Preço destilado

Produtores de açúcar e álcool obtêm vitória no Supremo

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6 de dezembro de 2005, 19h34

A União sofreu uma derrota considerável hoje na segunda turma do Supremo Tribunal Federal. Por maioria, os ministros deram ganho de causa a uma destilaria — Alto Alegre — que receberá R$ 40 milhões pelo menos. Isso porque o valor era o que estava presente na ação há dois anos, já defasado naquela época. A Advocacia Geral da União não soube precisar em quanto ficará o valor atualizado. Mas a questão está no precedente aberto. O julgamento havia sido interrompido em maio deste ano, em razão de um pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa, e foi retomado nesta tarde.

Existem várias outras empresas na mesma situação que, se conseguirem o mesmo resultado, poderão representar um prejuízo ao Estado da ordem de bilhões. Toda a história começou com o fim do extinto Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA).

O órgão foi criado em 1933. Entre as suas funções estava a de manter as condições para a exportação dos derivados da cana-de-açúcar. No entanto, o mercado interno apresentava desníveis no que diz respeito às empresas produtoras de açúcar e álcool. Enquanto em algumas regiões do país, como no nordeste, a produção era feita com baixa tecnologia, em outras regiões, havia mão-de-obra e maquinário adequado. A conseqüência era uma produção com custos desiguais.

Cabia ao IAA estabelecer preços a serem praticados para os produtores – preços que eram equalizados de acordo com a realidade de cada região. Assim, estados com mais tecnologia tinham preços mais baixos, enquanto estados mais atrasados podiam cobrar mais. Ocorre que, em muitos casos, o valor fixado não era suficiente para fazer frente aos custos.

Foi por essa razão que a destilaria Alto Alegre queria ser indenizada pela União em razão de prejuízos advindos de intervenção estatal no domínio econômico, que resultou na fixação de preços, no setor sucro-alcooleiro, abaixo dos valores apurados e propostos pelo IAA.

No entanto, até então, a Advocacia da União vinha sustentando que, apesar do preço não ser o ideal para fazer frente aos custos, as empresas recebiam subsídios e outros suportes para poderem funcionar. A última vitória havia sido da AGU, no Superior Tribunal de Justiça. Hoje, porém, a segunda turma do Supremo reconheceu os prejuízos sofridos pela destilaria.

Em seu voto, o relator, ministro Carlos Velloso, apontou: “a instância ordinária, com base na prova dos autos, esclareceu e decidiu que a autarquia federal, deixando de lado o critério legal para apuração dos preços dos produtos sucro-alcooleiros ¾ Lei 4.870/65 ¾, “estabelecia” tais preços “em valores inferiores, que não davam para cobrir os custos de produção”, o que foi confessado pelo próprio presidente do Instituto do Açúcar e do Álcool, “em ofício dirigido, em nove de abril de 1987, ao Ministro de Estado da Indústria e Comércio”.

De acordo com o relator, a fixação de preços a serem praticados pela destilaria, por parte do Estado, em valores abaixo da realidade e em desconformidade com a legislação aplicável ao setor “constitui-se em sério empecilho ao livre exercício da atividade econômica, em desrespeito ao princípio da liberdade de iniciativa”.

“No caso, o Estado, entendendo por bem fixar os preços do setor, elaborou legislação em que estabelecia parâmetros para a definição daqueles. Celebrou contrato com Instituição privada, para que essa fizesse levantamentos que funcionariam como embasamento para a fixação dos preços, nos termos da lei. Mesmo assim, fixava-os em valores inferiores. Essa conduta, se capaz de gerar danos patrimoniais ao agente econômico, no caso, a Recorrente, por si só, acarreta inegável dever de indenizar (art. 37, § 6º)”, disse Velloso.

Para o ministro, o acórdão do STJ ignorou os prejuízos causados à destilaria e ignorou, “olimpicamente”, os prejuízos, “ao curioso argumento” de que assiste ao Estado o poder discricionário “na adequação das necessidades públicas ao contexto econômico estatal”.


“É dizer, com base nessa discricionariedade inadmissível num Estado de Direito, é possível ao Estado, ao intervir no domínio econômico, desrespeitar liberdades públicas e causar prejuízos aos particulares, impunemente”, ironizou o relator.

