Valor máximo

Justiça limita reajuste de contratos da Sul América no RS

Autor

3 de agosto de 2005, 19h33

A Sul América Companhia de Seguro Saúde não pode reajustar os contratos firmados até janeiro de 1999 acima de 11,69%, índice previsto pela ANS — Agência Nacional de Saúde Suplementar na resolução 99/05. A decisão é do juiz Roberto Behrensdorf Gomes da Silva, da 15ª Vara Cível de Porto Alegre. Em caso de descumprimento, ele determinou multa diária de R$ 30 mil.

O juiz concedeu liminar, publicada no Diário Oficial na terça-feira (2/8), em ação coletiva de consumo ajuizada pelos promotores de Justiça Alexandre Lipp João, Alcindo Luz Bastos da Silva Filho e Rossano Biazus, da Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor. Cabe recurso. As informações são do Ministério Público do Rio Grande do Sul.

Uma semana antes, o desembargador Marcelo Navarro, do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, também limitou em 11,69% os contratos de planos feitos até janeiro de 1999. A ANS — Agência Nacional de Saúde Suplementar já informou que irá recorrer “o mais breve possível” da decisão. A agência reguladora baseia-se na lei 9.6956/98, que permitiu que as operadoras de plano de saúde fixem, em contrato, o valor e a freqüência dos reajustes.

As duas principais operadoras afetadas pela decisão judicial são a Sul América Companhia de Seguros e Bradesco Saúde. Com ela, as duas empresas não poderão aplicar reajustes já autorizados pela ANS de 25,80% e 26,10%, respectivamente.

O desembargador determinou ainda que nenhum usuário de plano de saúde seja multado ou tenha o atendimento suspenso pelas operadoras caso a prestação de julho, cobrada com o reajuste acima de 11,69%, não tenha sido paga.

Leia a íntegra da ação do MP gaúcho

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE PORTO ALEGRE:

Com distribuição preferencial a 15ª ou 16ª Varas Cíveis (Provimento nº 39/93-CGJ)

O MINISTÉRIO PÚBLICO, por intermédio da Promotoria de Justiça Especializada de Defesa do Consumidor, localizada no prédio deste Foro Central, na Rua Márcio L. Veras Vidor, 10, 5º andar, sala 573, Bairro Praia de Belas, nesta Capital, propõe a Vossa Excelência AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO contra SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE S. A., com endereço na Rua Sete de Setembro, 635/641, Lojas 5º ao 9º e 12º andar, Centro, nesta Capital, CEP 90010-190, pelos motivos de fato e de direito que passa a expor:

1. DOS FATOS:

A requerida, operadora de seguros de assistência médica, está enviando correspondência a inúmeros segurados seus comunicando reajustes totalmente abusivos, justificando-os como sendo necessário para “restabelecer o equilíbrio econômico das carteiras de clientes e o alto padrão de nossos produtos e serviços” (fl. 07 do IC). Afirma a demandada que o percentual de reajuste não depende de prévia autorização da Agência Nacional de Saúde Suplementar — ANS —, em razão de o seguro ter sido firmado antes de 2 de janeiro de 1999 e, por decisão do Supremo Tribunal Federal, ser regido exclusivamente por disposições contratuais. Parte da missiva transcrevemos a seguir:

“São Paulo, 22 de junho de 2004. Prezado (a) Segurado(a), Anualmente, no aniversário do seu seguro saúde, é feito um reajuste no valor da sua mensalidade, independente de eventuais reajustes por mudança de faixa etária. Neste ano, de acordo com as cláusulas contratuais, identificamos a necessidade de reajustar o prêmio mensal do seu seguro saúde para R$ 2.143,31, a partir do próximo boleto de pagamento, a ser enviado nos próximos dias, com o objetivo de restabelecer o equilíbrio econômico das carteiras de clientes e o alto padrão de nossos produtos e serviços. Esclarecemos que esse percentual não depende de prévia autorização da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS -, uma vez que se seguro foi firmado antes de 2 de janeiro de 1999 e, por decisão do Supremo Tribunal Federal, é regido exclusivamente pelas disposições contratuais. (…)

Importante: Informamos ainda que este reajuste não tem qualquer relação com o PROGRAMA DE INCENTIVO À ADAPTAÇÃO DE CONTRATOS, estipulado pelo governo através da Resolução 64 da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, de aceitação facultativa por você e que vise estimular a adequação dos contratos de planos de saúde contratados antes de 2 de janeiro de 1999 às regras e direitos assegurados pela Lei nº 9.656/98. A Sul América está apenas aguardando autorização da ANS para lhe enviar a documentação completa coma opção de ADAPTAÇÃO do seu contrato.”

Essa é uma carta referência, pois outros consumidores também foram tratados da mesma forma padronizada.

Segundo relata o consumidor que apresentou a reclamação, segurado há mais de 10 anos, ao contratar com a empresa requerida objetivou a efetiva cobertura dos riscos futuros à saúde, sendo que, para atingir esse objetivo, manteve relação de convivência e dependência com o fornecedor durante anos, pagando mensalmente suas contribuições conforme as instruções regulamentadoras de seu fornecedor.


