Revista íntima

Empregado que se recusou a ficar nu ganha indenização

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5 de dezembro de 2005, 12h03

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo) confirmou a tendência da Justiça de conceder indenização a trabalhadores submetidos à revista íntima. Os juízes 4ª Turma do tribunal condenaram uma empresa a pagar R$ 62 mil de indenização por danos morais a um trabalhador que tinha de “dar uma voltinha” nu para ser revistado.

Para os juízes, ninguém é culpado, até prova que se prove o contrário. E a revista íntima sem autorização judicial inverte essa ordem jurídica, estabelecendo a presunção de culpa dos empregados.

“O direito do empregador, de proteger o patrimônio próprio e, bem assim, o que lhe foi confiado por terceiros, termina onde começa o direito à intimidade e dignidade do empregado”, entendeu o relator do caso, juiz Ricardo Artur Costa e Trigueiros.

Depois de ser demitido pela Transbank Segurança e Transporte de Valores, o auxiliar de tesouraria entrou com processo na 2ª Vara do Trabalho de Santos, pedindo o pagamento de indenização por danos morais. Alegou que a empresa “o obrigava, todos os dias, a ficar totalmente nu no final do expediente a fim de ser revistado”.

Segundo os autos, a Transbank fazia um sorteio diário utilizando duas tampinhas, uma verde e outra vermelha. Se o empregado sorteasse a verde, era revistado de cueca; se retirasse a vermelha, deveria ficar nu e “dar uma voltinha”.

Um dia o empregado se recusou ser revistado e foi demitido por “descumprimento de normas de segurança da empresa”. Conforme alegou, a humilhação provocou “trauma irreparável”, com necessidade de acompanhamento médico e psiquiátrico. Na primeira instância, o trabalhador pediu que a reparação por danos morais fosse fixada em 500 salários mínimos — hoje, R$ 150 mil.

Para se defender, a Transbank sustentou que, “em virtude da crise de segurança que assola o país, nada mais natural que adote procedimentos de segurança para zelar pelo seu patrimônio e pela integridade de seus empregados. Dentre estas medidas (…), encontra-se, por exemplo, a revista dos empregados que, como o autor, prestam serviços no departamento de tesouraria ou caixa-forte”. A empresa também afirmou que, “curiosamente, o autor somente veio a se insurgir em relação à conduta — que afirma ter sido absolutamente vexatória e humilhante — após ter sido dispensado pela reclamada”.

A 2ª Vara do Trabalho de Santos entendeu que o trabalhador não comprovou o dano moral sofrido e negou o pedido de indenização. O ex-empregado recorreu ao TRT paulista. O juiz Ricardo Artur Costa e Trigueiros considerou que o “ato de ser obrigado a despir-se diante de terceiros, para satisfazer as suspeitas do empregador, constituiu grave humilhação”.

“Não é razoável que se submetesse sem constrangimento algum à revista íntima, nu ou de cuecas, diante de colegas e superior hierárquico, sob vaga suspeita de que pudesse ter surripiado algum numerário”, considerou o relator. Para ele, “a revista, sem que existam pelo menos indícios de comportamento delituoso e sem autorização judicial, constitui procedimento próprio dos regimes de exceção, autoritários, que colocam o cidadão sob permanente suspeita”.

O juiz ainda observou que, “não há nenhuma razão para que se estabeleça a premissa de que o trabalhador é sempre suspeito de furto ou apropriação indébita. Ao contrário, a regra em nosso país é que a gente humilde é honesta, e cada dia mais a delinqüência invade os estratos abastados da sociedade”.

A decisão da 4ª Turma do TRT de São Paulo foi unânime. Os juízes condenaram a Transbank a pagar indenização por danos morais no valor de 100 salários do empregado, o que equivale a R$ 62 mil.

Leia a íntegra da decisão

4ª. TURMA

PROCESSO TRT/SP NO: 01259200244202001(20030969454)

RECURSO: RECURSO ORDINÁRIO

1º) RECORRENTE: TRANSBANK – SEGURANÇA E TRANSPORTE DE VALORES LTDA.

2º) RECORRENTE: FRANCIMAR MARTINS MOTA

RECORRIDOS: OS MESMOS

ORIGEM: 02ª VT DE SANTOS

EMENTA: TRANSPORTADORA DE VALORES. NUDEZ. REVISTA ÍNTIMA. ATENTADO À DIGNIDADE DO EMPREGADO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. Ainda que se trate de empresa de transporte de valores, a prática diária de revista íntima, mesmo realizada por pessoa do mesmo sexo, não pode ser convalidada porque agride a dignidade humana, fundamento da República (CF, 1º, III).

O direito do empregador, de proteger seu patrimônio e o de terceiros termina onde começa o direito à intimidade e dignidade do empregado. A sujeição do empregado a permanecer nu ou de cuecas diante de colegas e superiores, retira legitimidade à conduta patronal, vez que incompatível com a dignidade da pessoa, com a valorização do trabalho humano e a função social da propriedade, asseguradas pela Constituição Federal (art. 1º, III e IV, art.5º, XIII, art. 170, caput e III) e ainda, porque a Carta Magna veda todo e qualquer tratamento desumano e degradante (art. 5º, inciso III ), e garante a todos a inviolabilidade da intimidade e da honra (art. 5º, inciso X).


Tratando-se de direitos indisponíveis, não se admite sua renúncia e tampouco, a invasão da esfera reservada da personalidade humana com a imposição de condições vexaminosas que extrapolam os limites do poder de direção, disciplina e fiscalização dos serviços prestados.

