Secretária de Valério

STJ livra Fernanda Karina de ação penal por extorsão

Autor

22 de agosto de 2005, 15h26

Fernanda Karina Ramos Somaggio, a ex-secretária do empresário Marcos Valério de Souza, está livre de responder, ao menos por enquanto, a processo por extorsão. O Superior Tribunal de Justiça concedeu liminar em Habeas Corpus para suspender a ação penal contra ela por entender que a denúncia está baseada em uma falsa premissa.

A denúncia foi apresentada por Marcos Valério, sócio das agências de publicidade SMP&B e DNA e apontado como um dos operadores do mensalão. Fernanda Karina foi secretária do empresário entre maio de 2003 e janeiro de 2004.

O relator do Habeas Corpus, ministro Hamilton Carvalhido, considerou que a denúncia colide com o depoimento de Adriana Fantini Boato, secretária de Cristiano de Mello, sócio de Valério.

Na denúncia, Marcos Valério diz que Adriana Fantini recebeu, após a demissão de Fernanda Karina, telefonemas nos quais a ex-secretária fazia ameaças e pedia dinheiro para não revelar informações da vida pessoal e profissional de Valério.

Na verdade, em depoimento, a secretária de Cristiano Mello disse que “ficou com a impressão de que Karina visava obter alguma vantagem”.

Para o ministro, “a imputação deduzida” é suficiente para garantir a plausibilidade jurídica do pedido de liminar para suspender a ação, até que a 6ª Turma do STJ julgue o mérito do Habeas Corpus e decida pelo trancamento definitivo ou não do processo.

Denúncia

No dia 1º de setembro do ano passado, Marcos Valério apresentou à Polícia Civil de Minas Gerais denúncia contra Fernanda Karina. O publicitário acusava a secretária de extorsão, crime previsto no artigo 158 do Código Penal. De acordo com o empresário, a ex-secretária, em agosto de 2004, avisou por telefone que estava sendo procurada por um jornalista para informar sobre a vida de Marcos Valério e que estaria disposta a fornecer tais dados, caso não recebesse ajuda financeira.

Segundo a denúncia, os telefonemas foram recebidos pela também secretária Adriana Boato, que levou ao conhecimento da gerente financeira das agências, Simone Vasconcellos, que por sua vez contou o que houve a Marcos Valério.

Em depoimento à polícia, por ocasião da instrução do processo, Adriana não falou que Fernanda Karina tentou obter vantagem financeira. O relato diz que, “por telefone, Karina disse muito da empresa e das relações de Marcos Valério e precisava alertá-lo de que tinham pessoas lhe procurando para obter informações sigilosas da empresa e da vida pessoal dele”. Adriana Boato ainda completou afirmando que “pelo que Karina disse, as pessoas que a estavam procurando se tratava de jornalistas”.

Depois de ter o pedido para trancar a ação penal rejeitado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a defesa de Karina apresentou Habeas Corpus ao STJ. A defesa alegou inépcia e ausência de justa causa para a denúncia e sustentaram que não há extorsão porque a ex-secretária jamais teria conversado diretamente com Marcos Valério sobre o assunto.

Para a defesa de Karina, ela não teria condições de intimidar o empresário porque foi “somente uma ex e simples secretária, e ele, um poderoso empresário da área de publicidade, além de ser super relacionado com todas as autoridades do poder e do mundo financeiro”.

A decisão liminar do ministro relator pode ser revista no julgamento do mérito do Habeas Corpus. Até lá, a ação penal ficará suspensa.

Leia a íntegra da decisão

HABEAS CORPUS Nº 46.751 – MG (2005/0131305-6)

RELATOR : MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO

IMPETRANTE : RUI CALDAS PIMENTA

IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

PACIENTE : FERNANDA KARINA RAMOS SOMAGGIO

DECISÃO

1. Habeas corpus contra o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que, denegando writ impetrado em favor de Fernanda Karina Ramos Somaggio, preservou-lhe o processo da ação penal a que responde pela prática do delito tipificado no artigo 158, caput, do Código Penal, em acórdão assim ementado:

“HABEAS CORPUS – EXTORSÃO – TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL – MEDIDA DE EXCEÇÃO – ORDEM DENEGADA.

