bem criados, inclusive um deles se trata de um bebê de 20 (vinte) meses de vida, que durante toda sua vida, sempre pautou-se e orientou-se pela mais inabalável conduta ética e moral.


32. Já com relação a outro pressuposto que viabilizaria a decretação da prisão preventiva, a conveniência da instrução criminal, também não restou devidamente demonstrada sua existência pelo MM. Juízo da 5ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro/RJ, em sua equivocada r. decisão, uma vez que, em nenhum momento, o Paciente ameaçou testemunhas, esboçou qualquer reação no sentido de ocultar ou eliminar provas documentais, até porque, todas as pretensas provas já foram apreendidas quando da arbitrária e ilegal Busca e Apreensão realizada, de forma truculenta, e sem a mínima discrição, no interior do escritório de advocacia de titularidade do Paciente, localizado em São Paulo.

33. Ademais, ao MM. Juízo cabe sempre demonstrar “in concreto” porque o indiciado ou acusado necessita ficar confinado à prisão antes de uma eventual sentença condenatória, violando-se, pois, o princípio constitucional da presunção da inocência, fato este, que simplesmente foi ignorado no caso sub judice.

34. Finalmente, cabe discorrer sobre o derradeiro pressuposto de decretação de prisão preventiva, que é o da garantia da possibilidade da aplicação da lei penal, pressuposto este, que assim como os demais necessários à decretação da prisão preventiva, também não foi demonstrado e comprovado pelo r. decreto prisional.

35. Neste diapasão, ressalte-se que o supramencionado pressuposto, deve aplicar-se com a finalidade de impedir o desaparecimento do autor da infração, que pretenda se subtrair aos efeitos de eventual condenação, fato este, que nem de longe ocorrera, pois, até antes da decretação de sua prisão preventiva, o Paciente já se encontrava preso temporariamente. Ademais, seguramente, não há nos autos qualquer indício de que o Paciente, se solto, possa eventualmente vir a delinqüir, pois, se cuida de pessoa sem qualquer antecedente criminal.

36. Acrescente-se que além do não preenchimento de qualquer dos requisitos legais imprescindíveis à decretação e manutenção da prisão preventiva do Paciente, o mesmo, comprovadamente, possui profissão, residência e domicilio fixos na capital paulista, possuindo, outrossim, excelentes antecedentes, vez que em toda sua vida sempre pautou-se pela mais ilibada e inabalável conduta ética e moral, pois, cuida-se de renomado intelectual, possuidor de enorme prestígio no âmbito jurídico e entre seus pares, profissional de raro brilhantismo, além de ser exemplar e zeloso pai de família, que sempre se orientou por bem criar seus três filhos, um deles, de apenas 20 (vinte) meses de idade, como comprova a inclusa certidão de nascimento (doc. fls.).

37. Neste sentido, insta salientar que além de todas as ilegalidades acima apontadas, que circundam a custódia cautelar do Paciente, imprescindível se faz trazer à baila as disposições legais contidas na Carta Magna, a seguir transcritas, ipsis verbis, que preceituam o direito à liberdade e à presunção da inocência:

“Art. 5º, XV, CF – É livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”.

“Art. 5º, LVII, CF – Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.”

38. Corroborando com o elementar direito de ir e vir, garantia constitucional à liberdade, bem como com o consagrado princípio da presunção da inocência acima abordados, é de rigor recordar que o Brasil é signatário do pacto de San José da Costa Rica, tratado este que consiste em uma importantíssima convenção internacional que dispõe sobre Direitos Humanos, sendo certo que uma das garantias outorgadas aos acusados em processo penal, consubstanciada no item 2 de seu artigo 8º, estabelece que:

“toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa (…)”

39. Logo, data maxima vênia, no caso sub judice, não existe qualquer embasamento em situações concretas aptas à manutenção da prisão preventiva do Paciente, tampouco qualquer razoabilidade que justifique o exorbitante excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal da ação penal através da qual o Paciente está sendo injustamente processado, uma vez que se encontra encarcerado há mais 160 (CENTO E SESSENTA) dias.

40. Diante das ilegalidades ora esposadas, tem-se, pois, que o Paciente está cumprindo pena antecipada, sendo certo que o mesmo sequer foi julgado nos autos da Ação Penal na qual figura como Réu, fato este que gera ainda mais sofrimento que o próprio cumprimento de uma pena legalmente imposta, pois, neste caso, sabe-se a data do término do cumprimento da medida restritiva de liberdade.

41. Por oportuno, imprescindível salientar que o já muito longo excesso de prazo da custódia legal do Paciente, em nenhum momento foi provocado pela defesa do mesmo, que em tempo algum procrastinou, de qualquer forma, o andamento e o regular deslinde do supramencionado feito processual, através de pedidos de adiamento, ou prorrogação de quaisquer atos processuais. Portanto, não existindo nos autos qualquer notícia no sentido de que a defesa do Paciente tenha contribuído para o retardamento do feito, deve ser prontamente expedido o competente Alvará de Soltura em favor de Newton José de Oliveira Neves.


42. A respeito deste tema, vale trazermos à colação jurisprudências do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, que se posicionaram no sentido de que não é possível manter-se um Réu encarcerado preventivamente há mais tempo do que determina a legislação vigente para o encerramento da instrução criminal, quando o mesmo não contribuiu para o retardamento dos atos processuais. Vejamos:

“Instrução criminal. Excesso de prazo sem qualquer contribuição do Paciente. Permanência do mesmo no cárcere. Impossibilidade. Se não houver contribuição por parte do Paciente, não podendo ser-lhe atribuída qualquer culpa pela demora na tramitação do processo, é impossível mantê-lo encarcerado, pelo excesso de prazo na formação da culpa.” (TACRIM, HC n° 268.432, j. 07/12/94 – Rel. Vico Mañas – 9ª Câmara). (grifos nossos)

“Habeas Corpus. Processo Penal. Excesso de prazo. Constrangimento ilegal. O prazo para encerramento da instrução criminal conta-se separadamente. Precedentes. A demora na formação da culpa, excedendo os 81 dias, sem motivo dado pela defesa, caracteriza constrangimento ilegal. Habeas deferido.” (JSTF 268/285) (grifos nossos)

“Comprovado o excesso de prazo ensejador da impetração e restando claro que a defesa em nada contribuiu para o injustificável atraso, há que ser concedido o benefício requerido”. (RSTJ 19/223-4) (grifos nossos)

“Todos os acusados guardam o direito à finalização do procedimento dentro de prazo razoável, não podendo esperar presos que a instrução criminal termine, em tempo indefinido, com vistas ao devido processo legal.” (TACRIM-SP – RJDTACRIM 18/157 – Rel. Sérgio Pitombo). (grifos nossos)

43. Outrossim, não pode ser cogitado por Vossas Excelências qualquer pretenso argumento de que o excesso de prazo, latente no caso em espécie, ocorreu diante da quantidade de Réus existentes no processo originário (11 – onze), bem como da suposta complexidade da causa, uma vez que o Estado – Juiz deve conduzir o processo penal dentro das normas legais vigentes. Ademais, absolutamente nada, ou qualquer hipótese plausível, justifica manter a prisão do Paciente a esta altura, por mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias, já que o que está em discussão é o direito de ir e vir do Paciente, o que, certamente, deverá ser reconhecido por este Excelso Tribunal.