A revista íntima não pode ser vista como regra ou condição contratual, pois nem mesmo a autoridade policial está autorizada a proceder dessa forma sem mandado. A revista sem autorização judicial inverte a ordem jurídica vigente no sentido de que ninguém é culpado senão mediante prova em contrário.

Estabelecer presunção de culpa contra os empregados, apenas pelo fato de a empresa lidar com valores é consagrar odiosa discriminação contra os trabalhadores dessa sofrida categoria, como se fosse regra a apropriação por estes, do numerário confiado por terceiros aos seus empregadores. Decisão que se reforma para deferir indenização por dano moral (art. 5º, V e X, CF).

Contra a respeitável sentença de fls.133/138 recorre ordinariamente a reclamada no tocante à projeção do aviso prévio para fins de anotação do termo final do contrato de trabalho, argumentando que nem mesmo a contribuição previdenciária incide sobre o referido período indenizado. No tocante ao intervalo sustenta contradição entre a inicial e o que foi aduzido ao longo da instrução processual. Aduz ainda que descabe falar em reflexos do pagamento previsto no artigo 71 parágrafo 4º da CLT, pois o mesmo não têm caráter salarial, mas indenizatório, visto que o referido intervalo não se confunde com as horas extras.

Contra-razões fls.172/175.

Recorre adesivamente o reclamante propugnando pela nulidade processual a partir de fls.143 em razão do cerceamento de defesa e negativa de prestação jurisdicional, afirmando que o juízo ignorou as razões finais. Sustenta que o dano moral está caracterizado pela prática da revista vexatória. O apelo ainda persegue o pagamento das horas extras, na forma do pedido. Quanto ao vale-transporte, insiste o reclamante nas diferenças do benefício em exame.

No que toca aos valores relativos a FGTS e multa de 40%, afirma o reclamante que jamais foi feito o depósito correto. No que diz respeito aos recolhimentos fiscais e previdenciários, alega que a reclamada deve responder isoladamente, pois não pagou os títulos devidos ao reclamante na vigência do contrato. Aduz que o cálculo deverá ser mês a mês, a fim de que não seja prejudicado o trabalhador.

Finalmente, quanto à correção monetária afirma que o índice de atualização deve ter como época própria o 1º dia do mês de competência, já que a faculdade legal de pagamento dos salários no 5º dia útil do mês subseqüente não se aplica em processo judicial.

Contra-razões do recurso adesivo fls.193/225, foram subscritas posteriormente à data em que foi protocolizada a medida.

Considerações do Digno representante do Ministério Público do Trabalho, fls.227, quanto à inexistência de interesse público que justificasse sua intervenção.

É o relatório.

V O T O

Conheço de ambos os apelos porque presentes os pressupostos de admissibilidade.

RECURSO DA RECLAMADA

EFEITOS DA PROJEÇÃO DO AVISO PRÉVIO

Não obstante o reconhecido esforço de argumentação do patrono da reclamada, no tocante à baixa na CTPS comungo do entendimento firmado pelo Colendo Tribunal Superior do Trabalho através da Orientação Jurisprudencial n° 82: “A data de saída a ser anotada na CTPS deve corresponder à do término do prazo do aviso prévio, ainda que indenizado”. Com efeito, por força do que dispõe o parágrafo 1º, do artigo 487 da Consolidação das Leis do Trabalho, o lapso do aviso prévio, mesmo quando indenizado, integra-se ao tempo de serviço para todos os efeitos e assim, projeta a extinção jurídica do liame para o trintídio subseqüente.

Logo, incensurável a respeitável sentença de origem que bem aplicou ao caso o melhor direito vigente.

Mantenho.

INTERVALO PARA REFEIÇÃO E DESCANSO E SEUS REFLEXOS.

A questão passa pela livre valoração da prova, assegurada pelo artigo 131 do Código de Processo Civil, e nesse aspecto, os depoimentos das testemunhas do reclamante mostraram-se firmes e convincentes, diante dos detalhes que levam a formar a convicção da autoridade judicial.

Embora o intervalo intrajornada não concedido não esteja conceituado como hora extra, deve ser remunerado com o acréscimo idêntico ao das horas extras, o que não significa que se trate de labor em sobretempo, vez que este por definição legal corresponde ao trabalho prestado além do limite diário de oito ou do módulo hebdomadário constitucional de 44.

Trata-se sim, de hora trabalhada durante o período destinado ao descanso e alimentação e que deve ser remunerada, portanto, como se extra fosse, com acréscimo ao valor da hora normal, para desestimular o empregador a essa prática prejudicial ao trabalhador.


Devido o principal, seguem-se devidos os acessórios, ou seja, os reflexos do pagamento como extra, tal como estipulado pela autoridade judicial de origem

Mantenho.

RECURSO DO RECLAMANTE.

DO CERCEAMENTO

A preliminar de cerceamento, sob o fundamento de que a respeitável sentença não se pronunciou sobre os argumentos das razões finais, não se sustenta, diante da realidade dos autos.

O fato de os anseios da parte não terem sido atendidos não redunda em nulidade.

Rejeito a preliminar.

DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

As relações de trabalho devem pautar-se pela respeitabilidade mútua, face ao caráter sinalagmático da contratação, impondo-se aos contratantes, reciprocidade de direitos e obrigações. Desse modo, ao empregador, além da obrigação de dar trabalho e de possibilitar ao empregado a execução normal da prestação de serviços, cabe, ainda, respeitar a honra, a reputação, a liberdade, a dignidade e integridade física, intelectual e moral de seu empregado. Isto porque tratam-se de valores que compõem o patrimônio ideal da pessoa, assim conceituado o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valoração econômica, integrando os chamados direitos da personalidade, essenciais à condição humana e constituindo assim, bens jurídicos invioláveis e irrenunciáveis.