Leia abaixo o voto do ministro Carlos Velloso:

31/05/2005

SEGUNDA TURMA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 422.941-2 DISTRITO FEDERAL

RELATOR

:

MIN. CARLOS VELLOSO

RECORRENTE(S)

:


DESTILARIA ALTO ALEGRE S/A

ADVOGADO(A/S)

:

HAMILTON DIAS DE SOUZA E OUTRO(A/S)

RECORRIDO(A/S)

:

UNIÃO

ADVOGADO(A/S)

:

ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

R E L A T Ó R I O

O Sr. Ministro CARLOS VELLOSO: – O acórdão recorrido, proferido pela Segunda Turma do Eg. Superior Tribunal de Justiça, está assim ementado:

“DIREITO ECONÔMICO. INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. TABELAMENTO. PREÇO ÚNICO. SETOR SUCRO-ALCOOLEIRO. CONGELAMENTO DE PREÇOS. PLANOS ECONÔMICOS. IAA – INSTITUTO DO ÁLCOOL E DO AÇÚCAR. APURAÇÃO DE CUSTO DE PRODUÇÃO PELA FGV – FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS. INDENIZAÇÃO PLEITEADA POR PREJUÍZO OCASIONADO POR POLÍTICA DE FIXAÇÃO DE PREÇOS EM DESACORDO COM OS CRITÉRIOS DO ART. 9º DA LEI N.º 4.870/65.

I – O exercício da atividade estatal, na intervenção no domínio econômico, não está jungido, vinculado, ao levantamento de preços efetuado por órgão técnico de sua estrutura administrativa ou terceiro contratado para esse fim específico; isto porque há discricionariedade do Estado na adequação das necessidades públicas ao contexto econômico estatal; imprescindível a conjugação de critérios essencialmente técnicos com a valoração de outros elementos de economia pública.

II – O tabelamento de preços não se confunde com o congelamento, que é política de conveniência do Estado, enquanto intervém no domínio econômico como órgão normativo e regulador do mercado, não havendo quebra do princípio da proporcionalidade ao tempo em que todo o setor produtivo sofreu as conseqüências de uma política econômica de forma ampla e genérica;

III – Apesar de inviável, em sede de recurso especial, a quantificação dos danos sofridos pelas usinas e engenhos de açúcar – com a fixação de preços únicos para o setor sucro-alcooleiro, decorrente de tabelamento de preço – porque implica em reexame de prova vedado pela Súmula n.º 07/Colendo Superior Tribunal de Justiça, é possível a discussão da legalidade dos critérios exteriorizadores da defasagem do setor.” (Fl. 651)

Rejeitaram-se os embargos de declaração opostos (fls. 734- 747).

Daí o RECURSO EXTRAORDINÁRIO, interposto pela Destilaria Alto Alegre S.A., fundado no art. 102, III, a, da Constituição Federal, com alegação de ofensa ao art. 37, § 6º, da mesma Carta, sustentando, em síntese, o seguinte:

a) ocorrência, na hipótese, de responsabilidade objetiva da União, dado que o ato estatal que fixou os preços dos produtos sucro-alcooleiros em valores inferiores ao levantamento de custos realizados pela Fundação Getúlio Vargas causou, consoante demonstrado nos autos e reconhecido pelo acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, dano à recorrente. Ademais, “ainda que os critérios da Lei nº 4870/65 não fossem obrigatórios, como pretende o acórdão ora recorrido, serviram eles para o levantamento do preço que deveria ser fixado pelo IAA, à base dos estudos realizados pela Fundação Getúlio Vargas, contratada por aquele Instituto com tal finalidade” (fl. 753);

b) o dano sofrido pela recorrente, a despeito de decorrer de legítima atividade estatal de intervenção no domínio econômico, deve ser indenizado, tendo em vista o disposto no art. 37, § 6º, da Constituição, valendo salientar que, para a configuração da responsabilidade objetiva, consoante entendimento desta Corte (RE 113.587/SP, RE 217.389/SP), basta a ocorrência do dano, da ação administrativa e do nexo causal entre o dano e a ação;

c) o recurso especial sequer poderia ter sido conhecido, conforme a Súmula 126/S.T.J., haja vista a ausência de interposição de recurso extraordinário para impugnar o fundamento constitucional do acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

Admitido o recurso, subiram os autos.

A Procuradoria-Geral da República, em parecer lavrado pelo ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. Eitel Santiago de Brito Pereira, opinou pelo provimento do recurso extraordinário.

Autos conclusos em 03.03.2005.

É o relatório.

V O T O

O Sr. Ministro CARLOS VELLOSO (Relator): A espécie é esta: a sentença de 1º grau julgou procedente a ação ajuizada pela Destilaria Alto Alegre, para condenar a União a indenizar os prejuízos advindos da intervenção do Poder Público no domínio econômico, que resultou na fixação de preços, no setor sucro-alcooleiro, abaixo dos valores apurados e propostos pelo Instituto Nacional do Açúcar e do Álcool.

A União recorreu, mas o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, Relator o eminente Juiz Tourinho Neto, negou provimento à apelação.

Destaco do acórdão do Regional:

“(…)

Os preços dos produtos sucro-alcooleiros eram, de acordo com a Lei nº 4.870, de primeiro de dezembro de 1965, fixados pelo então Instituto do Açúcar e do Álcool. Lei esta que indicava os critérios a serem obedecidos, sendo que o art. 9º tratava do levantamento dos custos. Assim dispunha esse artigo:

‘O IAA, quando do levantamento dos custos de produção agrícola e industrial, apurará, em relação às usinas das regiões Centro-Sul e Norte-Nordeste, as funções custo dos respectivos fatores de produção, para vigorarem no triênio posterior.