44. O excesso de prazo da prisão preventiva do Paciente está plenamente caracterizado, posto que, ultrapassados, em muito, injustificadamente, os 81 (oitenta e um) dias fixados em lei, ou mesmo 96 (noventa e seis) dias, prazo este aplicável a delitos ocorridos na esfera da Justiça Federal, sem sequer ter-se completado a oitiva das testemunhas de acusação, nos autos da referida Ação Penal através da qual o Paciente está sendo indevidamente acusado pela suposta prática dos delitos elencados na denúncia ministerial, ofertada há quase meio ano.

45. Insta salientar que é dever do Estado ter a competência necessária para processar e julgar qualquer cidadão dentro do prazo que a legislação fixa. Qualquer excesso de prazo, que se dê por qualquer motivo, quando o acusado encontrar-se preso, deve ser considerado constrangimento ilegal, uma vez que fere o direito constitucional de ir e vir do Paciente se vê flagrantemente violado, pois o mesmo não está sendo processado dentro do limite temporal que a legislação impõe, violação legal esta que consiste em inaceitável pré-julgamento e cumprimento antecipado de pena, já que absolutamente nada justifica a vultosa extrapolação do prazo legal para o encerramento da instrução criminal.

46. O intolerável constrangimento ilegal a que está submetido o Paciente deve ser imediatamente cessado, posto que seu bem maior, a liberdade, está a sofrer injustificável restrição. Neste sentido é o venerando acórdão proferido pela 6ª Turma do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, em que foi concedida a ordem de Habeas Corpus, para restaurar a liberdade do Paciente, adotando o entendimento pretoriano e legal que fixou o prazo máximo de 81 (oitenta e um) dias para o término da instrução criminal, abaixo transcrito:

“PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL. PRISÃO PROCESSUAL. DEMORA NO JULGAMENTO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. A jurisprudência pretoriana, interpretando sistematicamente as normas que informam o processo penal pertinentes ao sumário de culpa, construiu o entendimento de que, estando o Réu preso, deve a instrução criminal ser encerrada no prazo máximo de 81 dias, configurando o constrangimento ilegal o excesso de prazo, susceptível de correção por via de habeas-corpus. Mesmo com o encerramento do sumário, perdura o constrangimento ilegal se ocorre injustificável demora no julgamento do feito, estando os Réus submetidos à prisão processual. Habeas-corpus concedido”. (HC 8371/RJ – 1998/0098832-7 – DJ 20.09.1999 – Relator para acórdão Ministro Vicente Leal – 6ª Turma) (grifos nossos).


47. Vale ainda transcrevermos outros julgados, que coadunam com o entendimento até aqui esposado:

“Prisão preventiva – Excepcionalidade. A prisão preventiva, porque conflita com a garantia constitucional da não-culpabilidade, revela-se como exceção, somente podendo ser implementada em situações extremas, observados os requisitos legais próprios – artigos 5°, inciso LVII, da Constituição Federal e 312 e 313 do Código de Processo Penal. Prisão Preventiva. Excesso de Prazo. Impõe-se a concessão de liminar e, posteriormente, da ordem – artigo 648, inciso II, do Código de Processo Penal – Uma vez configurado o excesso de prazo, consideradas as dilações previstas na legislação instrumental para o processo encontrar-se sentenciado.” (STF; HC 80679; Rel. Min. Marco Aurélio; DJ 29/08/2003) (grifos nossos)

“Instrução Criminal – Excesso de prazo – Superação do lapso de 81 dias para encerramento da fase instrutória – Constrangimento ilegal – Ocorrência – Ocorre constrangimento ilegal na manutenção do Réu preso quando ultrapassado o lapso de 81 dias, que a jurisprudência passou a ter como o fixador do termo da instrução criminal e que a própria legislação, depois, passou a considerar como o adequado a tanto, conforme se nota à leitura do artigo 8° da Lei n 9.034/95” (RJTACRIM 48/329) (grifos nossos)

“HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRELIMINAR DE PREVENÇÃO REJEITADA. EXCESSO DE PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA. INJUSTIFICADA DELONGA NA INSTRUÇÃO CRIMINAL. DELITO FINANCEIRO.

– Habeas Corpus impetrado objetivando o relaxamento da prisão preventiva do Paciente, sob a alegação de ter sido ultrapassado o prazo de 81 dias previsto para a conclusão da instrução criminal.

– Preliminar de prevenção da 6ª Turma rejeitada, por unanimidade, nos termos do que dispõe o Regimento Interno deste Tribunal, a teor do artigo 16, § § 1° e 2°.

– Qualquer excesso de prazo, que se dê por qualquer motivo, está violando o direito da parte, pouco importando a gravidade ou natureza do delito.

– Preliminar de prevenção rejeitada, por unanimidade.

– Ordem concedida, por maioria.” (TRF 2ª Reg.; HC n° 2003.02.01.004314-4; Rel. Des. Maria Helena Cisne) (grifos nossos)

“Réu preso – Excesso de prazo no encerramento da instrução criminal – demora injustificada e abusiva – Inadmissibilidade – Garantia Constitucional do devido processo legal – Inteligência do artigo 5°, LIV, da CF.

– Em decorrência da garantia constitucional do devido processo legal (artigo 5°, LIV, da CF), todo acusado tem direito à finalização do processo criminal dentro dos prazos previstos na lei processual ou em tempo razoável, não se tolerando demora injustificável e abusiva por inércia de órgão do Estado-Administração. Tratando-se de Réu preso, o encerramento do processo comum deveria ocorrer em 81 dias, a partir da prisão do agente, tomando por base a seqüência das atividades processuais.” (TACRIM – 10ª Câm. Criminal; HC n° 276.240/7-SP; REL. Juiz Márcio Bártoli; j. 16.08.1995; v.u) (grifos nossos)

“Constrangimento ilegal – Ocorrência – Ação Penal – Extravasamento do somatório dos prazos alusivos à instrução e prolação de sentença – Desnecessidade de perquirir a origem da demora – Direito do acusado aguardar o julgamento em liberdade. (…) Surgindo dos autos extravasamento do somatório dos prazos alusivos à instrução e prolação de sentença na ação penal, cumpre, sem perquirir-se a origem da demora, concluir pela ocorrência de ato ilegal de constrangimento, assegurando-se ao acusado, simples acusado até então, o direito de aguardar o julgamento em liberdade.” (RT 780/535 e JSTF 265/361) (grifos nossos)