Tais valores foram objeto de preocupação do legislador constituinte de 1.988, que lhes deu status de princípios constitucionais que fundamentam a República (CF, artigo 1º, incisos III e IV), assegurando o direito à indenização pelo dano material e moral decorrente de sua violação (CF, art.5º,V e X).

Portanto, sempre que o trabalhador, em razão do contrato de trabalho, por ação ou omissão do empregador, sofrer lesão à sua dignidade, honra, ou ofensa que lhe cause um mal ou dor (sentimental ou física) causando-lhe abalo na personalidade ou psiquismo, terá o direito de exigir a reparação por danos morais e materiais decorrentes da conduta impertinente. Nesse sentido dispõem os artigos 186 e 927 do Código Civil de 2002 (artigo 159 do Código Civil de 1916, vigente à época dos fatos).

In casu, o reclamante imputou à reclamada, na inicial, responsabilidade por ter sido reiteradamente submetido a situação de grande humilhação e constrangimento diante de seus colegas de trabalho, visto que a demandada, dedicada à atividade de transporte de valores, obrigava-o a ficar inteiramente nu ao final do expediente, a fim de ser revistado.

A inicial esclareceu que os fatos ocorriam mediante sorteio feito pelo próprio trabalhador, utilizando duas tampinhas, sendo uma de cor vermelha e outra verde. O empregado que pegasse a vermelha deveria ficar nu e dar uma “voltinha”, o que era exigido pelo vigilante; a senha verde permitia que o empregado permanecesse de cuecas. Aduziu ainda a inicial, que dita revista é feita somente na cidade de Santos.

Argumentou o reclamante, na exordial, que tais fatos afetaram seu psiquismo, levando-o a procurar médico e psiquiatra, segundo documentos juntados, tendo sido receitados três remédios diferentes destinados ao combate de depressão.

E quanto à questão tratada na inicial informou que a sua dispensa resultou, segundo a reclamada, do “descumprimento das normas de segurança da empresa”, ou seja, recusou-se, em uma oportunidade, “a dar uma voltinha” totalmente despido.

A reclamada, em contestação, negou a situação vexatória e violação a privacidade e intimidade dos empregados (fls.54), porém, em virtude das atividades desenvolvidas (transporte de valores) admitiu a existência de revistas realizadas somente na presença do encarregado do mesmo sexo, procedidas individualmente, de forma moderada, discreta, visualmente e sem contato físico. (vide fls.53), com o consentimento dos empregados e com a “finalidade de evitar a subtração de bens e valores de terceiros”(fls.54).

Em depoimento, o preposto da reclamada afirmou, às fls.46, que “na saída, havia um sorteio e o sorteado passava por uma revista individual; o funcionário ficava com roupas íntimas….”

A primeira testemunha do reclamante Sr. Oswaldo Borges dos Santos Filho, em seu esclarecedor depoimento, às fls.46, informou que “….na saída iam para o vestiário de três a quatro pessoas, ficavam nus e davam “uma voltinha”…”

A segunda testemunha do reclamante, Sr. Edison Fernando Santana, quanto à questão aqui tratada, às fls.46 informou o seguinte: “…na saída reunia de quatro a cinco funcionários por vez, em um quartinho, os funcionários se despiam, e davam “uma voltinha”…”

Não obstante o D. Juízo de origem tenha afirmado que as testemunhas do autor não teriam sido uníssonas quanto ao procedimento da revista, os depoimentos acima reproduzidos, compatíveis com a própria defesa que admite o fato da revista, levam-nos a conclusão diversa.


Com efeito, os depoimentos em realidade são até harmônicos se considerado que o preposto chegou a confessar que as revistas eram feitas em trajes íntimos, enquanto a contestação havia sustentado que o procedimento adotado era moderado e sem constrangimento aos empregados.

A prova oral consubstanciou-se na oitiva de duas testemunhas do reclamante, que firmaram compromisso com a verdade e não foram contraditadas pela reclamada, não tendo havido prova ou contraprova oral por parte da empresa. Diante disso, e tendo a própria defesa admitido o fato da revista, prevalece a versão das testemunhas ouvidas, não infirmada por elemento de convicção em sentido contrário, de que o reclamante estava submetido ao constrangimento de ter que permanecer nu para ser inspecionado, a cada vez que era “sorteado”, se é que se pode dizer que tal circunstância traduz-se como sorte.

Ganham relevo, para uma análise mais aprofundada do tema, o perfil do trabalhador e as características do segmento explorado pela empresa.

Fosse o reclamante um modelo fotográfico e, ainda assim, a circunstância continuaria tendo relevo, vez que até para um “operário da nudez”, o ato de ser obrigado a despir-se diante de terceiros, para satisfazer as suspeitas do empregador, constituiria grave humilhação.

A ficha de registro do reclamante (doc. 1, Vol. 1 de documentos da série da reclamada) indica tratar-se de homem casado, pai de dois filhos.

Não é razoável que se submetesse sem constrangimento algum a revista íntima, nu ou de cuecas, diante de colegas e superior hierárquico, sob vaga suspeita de que pudesse ter surripiado algum numerário. A versão patronal, nesse particular, não se afigura crível.