§ 1º – As funções custo a que se refere este artigo serão valorizadas anualmente, através de pesquisas contábeis e de outras técnicas complementares, estimados, em cada caso, os fatores que não possam ser objetos de mensuração física.

§ 2º – Após o levantamento dos custos estaduais, serão apurados o custo médio nacional ponderado e custos médios regionais ponderados, observados, sempre que possível, índices mínimos de produtividade.

§ 3° – O IAA promoverá, permanentemente, o levantamento dos custos de produção, para o conhecimento de suas variações, ficando a cargo do seu órgão especializado a padronização obrigatória da contabilidade das usinas de açúcar.’

O critério, portanto, para fixação dos preços era legal. Contratou o IAA a Fundação Getúlio Vargas para proceder os levantamentos e apurar o preço dos produtos do setor sucro-alcooleiro.

A Fundação Getúlio Vargas apurava corretamente os preços, no entanto, o IAA os estabelecia em valores inferiores, que não davam para cobrir os custos de produção. O próprio Presidente desse instituto isto confessou, em ofício dirigido, em nove de abril de 1987, ao Ministro de Estado da Indústria e do Comércio (v. fl. 34):

‘Os preços da cana-de-açúcar, do açúcar e do álcool são fixados administrativamente, mediante atos que substituem a resultante da livre ação das forças de mercado. Por este motivo, os preços têm se constituído no ponto de permanente fricção entre o governo e o empresariado, fenômeno que se torna mais agudo nas épocas em que a inflação se exacerba, em virtude de o impacto inflacionário que deriva dos preços daqueles produtos se contrapor à necessidade do estabelecimento de uma adequada remuneração aos produtores.’

E observava (fl. 35):

‘Explica-se, deste modo, o fato de os preços fixados para os produtos sucro-alcooleiros, nos últimos anos, situarem-se abaixo das indicações resultantes dos levantamentos de custos, realizados pela Fundação Getúlio Vargas, em conseqüência de contrato firmado com esse Instituto.’ (destaquei)

E frisou (fl. 39):

‘Essa razão pela qual, neste ofício, o Instituto do Açúcar e do Álcool propõe que os preços dos produtos sucro-alcooleiros sejam fixados tão próximos quanto possível dos preços que o mercado estabeleceria, não estivesse o sistema produtor sob o controle governamental.’

A perícia isso comprovou. Ao responder o quinto quesito formulado pela autora, disse o perito, contador Sílvio Caracas de Moura Júnior (fl. 388):

‘No período abrangido pela inicial, os preços fixados para os produtos sucro-alcooleiros não correspondiam aos custos levantados pela Fundação Getúlio Vargas.’

E explicou, ao responder o primeiro quesito apresentado pela ré (fl. 393):

‘O que a Fundação Getúlio Vargas – FGV apurou, no período de março de 1985 a outubro de 1989, foi o custo de produção para o setor sucro-alcooleiro. Ele foi apurado com base em pesquisas de campo, realizada por amostragem estatística estratificada, assentada em grupos de empresas grandes, médias e pequenas, com diversos graus de produtividade, que permitiam aferir custo médio da região.’

E adiante, em resposta ao quarto quesito da ré, afirmou (fl. 396):

‘O índice de reajuste de preços apurado pela Fundação Getúlio Vargas – FGV, período de março de 1985 a outubro de 1989, calcava-se no custo de produção do setor sucro-alcooleiro, em obediência ao disposto nos arts. 9º a 11 da Lei nº 4.870, de 1965.’

De tudo isto, resultou prejuízo para a autora. Respondendo o oitavo quesito da ré, foi o perito conclusivo (fl. 400):

‘Os balanços mostram a situação econômico-financeira da empresa numa certa data. No passivo, existe um grupamento de contas denominado Patrimônio Líquido, que é formado, também, pelos resultados obtidos pela empresa. Quando a empresa tem lucro, o Patrimônio Líquido é aumentado e, quando há prejuízo, o Patrimônio Líquido é diminuído. Os preços de venda dos produtos afetam o resultado obtido. Como se constatou no decorrer desta perícia, os níveis de preços fixados pelo Governo provocaram frustração de receita, independentemente dos níveis dos custos de produção da empresa. (destaquei)

Segundo o perito, o prejuízo da autora, ‘a preços de setembro de 1993, com os valores atualizados pelo IGP d.i da Fundação Getúlio Vargas, é de três bilhões, trezentos e quarenta e nove milhões, novecentos e setenta e nove mil cruzeiros reais e setenta e seis centavos’ (v. fls. 392 e 422 a 425).