Para ilustrar os fatos é conveniente registrar a reclamação de Paulo Marsiaj Oliveira (fl. 25 do IC):

“..Informa o autor que é segurado do plano de assistência médico hospitalar junto aos requeridos desde janeiro de 1992 sempre cumprindo com suas obrigações de acordo com as normas contratuais. Relata que a partir de agosto de 2003 os demandados entraram em contato ofertando a migração para um outro plano visando ‘adequá-lo’ às novas normas da ANS, tendo o autor se negado insistentemente. Correlatamente a partir de então os réus tem passado a negar autorização a atendimento os mais diversos a ponto de negar o reembolso de gastos de uma cirurgia de retirada de um tumor com alegação de que tratava-se de um procedimento estético. Negaram também os réus o pedido de autorização prévia para uma litotripsia ortopedica, considerando que trata-se de um tratamento não previsto contratualmente. Não bastasse os transtornos pelos quais vem passando o autor em junho do corrente ano recebeu uma correspondência na qual os requeridos acenam com a majoração do seu plano de saúde em 47,10%, ou seja, dos R$ 1.457,00 mensais passará a R$ 2.143,31 já tendo recebido o boleto de pagamento da mensalidade para o dia 10/07/2004, quando seu reajuste no mês de aniversário novembro/2004. O autor entrou em contato com o PROCON a fim de resguardar os seus direitos, tendo esse tomado as medidas administrativas mas como não houve nenhuma resposta foi orientado a ingressar com o presente processo nesses juizados.

Diante do exposto requer que seja deferida uma liminar por esse juízo no sentido de determinar aos réus que suspendam o reajuste de 47,10% voltando a cobrar-lhe os R$ 1.457,00 mensais até o exame do mérito. Requer também que os demandados sejam compelidos a autorizarem os exames que forem necessários visto que possui cobertura total. Requer a citação e condenação dos demandados a reconhecerem o seu direito no mérito majorando o plano de assistência de acordo com o índice da Agência Nacional de Saúde Suplementar sem qualquer outro tipo de ônus para o requerente, bem como o ressarcimento dos valores já gastos nos exames e procedimentos necessários.”

Muitas outras reclamações de consumidores lesados pelo réu foram recebidas, mormente no PROCON, como se observa no quadro demonstrativo que segue:

2. DA SUSPENSÃO DA RESOLUÇÃO NORMATIVA Nº 64/03:

Em primeiro lugar, cumpre destacar que a Resolução Normativa nº 64/03 da Agência Nacional de Saúde Suplementar, que dispôs sobre o Programa de Incentivo à Adaptação de Contratos, encontra-se suspensa em virtude de liminar concedida pelo Juiz Federal Roberto Wanderley Nogueira, da 1ª Vara Federal de Recife/PE, no dia 22 de junho do corrente ano, gerando efeitos em todo o Brasil, nesses termos:

“A entidade proponente da presente ‘class action’, constituída segundo a previsão do art. 5º, parte final, incisos I e II, da Lei nº 7.347/85, insurge-se contra iniciativa governamental, no caso representada pelas ações da autarquia demanda no que se refere aos diretivos da Lei nº 9.556/98, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde, e da Lei nº 10.850/04 (originária de conversão da Media Provisória nº 148/03), que lhe atribui competência para a implantação de programas especiais do incentivo à adaptação de contratos antigos da espécie, sob o argumento de violação do interesse público consistente no amparo e garantia dos quadros associativos de Empresas Provedores de tais sistemas de prestação de serviços de saúde privada.

Em ampla e percuciente exposição, a proponente alude que o papel da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS tem extrapolado, acerbamente, no particular, aos limites ético-legais de suas funções, haja vista que o “Programa de Incentivo à Adaptação de Contratos” da espécie, constituído em face da Resolução Normativa/ANS nº 64/03 e levado a efeito por intermédio de um amplo espectro midiático, tem servido aos propósitos de mercado e menos às legiões de hipossuficientes contratantes, aliás, já amparados por pacificada e remansosa jurisprudência, bem como por normas de ordem pública estatuídas pelo Código de Defesa do Consumidor.

Sem embargo, a orientação, algo forçada, que se vem esgrimindo massivamente contra o cidadão negligencia o princípio constitucional do direito adquirido bem assim do ato jurídico perfeito, agravando, pelo vício da omissão travestida de virtude propagandística sob o penhor de profissional médico notoriamente conhecido, o vezo de ilegalidade contra o que a inicial faz carga litigiosa.

Cortar o mal pela raiz é o intento das assim denominadas class actions. Mais ainda, quando o Estado se insinua em favor de interesses nada públicos como produto de uma cultura que se vai espraiando, pouco-a-pouco, no inconsciente dos seus próprios agentes os quais, a pretexto de executarem a idéia de um “Estado-mínimo”, acabam desconstruindo os fundamentos clássicos da organização social civilizada.

Outra não parece transparecer a hipótese vertida aos presentes autos – pois, a bem do interesse público que é preconizado pelo art. 1º, da Lei nº 10.850/04, bem como da garantia aos direitos do consumidor que o seu art. 3º igualmente enfatiza, o que se descreve, na prática dos acontecimentos ora denunciados, é um exercício velado de “associativismo” entre o Estado (representado pela atuação ANS) e a iniciativa privada (representada pelos interesses das Empresas Provedoras de Planos e Sistemas de Saúde Privados).