Resta saber se a par do constrangimento inerente ao ato da revista íntima por motivo de suspeição, feita em um trabalhador comum, casado e pai de filhos, ainda assim a empresa estaria autorizada a procedê-la por considerar a medida indispensável à proteção do patrimônio a ela confiado e ainda, porque compatível com o direito de propriedade e o poder diretivo.

Não incorporo o argumento simplista de que a atividade econômica explorada pela reclamada autoriza de plano a revista de seus empregados.

Com efeito, ainda que se trate de empresa de transporte de valores, o procedimento adotado como meio de segurança, colocando empregados nus ou de cuecas, aleatoriamente, para a prática diária de revista, ainda que realizada por pessoa do mesmo sexo, no estado de direito, jamais poderá ser convalidado, muito menos a pretexto de proteger o patrimônio, porque agride a dignidade humana, que é fundamento da república (art. 1º, III, CF).

O direito do empregador, de proteger o patrimônio próprio e bem assim, o que lhe foi confiado por terceiros, termina onde começa o direito à intimidade e dignidade do empregado.

A privacidade e intimidade, não se pode esquecer, foram alçadas ao texto constitucional como bens a serem tutelados (art. 5º, X – “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material e moral decorrente de sua violação”), não se admitindo a renúncia a estas garantias constitucionais e tampouco a invasão dessas esferas reservadas da personalidade humana com a imposição, mediante cláusula contratual ou não, de condições vexaminosas que extrapolem os limites do poder de direção, disciplina e fiscalização dos serviços prestados.

A revista não pode ser vista como regra ou uma situação normal e nem pode ser considerada integrada como condição do contrato de trabalho, pois nem mesmo a autoridade policial está autorizada a proceder dessa forma sem que exista mandado emitido por autoridade competente.

Mais. A revista sem autorização judicial inverte a ordem jurídica vigente no sentido de que todos são inocentes salvo prova em contrário.

Estabelecer presunção de culpa contra o empregado, apenas pelo fato de a empresa lidar com valores é consagrar odiosa discriminação contra os trabalhadores dessa sofrida categoria, como se fosse regra a apropriação por estes, do numerário confiado por terceiros aos seus empregadores.

A revista sem que existam pelo menos indícios de comportamento delituoso, e sem autorização judicial, constitui procedimento próprio dos regimes de exceção, autoritários, que colocam o cidadão sob permanente suspeita.

Não há nenhuma razão para que se estabeleça a premissa de que o trabalhador é sempre suspeito de furto ou apropriação indébita. Ao contrário, a regra em nosso país é que a gente humilde é honesta, e cada dia mais a deliqüência invade os estratos abastados da sociedade.

De mais a mais, a se admitir como regra a revista, em face do princípio da reciprocidade seria o caso de se autorizar a que o empregado procedesse igual inspeção íntima no empregador e seus prepostos, para verificar se seus pertences ou valores de terceiros sob sua custódia foram subtraídos nas dependências da empresa.


Milita ainda, contra o argumento patronal de que a atividade da empresa tornaria exigível a revista íntima, o fato alegado na vestibular e não contestado (e portanto, incontroverso), de que aquele procedimento só existia na cidade de Santos, muito embora a reclamada tenha sede em diversas localidades do país e esteja organizada para operar em âmbito nacional e até no exterior (vide contrato social de fls. 88). Aí está. Ou a atividade de transporte e guarda de valores é de tal risco que exigiria – em tese -, a revista dos empregados em todas as suas sedes, ou a medida é despicienda e poderia ser substituída por outros procedimentos, não se justificando a imposição de revista discriminatória, somente em detrimento dos trabalhadores daquela cidade praiana.

Sob qualquer óptica temos que a situação em exame é típica de dano moral, por notória a humilhação, que atinge o trabalhador em sua dignidade e agride seus valores mais íntimos.

Diante da gravidade do modus operandi adotado pela ré na revista do autor não se admite a subjetividade no encaminhamento do debate quanto à extensão do dano sofrido. A hipótese dos autos não comporta devaneios acerca do conservadorismo ou liberalidade de uns em face da maior tolerância e adaptabilidade de outros. Sob um único ponto de vista a questão posta merece análise. Apenas sob a ótica do ser humano médio, sob sua perspectiva e conceito do que é certo ou errado e do que é admitido ou é censurável, a questão deve ser analisada. Evidente que para o homem médio a exposição de suas partes pudendas a terceiros, para submeter-se a revista, não pode, de forma alguma, ser tida como fato corriqueiro.

Indubitavelmente tal situação imposta pelo empregador, num primeiro momento causaria espécie, e, depois, ocorrendo reiteradas vezes, constrangeria, revoltaria e abalaria a auto-estima do indivíduo submetido a tal vexame, mormente considerado o fato humilhante de estar permanentemente sob suspeição pelo empregador.

As atividades desenvolvidas pela reclamada, de modo algum, autorizam a revista, mormente porque a própria sujeição em si, do trabalhador, a permanecer nu ou de cuecas diante de colegas e do superior, afasta qualquer legitimidade para a conduta patronal, vez que incompatível tal prática, com a dignidade da pessoa do trabalhador, com a valorização do trabalho humano e a função social da propriedade, asseguradas pela Constituição Federal (art. 1º, III e IV, art.5º, XIII, art. 170, caput e III) e ainda, porque a Carta Magna veda todo e qualquer tratamento desumano e degradante (art. 5º, inciso III ), e garante a todos a inviolabilidade da intimidade e da honra (art. 5º, inciso X).