Demonstrado está, portanto, o dano sofrido pela autora.

Dano esse decorrente da atuação do Estado. Fixou os preços do setor sucro-alcooleiro abaixo do preço de custo, contrariando a própria Lei nº 4.870, de 1965. Contratou a Fundação Getúlio Vargas para apurar os preços do produto desse setor e não atentou para os mesmos. Qual a finalidade, então, do contrato? Dinheiro jogado fora. Dispunha a cláusula terceira do contrato (fl. 24):

‘IAA pagará à Fundação pela execução dos serviços objeto da cláusula primeira deste contrato o preço de Cr$ 4.025.000,00…’

Isto em outubro de 1974. Será que o Tribunal de Contas da União apurou tal fato?

O nexo de causalidade entre a ação da União e o prejuízo sofrido pela autora está mais do que evidenciado. Cabia à ré a fixação dos preços, fixou-os, de forma obrigatória, abaixo do preço de custo, impondo, de antemão, um dano para autora, e disso sabia porque não atentava para a apuração feita pela Fundação Getúlio Vargas. Demonstrou a autora o dano que efetivamente sofreu.

(…).” (Fls. 524-529)

É dizer, a instância ordinária, com base na prova dos autos, esclareceu e decidiu que a autarquia federal, deixando de lado o critério legal para apuração dos preços dos produtos sucro-alcooleiros ¾ Lei 4.870/65 ¾, “estabelecia” tais preços “em valores inferiores, que não davam para cobrir os custos de produção”, o que foi confessado pelo próprio presidente do Instituto do Açúcar e do Álcool, “em ofício dirigido, em nove de abril de 1987, ao Ministro de Estado da Indústria e Comércio”.

O acórdão do Regional apóia-se, para as suas conclusões, inclusive, na perícia realizada nos autos.

O acórdão do Regional ficou resumido na seguinte ementa:

“ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. INDENIZAÇÃO. PREÇOS DOS PRODUTOS DO SETOR SUCRO-ALCOOLEIRO FIXADOS ABAIXO DO PREÇO DE CUSTO. LEI Nº 4.870, DE 1º DE DEZEMBRO DE 1965.

1. A União fixou os preços do setor sucro-alcooleiro abaixo do preço de custo, em desacordo com os preços encontrados pela Fundação Getúlio Vargas, e, assim, contrariou a Lei nº 4.870, de 1965.

2. O Governo não pode estabelecer uma política que cause prejuízos aos particulares, de tal maneira que possa levá-los à falência, e assim, o Estado responde pelos danos causados, nos termos do art. 37, § 6°, da Constituição Federal.

3. Inexistência na hipótese de subsídios à custear.

4. A correção monetária, já é ponto pacífico na jurisprudência, deve incidir a partir da ocorrência do dano, e não da data do ajuizamento da ação.

5. Os juros moratórios devem ter o início da contagem a data da verificação do dano, e não a partir da citação. É jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidada na súmula 54.” (Fl. 534)

Acontece que, em recurso especial, o acórdão do Regional Federal foi reformado pelo Superior Tribunal de Justiça, assim ementado o acórdão:

“DIREITO ECONÔMICO. INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. TABELAMENTO. PREÇO ÚNICO. SETOR SUCRO-ALCOOLEIRO. CONGELAMENTO DE PREÇOS. PLANOS ECONÔMICOS. IAA – INSTITUTO DO ÁLCOOL E DO AÇÚCAR. APURAÇÃO DE CUSTO DE PRODUÇÃO PELA FGV – FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS. INDENIZAÇÃO PLEITEADA POR PREJUÍZO OCASIONADO POR POLÍTICA DE FIXAÇÃO DE PREÇO EM DESACORDO COM OS CRITÉRIOS DO ART. 9º DA LEI Nº 4.870/65.

I – O exercício da atividade estatal, na intervenção no domínio econômico, não está jungido, vinculado, ao levantamento de preços efetuado por órgão técnico de sua estrutura administrativa ou terceiro contratado para esse fim específico; isto porque há discricionariedade do Estado na adequação das necessidades públicas ao contexto econômico estatal; imprescindível a conjugação de critérios essencialmente técnicos com a valoração de outros elementos de economia pública.

II – O tabelamento de preços não se confunde com o congelamento, que é política de conveniência do Estado, enquanto intervém no domínio econômico como órgão normativo e regulador do mercado, não havendo quebra do princípio da proporcionalidade ao tempo em que todo o setor produtivo sofreu as conseqüências de uma política econômica de forma ampla e genérica.

III – Apesar de inviável, em sede de recurso especial, a quantificação dos danos sofridos pelas usinas e engenhos de açúcar – com a fixação de preços únicos para o setor sucro-alcooleiro, decorrente de tabelamento de preço – porque implica em reexame de prova vedado pela Sumula nº 07/Colendo Superior Tribunal de Justiça, é possível a discussão da legalidade dos critérios exteriorizadores da defasagem do setor.” (Fl. 651)

Rejeitaram-se os embargos de declaração.