Ouvi e vi, várias vezes, o conteúdo da mídia constante do material acostado às fls, 23, dos autos (CD-Rom), e pude conferir que se trata do mesmo conteúdo veiculado pela grande imprensa televisionada, objeto de notória verificação (art. 334, inc. I, do Cód. De Proc. Civil). O que se observa ali, com isenção, é uma rotina de induções psicológicas que atua sobre a coletividade tão ou mais virulentamente conforme sucede como resto da programação para consumo “descartável” do povo, de seus valores e, sobretudo, de sua própria identidade.

Sobre isto, aliás, já se disse que a sociedade brasileira é obediente a um perfil cênico, além de tanático e, por vezes, cínico. Bem por isso, as audições de programas folhetinescos, espetaculosos e mórbidos granjeiam tanta audiência e também tanta recorrência na vida prática dos cidadãos. Não é difícil observar quando as pessoas incorporam costumes e falas em face da propaganda subliminar obtida dessas veiculações pouco criteriosas, desconstrutivas.

É bem por intermédio desse flanco midiático eticamente ilícito que se vai medrando o que inicial classifica como “propaganda enganosa” do Governo Federal em adesão aos processos e jogos de pressão, ainda não de todo revelados, embora críveis como verdadeiros, partidos da iniciativa privada, recrudescida na atmosfera do neoliberalismo globalizante.

Por certo, esse cenário descortina um feixe de condições claramente desfavoráveis ao cidadão e transforma a rotina de suposta aplicação da lei de regência em um exercício de contradições essenciais que não pode ser licitamente tolerável, porque o mesmo seria admitir, no caso, que o Estado passe a ser gerido pela iniciativa privada, ainda que sob o pálio das mais refinadas e eruditas manifestações.

Como se disse alhures e desde o Medievo: ‘o vício fica agravado quando dissimulado de virtude’. Pelo que ficou descrito na petição inicial da presente class action, a encontrar perfeita consonância e simetria nos meios de demonstração desde pronto acostados aos autos, firmo-me no convencimento, ainda preliminar, de que assiste toda razão à entidade proponente, cabendo, neste passo, tão urgentemente quanto se revele a obtusidade da situação destacada, reverter o quadro em benefício dos cidadãos, coletivamente considerados em seus direitos e em sua homogeneidade, e sobretudo para resgatar a higidez jurídica do Sistema Legal conspurcado, garantindo-se, outrossim, a autonomia da vontade das partes contratantes de tais negócios especializados e a melhor topografia do Estado frente a eles.

Em face destes fundamentos, dada a importância da matéria e a urgência de seu processamento, a plausibilidade jurídica do pedido e a legitimidade da parte proponente, admito a presente ação civil pública para discussão.

Por isto mesmo, concedo, de acordo com os arts. 11 e 12, da Lei nº 7.347/85, a medida liminar requestada, nos seguintes termos e alcance jurisdicional ‘ergaomnes’:

1) Determino, até final solução da presente causa de efeito coletivo e de âmbito nacional, a imediata suspensão dos efeitos do ‘Programa de Incentivo à Adaptação dos Contratos’ de que trata a Resolução Normativa – ANS nº 64/03, e seus consectários lógicos, devendo a Agência demandada comprovar, se o caso, que vem encontrando providências reais de promoção e proteção aos direitos do universo de segurador de Planos e Sistemas de Prestação de Serviços de Saúde Privados no país, sem recuo ou negligências, explícitas e/ou veladas, ao permissivo constante do art. 3º, da Lei nº 10.850/04.

Ao descumprimento deste preceito, incidirá à Agência demandada, multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais), reversíveis ao Fundo Federal de que trata o art. 13, da Lei nº 7.347/85, sem prejuízo da execução específica que se fizer como necessário sobre a pauta em comento findo.

2) Determino a imediata interrupção da ‘propaganda institucional’ em todo e qualquer formato da mídia de massa e/ou interna, assim em âmbito nacional quanto local, que tenha por escopo o ‘encorajamento’ de associados a migrarem, adaptarem ou de algum modo revisarem os seus antigos contratos adrede manutenidos, desde antes do advento da Lei nº 9.556/98.

3) Determino, outrossim, que se passe inteira e ampla informação desta decisão judicial, através dos meios de comunicação utilizados para a propaganda ora interrompida, para que o universo de segurados possa melhor avaliar o cenário da presente lide de fundo coletivo a bem de seus direitos e interesses agasalhados pela Ordem Jurídica.

4) Determino, para tanto, que se oficie à Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL a fim de que proceda à execução específica do comando acima, sem prejuízo da iniciativa espontânea da parte obrigada.

5) Determino, ainda que se oficie ao Conselho Federal de Medicina – CFM a fim de considerar a participação de profissional médico na “propaganda institucional” antes aludida.

6) Determino a citação da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS para responder, querendo, aos termos da presente ação civil pública, nos termos da lei.

7) Ciência ao Ministério Público Federal para participar de todos os termos presente ação coletiva.

Intimem-se. Cumpra-se.

Recife, 22 de junho de 2004.

Roberto Wanderley Nogueira

Juiz Federal da 1ª Vara Federal – PE.”


Independente desta decisão, a opção pela adaptação dos contratos chamados “antigos” às regras da LPS não foram afastados pela Corte Superior no julgamento de medida cautelar incidente à Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 1931:

“Art. 35. Aplicam-se as disposições desta Lei a todos os contratos celebrados a partir de sua vigência, assegurada aos consumidores com contratos anteriores, bem como àqueles com contratos celebrados entre 02 de setembro de 1998 e 1o de janeiro de 1999, a possibilidade de optar pela adaptação ao sistema previsto nesta Lei.