In casu, os prepostos da reclamada, com a conduta adotada, como bem se extrai da prova oral colhida, indisfarçavelmente ofenderam a honra e a dignidade do reclamante perante seus colegas e pessoas do seu convívio social, ensejando esta condenável prática o direito à reparação indenizatória.

É inaceitável o argumento desenvolvido ao longo do processo de que, por não ter se insurgido, o reclamante teria concordado com a revista durante a vigência do contrato de trabalho. Indisfarçável a pressão patronal decorrente da própria situação de dependência econômica, vez que o trabalhador só tem como garantia da sua subsistência os recursos advindos da venda da sua força de trabalho, sendo de notório conhecimento as estatísticas que apontam para expressivas taxas de desemprego.

Insustentável ainda, a defesa discriminatória da legitimidade da revista íntima tão-somente em face do ramo de atividade da empresa, tanto mais em face da circunstância de que a prática não se estendia a todas as unidades da reclamada, e ainda, diante dos termos da CONVENÇÃO 111 DA OIT, ratificada pelo Brasil, que veda a Discriminação no Emprego e Profissão.

In casu, não há mesmo como tolerar o tratamento dispensado pela empresa aos empregados.

Em verdade, resta presumido o impacto moral e psicológico sofrido pela empregado pela injustificável invasão da intimidade, privacidade e à honra, que o legislador constitucional fez proteger inserindo tais salvaguardas como verdadeira cláusula pétrea, via artigo 5º, inciso X da Carta Magna de 1988.

Nunca é demais lembrar que o trabalhador é sujeito e não objeto da relação contratual, e tem o direito de preservar sua integridade física, intelectual e moral, em face do poder diretivo do empregador.

A subordinação no contrato de trabalho não autoriza a revista, ainda mais de forma íntima, com imposição de nudez ao trabalhador, para exame do corpo sob os olhares de colegas e superiores, a pretexto de proteger o patrimônio do empregador ou de terceiros.

A matéria em exame já foi objeto de Acórdão desta 4ª Turma, em brilhante Voto da lavra do Eminente Juiz Paulo Augusto Câmara, do qual constou a seguinte ementa, in verbis:


EMENTA Dano moral configurado. Revista abusiva e vexatória. Nudez do empregado. É certo que o empregador detém o poder diretivo, que lhe permite traçar as diretrizes para atingimento de suas metas. Todavia, esta prerrogativa não se sobrepõe jamais ao princípio da dignidade humana (valor humano). Os cuidados patronais pela preservação de seu patrimônio encontram limite intransponível nos direitos personalíssimos.

A revista do empregado não pode resultar em injustificada invasão de privacidade, pois são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, direitos estes assegurados por norma de status constitucional (art. 5º, inc. X da Constituição Federal de 1988).

A conduta do empregador que desborda dos limites da dignidade do homem configura procedimento vexatório e humilhante que impõe a indenização por danos morais ao trabalhador (art. 5º, inc. V, CFR/88). DECISÃO por unanimidade de votos, dar provimento parcial ao recurso ordinário, para condenar a reclamada a pagar indenização por dano moral no importe de R$ 13.000,00 (Treze mil reais), com custas no importe de R$ 460,00, calculadas sobre o valor da condenação, redimensionado para R$ 23.000,00.

Mantém-se, quanto ao remanescente, a r. sentença combatida, tudo nos termos da fundamentação do voto. DOE SP, PJ, TRT 2ª Data: 20/05/2005 PG: Partes Recorrente(S):Gílson Antônio Oliveira Recorrido(S): Transpev Transp de Valores e Segurança. Relator Paulo Augusto Câmara. Acórdão Num: 20050286654 Decisão: 10 05 2005 Tipo: Ro01 Num: 01100 Ano: 2005 Número Único Proc: Ro01 – 01100-2004-054-02-00

Recurso Ordinário Turma: 4ª Órgão Julgador – Quarta Turma.

A jurisprudência, em situações semelhantes, vem reiteradamente reconhecendo o direito à indenização por dano moral, conforme se verifica in verbis:

EMENTA : DANO MORAL – INDENIZAÇÃO – EMPRESA DE TRANSPORTE DE VALORES – A condenação ao pagamento da indenização por dano moral tem caráter pedagógico em relação ao empregador, que deve ficar atento para que não mais deixe realizar procedimentos de tamanho constrangimento aos seus empregados, como o aqui relatado: o reclamante sujeita-se a revista íntima diariamente na empresa, sendo obrigado a despir-se na presença de outro funcionário, a fim de que fosse conferido eventual furto de numerário.

Na fixação do valor da indenização por danos morais deve o juízo visar a reparação do dano e a prevenção da reincidência, levando em linha de conta a situação econômica do empregador. Sentença que se mantém integralmente. PARTES RECORRENTE(S): TRANSPEV Transporte de Valores e Seguranca Ltda RECORRIDO(S): Robson de Oliveira Martins. RELATOR TRIBUNAL: 3ª Região DECISÃO: 19 11 2003TIPO: RO NUM: 00600 ANO: 2003 NÚMERO ÚNICO PROC: RO – 00600-2003-020-03-00-7 TURMA: Oitava Turma Juiz Heriberto de Castro DJMG DATA: 29-11-2003 PG: 20

O Tribunal Superior do Trabalho em situação semelhante também não discrepa desse entendimento:

EMENTA INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – REVISTA ÍNTIMA. O Eg. Tribunal de origem emitiu entendimento no sentido de que não há dano moral a ser objeto de indenização resultante de vistoria pessoal (revista) feita em empregado despido, mas levada a efeito de forma respeitosa, por empresa que tem de velar pelos produtos que manipula de natureza farmacêutica, tóxica e psicotrópica.