Daí o presente recurso extraordinário ¾ CF, art. 102, III, a ¾, com alegação de ofensa ao art. 37, § 6º, da mesma Carta.

Oficiando nos autos, assim se pronunciou a Procuradoria Geral da República, fls. 782-787, parecer lavrado pelo ilustre Subprocurador-Geral, Dr. Eitel Santiago de Brito Pereira:

“(…)

5. Em síntese, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que fixação de preços, no setor sucro-alcooleiro, abaixo dos valores apurados e propostos pelo Instituto Nacional do Álcool e Açúcar não foi ilícita. Decorreu do poder que tinha o Estado de intervir no domínio econômico. Daí não ter a recorrente direito á indenização pelos prejuízos sofridos com tal medida.

6. Mas tal exegese não é a que melhor se extrai do artigo 37, § 6º, da Lei Maior. Com efeito, Celso Ribeiro Bastos, discorrendo sobre o fundamento da responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público, ensina que:

‘… o Estado está sempre voltado para o atingimento de finalidades dirigidas ao bem-estar geral, e desse seu atuar pode derivar como subproduto indesejável a causação de danos. Danos esses que se tornam inevitáveis para o atingimento de certos fins. Ocorre que, por vezes, a realização destes implica o sacrifício de um direito particular que, embora deva ceder em nome do interesse público, não deixa de merecer indenização. Não seria hoje lícito fazer prevalecer o interesse particular sobre o interesse público.

‘Assim sendo, vê-se que a idéia da responsabilidade pelos danos causados, ou da responsabilidade patrimonial, ou, ainda, da responsabilidade extracontratual, não derivada dos contratos, e, portanto, decorrente da mera atuação administrativa, vincula-se à própria noção do Estado de Direito. Este impõe que o Estado seja responsável pelo resultado prejudicial dos atos que realize.

‘Portanto, torna-se de menor importância o saber se o ato foi praticado com culpa ou sem culpa, se era lícito ou ilícito; o que ocorre é que em decorrência do Estado de Direito, do Estado controlado e submetido ao direito, não resulta aceitável a causação de danos, a incidência de lesões sobre alguns, decorrentes do exercício de uma atividade estatal que procura o bem-estar de todos sem o preço da sobrecarga de alguns.

‘Em síntese, a ação estatal está hoje adstrita a esse dever de não ser produtora de danos aos particulares. Toda vez que isso ocorrer, dá-se um encargo do Estado consistente em recompor o prejuízo causado. São pois pressupostos fundamentais para a deflagração da responsabilidade do Estado: a causação de um dano e a imputação deste a um comportamento omissivo ou comissivo seu; é o denominado nexo de causalidade…’

7. Como se percebe, a Administração pode ser responsabilizada por ato lícito, quando o demonstrado, como no caso, o nexo de causalidade entre a ação estatal e o prejuízo sofrido pelo particular.

8. Aliás, o TRF da 1ª região bem destacou que:

‘Demonstrado está, portanto, o dano sofrido pela autora.

‘Dano esse decorrente da atuação do Estado. Fixou os preços do setor sucro-alcooleiro abaixo do preço de custo, contrariando a própria Lei n. 4.870, de 1965. Contratou a Fundação Getúlio Vargas para apurar os preços do produto desse setor e não atentou para os mesmos. Qual a finalidade, então do contrato? Dinheiro jogado fora. Dispunha a cláusula terceiro do contrato (fl. 24):

‘O IAA pagará à Fundação pela execução dos serviços objeto da cláusula primeira deste contrato o preço de Cr$ 4.025.000,00…’

‘Isto em outubro de 1974. Será que o Tribunal de Contas da União apurou tal fato?

‘O nexo de causalidade entre a ação da União e o prejuízo sofrido pela autora está mais do que evidenciado. Cabia à ré a fixação dos preços, fixou-os, de forma obrigatória, abaixo do preço de custo, impondo, de antemão, um dano para autora, e disso sabia porque não atentava para a apuração feita pela Fundação Getúlio Vargas. Demonstrou a autora o dano que efetivamente sofreu.

‘Não recebia, por outro lado, a autora subsídios. É a afirmativa do perito. ‘Os subsídios dados ao setor sucro-alcooleiro, no período 1985/1989, eram específicos para as unidades produtoras existentes nas regiões Norte/Nordeste’ (fl. 402). A autora é empresa paulista. A ré não fez, ademais, nenhuma prova de que tenha a autora recebido subsídio.

