Sistema prisional

Penas alternativas são mais baratas e mais eficazes

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21 de agosto de 2005, 11h43

Duas coisas que pareciam inconciliáveis começam a andar juntas no sistema carcerário brasileiro: a punição dos infratores com redução de gastos. Números do Ministério da Justiça demonstram que a aplicação de penas alternativas traz benefícios não só para os condenados — que se livram da cadeia em troca da prestação de serviços à comunidade ou o pagamento de cestas básicas —, mas também para os cofres públicos.

“Já está provado que a pena tradicional é cara e muitas vezes ineficaz. Nosso grande desafio é mostrar que, além de mais barata, a pena alternativa, se bem monitorada, é o contrário da impunidade”, afirma o Juiz Flávio Augusto Fontes de Lima, da Vara de Execução de Penas Alternativas do Tribunal de Justiça de Pernambuco, também integrante do Conselho Nacional de Acompanhamento de Penas e Medidas Alternativas.

Criada há quatro anos, a Vara de Penas Alternativas de Pernambuco foi a segunda do país. A primeira foi instalada em Fortaleza. Hoje existem outras cinco do gênero, em Salvador, Aracaju, Curitiba, Porto Alegre e Belém do Pará. Em todas elas, os resultados são animadores. Na vara de Pernambuco, por exemplo, que atende a 13 comarcas da Região Metropolitana do Recife e monitora 2.400 “beneficiários” (quase 17% da população carcerária do Estado, que é de 14.500 presos), a taxa de reincidência é quase nula: “Em nosso caso, a reincidência fica abaixo de 1%”, garante o Juiz Flávio Fontes.

De acordo com as estatísticas, a troca das penas privativas de liberdade (prisão) pelas restritivas de direitos (alternativas) tornou-se sinônimo de economia e resultado. A começar pela recuperação dos infratores, os números impressionam. No Brasil, o percentual médio de reincidência no sistema carcerário tradicional, que tem na privação da liberdade do condenado o seu modelo milenar, chega a robustos 65%. Veja bem: de cada 100 presos, apenas 35 não voltam para a prisão! Quando a pena aplicada é alternativa, o percentual de reincidência despenca para enxutos 5%.

Mesmo levando-se em conta grau de periculosidade, perfil dos criminosos, tipo e modo do crime cometido, e outros pressupostos que determinam a aplicação da pena tradicional ou da alternativa (pela Lei brasileira, esta só pode ser aplicada a determinados crimes, sem violência ou grave ameaça, e com condenação de até 4 anos), as diferenças numéricas entre uma e outra, ainda assim, são expressivas.

As comparações tornam-se ainda mais significativas quando o assunto é dinheiro público. Para manter um só preso na cadeia, o Estado brasileiro gasta, em média, entre R$ 700 e R$ 1 mil por mês. Por outro lado, estima-se que o monitoramento de um sentenciado a pena alternativa custa em torno de R$ 70 mensais. Ou seja, o preço de uma punição tradicional pode ser até 15 vezes maior do que o valor gasto na execução de uma pena alternativa. Um dado extra onera a pena de prisão: cada vaga em presídio, segundo os dados do Ministério da Justiça, custa R$ 15 mil.

Esses números — e custos! — se potencializam quando se tem em mente o crescimento da população carcerária do país. Na metade da década de 1990, eram cerca de 150 mil presos. Em 2002, já superavam 200 mil. Hoje o universo prisional é de 330 mil presos no Brasil.

Para ilustrar, na prática, a possibilidade de economia com as penas alternativas, o Juiz Flávio Fontes cita um grupo especial de beneficiários de pena alternativa. Em Pernambuco, de forma inédita no país, existem 59 casos de réus condenados com base no Artigo 12 da Lei 6.368/76 (Lei de Entorpecentes), que tiveram concedida a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos.

Esses homens e mulheres deveriam estar presos, em regime fechado, porque o crime cometido é assemelhado aos hediondos (Lei 8.072/90), sem direito à progressão de regime. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal ainda não decidiu a questão e, com penas de até 4 anos, eles foram beneficiados com a conversão. “Pois bem, se estivessem presos, calculando-se a despesa de R$ 700 por pessoa, apenas estes apenados custariam R$ 41,3 mil mensais ao Estado”, afirma Fontes. Um dado relevante: no grupo de beneficiários citado pelo Juiz, a taxa de reincidência é zero, apontando no sentido de que a medida tem se mostrado acertada.

Comparado a outros países, o Brasil ainda esboça um percentual tímido na aplicação de penas alternativas. Do universo de 330 mil presos do sistema prisional brasileiro, pouco mais de 9% (cerca de 30 mil pessoas) estão submetidos a este tipo de punição pelo cometimento de crimes. Em alguns países da Europa, como o Reino Unido, o mesmo percentual chega a 80% do total de condenados.

Por aqui, a depender da política criminal adotada, esse número poderia crescer para cerca de 20%. Estudos do Ministério da Justiça indicam que 66 mil condenados no país – e não apenas os 30 mil atuais – poderiam trocar as celas das penitenciárias pelo cumprimento de penas alternativas. “É fundamental que existam no Brasil projetos no sentido de se ampliar ainda mais a utilização das penas alternativas, mas é preciso também se tomar o cuidado de não se ampliar muito sem criar mecanismos de fiscalização, pois este tipo de pena só funciona bem com um bom monitoramento do seu cumprimento” , alerta Fontes.

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