Adeus, Supremo

Carlos Velloso participa de sua última sessão no Supremo

Autor

13 de dezembro de 2005, 20h46

O ministro Carlos Velloso participou, nesta terça-feira (13/12), da sua última sessão de julgamento no Supremo Tribunal Federal. Ele terá de se aposentar em janeiro, quando completa 70 anos. Foi a última sessão do ano, já que o STF entrará em recesso forense.

A sessão da 2ª Turma, da qual Velloso faz parte, foi aberta com uma homenagem ao ministro. O presidente da Turma, Celso de Mello, fez um registro histórico de ministros da Corte que, com o respaldo da Constituição Federal de 1891, estiveram à frente do cargo por períodos superiores ao limite atual para aposentadoria compulsória. O ministro André Cavalcanti, por exemplo, foi nomeado em 1897 e presidiu o STF até os 93 anos de idade.

“Lamenta-se que o legislador constituinte se tenha afastado do modelo da primeira Constituição republicana, que soube preservar com equilíbrio e sabedoria a vasta experiência que ilustres magistrados desta Corte legaram à causa pública após os 70 anos de idade”, ressaltou Celso de Mello.

No discurso em homenagem ao ministro Velloso, Celso de Mello disse, ainda, que a sessão preservaria nesta instituição a recordação da significativa e poderosa presença do ministro na vida do Supremo Tribunal Federal, “a perpetuar-se na experiência jurisprudencial e no registro dos brilhantes votos e decisões proferidos por Vossa Excelência”.

A subprocuradora geral da República, Sandra Cureau, e o advogado José Júlio dos Reis, que trabalhou no Supremo por mais de 40 anos, também homenagearam o ministro. Velloso agradeceu: “Fui muito feliz no Supremo, especialmente nesta 2ª Turma”.

“Esta Casa, como dizia Levi Carneiro, é a jóia das instituições republicanas”, afirmou Velloso, dizendo-se contrariado por deixar o cargo por causa da saudade que sentirá do convívio com os colegas. “Estarei sempre com vocês, nem que seja para assistir às sessões e continuar o meu aprendizado.”

Leia a íntegra do discurso do ministro Celso de Mello em homenagem ao ministro Carlos Velloso

HOMENAGEM AO EMINENTE MINISTRO CARLOS VELLOSO, POR OCASIÃO DE SUA ÚLTIMA SESSÃO NA SEGUNDA TURMA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (13/12/2005).

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO – (Presidente):

Quando os Fundadores da República conceberam esta Nação, promulgando, em 1891, a Constituição do novo Estado brasileiro, nela repousando as inúmeras modificações que inovaram o perfil institucional de nossa organização político-jurídica, registrou-se, quanto ao Poder Judiciário – e, em particular, quanto ao Supremo Tribunal Federal -, uma significativa transformação no âmbito de sua esfera de competência, em ordem a conferir, aos juízes e Tribunais, um papel de maior relevo na jovem República, eis que se lhes atribuiu a grave responsabilidade de velar pela supremacia do novo estatuto constitucional.

Nesse novo contexto histórico, ampliou-se, de maneira expressiva, o papel institucional desta Suprema Corte, que passou a ser, nas palavras de Ruy, “o grande tribunal da Federação”, concebido, segundo o pacto republicano, como obstáculo insuperável aos excessos do poder e aos atos de transgressão e prepotência contra as liberdades públicas.

Ao assim dispor sobre o Supremo Tribunal Federal (e sobre os magistrados em geral), o constituinte republicano de 1891 – reafirmando dispositivo que constava do famoso Decreto nº 848, de 11/10/1890 – teve o cuidado, ao estender-lhes a garantia da vitaliciedade, de estabelecer que os juízes perderiam o cargo “unicamente por sentença judicialou, então, por efeito de condenação por crimes de responsabilidade (art. 57 e § 2º), delineando, desse modo, um sistema destinado a permitir o exercício independente das funções jurisdicionais, em ordem a proteger os magistrados contra indevidas interferências de agentes vinculados aos demais Poderes do Estado.