§ 1º Sem prejuízo do disposto no art. 35-E, a adaptação dos contratos de que trata este artigo deverá ser formalizada em termo próprio, assinado pelos contratantes, de acordo com as normas a serem definidas pela ANS.

§ 2º Quando a adaptação dos contratos incluir aumento de contraprestação pecuniária, a composição da base de cálculo deverá ficar restrita aos itens correspondentes ao aumento de cobertura, e ficará disponível para a verificação pela ANS, que poderá determinar sua alteração quando o novo valor não estiver devidamente justificado.”

Estes dispositivos apenas reforçam a assertiva de que a adaptação dos contratos é faculdade que pode ser exercida a qualquer tempo, devendo-se, portanto, repudiar a coação da empresa, que, agindo nesse sentido, induz o associado a renunciar ao contrato antigo, aderindo ao novo por um custo mais elevado.

Todavia, a Seguradora, inconformada com a vontade dos consumidores em permanecer com as condições dos seguros que há anos mantém com a requerida, remeteu correspondências pretendendo não deixar outra opção, senão a migração menos gravosa para a seguradora.

Cabe aqui a transcrição da parte final da correspondência enviada aos segurados (fl. 07 do IC):

“Importante: Informamos ainda que este reajuste não tem qualquer relação com o PROGRAMA DE INCENTIVO À ADAPTAÇÃO DE CONTRATOS, estipulado pelo governo através da Resolução 64 da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, de aceitação facultativa por você e que visa estimular a adequação dos contratos de planos de saúde contratados antes de 2 de janeiro de 1999 às regras e direitos assegurados pela Lei nº 9.656/98. A Sul América está apenas aguardando autorização da ANS para lhe enviar a documentação completa com a opção de ADAPTAÇÃO do seu contrato.”

Conforme referido, a opção de alteração cabe ao consumidor, conforme expressamente disciplinado no art. 35, § 4º, da Lei nº 9.656/98: “Nenhum contrato poderá ser adaptado por decisão unilateral da empresa operadora.”

Assim, conforme se verifica nas cartas padronizadas enviadas aos consumidores, a Seguradora faz alusão de que o reajuste somente seria aplicado se os consumidores não optassem pela migração, quando, na realidade, independentemente do plano de incentivo, suspenso pela decisão liminar acima destacada, os segurados sempre terão direito à adaptação, nos termos do art. 35 da LPS.

3. DA AÇÃO DECLARATÓRIA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADIN N° 1931) E OS SEUS EFEITOS EM RELAÇÃO AOS CONTRATOS FIRMADOS ANTERIORMENTE À EDIÇÃO DA LEI Nº 9.656/98:

No julgamento da Medida Cautelar da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1931, ajuizada pelo Conselho Nacional de Saúde contra a constitucionalidade de diversos artigos da Lei nº 9.656/98, os Ilustres Ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram conceder em parte a liminar para suspender, dentre outros, a aplicabilidade do artigo 35-E.

A medida suspendeu a vigência do art. 35-E da Lei nº 9.656/98, dispositivo que buscava estender sua amplitude normativa aos contratos firmados anteriormente à sua existência. Assim, a partir da liminar do STF, as mensalidades deverão ser reajustadas pelos índices previstos em contrato.

Ocorre que, nos contratos firmados entre a Requerida e os consumidores atingidos, não consta índice de reajuste anual das contraprestações pecuniárias. Limitam-se os instrumentos a estipular, de forma imprecisa, que a correção obedecerá à variação dos custos médico-hospitalares ou em função de mudança de faixa etária.

Na apólice de seguro individual de reembolso de despesas de assistência médica de Paulo Marsiaj de Oliveira (cfe. documentação do IC), a abusividade é cristalina.

Na cláusula nº 13 e seguintes do contrato firmado com o segurado anteriormente à vigência da LPS, verifica-se critérios de reajuste genéricos – como “variação de custos médico-hospitalares” e “mudança de faixa etária”, dando aparente permissão à ré de praticar aumentos em percentuais altíssimos e absolutamente incompatíveis com os índices oficiais de inflação apurados no período.

Isso não é somente de difícil compreensão para o consumidor, mas configura nulidade de pleno direito (arts. 51, inciso X, e 54, parágrafo 3º, do Código de Defesa do Consumidor).


Atento a essa realidade, o legislador instituiu como princípio básico o da “equidade contratual”, instituindo normas de ordem pública visando impedir a prática de cláusulas abusivas, consideradas, na dicção legal, ipsis verbis:

“Art. 51 – São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

(Omissis)

IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade … “

Ora, ainda que se chegasse à conclusão de que a correção dos preços dos planos de saúde firmados anteriormente à entrada em vigor da Lei n.º 9.656/98 não estaria adstrita à observância dos índices estabelecidos pela ANS, isto não significa que a requerida poderá deixar de observar quaisquer parâmetros, ou que possa, ao seu livre arbítrio, determinar os índices de reajuste, abusividades atentatórias à eqüidade e boa-fé.

Veja-se que o negócio jurídico firmado entre a operadora de planos de saúde e seus consumidores constitui uma relação jurídica de consumo, que, antes de encontrar amparo nas disposições da legislação específica do setor, está sob proteção do Código de Defesa do Consumidor, e pelos artigos 5º, XXXII, e 170, V, da Constituição Federal.

