À revelia

Editora Três é condenada por renovar assinatura sem autorização

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24 de agosto de 2005, 13h22

A Editora Três e a Credicard — Administradora de Cartões de Créditos foram condenadas a indenizar um leitor por renovar a assinatura da revista Isto É, sem a autorização do leitor. A decisão é da 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que fixou a indenização por danos morais em R$ 3 mil. Cabe recurso.

Marco Antônio Sales se tornou assinante da revista em 18 de março de 1999. O contrato estabelecia a entrega de104 edições. O pagamento foi feito em seis parcelas mensais de R$ 55. Vencido este prazo, sem que manifestasse nenhum interesse em continuar recebendo a revista, a Editora Três cobrou a parcela referente à renovação do contrato.

Imediatamente, o leitor solicitou o cancelamento da assinatura. Mas, ao contrário do que esperava, foi surpreendido com a cobrança de mais quatro parcelas consecutivas. Marco Antônio ajuizou ação de indenização contra o Grupo de Comunicação Três e a Credicard S/A – Administradora de Cartões de Crédito.

Em primeira instância, as empresas foram condenadas a indenizar o consumidor por danos morais em R$ 5,2 mil. Inconformado com a decisão, o grupo de comunicação recorreu ao Tribunal de Justiça.

Os desembargadores Guilherme Luciano Baeta Nunes (relator), Unias Silva e D. Viçoso Rodrigues observaram que a conduta da editora gerou transtornos para o consumidor, já que, sem sua intenção, ficou obrigado a pagar por algo que não contratou e, para completar, não foi atendido quando pediu para cancelar a cobrança.

Apesar de a Credicard S/A não ter recorrido, os desembargadores entenderam que as duas empresas devem pagar, solidariamente, a indenização, reduzida para R$ 3 mil. Segundo o relator, “os fatos não causaram ao autor qualquer repercussão negativa no âmbito da sociedade em que vive, nem mesmo lhe ensejaram qualquer restrição de crédito ou coisa similar, daí porque a fixação do valor deve ser moderada”.

Processo 0516536-2

Leia a íntegra do acórdão

EMENTA: COBRANÇA ARBITRÁRIA – REVISTA – ASSINATURA – RENOVAÇÃO – AUSÊNCIA – DANOS MORAIS.

A cobrança arbitrária e indevida de débito resultante de renovação de assinatura de revista semanal, a qual não teve o consentimento do assinante, configura ofensa moral passível de reparação civil.

O juiz, ao fixar o valor da indenização por danos morais, deve estar atento aos critérios da proporcionalidade e razoabilidade, observando a extensão do dano e o grau da culpabilidade do ofensor, sob pena de não fazer a verdadeira justiça.

O arbitramento do dano moral em valor inferior ao pleiteado na inicial não caracteriza sucumbência recíproca.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível Nº 516.536-2 da Comarca de VARGINHA, sendo Apelante (s): (1º) GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S.A., (2º) MARCO ANTÔNIO SALES e Apelado (a) (s): EMPRESA DE REPRESENTAÇÃO EDITORIAL LTDA. E OUTRO E OS MESMOS,

ACORDA, em Turma, a Décima Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais DAR PARCIAL PROVIMENTO À PRIMEIRA E SEGUNDA APELAÇÕES.

Presidiu o julgamento o Desembargador JOSÉ AFFONSO DA COSTA CÔRTES e dele participaram os Desembargadores GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES (Relator), UNIAS SILVA (Revisor) e D. VIÇOSO RODRIGUES (Vogal).

O voto proferido pelo Desembargador Relator foi acompanhado, na íntegra, pelos demais componentes da Turma Julgadora.

Belo Horizonte, 11 de agosto de 2005.

DESEMBARGADOR GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES

Relator

VOTO

O SR. DESEMBARGADOR GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES:

Cuida-se de duas apelações, a primeira delas interposta pelo Grupo de Comunicação Três S.A., e a segunda por Marco Antônio Sales, contrariando a decisão prolatada às f. 90-93, pela qual a ilustre Juíza de primeiro grau, motivadamente, julgou procedente, em parte, o pedido objeto da ação de indenização versada nestes autos, quando acabou por julgar improcedente a pretensão contida na lide secundária.