“HABEAS CORPUS – Instrução Criminal. Excesso de prazo. Constrangimento ilegal. Paciente preso há mais de 81 dias sem que a instrução tenha sido iniciada. Inexistência de qualquer notícia no sentido de que a defesa tenha contribuído para o retardamento do feito. Alegação de que a defesa não instruiu o pedido com documentos que pudessem evidenciar a data da prisão do Paciente; e, por outro lado, nas informações prestadas pela autoridade coatora, bem como nas cópias juntadas, também nada foi apresentado no sentido de se concluir com certeza, qual teria sido a data da prisão do Paciente. Eventuais problemas de ordem administrativa não devem ser debitados ao Paciente. Constrangimento ilegal manifesto sofrido pelo Paciente. Concessão da ordem de habeas corpus, expedindo-se em favor do Paciente o competente alvará de soltura clausulado.” (TACRIM – 10ª Câm. Criminal; HC n° 381818/4-SP; Rel. Juiz Ary Casagrande; j. 28.03.2001; v.u.). (grifos nossos).

48. A manutenção da prisão preventiva do Paciente não encontra paralelo nos caminhos do direito, ou mesmo da mínima razoabilidade, senão naqueles escaninhos de irremediável perda para o nosso sistema de leis, que sucumbe ante a transparência e indiscutível força de dispositivo legal, que é claro ao mencionar que a instrução criminal deve findar-se em 81 (oitenta e um) dias, ou mesmo 96 (noventa e seis) dias, para delitos de competência da Justiça Federal, quando o acusado estiver preso, não sendo admissível a manutenção da custódia cautelar por quase o dobro do prazo legal, sem que se tenha culpa formada, como injustificadamente ocorre no caso vertente, pois, desta forma, tem-se um abusivo e arbitrário cumprimento antecipado de pena, fato este que não pode ser mantido por Vossas Excelências, sob pena de, em assim não sendo, estarmos aviltando frontalmente os ordenamentos legais que alicerçam o Estado Democrático de Direito.


49. Cultos Ministros, o que está em discussão é o direito de ir e vir, a liberdade do Paciente, bem maior que integra a sua cidadania, a cuja tutela esta Excelsa Corte Suprema não pode dar as costas, sendo de rigor, e solução inafastável, a expedição de Alvará de Soltura em favor do Paciente, tendo em vista o manifesto constrangimento ilegal a que está sendo submetido, desde a decretação de sua prisão temporária, que foi convertida em prisão preventiva, tendo em vista o excesso de prazo para encerramento da instrução criminal, sendo certo que até a presente data sequer se encerrou a oitiva das testemunhas de acusação, como acima ilustrado.

50. Em assim agindo, Vossas Excelências estarão zelando e cumprindo a determinação contida em nosso ordenamento jurídico, que prevê que a instrução criminal, quando o acusado estiver preso, como é o caso dos autos, deve findar-se em 81 (oitenta e um) dias, ou até mesmo em 96 (noventa e seis) dias, para crimes apurados na Justiça Federal, sob pena de ferir-se o Princípio da Legalidade e do Devido Processo Legal, consolidado na Carta Magna de 1988, não abrindo qualquer margem de discussão a interpretações de dilação do referido prazo processual penal, muito menos sob o infundado argumento de suposta complexidade da causa, o que seguramente não se verifica no caso vertente.

DA VERDADEIRA TORTURA PSICOLÓGICA QUE VEM SENDO DURAMENTE SUPORTADA PELO PACIENTE

51. Como acima explanado, o Paciente se encontra custodiado, preventivamente, há mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias, ou seja, há mais de 05 (cinco) meses, portanto, o dobro do prazo legal para o encerramento da instrução criminal, consubstanciado no artigo 8° da Lei n° 9.034/95, ilegalidade esta que caracteriza uma verdadeira tortura psicológica contra o Paciente, mostrando-se a custódia de exceção como uma efetiva prisão por tempo indeterminado, vez que o Paciente não tem conhecimento de quando estará em liberdade, já que os prazos legais, reiteradamente, não vêm sendo obedecidos no caso vertente.

52. Neste particular, insta salientar, a título exemplificativo, que uma pessoa condenada pela Justiça, com sentença transitada em julgado, ao contrário do Paciente, ao menos sabe a quantidade de pena que lhe foi imposta, ou seja, sabe, exatamente, quanto tempo ficará detido e quando se encerrará a sua execução penal, além de fazer jus a diversos direitos e benefícios legais que são outorgados aos condenados pela Justiça, tais como, progressão do regime prisional, indultos de Natal, remissão da pena pelo trabalho, redução da pena pelo bom comportamento, dentre diversos outros, fato que, em tese, outorga aos “condenados”, uma posição e expectativa bem mais humana e justa que a outorgada ao ora Paciente.

53. Por outro lado, o Paciente, que está cumprindo prisão preventiva há mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias, fora do distrito da suposta culpa, e em local incondizente com sua prerrogativa de classe, anomalia esta que será analisada no corpo deste mandamus, mais adiante, não possui nenhum dos beneplácitos legais acima elencados, fato este que se constitui em verdadeira e nefasta tortura psicológica, veementemente, condenada e combatida por Comissões de Defesa aos Direitos Humanos, bem como pela Carta Magna e pelo Pacto / Convenção Internacional de San José da Costa Rica, do qual o nosso país é membro signatário, já que o Paciente sequer teve sua culpa reconhecida judicialmente, por sentença condenatória, transitada em julgado, caracterizando, destarte, a sua custódia cautelar, em verdadeiro cumprimento antecipado de pena, que jamais lhe foi imposta, e sem que lhe sejam concedidos os mesmos direitos e benefícios legais que são outorgados aos condenados pela Justiça Pública.

54. Portanto, Cultos Ministros, conclui-se que as violações aos direitos do Paciente, acima apontadas, não podem passar despercebidas ao crivo destes Insignes Ministros, pois há de se analisar o aspecto humanitário da questão, já que o Paciente, homem pacífico e de boa índole, pai de família exemplar e sem qualquer antecedente criminal, com profissão definida, gerando inúmeros empregos e o sustento de diversas famílias, direta e indiretamente, com residência e domicílio fixo, conforme faz prova a documentação anexa (doc. fls.), está sendo cruelmente torturado psicologicamente, violência está que deverá ser repelida por este Excelso Tribunal.

