Estrada fatal

Agência de viagens é condenada por acidente que matou turista

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6 de dezembro de 2005, 10h57

A agência BR Sul Turismo foi condenada a pagar indenização por danos morais de R$ 75 mil a José Freire de Góis, que perdeu sua mulher num acidente de ônibus na Rodovia Régis Bittencourt, em janeiro de 2003. A decisão é da juíza Criscia Curty Lopes, da 23ª Vara Cível do Rio de Janeiro. Cabe recurso.

A empresa alegava que não poderia responder pelo acidente porque era impossível prever a existência de buraco na pista. “É de conhecimento notório que as estradas do nosso país estão em péssimas condições e que toda a cautela deve ser utilizada pelos motoristas. No mais, o fato não tem a qualidade de inevitável, pois se fosse assim vários acidentes deste tipo teriam acontecido no mesmo dia com outros automóveis”, afirmou a juíza.

Irene Rodrigues de Góis viajava do Rio de Janeiro para Camboriú, em Santa Catarina, e morreu afogada após o motorista do ônibus perder o controle do veículo depois de passar por um buraco e cair de aproximadamente 10 metros de altura num rio. Para viajar, a passageira contratou a empresa La Rochelle Transportes Turísticos, que por sua vez contratou a BR Sul Turismo para o serviço de transporte.

Processo 2003.001.042438-0

Leia a íntegra da sentença

Trata-se de Ação condenatória, de rito ordinário, proposta por José de Freire de Gois em face de BR Sul Turismo Ltda, que tem por fim obter a condenação da Ré ao pagamento de indenização a título de reparação de danos materiais (danos emergente e lucros cessantes) e compensação por danos morais. Aduz o Autor que a esposa dele Sra. Irene Rodrigues e Góis faleceu em 14 de janeiro de 2003 em razão de acidente dado causa por preposto da Ré.

Explica que a Ré foi contratada pela esposa do Autor e outras pessoas para realizar o transportes deles do Rio de Janeiro à Camboriú em Santa Catarina. Que na viagem na altura do quilometro 363,5 da Rodovia Régis Bittencourt o motorista do ônibus perder o controle sobre a direção do automóvel e este despencou de um penhasco de aproximadamente 10 metros de altura e caiu dentro do Rio São Lourencinho. Afirma que a sua esposa morreu em virtude de afogamento.

Assevera que em razão do evento arcou com o pagamento da viagem da sua esposa, na ordem de R$ 500,00 e com o valor de R$ 4.524,56 com o funeral. Que a sua esposa exercia a atividade de costureira e percebia aproximadamente por mês a quantia de R$ 400,00, auxiliando o Autor com as despesas do lar.

Com a inicial vieram os documentos de fls. 11/30. Decisão às fls. 31 que designa audiência de conciliação, nos termos do artigo 277 do Código de Processo Civil e determina a citação. Em 30 de maio de 2003 foi realizada a audiência de conciliação momento em que as partes declararam a impossibilidade de acordo e que a Ré apresentou contestação de fls. 36/46, que veio acompanhada dos documentos de fls. 47/97.

Em resposta requer a Ré a denunciação à lide a empresa que, de fato, contratou a Ré para o serviço de transporte ´La Rochelle Transportes Turísticos Ltda´. E questão preliminar ao mérito alega a ilegitimidade ativa e passiva para a causa, pois o Autor não convivia com a vítima e já que não foi a demandada quem firmou contrato com a falecida.

Alega ainda a ausência de causa de pedir. No mérito alega que não há provas de que a falecida percebia R$ 400,00 mensais e que o Autor pagou a viagem para ela. Assevera que não cabe o ressarcimento das despesas com o funeral, pois a indenização do seguro obrigatório já serve para este fim.

Por fim alega que o fato foi imprevisível e que configurado está o caso fortuito/força maior. Decisão saneadora às fls. 100/104, que indefere a denunciação à lide, defere ao Autor a Gratuidade de Justiça, rejeita as preliminares suscitadas e defere a produção de prova testemunhal, depoimento pessoal do autor e prova documental suplementar.

Certidão às fls. 109 que atesta que a Ré não providenciou o recolhimento das custas para as diligências de intimação das testemunhas que arrolou e do Autor para prestar depoimento pessoal. Audiência de Instrução e Julgamento realizada em 20 de agosto de 2003, momento em que se verificou a ausência da Ré e o Autor desistiu da oitiva de uma de suas testemunhas. Pelo Juiz presidente da audiência foi determinado o aguardo da devolução das cartas precatórias expedidas para oitivas das testemunhas do Autor.

Admissão da Seguradora Hannover International Seguros S/A como assistente do Réu, conforme autos em apartados. As duas cartas precatórias expedidas foram devidamente devolvidas. Alegações finais pelo Autor às fls. 261/264 e pela assistente às fls 268/283. Certidão às fls. 286 que atesta a não manifestação da Ré em alegações finais. Os autos vieram conclusos para sentença em 03 de novembro de 2005.