Os direitos dos consumidores que assinaram contratos anteriormente à vigência da Lei nº 9.656/98 estão protegidos pelo Código de Defesa do Consumidor. A decisão recente do STF não alterou o quadro de defesa dos direitos dos consumidores-usuários de planos privados de assistência à saúde.

Por outro lado, a abusividade das cláusulas também pode ser aferida quando em cotejo com os deveres anexos que defluem do princípio da boa-fé (proteção, informação e lealdade), que permeiam a relação consumerista, conforme verifica-se no art. 4º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor, ao dispor:

“Art. 4º

(Omissis)

III – harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (artigo 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores … “

Já o artigo 6º, incisos III e V, do CDC, estabelece como direitos básicos do consumidor, o acesso à informação adequada e clara acerca dos diferentes produtos e serviços, disposições válida no caso, especialmente no que tange às suas características. Além disso, o inciso V institui a vedação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais e prevê a sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.

É patente que os consumidores, se mantida a situação de que trata a presente ação, ficarão à mercê de um reajuste injusto e desproporcional em relação à realidade econômica brasileira, extrapolando toda e qualquer inflação do período.

Cumpre destacar o trabalho técnico desenvolvido pelo Sr. Fabrício Santana, Assessor Econômico do Ministério Público, atestando que os índices inflacionários medidos pelo IGPM corresponderam a 8,71% no ano de 2003, e 6,78% até o mês de junho do corrente ano (fl. 59 do IC).

Oportuno destacar, à título exemplificativo, a importância que o consumidor pagou no último vencimento para a demandada e aquilo que a seguradora pretende obrigá-lo a pagar nos próximos vencimentos, por não ter optado pela migração interna, que, de igual forma, acarretaria num sensível aumento do seguro até então pago:

SEGURADO ÚLTIMO VALOR PAGO NOVO VALOR EXIGIDO Paulo Marsiaj Oliveira (fls. 04, 25 e 27 do IC) R$ 1.457,00 R$ 2.143,31

Para este fim, é de grande valia a Resolução Normativa nº 74/04 da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Saúde Complementar, conforme se verifica nos seus artigos 3º e 4º:

“Art. 3º. Os contratos individuais de planos privados de assistência a saúde celebrados anteriormente à vigência da Lei nº 9.656, cujas cláusulas não indiquem expressamente o índice a ser utilizado para os reajustes das contraprestrações pecuniárias e sejam omissos quanto ao critério de apuração e demonstração das variações consideradas no cálculo do reajuste, deverão adotar o percentual limitado ao reajuste estipulado pela Resolução.

Art. 4º. O reajuste máximo a ser autorizado pela ANS para o período de que trata esta resolução será de 11,75% (onze inteiros e setenta e cinco centésimos por cento).

Parágrafo Único. Os valores relativos às franquias ou co-participações não poderão sofrer reajuste em percentual superior ao autorizado pela ANS para contraprestação pecuniária.” (grifou-se)


Com efeito, a ré motiva o aumento em percentuais que se aproximam de 50% utilizando-se de dados que não estão ao alcance dos consumidores, e mais, dando a impressão de que a elevação das mensalidades também teria como causa subjacente a decisão que tomou o artigo 35-E como inconstitucional, o que não é verdade, pois referida decisão apenas afastou a aplicabilidade deste artigo aos contratos firmados anteriormente à edição da Lei nº 9.656/98.

Se os dados levantados são atinentes a custos, que não são comprováveis aos segurados mais esclarecidos, nem de perto se poderia aludir que o motivo seria a insuficiência dos índices aprovados pelos órgãos governamentais e também a própria conseqüência da decisão da Corte Constitucional.

Desta forma, o Supremo Tribunal Federal ao decidir-se pela inconstitucionalidade do dispositivo 35-E da LPS, de forma alguma estaria a chancelar qualquer aumento abusivo por parte das operadoras.

Nesse sentido, no dia 08 de julho do corrente ano foi deferida liminar em Ação Declaratória de nulidade de aumento abusivo de preços intentada por inúmeros consumidores lesados contra Bradesco Saúde S/A, processo nº 117336298, que tramita na 11ª Vara Cível do Foro Central, 2º Juizado, nos seguintes termos:

“Uma vez que os autores demonstram, através de correspondências recebidas, que a ré Bradesco Seguros S.A., no aniversário dos contratos antigos que possuem, neste mês de julho, sofrerá aumento da ordem de 80% – o que não ocorreria se viessem a migrar para planos novos que lhes foram oferecidos – resta demonstrada a verossimilhança do direito alegado a sustentar o deferimento da tutela requerida, já que o percentual referido supera em muito a inflação de um ano, não podendo ser unilateralmente fixado, sem previsão contratual, pena de inviabilizar a manutenção dos contratos e obrigar os autores a rescisão dos mesmos, em afronta às disposições do Codecom.

Em vista disso, determino que a ré se abstenha de aplicar o percentual de 81,6%, noticiado para este mês, devendo emitir os bloquetos de pagamento, com os valores até então praticados, com incidência do IGP-M dos últimos 12 meses até decisão final da lide, acerca do cabimento ou não do reajuste pretendido.

Acaso já emitidos com o valor do reajuste, deverá reemitir os carnês, com nova data de vencimento aos autores.

Enquanto perdurar a lide e os pagamentos segundo o ora determinado, fica, também, assegurada aos autores a manutenção do plano original que possuem, em todos os seus termos.