DA FLAGRANTE ILEGALIDADE OCASIONADA PELO FATO DE ESTAR O PACIENTE CUSTODIADO EM LOCAL INCONDIZENTE COM A SUA PRERROGATIVA DE CLASSE PROFISSIONAL ENCARTADA NA LEI FEDERAL Nº 8.906/94 – ESTATUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL

55. Apenas a guisa de argumentação, na remota hipótese de Vossas Excelências não reconhecerem, liminarmente, a flagrante ilegalidade acima demonstrada, qual seja; o exorbitante excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal da ação penal através da qual o Paciente vem sendo processado, e principalmente o fato de que o mesmo se encontra custodiado há mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias, ou seja, o dobro do prazo legalmente estabelecido, caracterizando um intolerável constrangimento ilegal e violação ao direito de ir e vir do Paciente, curial elucidar as condições precárias e deploráveis em que se encontra preso o Paciente, absolutamente incondizentes com sua prerrogativa profissional de advogado, consubstanciada na Lei Federal Especial inerente ao Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, a seguir esposado, fato este que, assim como o excesso de prazo na custódia do Paciente, também consiste em uma evidente violação legal. Vejamos, cultos Ministros:


56. Esclareça-se, de plano, que o local onde se encontra o Paciente custodiado no momento, denominado Ponto Zero, Rio de Janeiro/RJ, famigerado presídio, não condiz com as prerrogativas conferidas aos advogados militantes, como é o caso do Paciente, pela Lei Federal vigente, ou seja, custódia em Sala Especial de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela OAB, consoante expressamente disposto no art.7º, inc. V da Lei nº 8.906/94, DISPOSITIVO LEGAL EM PLENA VIGÊNCIA, razão pela qual o Paciente deverá, prontamente, ser removido, por Vossas Excelências, à Sala Especial de Estado Maior.

57. A prisão do Paciente, além de não atender as exigências encartadas na Lei que regula as prerrogativas legais dos advogados, cumpre salientar que a aludida carceragem do Ponto Zero cuida-se de local inadequado, vez que suas dependências se encontram em estado degradante, tratando-se de estabelecimento velho e em decomposição, construído há cerca de 80 (oitenta) anos, não oferecendo ao Paciente as condições mínimas à que faz jus, pois, não proporciona elementos que possibilitem a manutenção de saúde, higiene pessoal e dignidade humana, e ainda, o mesmo encontra-se seriamente adoecido.

58. Em razão destes fatos, o Paciente vem sendo mantido à base de remédios fortíssimos, tendo sido acometido de dores de cabeça constantes, encontrando-se em permanente estado de profunda depressão, além de ter que se submeter, por normas deste presídio, diuturnamente, às tarefas de limpeza de fossas e latrinas de outros presos e outras dependências do aludido estabelecimento prisional, sendo certo que, atualmente, o Paciente tornou-se um vulnerável e doente, sendo que sequer possui cela individual, como determina a legislação vigente e suas prerrogativas legais, estando obrigado a compartilhar o cubículo em que sobrevive com outros custodiados (doc. fls. – atestados médicos e diagnósticos inclusos).

59. Verifica-se, pois, no caso vertente, que o Paciente se encontra exposto as mais absolutas violações à dignidade humana, sem falarmos de sua prerrogativa profissional violada, visto que o local inadequado, onde se encontra injustamente detido, e, repita-se, dividindo, inclusive, cela com outros detentos, não apresenta qualquer condição de manutenção de higiene pessoal, ou conforto mínimo, condizentes com o princípio da dignidade humana previsto na Lei Federal acima enunciada (Estatuto da Advocacia).

60. Neste diapasão, oportuno se faz elucidar que a dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que traz consigo a pretensão de respeito perante a sociedade, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo Estatuto Jurídico deve assegurar, o que, equivocadamente, não vem sendo observado no caso em pauta, pois como acima ilustrado, o Paciente foi lançado em um estabelecimento prisional precário, fato este, que por si só, beira as raias do absurdo, violando-se assim, além do princípio da dignidade humana e dos diversos princípios constitucionais que naturalmente a ele se estendem, as normas legais consubstanciadas Lei Federal nº 8.906/94, Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, em seu artigo 7º, inciso V.

61. Curial afirmar que, além do Paciente sequer ter sido julgado, e encontrar-se indevidamente detido em caráter preventivo há mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias, o mesmo vem recebendo tratamento indigno, pois, a prisão preventiva a ele judicialmente imposta, por suposto implica na subtração de seu inquestionável direito à dignidade e à presunção da inocência e do direito de ir e vir, que foi relegado ao esquecimento, pois o Paciente é advogado com elevado grau de instrução, professor de direito e pessoa que sempre se orientou e pautou pela mais ilibada moral, ética e correção, permanecendo encarcerado em condições subumanas e dividindo cela, fatos estes, que evidenciam expressa afronta aos fundamentos elementares que regem o Estado Democrático de Direito Brasileiro, que, certamente, será sanado por este Excelso Tribunal.

DA INAPLICABILIDADE, AO CASO VERTENTE, DA LEI N° 10.258/01, QUE ALTEROU O ARTIGO 295 DO CPP, POR NÃO TER O CONDÃO DE MODIFICAR A LEGISLAÇÃO ESPECIAL DESTINADA AOS ADVOGADOS – ESTATUTO DA OAB.

62. Aprioristicamente, curial afirmar que a Lei n° 10.258/01, que deu nova redação ao artigo 295 do Diploma Processual Penal, em nada modificou a situação dos advogados, como é o caso do ora Paciente, que são regidos por norma de natureza especial a eles destinada, qual seja, Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, Lei n° 8.906/94. Vejamos:

63. A aludida Lei n° 10.258/01, que deu nova disposição ao supramencionado artigo 295 do Código de Processo Penal acrescentou o parágrafo primeiro, que assim estabelece:

“Artigo 295 – Serão recolhidos a quartéis ou a prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão antes da condenação definitiva:

(…)

§ 1° – A prisão especial, prevista neste código ou em outras leis, consiste exclusivamente no recolhimento em local distinto da prisão comum.

(…)”


64. No que tange ao supramencionado parágrafo primeiro do artigo 295 do CPP, insta salientar que a interpretação de que o direito subjetivo do Advogado e, bem assim, o de qualquer outro preso especial, circunscreve-se à garantia do recolhimento em local distinto da prisão comum, se constitui em crasso erro de direito e manifesto equívoco de interpretação do Diploma Legal, visto que o Paciente não pode ser equiparado a um preso especial, ou seja, possuidor apenas de diploma universitário, uma vez que na realidade, o Paciente é advogado, devidamente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, possuindo prerrogativas de classe inerentes à honrosa profissão que exerce, outorgadas pela já ilustrada Lei Federal n° 8.096/94, que não pode ser desrespeitada, em hipótese alguma.

65. Não se trata o Paciente de mero preso especial, mas sim, de advogado militante e regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, portanto, deve ser respeitado o Estatuto da OAB, Lei Federal Especial, que se sobrepõe às normas apostas no Diploma Processual Penal (art. 295), lei ordinária esta de caráter apenas genérico, absolutamente inaplicável ao advogado militante, como o Paciente. Por sua vez, a aludida Lei Federal – Estatuto da OAB – determina que os advogados custodiados, devem permanecer recolhidos em Sala Especial de Estado Maior, e, na sua ausência, em prisão domiciliar, o que não vem sendo respeitado no caso em pauta.