‘O Governo não pode estabelecer uma política que cause prejuízos aos particulares, de tal maneira que possa levá-los à falência. O Estado responde objetivamente pelos danos causados, nos termos do art. 37, § 6º da Constituição. E, in casu, o Governo desobedeceu a lei. Com prioridade, disse a autora (fl. 491):

‘A lei estabelece critérios a serem atendidos pelo ato administrativo de fixação de preços. Ao Executivo cabe cumprir as determinações da lei. O ato praticado é ato vinculado que não pode desatender aos ditames legais, se tal ocorrer, como no caso concreto ocorreu, o ato se torna ilícito e viciado, dando ensejo à responsabilidade civil do Estado.’

‘Não deu a sentença pela indenização correspondente ao período de junho de 1987 a outubro de 1989, sob o seguinte fundamento (fl. 453):

‘Como se disse precedentemente, cabe à ré indenizar o prejuízo causado à autora. Mas somente no período de março/85 até maio/87, conforme os valores indicados pelo período no Anexo 5-A do laudo (fl. 422). Isto porque a partir de junho/87, diversas políticas de congelamento de preços foram adotadas no País, desvinculando, assim, a fixação dos preços do álcool e do açúcar pelo levantamento de custos de produção pela FGV.’

‘A autora insurgiu-se, contra essa afirmativa com justa razão. O art. 1º do Decreto-lei n. 2.335, de 12 de junho de 1987, estabeleceu o congelamento de preços pelo prazo de noventa dias, durante os meses de junho a agosto. Escoado esse prazo, cessou o congelamento, seguindo-se uma fase de flexibilização. Mas durante esse congelamento, os preços que deveriam vigorar seriam os encontrados pela Fundação Getúlio Vargas. Quanto aos preços sujeitos a controle oficial, como os do setor sucro-alcooleiro, o art. 6º desse Decreto-lei previa o seguinte:

‘Na fase de flexibilização, os preços sujeitos a controle oficial poderão ter reajuste, para mais ou para menos, em função das variações nos custos de produção e na produtividade.’

‘Logo, nesse período de flexibilidade, o Governo deveria obedecer a Lei n. 4.870, de 1965, fixando de acordo com os critérios estabelecidos nos art. 9º a 11, não podendo nunca os preços serem inferiores aos custos.’ (fls. 528/531).

9. Em suma, segundo a jurisprudência do STF, é objetiva e funda-se na teoria do risco administrativo a responsabilidade civil do Estado. Assim, ressalvadas as hipóteses de abrandamento ou de exclusão por comprovada culpa concorrente ou exclusiva do particular, fica configurada a obrigação de indenizar quando a ação administrativa, mesmo sendo lícita, causou prejuízos ao administrado.

10. Desta forma, como o acórdão se afastou da mencionada orientação, eximindo a pessoa jurídica de direito público do dever de ressarcir os prejuízos causados ao particular, exsurge a ofensa ao preceito constitucional (art. 37, § 6º), que justifica sua reforma, através do provimento do recurso extraordinário interposto (art. 102, III, a, da CF).

(…).” (Fls. 784-787)

Está correto o parecer.

O RE é de ser conhecido e provido.

De fato, o texto constitucional de 1988 é claro ao autorizar a intervenção estatal na economia, por meio da regulamentação e da regulação de setores econômicos. Entretanto, o exercício de tal prerrogativa deve se ajustar aos princípios e fundamentos da Ordem Econômica, nos termos do art. 170 da Constituição.

Assim, a faculdade atribuída ao Estado de criar normas de intervenção estatal na economia (Direito Regulamentar Econômico, na lição de Bernard Chenot e Alberto Venâncio Filho, Droit public économique, Dictionnaire des Sciences Économiques, 1958, pp. 420-423 e A intervenção do Estado no domínio econômico. O direito econômico no Brasil, 1968, respectivamente) não autoriza a violação ao princípio da livre iniciativa, fundamento da República (art. 1º) e da Ordem Econômica (art. 170, caput).

No caso, a fixação de preços a serem praticados pela Recorrente, por parte do Estado, em valores abaixo da realidade e em desconformidade com a legislação aplicável ao setor constitui-se em sério empecilho ao livre exercício da atividade econômica, em desrespeito ao princípio da liberdade de iniciativa.

Ademais, o estabelecimento de regras bem definidas de intervenção estatal na economia e sua observância são fundamentais para o amadurecimento das instituições e do mercado brasileiros, proporcionando a necessária estabilidade econômica que conduz ao desenvolvimento nacional.

No caso, o Estado, entendendo por bem fixar os preços do setor, elaborou legislação em que estabelecia parâmetros para a definição daqueles. Celebrou contrato com Instituição privada, para que essa fizesse levantamentos que funcionariam como embasamento para a fixação dos preços, nos termos da lei. Mesmo assim, fixava-os em valores inferiores. Essa conduta, se capaz de gerar danos patrimoniais ao agente econômico, no caso, a Recorrente, por si só, acarreta inegável dever de indenizar (art. 37, § 6º).