Expeça-se de mandado de intimação da presente decisão e citação, para querendo, contestar a ação no prazo legal. Intimem-se. Em 08/07/2004″.

Também a decisão liminar de 02/07/04, proferida pela Juíza Maria Isabel Caponero Cogan, da Comarca de São Caetano do Sul/SP, em Ação Cautelar ajuizada pelo PROCON Municipal contra a Sul América Seguro Saúde S/A, concedeu liminar para viabilizar a manutenção do atendimento de todos os eventos cobertos pelo seguro e emissão e o envio de novos boletos para pagamento das mensalidades, sem aumento, ou majoradas apenas pelo percentual recomendado pela ANS, qual seja, 11,75%.

Igualmente, recentíssima decisão (em 13/07/2004) no mesmo sentido foi exarada pelo Juiz de Direito Giovanni Conti, da 15ª Vara Cível, do Foro Central desta Comarca, nos autos da ação coletiva de consumo proposta por esta Promotoria contra BRADESCO SAÚDE S/A, conforme transcrição a seguir:

“(…) Plausíveis as alegações do autor, cumpre, agora, determinar onde reside o perigo de dano iminente e irreparável. Tal dano não decorre da simples morosidade eventual ou natural que atinge a prestação jurisdicional em razão da busca da cognição plena e segurança jurídica inequívoca – impensável na sociedade de consumo de massa, instantânea. O dano advém da própria violação jurídica coletiva (art. 81 do CPC), em que muitos, diria incalculáveis consumidores, serão atingidos por uma medida de aumento nos planos de saúde, com o aumento da prestação, oneração demasiada, ingresso de ações, desgaste econômico, inadimplência aumentada, inscrição em cadastros, além da violação íntima, moral, pessoal; na convicção do consumidor de ser melindrado por aumentos sem que lhes sejam ESCLARECIDOS, EVIDENCIADOS, PROVADOS, DEMONSTRADOS E PUBLICIZADOS os motivos do aumento e mais que sua legalidade, que lhes sejam ao menos justificadas a supressão de suas garantias com base no Princípio da Moralidade, pois hoje, mais do que legal as relações jurídicas e econômicas, até MESMO AS DECISÕES POLÍTICAS (!) devem ser lastreados por bases éticas, morais.

O dano advém dessa perspectiva material e moral do consumidor, que não pode ser ignorada. Restam, por isso, presentes os requisitos positivos para concessão da medida antecipatória da tutela. Também se alerte que não observo a presença dos requisitos negativas que vedariam a concessão da medida liminar.

De outra banda, conforme muito bem salientado na exordial, o simples fato do Supremo Tribunal Federal – STF [3] ter estabelecido que os reajustes das mensalidades para contratos firmados antes da edição da Lei nº 9.656/98, cujos consumidores não migraram para outros planos oferecidos, terão como base as cláusulas estabelecidas entre as partes, não significa dizer que ampla liberdade UNILATERAL de fixação de valores, sem observância de parâmetros razoáveis, principalmente sem o esclarecimento no que diz respeito aos ‘aumentos das despesas médicohospitalares pagas pela Seguradora ou o que vier a ser estabelecido por órgão governamental competente’ ou ‘quando houver mudança de faixa etária do Segurado ou de seus beneficiários dependentes’.[4]

Sobre o ‘órgão governamental competente’, saliento que a Agência Nacional de Saúde Complementar, através da Resolução Normativa nº 74/04, estabeleceu o reajuste máximo de 11,75% para os contratos individuais de planos privados de assistência à saúde, celebrados anteriormente à vigência da Lei nº 9.656/98.

Na qualidade de guardião dos interesses da sociedade, função constitucional indelegável, compete ao PODER JUDICIÁRIO regular as relações sociais e obrigacionais, buscando sempre o interesse público, sem jamais se esquecer também dos direito individuais e de iniciativa privada. Porém, no caso dos autos, deverá a requerida comprovar nos autos, uma vez invertido o ônus da prova (art. 6º, inciso VIII, do CDC), que o percentual de reajuste das mensalidades fazem necessários, trazendo o balanço dos créditos e débitos, bem como de outros elementos necessários que justifiquem a elevação das mensalidades nos patamares anunciados.

Portanto, após a explicitação de todas estas questões, é possível a concessão liminar pleiteada. O Princípio da Proporcionalidade e os fundamentos jurídicos tecidos, evidenciam quais os valores as normas princípios que devem ser preponderantes na tomada de decisões jurídicas em que não ocorra a supressão total de um em favor de outro, mas que no equilíbrio de forças sejam relevantes àqueles que servem de base ao sistema jurídico e que atinjam o nível mais elevado e englobante de proteção de modo a ter como regra básica a harmonia de princípios, não podendo negar o interprete que sua função também deve buscar a ‘força normativa da Constituição (Konrad Hesse)’, mais que isso, a força da Lei 8078/90.

Por isso, há necessidade de concessão de tutela específica, com a fixação de uma obrigação de não fazer (aplicar os aumentos anunciados) e outra de fazer (confecção de novos boletos bancários), para que o dano seja evitado, a lesão proibida e para que o mandamento contido na ordem judicial não venha a ser abstido de força cogente. Para isso o sistema processual conta com a fixação de uma multa diária (astreintes), como modo de punir economicamente uma vez infringida a decisão judicial que mais que uma decisão liminar, procura efetivar direitos previamente, para que a prestação socorra o consumidor no momento da ocorrência da lesão e não quando a mesma já tiver sido concretizada, em evidente atividade Preventiva e Real da prestação jurisdicional que mais do que segura, deve ser REALIZADORA DOS INTERESSES INDIVIDUAIS E COLETIVOS.