66. A Lei Federal nº 8.906/94 (Estatuto da OAB) ora em comento deve ser aplicada, pois é clara e vigente, sob pena de não o fazendo, se praticar um intolerável abuso de poder e ilegalidades insustentáveis no Estado Democrático de Direito, consagrado pela Constituição Federal de 1988, por ser Lei especial em plena vigência, portanto, se sobrepõe à Lei genérica, sob pena de assim não sendo, estarmos retroagindo a uma tenebrosa e não mais admissível fase de supressão de direitos, constitucionalmente, conferidos e intolerável arbítrio estatal.

67. Importante trazermos à colação a lição do processualista Guilherme de Souza Nucci, in Código de Processo Penal Comentado, p. 537/538, que em comentários ao artigo 295, CPP, item 45, assim se manifestou:

“Prisão do advogado e outros profissionais: todas as categorias que fizerem expressa referência à sala de Estado-Maior das Forças Armadas, em leis específicas para reger a carreira ou profissão, como é o caso dos advogados, desprezando-se a prisão especial, porque criada outra modalidade, mais especial ainda, permanecem com seu direito intocável. A modificação legislativa, trazida pela Lei n° 10.258/01, alterou somente a parte referente à prisão especial e não outras espécies, previstas em leis especiais, que já não tinham essa denominação. Eis o disposto na Lei n° 8.906/94 (Estatuto da Advocacia), no art. 7° : “são direitos do advogado: V – não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em Sala de Estado-Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela OAB, e, na sua falta, em prisão domiciliar.” (grifos nossos)

68. A respeito deste tema, e corroborando no mesmo sentido, imprescindível se faz trazer à colação recente julgamento realizado por esta Corte Maior de Justiça, que em habeas corpus análogo, de relatoria do eminente jurista Ministro Carlos Velloso, assim se posicionou:

“Habeas Corpus. Advogado. Prisão provisória. Sala de Estado-Maior. Prerrogativa de Classe. Recolhimento em Distrito Policial. Cela que não atende a requisitos legais. Situação demonstrada por documentos e reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça em outro processo. Dilação probatória. Desnecessidade. Prisão domiciliar deferida.

1 Habeas Corpus impetrado contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça que, em reclamação, rejeitou o argumento de inobservância da ordem deferida no HC 15.873-STJ em favor do Paciente, advogado, a fim de que fosse transferido para local condizente com as prerrogativas legais da classe. Alegação de simples deslocamento de um distrito policial para outro, mantidas as condições incompatíveis com a prisão especial garantida por lei.

2 Bacharel em direito, regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil. Lei 8.906/94, artigo 7°, inciso V. Recolhimento em sala de Estado-Maior, até o transito em julgado de sentença penal condenatória. Direito público subjetivo, decorrente de prerrogativa profissional, que não admite negativa do Estado, sob pena de deferimento de prisão domiciliar.

3 Incompatibilidade do estabelecimento prisional em que recolhido o paciente, demonstrada documentalmente pela Ordem dos Advogados do Brasil – SP e reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça no HC 16056. Necessidade de dilação probatória para o deferimento do writ. Alegação improcedente. Ordem deferida para assegurar ao paciente seu recolhimento em prisão domiciliar.” (HC nº 81.632-1/SP – j. 20/08/2002, 2ª Turma do STF – Rel. Min. Carlos Velloso – DJ – 21.03.03).


69. No bojo do supramencionado mandamus, oportuno se faz transcrever, ipsis verbis, trechos do voto do culto Ministro Maurício Corrêa da Segunda Turma deste Excelso Supremo Tribunal Federal, que reconhece ser assegurado ao advogado o direito a recolher-se em Sala Especial de Estado Maior, não em simples prisão especial, conforme determinado pelo artigo 295 do Diploma Processual Penal, senão vejamos:

“(…) Destaque-se, de início, que ao advogado – entenda-se aí o bacharel em direito inscrito na OAB – é assegurado o recolhimento em sala de Estado-Maior e não em simples prisão especial destinada aos portadores de diploma de curso superior, por exemplo. Tal diferenciação há muito tempo vem sendo reconhecida por esta Corte, que no julgamento do HC 34191-SP, Edgar Costa, j. 07/06/56, consignou, verbis:

“EMENTA: Ao bacharel em direito, como diplomado por faculdade de curso superior, aplica-se o disposto no artigo 295 do Código de Processo Penal. Somente o advogado regularmente inscrito tem direito a ser recolhido, quando preso, em sala especial de Estado-Maior.”

Segundo o consagrado Julio Fabrini Mirabete, “a prisão provisória de advogado em sala de Estado-Maior é prerrogativa da classe, diante do art. 7º, V, da Lei nº 8.906/94 (estatuto da OAB), não se confundindo com a prisão especial que é direito dos diplomados em curso superior”. E por aí se vê que a simples alegação de que o 13º Distrito Policial tem “natureza especial, pelas condições materiais, categoria de portadores de curso universitário” não é suficiente para assegurar o direito extraordinário do paciente.

A propósito, observo que a Lei 10.258/01, que alterou o artigo 295 do Código de Processo Penal, em nada modificou a situação dos advogados, que são regidos por norma de natureza especial (CP, artigo 12 e LICC, artigo 2º, § 2º)

(…)”

70. Conforme acima mencionado, é o Paciente advogado regularmente inscrito na OAB/SP, tendo o incontestável direito de apenas ser recolhido preso em Sala Especial de Estado Maior, assim reconhecida pela OAB, conforme prescreve o artigo 7º, V, da Lei 8.906/94, abaixo transcrito:

“V – não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela OAB, e, na sua falta, em prisão domiciliar;” (grifos nossos).

71. Somente pode-se concluir que o Paciente tem o direito, por prerrogativa profissional, de ser recolhido à Sala Especial de Estado Maior, assim reconhecida pela Ordem dos Advogados do Brasil, sendo que, na falta desta, o que certamente é o caso, pois, como é de conhecimento de Vossas Excelências, não há sala de Estado Maior nos Estados do Rio de Janeiro e São Paulo e em nenhum outro Estado da Federação, como já se posicionou expressamente este Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, portanto, deverá o Paciente cumprir prisão domiciliar, como determina expressamente a legislação vigente.