ESTE É O RELATÓRIO.

EXAMINADOS.

DECIDO.

Fixo que o feito está pronto para julgamento, eis que percorridas todas as fases do rito sumário. De plano ressalvo que as questões preliminares ao mérito já foram decididas, que não há razões para a reconsideração da decisão e que, portanto, estão presentes os pressupostos processuais e as condições para o exercício regular do direito de ação, razões pelas quais passo a examinar a questão de fundo.

O Autor pretende a condenação da Ré ao pagamento de indenização por danos morais e materiais em razão do falecimento de sua esposa após um acidente em ônibus da Ré onde viajava. Da análise do conjunto de alegações e de provas, concluo que a pretensão autoral merece prosperar em parte, apenas no que tange à condenação da Ré ao pagamento de indenização para compensação pelos danos morais sofridos.

Isto porque, restou incontroverso que a esposa do Autor faleceu em acidente quando estava na qualidade de passageira em ônibus da Ré e já que a Ré não logrou convencer que o evento danoso aconteceu em razão da ocorrência de caso fortuito ou força maior.

Neste ponto destaco que não merece acolhida a alegação da Ré de que o acidente era imprevisível, pois o motorista do ônibus não poderia prever a existência de buraco na pista da ponte e que ao passar sobre ele iria perder o controle do ônibus, uma vez que entendo que não há imprevisibilidade desde fato, tendo em vista ser de conhecimento notório que as estradas do nosso país estão em péssimas condições e que toda a cautela deve ser utilizada pelos motoristas de automóveis. No mais, o fato ainda não tem a qualidade de inevitável, pois se fosse assim vários acidentes deste tipo teriam acontecido no mesmo dia com outros automóveis.

Ressalvo ainda que não há que se discutir aqui a existência de culpa do preposto da Ré, pois a relação deduzida indica nos termos da Lei 8078/90 que a responsabilidade da Ré é objetiva, considerando que o Autor sofreu danos em razão do fato de consumo e é consumidor por equiparação.

No mais, não logrou a Ré provar a existência de qualquer outra excludente de responsabilidade nos termos do artigo 14 da Lei 8078/90. Nestes termos, considero que restam configurados o fato danoso e o nexo de causalidade, cabendo ainda apreciar os supostos danos sofridos pelo Autor.

No que tange ao dano material alegado, danos emergentes e lucros cessantes, reconheço a existência apenas do dano emergente advindo do pagamento das despesas do funeral da esposa do Autor. Isto porque o Autor apenas apresentou provas de custeio do funeral conforme documentos de fls. 28/29 e não logrou provar que custeou a viagem para a sua esposa.

E ainda porque não apresentou uma prova sequer de que ela exercia atividade laborativa remunerada e contribuía para as despesas do lar. Não obstante reconhecer a existência do dano material nos termos acima expostos, considero, na esteira do entendimento do Superior Tribunal de Justiça esposado no verbete 246 de sua Súmula, que este valor deve ser deduzido do valor da indenização já recebida pelo Autor do seguro obrigatório, conforme prova o documento de fls. 30.

No que pertine ao dano moral alegado, tenho que resta devidamente demonstrado, pois, o Autor provou sua condição de marido da falecida e já que a experiência comum indica que o falecimento de cônjuge gera ao sobrevivente grande sofrimento e dor emocional. Nesta perspectiva, resta ainda estabelecer o valor da reparação para indenização pelo dano moral sofrido.

Com fulcro nos princípios da razoabilidade, proporcionalidade, vedação ao enriquecimento sem causa e nos critérios da reprovabilidade da conduta das Rés, da intensidade e duração do sofrimento experimentado, aliados à capacidade econômica do causador do dano e do autor, fixo a quantia de R$ 75.000,00 (setenta e cinco mil reais), como valor de compensação do dano sofrido. Desta feita, em razão dos fundamentos acima expendidos, refuto as demais alegações da Ré e passo a decidir.

ISTO POSTO, JULGO PROCEDENTE, EM PARTE, OS PEDIDOS CONSTANTES NA INCIAL, APENAS PARA CONDENAR O RÉU A PAGAR AO AUTOR O VALOR DE R$ 75.000,00 (setenta e cinco mil reais) a título de compensação pelos danos morais sofridos. E JULGO IMPROCEDENTES OS DEMAIS PEDIDOS.

Ante a sucumbência recíproca, condeno as parte ao pagamento das custas processuais e determino que sejam compensados os honorários advocatícios, nos termos do artigo 24 do Código de Processo Civil. Isento, todavia, o Autor do pagamento das custas nos termos da Lei 1060/50. Após o trânsito em julgado e certificada a insubsistência de custas, dê-se baixa e arquivem-se os autos.

Registre-se. Publique-se. Intimem-se.

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