Nesse sentido os artigos 84, do CPDC e art. 461, do CPC, que contém disposições de mesma utilidade, mas que combino na decisão liminar como modo de buscar em todo sistema jurídico a justificação destes ‘novos instrumentos’ não só como relação de consumo como novo norte do processo (instrumento).

Aplico, do mesmo modo, as disposições da Lei de Ação Civil Pública, que também deve ser observada por ser o primeiro dispositivo a tratar do processo coletivo em suas dimensões buscadas e por ser instrumento que deve e pode ser lido em consonância com o Código de proteção e Defesa do Consumidor, buscando unidade e entrelaçamento do sistema, com especial atenção ao art. 12 da referida lei. Aliás, entendo que a Ação Coletiva de Consumo e a Ação Civil Pública em Defesa do Consumidor, em essência apresentam diferenciação unicamente semântica – ainda que com competentes vozes em contrário.

Por isso, como a decisão apresentaria uma limitação de base territorial, aplico a regra do art. 93, inciso II, da Lei 8078/90, hipótese em que, como a Ação Coletiva foi ajuizada na Capital do Estado do Rio Grande do Sul, sua base territorial abrange toda a extensão deste Estado.

III – DIANTE DO EXPOSTO, defiro os pedidos LIMINARES, inaudita altera pars, para:

a) DETERMINAR que a requerida se abstenha de aplicar os índices de reajustes noticiados aos contratos de seguros de assistência médica aos seus consumidores-clientes no Estado do Rio Grande do Sul, permitindo tão somente o percentual de reajuste fixado pela Resolução Normativa nº 74/04 da ANS, ou seja, em 11,75%, sobre o valor da prestação do mês anterior;

b) DETERMINAR que a requerida emita novo documento de cobrança, contendo informação objetiva sobre a liminar deferida, número do processo e vara cível, bem como contendo o valor já adequado ao limite máximo estabelecido no item anterior;

c) IMPOR aplicação de multa diária de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) por dia, corrigidos pelo IGPM, para hipótese de descumprimento de qualquer dos itens anteriores;

d) INVERTER o ônus da prova (art. 6º, VIII, do CDC), para determinar que a requerida comprove a necessidade do reajuste das mensalidades nos moldes anunciados.

Publique-se o edital a que alude o art. 94 do CDC.Cite-se. Intimem-se.

Porto Alegre, 13 de julho de 2004.

GIOVANNI CONTI, Juiz de Direito.”


Nessa esteira, oportuna a transcrição dos fundamentos do acórdão exarado pela Sexta Câmara Cível do TJRGS, onde foi apreciado o reajuste estabelecido pela seguradora de planos de saúde quando do implemento da idade de 70 anos:

“De não esquecer que essa hipótese não trata de contrato novo, mas de pacto já existente e que, portanto, suspenso ou interrompido, ou seja, quebrado não fica pela simples alteração da faixa de idade, ou pelo implemento da idade do segurado. Contrato cujos efeitos não se exaurem nessa data limite, mas se estendem no tempo, e sem solução de continuidade.

Por certo de todo desproporcional o reajuste estabelecido pela seguradora por ter, o autor, alcançado a faixa de idade de 70 anos, ferindo o disposto no inciso V, do art. 6º, do Código do Consumidor, que veda o estabelecimento de prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.

Além do que não é de todo correto o argumento segundo o qual, pelo simples fato de o segurado passar de uma faixa de idade para outra os riscos da ocorrência do fato gerador – morte ou incapacidade, exemplificando – aumentam ou se agravam. E se aumentam, é uma conseqüência lógica pelo decorrer da idade. E a pessoa que faz um seguro quando é mais jovem, o é exatamente para ter mais segurança, para si ou para o beneficiário que indica, normalmente pessoa da família, ao chegar numa idade mais avançada. Não para ver-se escorraçada por quem assumiu a obrigação de lhe dar essa segurança e tranqüilidade.

Neste ponto desejo deixar consignada uma observação, que não é inédita, eis que já a fiz em diversos julgados, envolvendo sempre questões de seguro ou previdência privada: Institui-se no País, e é do SISTEMA, quer para o setor público de saúde e previdência, quer para privado, que a pessoa idosa passa a ser uma coisa descartável, como se fora um preservativo usado, portanto, imprestável e que, por isso mesmo, deve ser jogada fora. Ou um entulho social ou entrave econômico, estorvo que deve ser removido do caminho para que não atrapalhe o bom desempenho financeiro do País e mormente dessas empresas que se dedicam ao comércio do seguro e da saúde. E, do SISTEMA OFICIAL de previdência e saúde. Basta ver o ódio irracional que os homens do Governo que gerenciam esse SISTEMA nutrem aos idosos, mormente aos aposentados, que, com a jubilação, passam a ser um custo insuportável, daí dever ser removido dos caminhos do desenvolvimento nacional e pela quebra total do setor da saúde pública.

Ou como simples porca de uma engrenagem que se desgasta com o tempo e pelo uso. E que, por inservível para qualquer utilização, há que ser jogada ao lixo social à espera da morte, tanto melhor quanto mais rapidamente ocorra.