A primeira apelante alega, nas razões recursais produzidas às f. 97-108, que a prorrogação do contrato de assinatura da revista foi amplamente divulgado nos exemplares recebidos pelo apelado, e a ausência dos requisitos necessários à responsabilização civil frustra o pedido de indenização; que, mesmo que assim não fosse, o responsável pelas cobranças efetuadas ao autor é a própria administradora de cartões de crédito; que a cobrança se deu pela prorrogação presumida do contrato; que o autor não teve seu nome incluído em nenhum cadastro restritivo de crédito, sequer foi submetido a protesto indevido ou sofreu qualquer prejuízo a configurar direito em ser indenizado; que, se a indenização fosse devida, fora ela fixada em quantia exacerbada, devendo, pois ser reduzida ao valor correspondente ao “dobro do valor pago indevidamente pelo autor”; que a responsabilidade da denunciada é evidente, daí por que faz-se mister a reforma da sentença hostilizada no que toca o indeferimento da denunciação da lide; que os juros e correção monetária, se devidos, hão de ser contados apenas do trânsito em julgado da decisão recorrida.

O segundo apelante sustenta, através das razões recursais de f. 112-115, a necessidade de se impor reforma na sentença recorrida, eis que, ao seu pensar, a indenização foi arbitrada em quantia irrisória; que, considerando a solidez e a grandeza das sociedades recorridas, a verba indenizatória não se mostra apta a inibir a reiteração do ato; que o pedido exordial foi integralmente acolhido, inexistindo razão para a sua condenação proporcional em custas e honorários.

O primeiro recurso foi alvo das contra-razões produzidas às f. 117-120, nas quais o apelado refuta os argumentos expendidos pelo Grupo de Comunicações Três S/A.

A ré, por sua vez, ofertou as contra-razões de f. 122-130, rechaçando, por completo, o inconformismo manifestado pelo segundo apelante.

Os dois recursos foram devidamente preparados.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos.

DA PRIMEIRA APELAÇÃO.

Falece razão à primeira apelante, quando assevera que a culpa pelas cobranças efetuadas ao autor, de forma indevida, deva ser debitada à Administradora do Cartão de Crédito.

A referida tese revela-se completamente conflitante com os próprios argumentos expendidos pela apelante, já que esta, com muita transparência, também afirma que a prorrogação do contrato de assinatura da revista foi “amplamente divulgada nos exemplares recebidos” pelo autor. Em assim sendo, força reconhecer que a própria apelante admite ter operado a prorrogação do referido contrato, emergindo daí a conclusão de que os débitos registrados no cartão do assinante, pela referida Administradora, tiveram como causa o comando emanado da suposta credora, o que a legitima a responder os termos da ação intentada pelo autor.

Do mesmo modo, a alegação de que o autor não sofreu qualquer dano passível de reparação não merece êxito.

A conduta da ré, ora apelante, por sua conta e risco, sem a anuência do assinante, em promover a renovação da assinatura de revista semanal, com a conseqüente cobrança de valores através de débitos na fatura mensal de cartão de crédito, por si só, já constitui a prática de ato abusivo a violar o direito do consumidor.

Referido comportamento além de inadmissível e reprovável, também gera transtornos para o consumidor, sendo evidente o seu constrangimento, pois, sem a sua intenção se vê onerado e cobrado por negócio que não contratou.

Pelas missivas de f. 10, 11 e 13, todas dirigidas à Editora Três, é possível notar que o autor, por várias vezes manteve contato com a ré em busca de fazer cessar a cobrança indevida, sem, contudo, obter êxito, até que se viu obrigado a se valer de ação judicial destinada a defender seu direito.

Todo o transtorno experimentado pelo autor poderia ter sido evitado, mas a ré além da sua censurável conduta em exigir a remuneração por um serviço não contratado, também fez ouvidos moucos à insistente reclamação promovida pelo então assinante, a este dispensando tratamento incompatível com as normas contidas no Código de Defesa do Consumidor.

Desse modo, todos os requisitos necessários à configuração da responsabilidade civil da apelante se fazem presentes.