Logra o Reclamante demonstrar o dissenso mediante o primeiro aresto transcrito e o último de fl. 180 (RO 313/97), ambos inadmitindo a revista pessoal, por constituir ato de constrangimento, não obstante a atividade da empresa seja ligada à manipulação de medicamentos e drogas. Recurso conhecido por divergência jurisprudencial. Quanto ao mérito, decide-se pelos seguintes fundamentos: filio-me à corrente cujo entendimento é favorável à indenização.

Com efeito, não há circunstância que autorize o empregador a proceder à revista de seus empregados quanto mais se ela os constrange a despirem-se, por mais respeitosa que seja a conduta do preposto responsável pela vistoria. É de todos sabido que o contrato de trabalho envolve um mínimo de fidúcia entre ambas as partes.

Se ao empregador remanesce dúvida sobre a integridade moral do candidato ao emprego deve, então recusar a contratação. Não há como conciliar uma confiança relativa com o contrato de trabalho variável conforme a natureza da atividade da empresa.

Se esta a direciona para a manipulação de drogas e substâncias psicotrópicas, deve, naturalmente, tomar as precauções necessárias à segurança, como, por exemplo, a instalação de câmeras, que em nada ofendem a dignidade do trabalhador. Mas não pode, a pretexto disso investir-se dos poderes de polícia e submeter seus empregados a situações de extremo constrangimento, com total desprezo do direito do cidadão à preservação de sua intimidade.


Não é por menos que tais valores e direitos foram erigidos ao “status” de objeto de garantia constitucional, o que se verifica do contido nos arts. 1º, III, 5º, III, e, sobretudo o art. 5º, X, todos da Constituição. Nesses preceitos estão garantidos como direitos fundamentais a dignidade da pessoa, a vedação do tratamento desumano e degradante, assim como a inviolabilidade da intimidade e da honra.

Este Tribunal, inclusive por esta mesma Segunda Turma, já proferiu decisões no mesmo sentido quanto à revista íntima, como se pode verificar dos processos RR 641571/00, Quarta Turma, DJ 21/02/03, Rel. Min. Antônio José de Barros Levenhagen e RR 512905/98, Segunda Turma, DJ 07/02/03, Rel. Juiz Convocado José Pedro de Camargo. Recurso a que se dá provimento para condenar a Reclamada ao pagamento de indenização por dano moral, na forma do pedido. DECISÃO Unanimemente, conhecer do recurso de revista e, no mérito, dar-lhe provimento para condenar a Reclamada ao pagamento de indenização por dano moral, na forma do pedido. Partes Recorrente: Jorge Rosário Marinho. Recorrida: Distribuidora Farmacêutica Panarello Ltda. Relator Juiz Convocado Samuel Corrêa Leite DJ DATA: 06-02-2004 Tribunal: Tst Decisão: 26 11 2003 Proc: Rr Num: 533779 Ano: 1999 Região: 03 Recurso De Revista Turma: 02 Órgão Julgador – Segunda Turma.

Ex positis, tendo ficado caracterizado o constrangimento praticado pelos prepostos da reclamada, há que responder o empregador pela obrigação de indenizar os danos morais resultantes dos atos praticados. Na fixação do valor, atento para a capacidade do ofensor, que opera em âmbito nacional, a condição do ofendido, e a feição pedagógica e suasória da condenação, arbitrando-o em 100 (cem) salários contratuais do autor, observado o último valor global percebido.

Reformo.

HORAS EXTRAS

A inicial informou a jornada de trabalho prestada pelo reclamante, (fls.06) nos primeiros oito meses de vigência do contrato de trabalho, e também, no interregno de setembro/98 a junho/2001 e finalmente, no período de julho/2001 até a rescisão.

Foi denunciado, inclusive, que o intervalo mínimo de onze (11) horas entre as jornadas não era observado (fls.04)

A exordial também informou que os controles eram assinados pelo obreiro por imposição da reclamada, sendo os horários, no entanto, adulterados pelo gerente (vide fls.07).

E diante do denunciado, postulou diferenças de horas extras excedentes de oito (8) diárias e quarenta e quatro (44) horas semanais, como também, aquelas relativas a inobservância do intervalo de onze (11) horas entre jornadas, e ainda, aquelas relativas aos primeiros oito (8) meses, com arrimo no Enunciado 118 do C.TST, e reflexos conseqüentes nos títulos contratuais.

Postulou ainda o reclamante, acréscimo de vinte por cento (20%) nas horas extras prestadas em prorrogação da jornada noturna, como também, diferenças de adicional noturno e integrações nos títulos contratuais.

A reclamada, em contestação, negou os fatos (fls.62) asseverando que “A ré jamais adotou tal prática, sendo certo que, os registros consignam a efetiva e real jornada de trabalho cumprida pelo autor. Tanto é assim que, não obstante a absurda alegação quanto a suposta manipulação dos registros, rendendo-se à realidade fática, admite a validade dos mesmos requerendo a juntada dos controles aos autos, sob as penas do artigo 359 da Lei Adjetiva”

Negado pela defesa que os registros de ponto eram manipulados e levando-se em conta que o reclamante, ainda assim, insistiu em que a reclamada carreasse aos autos os registros de ponto, os quais afirmou serem manipulados, restou endereçado ao autor o ônus de provar a jornada informada na inicial, nos três períodos em que laborou.