72. Neste diapasão, oportuno se faz trazer à colação decisão prolatada pelo Excelso Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do HC nº 16.056/SP, cujo o Paciente, Hanna Gharib, através do qual este Egrégio Tribunal, com costumeiro acerto, em caso análogo ao presente writ, entendeu por bem conceder a ordem ao aludido mandamus, relaxando a prisão do referido Paciente (doc. fls.), em razão de não haver Sala de Estado Maior, considerando ainda, que é uma ilegalidade flagrante alguém ficar preso por mais de 100 (cem) dias, – (no caso sub judice já são 160 dias) – sem culpa formada e que um dia de prisão injusta e ilegal, não pode ser compadecida pela justiça, consoante se denota nos inclusos votos dos Eminentes Ministros Fernando Gonçalves e Vicente Leal. Confira-se o acórdão do mencionado Habeas Corpus, in verbis: (doc. fls.).

“Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, após o voto do Sr. Ministro – Relator concedendo a ordem para deferir a prisão domiciliar, no que foi seguido pelos Srs. Ministros Fontes de Alencar, Vicente Leal e Fernando Gonçalves, e, da concessão de habeas corpus de ofício, pelo voto do Sr. Ministro Fernando Gonçalves para relaxar a prisão do paciente, no que foi acompanhado pelo Sr. Ministro Vicente Leal, e dos votos divergentes dos Srs. Ministros Relator e Fontes de Alencar, por unanimidade, conceder a ordem para deferir a prisão domiciliar e, de ofício, verificado o empate e prevalecendo a decisão mais favorável, conceder a ordem para relaxar a prisão do paciente, expedindo-se, ‘incontinenti’, alvará de soltura. Votaram como Relator os Srs. Ministros Fontes de Alencar, Vicente Leal e Fernando Gonçalves. Votou com o Sr. Ministro Fernando Gonçalves, quanto ao habeas corpus de ofício, o Sr. Ministro Vicente Leal. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo Gallotti.” (grifos nossos) (doc.fls.)


73. Pacífico é o entendimento dos Tribunais da Federação, assim como o desta Corte Maior de Justiça acerca do tema em pauta, qual seja: os inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil somente deverão ser recolhidos a Salas Especiais de Estado Maior, e, na falta destas, como no caso vertente, cumprir prisão domiciliar, senão vejamos:

“PRISÃO ESPECIAL – ADVOGADO – ESTATUTO DA OAB – ARTIGO 7º, “CAPUT”, INCISO V – EXEGESE. A regra da prisão especial para advogados objetiva protegê-los do convívio com presos comuns. A privação da liberdade da advogada em dependência especial do presídio não supre a exigência de prisão especial. Ordem concedida. (STJ – 6ª T.; HC nº 3.158-0-SP; Rel. Min. Vicente Leal; j. (27.03.1995). BAASP, 1943/89-j, de 20/03/1996). (grifos nossos).

“HABEAS CORPUS – ADVOGADO – PRISÃO PROVISÓRIA – SALA DE ESTADO-MAIOR – PRERROGATIVA DE CLASSE – RECOLHIMENTO EM DISTRITO POLICIAL – CELA QUE NÃO ATENDE A REQUISITOS LEGAIS – SITUAÇÃO DEMONSTRADA POR DOCUMENTOS E RECONHECIDA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM OUTRO PROCESSO – DILAÇÃO PROBATÓRIA – DESNECESSIDADE – PRISÃO DOMICILIAR DEFERIDA

– 1 – Habeas corpus impetrado contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça que, em reclamação, rejeitou o argumento de inobservância da ordem deferida no HC nº 15.873-STJ em favor do Paciente, advogado, a fim de que fosse transferido para local condizente com as prerrogativas legais da classe. Alegação de simples deslocamento de um distrito policial para outro, mantidas as condições incompatíveis com a prisão especial garantida por lei. 2 – Bacharel em Direito, regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil. Lei nº 8.906/94, art. 7º, inciso V. Recolhimento em sala de Estado-Maior, até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Direito público subjetivo, decorrente de prerrogativa profissional, que não admite negativa do Estado, sob pena de deferimento de prisão domiciliar. 3 – Incompatibilidade do estabelecimento prisional em que recolhido o Paciente, demonstrada documentalmente pela Ordem dos Advogados do Brasil-SP e reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça no HC nº 16.056. Necessidade de dilação probatória para o deferimento do “writ”. Alegação improcedente. Ordem deferida para assegurar ao Paciente seu recolhimento em prisão domiciliar.” (STF – 2ª T.; HC nº 81.632-1-SP; Rel. Min. Carlos Velloso; j. 20/8/2002; maioria de votos.) (grifos nossos).

“PROCESSUAL PENAL – PRISÃO DOMICILIAR – ADVOGADO – CONDIÇÕES – A concessão de prisão domiciliar a presos com direito a regime especial de prisão, condiciona-se a inexistência de estabelecimento ou local adequado, para seu cumprimento.” (STJ – 5ª T.; Rec. em MS nº 1.230-SP; rel. Min. Flaquer Scartezzini; j. 11.12.1991; maioria de votos; DJU, Seção I, 17.02.1992, p. 1.380, ementa.) BAASP, 1740/131, de 29.04.1992. (grifos nossos).

“ADVOGADO – Direito a recolhimento provisório – Art. 89, V, da Lei nº 4.215/63 (Estatuto da OAB) – Revogação da concessão da prisão domiciliar, anteriormente concedida pela segunda instância, pelo juízo impetrado – Admissibilidade – Art. 4º da Lei nº 5.256/67 – Ordem, todavia, concedida, para restabelecer a prisão especial domiciliar do Paciente, por entender a turma julgadora que o Paciente está preso em estabelecimento inadequado, vez que, sendo advogado, tem direito ao cumprimento de prisão provisória, no Estado-maior e não em sala especial de Estado, prisional comum, ressalvado seu indiscutível direito ao trabalho, ao comparecimento a fóruns, tribunais e repartições públicas, enfim, tudo o que for comprovadamente necessário, e ainda, total privacidade, depois que recolhido a sua residência, no período noturno.” (TJSP – 2ª Câm. de Férias; HC nº 109.704-3/9-SP; Rel. Des. Silva Leme; j. 16/7/1991; v.u.).BAASP, 2200/1731-j, de 26.2.2001. (grifos nossos).

“PRISÃO- ALBERGUE DOMICILIAR – DENUNCIADA, ADVOGADA, RECOLHIDA À CADEIA PÚBLICA – ALEGADO DESRESPEITO AO DISPOSTO NO ART. 295, VII, DO CPP – AUSÊNCIA DE CONDIÇÕES LOCAIS PARA O OFERECIMENTO DE PRISÃO ESPECIAL – INTELIGÊNCIA DO ART. 1º, DA LEI Nº 5.256, DE 06.04.1967 – COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE PRIMEIRA INSTÂNCIA. O art. 295, VII, do CPP, assegura aos que sejam diplomados em escola superior o direito à prisão especial. Não reunindo a Cadeia Pública local condições de atender esse privilégio, a questão deve ser regida pelo art. 1º, da Lei nº 5.256, de 06.04.1967, que prevê a prisão domiciliar. O pedido, contudo, não pode ser dirigido inicialmente ao Tribunal, para que não seja suprimida uma instância”. (TACRIM – 5ª Câm.; HC nº 145.318/0-Angatuba; rel. Juiz Celso Limongi; j. 01.10.1985; v.u.). BAASP 1437/158, de 02.07.1986. (grifos nossos).