O dever de indenizar, por parte do Estado, no caso, decorre do dano causado e independe do fato de ter havido ou não desobediência à lei específica. A intervenção estatal na economia encontra limites no princípio constitucional da liberdade de iniciativa, e o dever de indenizar (responsabilidade objetiva do Estado) é decorrente da existência do dano atribuível à atuação do Estado.

Em caso semelhante, RE 368.558/DF, por mim relatado, interposto contra decisão da Quarta Turma do Eg. Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que deu provimento à apelação para estabelecer a responsabilidade objetiva do Estado pela fixação de preços do setor sucro-alcooleiro abaixo do preço de custo e em desacordo com os preços encontrados pela Fundação Getúlio Vargas, acolhi o parecer da ilustre Subprocuradora–Geral da República, Dra. Sandra Cureau, que mencionava a existência de evidente nexo de causalidade entre o dano e a conduta da Administração, “que, agindo contra a lei, fixou preços do setor em níveis incompatíveis com os custos de produção”.

Nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição, as pessoas jurídicas de direito público respondem pelos danos que causem a terceiros, decorrendo o dever de indenizar.

No julgamento do RE 113.587/SP, por mim relatado, RTJ 140/636, citado, aliás, pela Procuradoria-Geral da República, decidiu esta 2ª Turma:

EMENTA: – CONSTITUCIONAL. CIVIL. REPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. C.F., 1967, art. 107. C.F./88, art. 37, § 6º.

I. – A responsabilidade civil do Estado, responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo, que admite pesquisa em torno da culpa do particular, para o fim de abrandar ou mesmo excluir a responsabilidade estatal, ocorre, em síntese, diante dos seguintes requisitos: a) do dano; b) da ação administrativa; c) e desde que haja nexo causal entre o dano e a ação administrativa. A consideração no sentido da licitude da ação administrativa é irrelevante, pois o que interessa, é isto: sofrendo o particular um prejuízo, em razão da atuação estatal, regular ou irregular, no interesse da coletividade, é devida a indenização, que se assenta no princípio da igualdade dos ônus e encargos sociais.

II. – Ação de indenização movida por particular contra o Município, em virtude dos prejuízos decorrentes da construção de viaduto. Procedência da ação.

III. – R.E. conhecido e provido.” (Fl. 668)

Destaco do voto que então proferi:

“(…)

Em trabalho doutrinário que escrevi sobre o Tema (‘Responsabilidade Civil do Estado’, Rev. de Informação Legislativa, 96/233), lembrei que a teoria do risco administrativo fez surgir a responsabilidade objetiva do Estado. Segundo essa teoria, o dano sofrido pelo indivíduo deve ser visualizado como conseqüência do funcionamento do serviço público, não importando se esse funcionamento foi bom ou mau. Importa, sim, a relação de causalidade entre o dano e o ato do agente público. É que, segundo a lição de CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, com apoio em AMARO CAVALCANTI, PEDRO LESSA, AGUIAR DIAS, OROZIMBO NONATO e MAZEAUD et MAZEAUD, positivado o dano, ‘o princípio da igualdade dos ônus e dos encargos exige a reparação. Não deve um cidadão sofrer as conseqüências do dano. Se o funcionamento do serviço público, independentemente da verificação de sua qualidade, teve como conseqüência causar dano ao indivíduo, a forma democrática de distribuir por todos a respectiva conseqüência conduz à imposição à pessoa jurídica do dever de reparar o prejuízo, e, pois, em face de um dano, é necessário e suficiente que se demonstre o nexo de causalidade entre o ato administrativo e o prejuízo causado.’ (CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, ‘Instituições de Dir. Civil’, Forense, 1961, I/466, nº 116). GEORGE VEDEL leciona que o dano causado pela Administração ao particular ‘é uma espécie de encargo público que não deve recair sobre uma só pessoa, mas que deve ser repartido por todos, o que se faz pela indenização da vítima, cujo ônus definitivo, por via do imposto, cabe aos contribuintes.’ (G. VEDEL e P. DELVOLVE, ‘Droit Administratif’, Presses Universitaires de France, 9ª ed., 1984, ps. 448-449). Para L. DUGUIT, a atividade do Estado se exerce no interesse de toda a coletividade; as cargas que dela resultam não devem pensar mais fortemente sobre uns e menos sobre outros. Se, da intervenção do Estado, assim da atividade estatal, resulta prejuízo para alguns, a coletividade deve repará-lo, exista ou não exista culpa por parte dos agentes públicos. É que o Estado é, de um certo modo, assegurador daquilo que se denomina, freqüentemente, de risco social, ou o risco resultante da atividade social traduzida pela intervenção do Estado. (L. DUGUIT, ‘Las Transformaciones Del Derecho Publico’, Madri, 2ª ed., ps 306 e ss.).

