Desde janeiro deste ano, entendimento firmado pelo Cade — Conselho Administrativo de Defesa Econômica vem reduzindo o número de processos administrativos em até 30%. A chave da redução está na aplicação do princípio da territorialidade para decidir quais casos estão sujeitos à análise do órgão.
Pelo entendimento, o conselho só analisa casos de concentração em que o faturamento de uma das empresas ou grupos for igual ou superior a R$ 400 milhões no território brasileiro ou que tiveram participação no mercado brasileiro relevante de, pelo menos, 20%. A novidade está justamente no termo “território brasileiro”.
Na Lei 8.884, que transformou o Cade em autarquia, não consta a informação de que deveria ser considerado o faturamento e a participação no mercado apenas no Brasil. O parágrafo 3º do artigo 54 não especifica isso. Todas as empresas que tinham faturamento anual de R$ 400 milhões ou mais, independentemente de ser de origem nacional ou internacional, se submetiam à análise do órgão.
“A lei era omissa quanto a questão da territorialidade e, na dúvida, as empresas apresentavam todos os atos de concentração. O volume de processos era grande e, consequentemente, as decisões demoravam”, explica o advogado Ernani Teixeira Riberio Júnior, do escritório Peixoto e Cury.
O entendimento começou a ser pacificado em janeiro deste ano, com o voto do conselheiro Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer. Ao analisar a compra de todas as ações da Krone e da Krone Digital pela ADC, ele dispensou a operação da análise do Cade. Embora o faturamento mundial da ADC seja de R$ 2,38 bilhões, no Brasil é de apenas R$ 7 milhões. Por isso, Pfeiffer entendeu que a operação não representava risco para a concorrência. Foi acompanhado por unanimidade e sugeriu que a decisão desse origem à súmula.
Em 18 de outubro, o Cade publicou a sua súmula de número um, que diz: “Na aplicação do critério estabelecido no artigo 54, parágrafo 3º, da Lei 8.884/94, é relevante o faturamento bruto anual registrado exclusivamente no território brasileiro pelas empresas ou grupo de empresas participantes do ato de concentração”.
O conselheiro Roberto Pfeiffer, em seu voto no caso da ADC, ainda demonstrou que, do total de casos de concentração aprovados com alguma restrição pelo Cade nos últimos três anos, o faturamento das empresas era igual ou superior a R$ 400 milhões em território nacional ou tinha participação no mercado brasileiro relevante de 20%. Conclui-se que, quando a empresa ou grupo não se enquadra em nenhum destes casos, a operação feita por ela não prejudica à livre concorrência no país.
Resumindo: o Cade estava tendo trabalho desnecessário. A publicação da súmula e a redução dos processos desde janeiro, teve reflexo direto na agilização dos casos analisados pelo conselho e, consequentemente, em maior rapidez para as operações das empresas.
“A decisão é importante porque poupa a máquina estatal de analisar operações que não precisam ser analisadas”, comemora o advogado especialista em Direito Societário e de Contratos Aloísio Carneiro da Cunha Menegazzo, do Emerenciano, Baggio e Associados.
A medida, conforme considera o advogado Lauro Celidônio, do Mattos Filho Advogados, não traz nenhum risco para a livre concorrência. Dados apresentados pelo conselheiro Pfeiffer comprovam isso, até o momento.
Súmula 1
Embora o Cade exista desde 1962 e tenha se tornado autarquia do Ministério da Justiça em 1964, a edição de súmulas só foi permitida em fevereiro deste ano, com a publicação da Resolução 39.
Veja a íntegra do acórdão, relatório, voto e parecer do primeiro processo que deu origem à Súmula 1
Íntegra do Acórdão
ATO DE CONCENTRAÇÃO Nº 08012.002992/02004-14
Requerentes: ADC Telecommunications, Inc. e Krone International Holding Inc.
Advogados: Tito Amaral de Andrade e Adriana Franco Giannini
Relator: Conselheiro Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer
EMENTA: Ato de Concentração. Aquisição de Ações. Negócio Krone. Mercado de Produtos e Serviços de Conectividade. Faturamento das Requerentes no território nacional abaixo de R$ 400.000.000,00. Participação das Requerentes no mercado relevante abaixo de 20%. Revisão da jurisprudência tradicional do CADE. O critério estabelecido no art. 54, § 3º, da Lei 8.884/94 leva em conta o faturamento bruto anual registrado exclusivamente no território brasileiro pelas empresas ou grupo de empresas participantes do ato de concentração. Não subsunção ao art. 54, §3º c/c o art. 2º da Lei 8.884/94. Extinção do processo sem julgamento de mérito. Operação não conhecida. Proposta de edição de súmula.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, em conformidade com os votos e as notas eletrônicas, acordam a Presidente e os Conselheiros do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, por unanimidade, não conhecer do presente Ato de Concentração, por não estar subsumido às hipóteses previstas pelo art. 54, § 3o, julgando o processo extinto sem julgamento do mérito, mantendo as taxas recolhidas, tendo em vista a movimentação da máquina estatal e o exercício do poder de polícia no presente caso. Participaram do julgamento a Presidente Elizabeth Maria Mercier Querido Farina e os Conselheiros Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer, Ricardo Villas Bôas Cueva, Luis Fernando Rigato Vasconcellos e Luiz Carlos Thadeu Delorme Prado. Presente a Procuradora-Geral Maria Paula Dallari Bucci. Ausente justificadamente o Conselheiro Luiz Alberto Esteves Scaloppe. Brasília – DF, 19 de janeiro de 2005, data do julgamento da 338ª Sessão Ordinária de Julgamento.
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