A conduta antijurídica está claramente delineada, na medida em que a apelante insistiu e impôs ao réu a cobrança por um serviço não contratado, sequer prestado, negligenciando, ainda, na adoção de medida a estancar a continuidade do ilícito.

Quanto ao reclame referente o valor arbitrado a acobertar os danos morais, reconheço que razão, em parte, está com a ré.

Por falta de parâmetro legal e doutrinário, de natureza objetiva, a servir de norte para o arbitramento dos danos morais, compete ao órgão julgador a árdua missão de dosar a verba indenizatória em casos como o versado nestes autos.

Cabe ao juiz, relevando as peculiaridades de cada espécie, agir com prudência, observando os critérios de proporcionalidade e razoabilidade, tendo ainda em conta a extensão do dano e a culpabilidade do ofensor, sob o risco de impor punição excessiva ao responsável direto ou indireto pelo dano e, na outra ponta, premiar o ofendido.

A reparação, por certo, não visa apenas mitigar os efeitos dos sentimentos negativos sofridos pela vítima, mas também inibir a reiteração da conduta ilícita injustificadamente perpetrada.

Na hipótese, a extensão dos danos morais sofridos pelo autor não é grande, pois a ofensa apenas atingiu o seu íntimo. Os fatos não causaram ao autor qualquer repercussão negativa no âmbito da sociedade em que vive, nem mesmo lhe ensejou qualquer restrição de crédito ou coisa similar, daí por que a fixação do quantum indenizatório há de ser moderada, sem exagero.

Nessas circunstâncias, considerando, ainda, a proibição do enriquecimento sem causa do ofendido, bem como a força econômica da ré, entendo que o valor dos danos morais, no caso em análise, deve ser fixado na quantia de R$3.000,00 (três mil reais), com juros legais e correção monetária, conforme estipulado na sentença.

Inconsistente é o pedido de reforma do tópico da decisão monocrática, que julgou improcedente o pedido de denunciação da lide.

Deflui da fala da apelante, materializada à f. 28, último parágrafo, que a responsabilidade pela cobrança das parcelas não devidas pelo autor, por assinatura de revista que não pretendeu renovar, é fruto de deliberação exclusiva da denunciante, o que não autoriza a procedência do pedido formulado contra a denunciada. Some-se a isso que os contatos mantidos pelo autor, em busca de resolver seu problema, pelo teor dos documentos de f. 10, 11 e 13, foram todos com a própria apelante, sem nenhuma participação da denunciada, o que também inibe a pretensão da denunciante.

Com essas considerações, DOU PROVIMENTO, EM PARTE, À PRIMEIRA APELAÇÃO, reduzindo o valor dos danos morais para R$ 3.000,00 (três mil reais), quantia única a ser suportada pelas rés, bem como determinando a observância dos juros de mora de 0,5% ao mês, até a data da entrada em vigor do atual Código Civil, quando eles passarão a ser de 1% ao mês.

Custas do primeiro recurso na ordem de 70% para a apelante, e os 30% restantes a cargo do apelado.

DA SEGUNDA APELAÇÃO.

O segundo apelante almeja, com a interposição do seu recurso, a majoração da verba indenizatória e a revisão da distribuição dos ônus de sucumbência.

A questão referente à verba indenizatória já restou apreciada e decidida quando do julgamento da primeira apelação, portanto, em relação a este particular, dou por prejudicado o recurso.

Finalmente, quanto à distribuição dos ônus da sucumbência, razão assiste ao apelante.

A fixação do valor dos danos morais em valor inferior àquele postulado na inicial não implica em derrota para o autor, por isso entendo não ser possível seja declarada a existência de sucumbência mútua a permitir a reciprocidade e rateio de tais ônus.

Pelo exposto, DOU PROVIMENTO, EM PARTE, AO SEGUNDO RECURSO, para impor às rés, com exclusividade, o múnus de suportarem o pagamento integral das custas e honorários advocatícios, com o peremptório afastamento da sucumbência recíproca equivocadamente declarada na sentença recorrida.

O apelante deve arcar com o pagamento de 70% das custas do recurso que aviou, ficando as apeladas responsáveis pelo pagamento dos 30% restantes.

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