Na linha das opiniões acima indicadas, as lições de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (‘Elementos de Direito Administrativo’, Ed. Rev. dos Tribs., 1980, ps. 252-253), YUSSEF SAID CAHALI (‘Responsabilidade Civil do Estado’, Ed. Rev. dos Tribs., 1982) e WEIDA ZANCANER BRUNINI (‘Da Responsabilidade Extracontratual da Administração Pública’, Ed. Rev. dos Tribs., 1981).

Pode-se afirmar, em síntese, que a responsabilidade civil do Estado, responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo, que admite pesquisa em torno da culpa da vítima, para o fim de abrandar ou mesmo excluir a responsabilidade do Estado, ocorre, em síntese, vale repetir, diante dos seguintes requisitos: a) do dano; b) da ação administrativa; c) e desde que haja nexo causal entre o dano e a ação administrativa.

Ora, o acórdão recorrido deixa expresso que os requisitos acima indicados estão presentes, no caso.

Todavia, negou a reparação do dano, assentando o entendimento sobre os fundamentos sintetizados à fl. 280, já transcritos neste voto e que são os seguintes: a) o prejuízo não decorreu de ato ilícito. O argumento, entretanto, não tem procedência. É que a responsabilidade objetiva do poder público, com base na teoria do risco administrativo, não exige que a ação administrativa causadora do dano seja ilícita. Celso Antônio Bandeira de Mello, ao examinar o fundamento da responsabilidade do Estado, não obstante entender que ele se biparte ¾ pois, ‘no caso de comportamentos ilícitos, comissivos ou omissivos, o dever de reparar o dano é contrapartida da violação da legalidade’ ¾ deixa claro, no que concerne aos atos lícitos, que ‘o fundamento da responsabilidade estatal é a idéia de igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos, repartindo-se os ‘ônus provenientes dos atos lesivos, evitando que alguns suportem prejuízos ocorridos por ocasião do exercício de atividade desempenhada no interesse de todos.’(Celso Antônio Bandeira de Mello, ob. cit., p. 260). A lição, bem se vê, está na linha das opiniões anteriormente invocadas. Argumenta, ainda, o acórdão, que c) tendo o prejuízo ‘decorrido de atividade administrativa lícita, objetivou o interesse da coletividade, interesse presumido e ínsito ao tipo de conglomerado humano constituído no grande centro.’ O raciocínio esboroa-se, entretanto, data venia, frente às lições transcritas. Vale invocar PEDRO LESSA: ‘desde que um particular sofre um prejuízo, em conseqüência do funcionamento (regular ou irregular, pouco importa) de um serviço organizado no interesse de todos, a indenização é devida. Aí temos um corolário lógico do princípio da igualdade dos ônus e encargos sociais.’ (PEDRO LESSA, ‘Do Poder Judiciário’, ps. 163 e 165). Diz mais o acórdão: d) o prejuízo não teria afetado ‘singularmente a uma pessoa ou a um pequeno grupo de pessoas’, que e) ‘não existe o menor indício de que a obra pudesse ser desnecessária ou que aquilo a que objetivava pudesse vir a ser obtido por outras vias menos onerosas’, que f) ‘não se constitui o prejuízo em fato anômalo no grande centro urbano, onde zoneamentos são modificados, bairros envelhecem rapidamente, moradias são derrubadas, novas zonas residenciais surgem, numa modificação contínua e incessante’ e que g) ‘não há conflito entre interesses privados, mas entre um interesse privado e um interesse público, com primazia para este.’

Os argumentos acima transcritos ou são irrelevantes, diante da doutrina da responsabilidade objetiva do Estado, com base na teoria do risco administrativo, ou provam demais.

(…).” (Fls. 674-677)

No caso, o acórdão recorrido ignorou os prejuízos causados à recorrida pelo poder público, prejuízos apurados na instância ordinária, inclusive mediante perícia. Ignorou, olimpicamente, os prejuízos, ao curioso argumento de que assiste ao Estado o poder discricionário “na adequação das necessidades públicas ao contexto econômico estatal”. É dizer, com base nessa discricionariedade inadmissível num Estado de Direito, é possível ao Estado, ao intervir no domínio econômico, desrespeitar liberdades públicas e causar prejuízos aos particulares, impunemente.

Esclareça-se, ao cabo ¾ quase em termos de repetição ¾, que não se trata, no caso, de submeter o interesse público ao interesse particular da Recorrente. A ausência de regras claras quanto à política econômica estatal, ou, no caso, a desobediência aos próprios termos da política econômica estatal desenvolvida, gerando danos patrimoniais aos agentes econômicos envolvidos, são fatores que acarretam insegurança e instabilidade, desfavoráveis à coletividade e, em última análise, ao próprio consumidor.

Em face do exposto, conheço do recurso e lhe dou provimento.

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