‘Não se deve, no nascedouro da ação penal, decretar o trancamento de seu curso, se a denúncia descreve fato que, em tese, configura tipo penal. Somente após a depuração das circunstâncias, providência a ser efetivada durante a instrução criminal, é se poderá afastar, ou não, a culpabilidade do paciente.'” (fl. 121).

A impetração está fundada na falta de justa causa para a persecutio criminis e na inépcia da denúncia.

Alega o impetrante que “Como se vê pela peça inicial, os fatos narrados e tidos como criminosos teriam acontecido, em conversa telefônica, com a Adriana Fantini Boato, outra secretária da empresa, e por sua vez levou ao conhecimento de outra secretária, desta feita a denúncia sequer cita o nome de quem, ou seja, a denúncia não descreveu o fato como exigido pelo artigo 41, do Código Penal, que exige que a mesma conterá ‘a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias”.’ (fl. 17).

Sustenta, mais, que “(…) o fato descrito não constitui crime aos olhos da lei, vez que a extorsão exige constranger alguém, e no caso presente, pelos fatos narrados, vê-se claramente, que o Sr. Marcos Valério não foi constrangido em momento algum, em razão da paciente jamais ter conversado com ele sobre o mencionado assunto, assim como jamais teria condições de intimidá-lo, mormente por ter sido uma ex e simples secretária, e ele um poderoso empresário da área de publicidade, além de ser super relacionado com todas as autoridades do poder e do mundo financeiro.” (fl. 17).

Aduz, de resto, que é impossível se fazer uma defesa, eis que “(…) existem, de forma expressa, duas datas do referido fato narrado, a primeira nos idos de janeiro e a segunda em idos de agosto, sendo certo, que pela descrição da Sra. Adriana Fantini Boato, a suposta ligação telefônica se deu uma única vez, aliás junta-se ao presente o seu depoimento junto ao MM. Dr. Juiz da 6ª Vara Criminal, onde se vê que a paciente jamais pediu a ela qualquer dinheiro para fazer ou deixar de fazer alguma coisa. Segundo se depreende de seu depoimento, ela ‘supôs’ ou ‘deduziu’, ou seja, imaginou que a paciente teria ‘pedido’ algum dinheiro.” (fl. 17).

Pugna, liminarmente, pela suspensão do andamento da ação penal, até o julgamento do presente writ.

Tudo visto e examinado.

DECIDO.

Desprovida de previsão legal específica (artigos 647 a 667 do Código de Processo Penal), a liminar em sede de habeas corpus, admitida pela doutrina e jurisprudência pátrias, reclama, por certo, a demonstração inequívoca dos requisitos cumulativos das medidas cautelares, quais sejam, o periculum in mora e o fumus boni iuris.

In casu, a denúncia (fls. 37/39) não encontra ressonância no depoimento de Adriana Fantini Boato (fls. 57 e 134), em que se essencializa a imputação deduzida contra a paciente, o que assegura o quantum da plausibilidade jurídica do pedido, necessário ao acolhimento do pleito cautelar initio litis.

Pelo exposto, induvidosa a conveniência da medida, defiro a cautela, para suspender o andamento da Ação Penal nº 2004.4612653, a que responde Fernanda Karina Ramos Somaggio, até o julgamento do presente writ.

2. Comunique-se, com urgência, ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais e ao Juízo da Causa.

3. Ficam dispensadas as informações, por adequadamente instruída a inicial.

4. Vista ao MPF.

5. Publique-se.

6. Intime-se.

Brasília, 22 de agosto de 2005.

Ministro Hamilton Carvalhido, Relator

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!