Primeiro voto

Dono do Real sai na frente na disputa com minoritários

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10 de agosto de 2005, 13h49

O empresário Aloysio Andrade Faria começou bem o julgamento do Recurso Especial, que contesta a venda das ações do Banco Real e da Companhia Real de Crédito Imobiliário para o grupo holandês ABN-Amro. O relator, ministro Barros Monteiro, reconheceu o direito do empresário de transferir para seu patrimônio pessoal bloco de ações das sociedades abertas e depois revendê-las por preço superior.

O julgamento do Recurso Especial pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça foi iniciado na terça-feira (9/8) e interrompido pelo pedido de vista do ministro Cesar Asfor Rocha. Aguardam para votar os ministros Fernando Gonçalves, presidente da Turma, Aldir Passarinho Junior e Jorge Scartezzini. O recurso foi apresentado por Eduardo Slerca e outros investidores minoritários.

Para o ministro, se Aloysio de Andrade Faria detinha o controle indireto do Banco Real e do Banco Real de Investimento, não se pode dizer que tenha vendido o que não era seu, nem tampouco que tenha usurpado a oportunidade comercial das holdings abertas (Consórcio Real e Real Participações) e do Banco Real de Investimento de alienar diretamente as companhias operacionais abertas de interesse do ABN Amro Bank

De milhão a bilhão

Em julho de 1998, utilizando seu poder de controlador, Faria transferiu 62,45% das ações da empresa por R$ 220 milhões e revendeu em seguida ao grupo holandês ABN Amro por R$ 2,3 bilhões, equivalentes à época, US$ 2,3 bilhões.

Slerca, que representa os 73 mil acionistas minoritários, contesta a legalidade da transação. Ele ingressou com ação indenizatória para reposição do patrimônio das holdings de capital aberto Consórcio Real e Real Participações, no valor pelo qual o negócio foi transacionado, alegando supostos prejuízos causados ao patrimônio das sociedades

Os acionistas minoritários alegaram que “o controlador usurpou a oportunidade de a própria sociedade realizar a venda diretamente, agindo em total conflito de interesse com a empresa que administrava”.

Já o empresário argumentou ser o controlador das ações das empresas e ter sido totalmente legal a operação que realizou para facilitar a venda do Banco Real, já que era o dono único do grupo, tendo sido ele próprio quem fundou e desenvolveu todas as sociedades.

A sentença em primeira instância foi favorável ao pedido de indenização, determinando que se devolvesse o valor de US$ 2,3 bilhões à sociedade aberta, dividindo esse valor por todos os acionistas de acordo com o volume de capital que possuíssem nas empresas.

Mas o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, acolhendo a apelação do empresário, julgou improcedente a ação de ressarcimento. Para o TJ-RJ, não ficou comprovado que o negócio concretizado pelo acionista controlador teria causado dano aos acionistas minoritários integrantes das sociedades controladas. Conforme o acórdão, a responsabilidade civil do controlador dependeria da prova da ocorrência de dano causado aos outros acionistas, o que não teria ficado caracterizado no processo.

Abuso de poder

No recurso especial ao STJ, Slerca invoca a violação de artigos do Código de Processo Civil e de dispositivos da Lei de Sociedades Anônimas. Alega que o empresário controlador detinha apenas um terço das ações e, por isso, teria retirado da empresa parte que não lhe pertencia, o que caracterizou uso abusivo do poder de controle. Além disso, teria havido fraude nos passos do ex-controlador, numa tentativa de ocultar o verdadeiro preço da negociação.

Slerca argumentou que Faria não poderia dispor dos bens (ações) como se fosse proprietário. Contestou que, da maneira como foi feito, o negócio excluiu da transação todo o universo de acionistas minoritários. Insistiu que o ex-controlador do Real praticou operação fraudulenta e danosa, segundo eles, agindo em seu próprio e exclusivo interesse e em franco detrimento das sociedades administradas e de seus acionistas, ao retirar o bloco das ações ordinárias por um valor simbólico e meramente contábil, só para cumprir contrato pessoal, anteriormente assinado em benefício próprio, de vender ao grupo holandês o conglomerado administrado por ele.

A defesa do empresário Aloysio Faria disse que os acionistas minoritários nunca tiveram o controle da empresa e buscam meramente um “prêmio da loteria jurídica”. Ressaltou que o dano depende da prova, o que não existiria nos autos. Para a defesa do ex-controlador, não existem controles superpostos, porque o controle é um ato de poder que, no caso, cabia apenas a Faria. Assim, não haveria impedimento para ele fazer o negócio no legítimo papel de controlador, o que fez “às claras”.

Quem controla

Preliminarmente, o relator do recurso especial afastou a nulidade do acórdão invocada pelo recorrente, que alegava não haverem sido sanados todos os pontos invocados na apelação. Para o ministro Barros Monteiro, ficou claro não serem as holdings de capital aberto as controladoras do Banco Real, mas sim o empresário, que detinha 99% do capital social das holdings de capital fechado e exercia o controle das holdings de capital aberto.

O relator refutou o argumento do recorrente de abuso de poder, porque, no seu entender, o poder de controle existia e, “em si, também é um bem econômico”. Quanto à contestação das cisões feitas pelo empresário, o ministro entendeu que elas tiveram como objetivo viabilizar a transferência para o ABN Amro, pois o grupo holandês tinha interesse em parte das empresas. “Quem pode o mais, pode o menos”, afirmou o ministro Barros Monteiro.

O ministro cita julgamento anterior da própria 4ª Turma, segundo a qual é passível de configurar a situação de acionista controlador a existência de um grupo de pessoas vinculadas sob controle comum, bastando que um ou algum de seus integrantes detenham a titularidade dos direitos de sócio de tal ordem que garanta ao grupo a supremacia nas deliberações da assembléia-geral e o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia. Ainda sobre a ocorrência ou não de permuta ou quanto ao valor atribuído à transação, o ministro relator invocou a Súmula 7 do STJ, que impede a análise de provas dos autos nesta instância.

Outro Recurso

O ministro Barros Monteiro também levou a julgamento outro recurso na qual a empresa Asa Administração de Bens contesta as cisões feitas pelo ex-controlador a fim de vender as empresas. A defesa da empresa argumentou que o desmembramento causou prejuízo ao acionistas. Por isso, pede o pagamento de indenização referente às diferenças encontradas entre os preços.

O pedido foi negado em primeira e segunda instâncias. Ao analisar o caso, o ministro Barros Monteiro também não conheceu do recurso especial, destacou parte da decisão de primeiro grau, que ressaltou o fato de as ações das empresas cingidas terem tido cotações maiores que anteriormente, ao contrário do que foi alegado.

O julgamento deste recurso também foi interrompido em razão do pedido de vista do ministro Cesar Rocha.

Resp 551932

Resp 556265

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