Aumento de salário

O que o governo pode fazer com a MP do salário minimo

Autor

  • José Levi Mello do Amaral Júnior

    é professor associado de Direito Constitucional da USP professor do mestrado e do doutorado em Direito do Ceub livre-docente doutor e mestre em Direito do Estado procurador da Fazenda Nacional cedido ao TSE e secretário-geral da Presidência do TSE.

17 de agosto de 2005, 17h06

Está na iminência de ser votado projeto de lei de conversão relativo à Medida Provisória 248, de 20 de abril de 2005, que fixou em R$ 300 o valor do salário-mínimo.

A MP 248 foi aprovada pela Câmara dos Deputados sem modificações. No entanto, o Senado Federal elevou o valor do salário-mínimo para quase R$ 385. Modificada a MP pela Casa revisora, voltou à Casa de origem, que tem duas opções: (1) ou também aprova o valor majorado pelo Senado; (2) ou restabelece o valor original.

Primeira hipótese: se acaso a Câmara restabelecer o valor original, a lei de conversão daí resultante será promulgada (cf. leitura a contrario sensu do parágrafo 12 do artigo 62 da Constituição de 1988).

Segunda hipótese: se acaso a Câmara aderir ao valor majorado pelo Senado, o projeto de lei de conversão vai à sanção (ou veto) presidencial (cf. parágrafo 12 do artigo 62 da Constituição de 1988).

Nesta segunda hipótese, é provável que o Governo manifeste veto total contra o projeto de lei de conversão.

Em isso acontecendo, o salário-mínimo regredirá ao valor anterior de R$ 260, preservadas as relações jurídicas concretas firmadas com base na MP 248, isto é, os valores majorados pagos sob a sua vigência foram bem pagos e os contratos de trabalho firmados com base no valor majorado são preservados (atos jurídicos perfeitos preservados nos termos do parágrafo 11 do artigo 62 da Constituição).

Mas como fica o futuro?

Um primeira solução seria, concomitantemente ao veto, publicar uma nova medida provisória retomando o valor de R$ 300 para o salário-mínimo. A desvantagem desta solução é que pode configurar uma reedição, agora vedada pela Constituição em seu artigo 62, parágrafo 10. Por outro lado, na literalidade do parágrafo 10 do artigo 62, o veto total não parece impeditivo de “reedição”. Claro, a interpretação literal é pobre, rasteira.

No entanto, há outro argumento que daria guarida a esta primeira solução: a Constituição veda a edição de MP sobre matéria já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto (artigo 62, parágrafo 1º, IV). Em já havendo veto contra o projeto de lei de conversão, parece reaberta a possibilidade de edição de MP sobre a mesma matéria.

Com efeito, circunstância parecida moveu a edição da MP 8, de 31 de outubro de 2001. Claro, tratava-se, ali, de veto contra projeto de lei. No caso presente, trata-se de projeto de lei de conversão. Não obstante, o projeto de lei de conversão equivale a um projeto de lei. Tanto isso é verdade que um e outro resultam ato normativo da mesma espécie: uma lei ordinária.

O argumento pode parecer interessante. De toda sorte, importa considerar o seguinte: a reedição é vedada pela Constituição, entre outros motivos, para fazer prevalecer a vontade do Poder Legislativo contra a do Poder Executivo. No limite, poderia acontecer de o Presidente da República vetar insistentemente um projeto de lei de conversão e, a seguir, reeditar a medida provisória, o que não se pode admitir.

Um segunda solução (considerada pelo Governo, segundo noticiado pela mídia) seria o simples veto total seguido da edição de uma medida provisória fixando um abono de R$ 40,00 sobre o valor anterior do salário-mínimo (R$ 260,00). Vale destacar: o efeito prático e as eventuais conseqüências jurídicas são, em boa medida, nesta segunda solução, similares aos da primeira solução cogitada.

Terceira hipótese: se acaso a MP 248 caducar por decurso de prazo (o que poderá acontecer em função de obstrução promovida pelo Governo ou pela oposição na falta de acordo), também ficará restabelecido o valor anterior do salário-mínimo (R$ 260).

Enfim, seja como for, importa, aqui, destacar as limitações – e constrangimentos – que a Emenda Constitucional 32, de 11 de setembro de 2001, impõe à Medida Provisória. Em casos tais, fica evidenciado o óbvio: a conversão em lei devolve ao Congresso Nacional o protagonismo da atividade legislativa, momento em que é fundamental que a maioria e a minoria do dia dialoguem e encontrem ponto de acordo, sob pena de o decurso de prazo fazer caducar a medida provisória.

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