Todavia, desse encargo não logrou êxito, visto que a prova oral por ele produzida não permite o deferimento, já que as testemunhas não informaram a jornada efetivamente prestada, além do que, a segunda testemunha do reclamante, Sr. Edison Fernando Santana, em depoimento às fls.46, asseverou que “…passava cartão magnético para registrar seus horários; passava corretamente; não acontecia de passar a saída e continuar trabalho…”

No entanto, essa circunstância foi contrariada pela primeira testemunha, Sr. Oswaldo Borges dos Santos, às fls.46, ao asseverar que “…os horários não eram corretamente anotados; três a quatro vezes por semana registravam a saída e permaneciam trabalhando…”

Portanto, o exame da prova, nesse aspecto, não permite o reconhecimento da jornada alegada na inicial e tampouco as diferenças de adicional noturno.

Mantenho.

VALE- TRANSPORTE

O reclamante, na inicial (fls.08), afirmou que no período relativo aos oito primeiros meses laborava no horário das 07:00 às 09:00 horas às segundas feiras, contando numerário da empresa Breda Transportes, não lhe sendo fornecido vale-transporte para o referido labor.


A reclamada, em contestação, assevera que o reclamante recebeu correta e integralmente o vale-transporte. (fls.74).

A controvérsia diz respeito apenas ao vale-transporte relativo às segundas-feiras, pois o autor afirmou que nesses dias contava numerário da empresa Breda Transportes no horário das 07:00 às 09:00 horas, retornando depois, para a sua residência.

A prova em questão diz respeito apenas ao local de prestação de serviços às segundas-feiras e a respectiva jornada de trabalho, contudo, as testemunhas, nesse aspecto, em nenhum momento informaram que às segundas a prestação de serviços ocorria em local diverso.

Logo, não há como acatar a pretensão do reclamante, diante das alegações e provas produzidas.

Mantenho.

DIFERENÇAS DE FGTS E MULTA DE 40%.

O reclamante, na inicial (fls.09), afirmou que o Fundo de Garantia jamais foi depositado corretamente.

A reclamada, em contestação, através dos documentos nº 176 e seguintes encartados no volume II de documentos em apartado, da série da reclamada, comprovou que os depósitos do FGTS eram efetuados regularmente, não se verificando qualquer diferença ao serem confrontados com os recibos de pagamento. Aliás, nem mesmo o reclamante logrou demonstrar quaisquer diferenças.

Logo, impossível acatar a pretensão quando o exame da prova documental não permite o deferimento de diferenças.

Mantenho.

DA CORREÇÃO MONETÁRIA.

A incidência da correção monetária observará os termos do artigo 39, da Lei 8.177/91 c/c o disposto no artigo 459 da Consolidação das Leis do Trabalho, considerando-se época própria a data do efetivo vencimento da obrigação, porque o marco inicial para a exigibilidade do direito, consoante entendimento já sedimentado cristalizado na Súmula 381 do Colendo TST.

Mantenho.

DOS DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS

1-) Descontos previdenciários

No que diz respeito aos recolhimentos fiscais e previdenciários, adoto o entendimento firmado na Súmula 368 do C.TST incisos II e III.

As contribuições previdenciárias (Lei nº 8.212/91) devem ser atribuídas às partes, em proporção, cabendo ao empregado responder pela sua quota de participação, sendo nesse sentido o Provimento nº 2/93 do C. TST.

Acerca desse tema, já se pronunciou aquela Excelsa Corte, nos seguintes termos:

“As contribuições previdenciárias a incidir sobre créditos reconhecidos judicialmente ao obreiro em ação trabalhista devem ser descontados por determinação do próprio julgador, na forma da Lei 7.787/89, art. 12; do Provimento 3/84, da Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho e da Lei 8.212/91, arts. 43 e 44 (TST, RR 79.995/93.0, Vantuil Abdala, ac. 2a. T. 3.291/93).

“Descontos previdenciários. A Consolidação das Leis do Trabalho no seu art. 462, veda ao empregador efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamento, de dispositivo legal ou de contrato coletivo. Os descontos previdenciários resultam de lei e são dedutíveis das parcelas salariais, no percentual atribuível ao empregado. Não tem pertinência o fundamento de que a contribuição não incidiria porque não houve desconto e recolhimento no momento oportuno, posto que as parcelas que deram origem à incidência questionada só foram reconhecidas ao empregado por decisão judicial e a partir deste momento passa a ser oportuno o seu recolhimento”. (RR 27058/91.3, Rel. Indalécio Gomes Neto, DJU 11.09.92, pág. 14818).”

Ressalto que para apuração correta do crédito da previdência social, deve ser observada a Ordem de Serviço nº 66 de 10.10.97.

Portanto, deverão ser deduzidos mês a mês os valores já recolhidos à Previdência Social, observando-se mensalmente as alíquotas previstas no artigo 20 da Lei 8.212/1991, e o respectivo teto de contribuição.

Assim sendo, as diferenças dos descontos previdenciários serão apuradas discriminadamente, atentando-se que a dedução previdenciária deverá ser calculada mensalmente, com base no teto mensal estabelecido no artigo 20 da Lei 8.212/1991, na Orientação Normativa nº 02 de 15.08.94 do Secretário da Previdência Social, combinados com Ordem de Serviço nº 66 de 10/07/97 e o Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999 (“Art. 198 (..) e artigo 276 – §4º – A contribuição do empregado no caso de ações trabalhistas será calculada, mês a mês, aplicando-se as alíquotas previstas no art. 198, observado o limite máximo do salário-de-contribuição”), incidente sobre os valores devidos mês a mês, e atentará para as alíquotas e tabelas pertinentes, de acordo com suas vigências, deduzindo-se mensalmente os valores já recolhidos.