“PROCESSUAL PENAL – PRISÃO ESPECIAL – ADVOGADO – CONDENAÇÃO SEM TRÂNSITO EM JULGADO. I. “O advogado goza da prerrogativa de ser recolhido a prisão especial, quando condenado por tráfico de entorpecentes, em sentença ainda não transitada em julgado, por inexistir incompatibilidade legal entre aquela condenação e a concessão do referido benefício. II. Ordem deferida.” (TFR – 1ª T.; HC nº 7.424-SP; rel. Min. Carlos Thibau; j. 06.09.1988; v.u.). BAASP 1573/34 de 15.02.1989. (grifos nossos).

74. Fato é, como acima resta evidentemente comprovado, que definitiva e absolutamente não existe em nenhum Estado brasileiro Sala Especial de Estado Maior, condizente com as prerrogativas asseguradas aos advogados, logo, deverá ao Paciente ser concedido o irrefutável direito ao regime de prisão domiciliar, de acordo com a legislação vigente e com os diversos e pacíficos entendimentos jurisprudenciais neste sentido acima elucidados, bem como com a doutrina pátria.

75. Por oportuno, saliente-se o julgado do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, a seguir transcrito, corroborado pelo entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, também adiante especificado, que afinam no mesmo diapasão, qual seja, não há Sala Especial de Estado Maior no Brasil, portanto, deverá ao Paciente ser concedido o direito ao regime de prisão domiciliar.

“Enquanto não tiver transitada sentença condenatória em julgado, deve o advogado permanecer recolhido em prisão domiciliar, por absoluta inexistência de Sala Especial de Estado Maior. Esse direito, não foi conferido em relação à pessoa, mas sim em homenagem aos interesses públicos que a esses profissionais são confiados, porquanto, inobstante não seja funcionário público na acepção jurídica do termo, o advogado, no exercício de sua atividade privada, presta serviço público, sendo elemento indispensável à administração da Justiça.” (TACRIM / SP – RT 723/5914). No mesmo sentido, STJ: RSTJ 23/1473, 24/133, RT 676/358. (grifos nossos).

76. Diante da esmagadora jurisprudência, doutrina e legislação acima explanadas, resta límpido e cristalino, que o Paciente vem sendo submetido a uma ilegalidade latente, sendo brutalmente violentado e tendo degradadas sua dignidade e saúde física e mental, fatos estes, que não mais poderão ser tolerados e que, certamente, serão repelidos e reparados por este Egrégio Supremo Tribunal Federal.

77. Neste particular, sobreleva ressaltar, que em matéria jornalística veiculada pela conceituada revista “Isto É Dinheiro, Editora Três, edição de 09 de novembro de 2005, de nº 426, páginas 76/80” (doc. fls.), restou evidente o estado de penúria e ruína em que se encontra atualmente o Paciente. Observe-se, que em seu depoimento ao aludido periódico, o mesmo afirmou que:

Paciente : (…) eu tinha meu mundo centrado em minha família e meu trabalho. De repente me tiraram deste mundo. É melhor morrer. Se eu tivesse umas daquelas cápsulas de cianureto, que os oficiais americanos levam, eu teria tomado. Repórter : O sr. pensou em se matar neste período ? – Paciente : várias vezes. A situação é tão absurda que é preferível morrer. Penso na minha mulher e nos meus filhos. Senão, teria me atirado da janela de meu apartamento no dia de minha prisão. (…) – Repórter : Como o sr. vive hoje ? – Paciente : vivo a base de remédios. Tenho dores de cabeça fortíssimas e só durmo com ajuda de medicamentos. Estou em estado de depressão. Eu preferia estar morto do que viver nesta situação. Eu divido a cela com outra pessoa. Ajudo nos afazeres e nas tarefas de manutenção. O resto do tempo tento ler, mas não tenho cabeça para isso, não consigo me concentrar. Fico por aí (…)

78. Conclui-se, pois, com base nos sólidos fundamentos argüidos no presente petitório, ser esta a oportunidade de se corrigir este lamentável episódio, que viola o direito de ir e vir do Paciente, assegurado constitucionalmente, devendo ser concedido ao mesmo, que jamais ameaçou testemunhas, tampouco apresentou comportamento temerário à investigação criminal, o direito de poder aguardar seu julgamento em regime de prisão domiciliar, como determina expressamente legislação vigente e o posicionamento jurisprudencial dos Tribunais Superiores, ou, alternativamente, seja relaxada a prisão preventiva do Paciente, vez que não há motivos jurídicos plausíveis para se manter a custódia cautelar do mesmo, por ter há muito já decorrido o prazo legal para o encerramento da instrução criminal, conforme acima já esposado, repita-se, mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias.

DO PRECÁRIO ESTADO DE SAÚDE DO PACIENTE

79. Além do fato de já ter-se extrapolado, em muito, o prazo para o encerramento da instrução criminal, e de não estar sendo respeitado o Estatuto da Advocacia, como já mencionado anteriormente, o estado de saúde do Paciente é bastante precário, pois o mesmo foi acometido de uma série de males, que somados, o levaram a um estado de saúde bastante debilitado, consoante faz prova o incluso diagnóstico médico (doc. fls.), de lavra de Dr. Milton Penha, CRM – RJ 5237373-3, razão pela qual, por mais este motivo, ao Paciente deverá ser concedido o seu direito de aguardar o julgamento da ação penal em que está sendo injustamente processado em regime de prisão domiciliar.


80. No dia 01 de novembro de 2005, o Paciente sentiu-se mal, tendo desmaiado no pátio interno do Ponto Zero e sendo prontamente socorrido por outros presos. Por conta do mal súbito, os agentes carcerários responsáveis pelo referido estabelecimento prisional o levaram ao Centro Médico Guanabara, onde após ser medicado com remédio restrito e controlado, denominado Rivotril, o mesmo foi submetido a exames médico-laboratoriais que diagnosticaram que o Paciente contraiu uma série de patologias compreendidas no C.I.D. (Código Internacional de Doenças) R-53, patologias estas, que vão desde astenia, cansaço e debilidade até deterioração física geral e letargia (doc. fls.).