Em conseqüência dessa disciplina constitucional reservada aos magistrados, notadamente aos Juízes desta Suprema Corte, não se admitiu – considerada a prerrogativa da vitaliciedade – o instituto da aposentadoria compulsória por implemento de idade, razão pela qual a República pôde contar com a sabedoria, a experiência e os conhecimentos de notáveis Ministros que atuaram com grande visão e lucidez, nesta Suprema Corte, após os setenta anos, sendo digno de registro o fato de que, sob a Constituição republicana de 1891, o Ministro ANDRÉ CAVALCANTI presidiu o Supremo Tribunal Federal até os seus 93 anos de idade.

Somente com a Constituição de 1934 é que se instituiu, no Brasil, a aposentadoria compulsória, submetida, no entanto, a regimes diferenciados, conforme se tratasse de magistrados (que se aposentavam, compulsoriamente, aos 75 anos de idade – art. 64, “a” ) ou de servidores públicos em geral, cuja inativação por implemento de idade ocorria aos 68 anos (art. 170, 3º).

Esse limite foi unificado em torno de 68 anos de idade com a Carta Política de 1937 (art. 91, “a”, e art. 156, “d”), sendo elevado a 70 anos com a Constituição de 1946 e mantido, desde então, até hoje, nesse mesmo nível etário.

Lamenta-se, desse modo, que o legislador constituinte se tenha afastado do modelo consagrado pela primeira Constituição republicana, que soube preservar, com equilíbrio e sabedoria, a vasta experiência que ilustres magistrados desta Suprema Corte legaram à causa pública após os 70 anos de idade, valendo referir, dentre esses grandes juízes, os eminentes Ministros HERMÍNIO FRANCISCO DO ESPÍRITO SANTO (83 anos de idade), OLEGÁRIO HERCULANO D’AQUINO E CASTRO (78 anos de idade), SAYÃO LOBATO, o Marquês de Sabará (75 anos de idade), RIBEIRO DE ALMEIDA (75 anos de idade), EDMUNDO LINS (74 anos de idade), FREITAS HENRIQUES, que foi o primeiro Presidente do Supremo Tribunal Federal (72 anos de idade), GODOFREDO CUNHA (71 anos de idade) e TRISTÃO DE ALENCAR ARARIPE (71 anos de idade).

Todas essas observações são feitas, porque esta Sessão, lamentavelmente, é a última de que participa, na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, o eminente Ministro CARLOS VELLOSO.

Mais do que uma despedida, no entanto, este momento, por breve que seja, possui o sentido de preservar, no espírito desta Instituição, a recordação da significativa e poderosa presença de Vossa Excelência, Senhor Ministro CARLOS VELLOSO, na vida do Supremo Tribunal Federal, a perpetuar-se, historicamente, na experiência jurisprudencial desta Corte e no registro dos brilhantes votos e decisões proferidos por Vossa Excelência.

Achamo-nos reunidos, aqui e agora, eminente Ministro CARLOS VELLOSO, para celebrar mais um rito de passagem na vida de Vossa Excelência e na trajetória histórica do Supremo Tribunal Federal, ainda que com a simplicidade republicana que tão bem caracteriza as práticas institucionais desta Alta Corte.

Não hesito em proclamar, eminente Ministro CARLOS VELLOSO, e é justo que assim o faça, em nome desta Colenda Turma, a honra e o privilégio – que nos foram dados – de atuar, nesta Suprema Corte, ao seu lado, enriquecendo-nos, em nosso convívio e na prática da jurisdição, com a valiosa experiência e a grande sabedoria de Vossa Excelência, a quem apresentamos os mais afetuosos votos de felicidade plena nesta nova etapa que, agora, se abre no luminoso caminho que Vossa Excelência irá trilhar.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!