As deduções só serão perpetradas sobre o crédito quando o efetivo recolhimento estiver comprovado nos autos. Portanto, quanto aos recolhimentos previdenciários, cada parte arcará com sua cota, a ser comprovada, sob pena de execução nos próprios autos.


2-) Descontos fiscais

A retenção do imposto de renda na fonte decorre do disposto no artigo 46 da Lei nº 8.541, de 23.11.92 e do Provimento nº 1/96 da Corregedoria do TST.

O artigo 45 do CTN estabelece que a lei pode atribuir à fonte pagadora da renda a condição de responsável pela retenção e pagamento do imposto, que é o que faz a Lei nº 8.541/92.

Com a edição da Lei nº 7.713/88, desde 01.01.89 restou consagrado o regime de caixa, ou seja, a renda é considerada recebida quando paga, não se observando o regime de competência (mês a que se refere). O cálculo não mais será feito em separado de cada mês, mas sim toma-se todo o rendimento recebido e aplica-se a tabela do mês do pagamento, com a respectiva alíquota desse mês. A lei a ser observada corresponde à da época em que for realizado o pagamento, verificando-se os dependentes e as isenções.

Neste aspecto, observando os princípios da legalidade e da reserva legal, fica ressalvado que, segundo a lei vigente, não incide tributação sobre verbas de caráter indenizatório, nas hipóteses previstas no artigo 46, § 1º., inciso I, da Lei 8.541/92.

Estabelece o citado art. 46, § 1º., inciso I, da Lei nº. 8.541/92:

“Art. 46. O imposto sobre a renda incidente sobre os rendimentos pagos em cumprimento de decisão judicial será retido na fonte pela pessoa física ou jurídica obrigada ao pagamento, no momento em que, por qualquer forma, o recebimento se torne disponível para o beneficiário.

§ 1º Fica dispensada a soma dos rendimentos pagos no mês, para aplicação da alíquota correspondente, nos casos de:

I – juros e indenizações por lucros cessantes;

II – honorários advocatícios;

III – remuneração pela prestação de serviços de engenheiro, médico, contador, leiloeiro, perito, assistente técnico, avaliador, síndico, testamenteiro e liquidante.” (grifamos).

Os juros de que trata o inciso I do artigo 46 da Lei nº. 8.541/92 consistem em juros de mora, pois são devidos em virtude da expropriação temporária de valores devidos ao empregado. Assim, em virtude de sua natureza jurídica indenizatória, não estão sujeitos à incidência do imposto de renda. É que os créditos no processo trabalhista não representam investimento do trabalhador, e assim, os juros sobre eles incidentes objetivam indenizar a mora, não se confundindo com os juros de natureza compensatória ou remuneratória de capital aplicado.

O debate a respeito da exação tributária já foi travado no Tribunal Pleno do C. TST, que recentemente concluiu pela não incidência do imposto de renda sobre os juros de mora.

Neste sentido cabe destacar a seguinte ementa de julgado:

“DESCONTOS FISCAIS – NÃO-INCIDÊNCIA SOBRE JUROS DE MORA.

A Lei nº. 8.541/92, que alterou a legislação do imposto de renda e deu outras providências, estabeleceu, no artigo 46, § 1º, I, a exclusão dos juros de mora da base de cálculo do imposto de renda, devido em virtude de percepção de valores decorrentes de decisão judicial, pois têm natureza indenizatória, legitimados em face da expropriação temporária de valores devidos ao Reclamante. Logo, os descontos fiscais devem ser efetuados sobre o total dos valores pagos ao Reclamante, advindos dos créditos trabalhistas sujeitos à incidência tributária, excluídos os juros de mora.”

Processo nº TST-RR-797.031/2001.8 Publicado no DJ 29/11/2002 3ª Turma Ministra Relatora Maria Cristina Irigoyen Peduzzi.

(grifamos).

Importante ressaltar que o C. TST já firmou entendimento, por meio da Orientação Jurisprudencial nº. 207, da SDI-I, de que o imposto de renda não incide sobre verba de natureza indenizatória: “Indenização. Imposto de renda. Não-incidência.”, incidindo tal interpretação, à espécie, por analogia.

Portanto, ficam excluídos da incidência do imposto de renda os juros de mora.

Destarte, o imposto de renda também não incidirá sobre as férias indenizadas (Súmula 125 do STJ), FGTS e multas normativas, além daquelas hipóteses de doenças incuráveis previstas em lei (artigo 39 inciso XX do Decreto 3.000/99), e também, sobre os juros que possam vir a ser aplicados sobre tais títulos.

Se o valor do imposto de renda for recolhido em importe superior ao devido, o autor poderá buscar eventual restituição ao apresentar sua declaração anual de ajuste, como faculta a legislação.

Todas as deduções, sejam fiscais ou previdenciárias, só incidirão sobre o crédito quando o efetivo recolhimento estiver comprovado nos autos.

Reformo parcialmente.

Do exposto, conheço de ambos os apelos e, no mérito, NEGO PROVIMENTO ao recurso da reclamada e de outra parte DOU PROVIMENTO PARCIAL ao recurso adesivo do reclamante para condenar a reclamada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de cem (100) salários contratuais, bem como autorizar descontos fiscais e previdenciários, na forma da fundamentação que integra e complementa este dispositivo, mantendo, no mais, a respeitável sentença de origem.

RICARDO ARTUR COSTA E TRIGUEIROS

Juiz Relator

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