81. Por oportuno, no que concerne aos males de astenia e letargia, dos quais o Paciente também vem sendo acometido, após efetuarmos pesquisa via internet elaborada junto ao Dicionário Houaiss, nos cumpre esclarecer que “Astenia” consiste em “perda e diminuição de força física, ou, perda ou diminuição da resistência do sistema nervoso (neurastenia) ou do psiquismo (psicastenia); anergia”. Já a patologia “Letargia”, traduz-se em “estado de profunda e prolongada inconsciência, semelhante ao sono profundo, do qual a pessoa pode ser despertada, mas ao qual retorna logo a segui; incapacidade de reagir e de expressar emoções; apatia, inércia e/ou desinteresse”.

82. As moléstias acima referidas se tratam de doenças que exigem cuidados especialíssimos, incluindo internações do Paciente, prescrição de medicamentos controlados por especialistas, uma vez que pode comprometer a qualidade de vida do mesmo, chegando ao ponto de impedir que a pessoa por ela acometida possa se levantar, ou sequer se movimentar, em decorrência da fraqueza que atinge seu físico.

83. Diante deste quadro clínico comprovado pelo diagnóstico de lavra do respeitado Dr. Milton Penha, é necessário que o Paciente, por mais esta razão, seja recolhido à prisão domiciliar, sob o controle do MM. Juízo monocrático, para que o mesmo possa ser submetido a tratamento especializado, fato que certamente não ocorrerá em prisão comum em decorrência da precariedade do atendimento que são prestados aos reclusos, sendo certo que em seu domicílio ele poderá contar com a assistência médica adequada, tomar os medicamentos nos horários ministrados, bem como ter atendimento médico sempre que necessário.

84. Dessa forma, o cumprimento de prisão preventiva em instalações inadequadas para acomodação do Paciente, como é o caso do aludido Ponto Zero, que se cuida de uma obsoleta construção datada dos idos de 1930, em razão dos graves problemas de saúde que atravessa, demonstra a total inconveniência da medida e a necessária remoção do mesmo para o imediato cumprimento de regime de prisão domiciliar, conforme preceitua o já referido artigo 7°, inciso V, da Lei n° 8.906/94.

85. Por via de conseqüência, levando-se em conta o lamentável e precário estado de saúde do Paciente, bem como seus comprovados bons antecedentes e condição social estável, inexiste qualquer impedimento à pretendida remoção do mesmo ao cumprimento de regime de prisão domiciliar, preenchendo o Paciente todos os pressupostos legais para obter o benefício ao qual faz jus.

DA NECESSÁRIA CONCESSÃO DE MEDIDA LIMINAR, TENDO EM VISTA A PRESENÇA DO FUMUS BONI JURIS E DO PERICULUM IN MORA

86. Plenamente preenchidos os requisitos ensejadores da concessão de medida liminar, quais sejam; fumus boni juris e periculum in mora, resta límpida e cristalina a imperiosa necessidade de ser expedido em favor do Paciente, em caráter liminar, o competente Alvará de Soltura, tendo em vista que o intolerável fato de estar o mesmo custodiado preventivamente há mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias, ou seja, o dobro do prazo legal para o término da instrução criminal da ação penal através da qual o Paciente está sendo injustamente processado, constitui manifesto constrangimento ilegal, pois, avilta frontalmente as normas legais atinentes acima especificadas e o ordenamento jurídico vigente, o que, certamente, deverá ser corrigido por Vossas Excelências.

87. Acrescente-se, que além do exorbitante excesso de prazo para o término da instrução criminal da ação penal através da qual o Paciente vem sendo processado, há ainda, a inobservância de prerrogativa legal do Paciente, consubstanciada na Lei Federal Especial inerente ao Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, o que caracteriza, novamente, uma ilegalidade latente, que, apenas ad argumentandum tantum, e, por amor ao debate, na remota possibilidade deste Augusto Tribunal não reconhecer e declarar o expresso e manifesto excesso de prazo acima mencionado, deverá, subsidiariamente, ser concedido ao Paciente o seu inconteste direito alicerçado em prerrogativa legal, de somente ser recolhido preso em Sala Especial de Estado-Maior, assim reconhecido pela Ordem dos Advogados do Brasil, e na sua ausência, regime de prisão domiciliar.

DOS PEDIDOS

88. Diante de todo o exposto, requer a CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR para que:

a) diante do quadro fático acima vislumbrado, ocasionado pelo vultoso excesso de prazo para o devido encerramento da instrução criminal, mais de 160 (CENTO E SESSENTA) dias, seja expedido o competente e necessário Alvará de Soltura em favor do Paciente.

b) alternativamente, apenas a guisa de argumentação, e tão somente por apego ao direito, na remota hipótese de Vossas Excelências não reconhecerem o latente e manifesto excesso de prazo acima argüido, seja imediatamente concedido ao Paciente o seu incontestável direito, decorrente de prerrogativa legal de classe, de ser transferido à Sala Especial de Estado Maior, na cidade de seu domicílio, São Paulo, Capital, e consoante acima elucidado, como não existe Sala Especial de Estado Maior em nenhum Estado da Federação, deverá permanecer o Paciente custodiado sob o regime de prisão domiciliar, conforme disposto na Lei nº 8.906/94, em seu artigo 7º, inciso V, corroborado pelo seu deplorável e precário estado de saúde, bem como pelo entendimento jurisprudencial dominante acima mencionado,

89. Requer, ainda, por derradeiro, após os trâmites legais, seja ao final CONCEDIDA A ORDEM DE HABEAS CORPUS para que seja reconhecido e declarado o direito do Paciente a aguardar em liberdade o julgamento da ação penal na qual figura como Réu, registrada sob o nº 2005.51.01.517854-3, em curso perante o MM. Juízo da 5ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro/RJ, devendo ser reconhecido e declarado o excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal da supramencionada ação penal.

90. Requer ainda, subsidiariamente, apenas a titulo de argumentação, por amor ao debate, que, na remota hipótese de não ser este o entendimento de Vossas Excelências, seja ao final, CONCEDIDA A ORDEM DE HABEAS CORPUS para que o Paciente possa cumprir sua custódia cautelar em regime de prisão domiciliar, tendo em vista o fato público e notório, de que inexiste no país Sala Especial de Estado Maior, (prisão sem grades, individual, etc.), reconhecida pela Ordem dos Advogados do Brasil, Constituição Federal, e pelo Código de Processo Penal, e o seu debilitado estado de saúde ou, alternativamente, seja relaxada sua prisão preventiva, tendo em vista o intolerável e inaceitável decurso de prazo processual para o encerramento da instrução criminal, face aos inabaláveis argumentos de fato e de direito acima explanados. Em agindo assim, estará este Egrégio Tribunal praticando a mais lídima e incontestável JUSTIÇA !.

São Paulo, 06 de dezembro de 2005.

pp. CARLOS ELY ELUF

OAB/SP nº 23.437

pp. MELISSA PESSOTTI TAVEIRA STEFANI

OAB/SP nº 189.871

pp. DÉCIO EDUARDO DE FREITAS CHAVES JÚNIOR

OAB/SP nº 200.169

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