É a estampa da falta de dignidade com que se passa a tratar a pessoa porque alcança uma determinada idade, e, que, portanto, lucrativa deixa de ser a essas empresas que se dedicam ao comércio da saúde e do seguro.(…)

Creio não seja demasia lembrar que um pouco de respeito à pessoa humana, mormente em sendo idosa, é dever de toda a Sociedade. Mormente dessas empresas que se jactam de dar segurança à velhice, e sob cujo discurso exercem seu lucrativo comércio, ao chegar a determinada idade, jogam essa pessoa ao limbo da insegurança, se não ao inferno do desespero.

O que, convenha-se, não é ético, nem moral, muito menos jurídico. Afinal de contas, o ser humano não pode ser transformado em simples objeto de mercancia, polo de lucro ou fonte de riqueza como o está sendo. E que é no que se transformou hoje, quer, o disse, para o SISTEMA OFICIAL da saúde e previdência, sob a batuta de um Governo pusilânime, servilmente submetido a Órgãos Internacionais, mormente ao FMI, e para o SISTEMA PRIVADO, para o qual o HOMEM não passa de um objeto comercializável, e como tal deve ser tratado: serve enquanto dá lucro, desserve a partir do momento da contraprestação.” (Apelação Cível nº 70000142877, Sexta Câmara Cível, TJRS, Rel. Des. Osvaldo Stefanello, julgado no dia 27/09/2000)

Além disso, importante destacar que, num universo de 38,2 milhões de beneficiários dos planos de saúde, 21,5 Milhões têm planos e seguros anteriores à Lei n.º 9.656/98, conforme notícia divulgada no Jornal “O SUL” do dia 04/07/04 (fl. 23 do IC).

Assim, conforme amplamente analisado nesta peça, o reajuste adotado gera a impossibilidade de dar continuidade aos pagamentos, restando apenas a opção de requererem o cancelamento do contrato, ficando, então, desamparados do vital atendimento em serviços de saúde.

4. DOS PEDIDOS LIMINARES:

Resultou caracterizado o fumus boni iuris pela infringência aos diversos dispositivos legais invocados, havendo a violação aos mais elementares direitos dos consumidores, ligados à saúde pública.


Deve-se considerar, ainda, que os transtornos e constrangimentos causados pelos demandados no mercado de consumo ferem frontalmente os princípios da VULNERABILIDADE, da REPRESSÃO EFICIENTE AOS ABUSOS e, principalmente, o princípio da HARMONIA DAS RELAÇÕES DE CONSUMO.

De outra parte, o periculum in mora também está presente diante da compreensível demora de tramitação de uma ação coletiva, a qual poderá oportunizar a continuidade das práticas ilegais e abusivas, considerando, inclusive, que o vencimento das parcelas ocorre diariamente, acarretando prejuízos irreparáveis aos consumidores, o que não pode ser aceito.

O Código de Defesa do Consumidor prevê expressamente, no art. 84, § 3º, a possibilidade de concessão da tutela liminarmente, da mesma forma que o disposto na Lei nº 7.347/85, em seu art.

12. Essa possibilidade de concessão de medida liminar nas obrigações de fazer ou não fazer permite que alguns dos efeitos do provimento final possam ser desde logo implementados. Pertinente a transcrição do artigo 84, § 3°, do CDC:

“Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.(…)§ 3º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é ilícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.”

Assim, forte no art. 84, §§ 3º e 5º, do Código de Defesa do Consumidor, no art. 12 da Lei nº 7.347/85 e demais dispositivos apontados nesta ação, requer o Ministério Público, sem audiência da parte contrária, as seguintes medidas liminares:

a) seja determinado à demandada a suspensão do aumento ora praticado, permitindo-se, tão somente como parâmetro, o percentual fixado pela Resolução Normativa nº 74/04 da ANS, qual seja, 11,75% (onze inteiros e setenta e cinco centésimos por cento) sobre o valor da prestação do mês anterior;

b) a remessa de novo documento de cobrança, contendo informação objetiva sobre o eventual deferimento da liminar pleiteada, o número do processo e da Vara Cível onde o mesmo tramita, contendo o valor já adequado ao limite máximo previsto pela ANS (11,75%);

c) a manutenção do atendimento de todos os eventos cobertos pelo seguro, em suas diversas modalidades, com a imprescindível prestação do atendimento médico, enquanto não forem emitidos os novos documentos de cobrança; e,

d) a imposição de multa diária aos réu, em valor equivalente a R$ 30.000,00 (trinta mil reais), corrigidos pelo IGP-M, para o caso de descumprimento da obrigação contida no pedido “a”. Para o descumprimento das letras “b” e “c”, multa de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais). As multas deverão ser recolhidas ao Fundo de Reconstituição de Bens Lesados de que trata o art. 13 da Lei nº 7.347/85.

5. DOS PEDIDOS:

Diante do exposto, requer o Ministério Público a procedência da presente ação coletiva de consumo, observando-se os efeitos erga omnes do art. 103 do CDC, nos termos abaixo:

a) que seja declarada a nulidade do aumento pretendido aos contratos de assistência à saúde firmados anteriormente à edição da Lei n.º 9.656/98, observando a empresa demandada os índices que venham a ser indicados pela ANS ou outro índice legal de recomposição de preços;

b) a condenação da ré ao ressarcimento ou compensação dos valores indevidamente cobrados dos consumidores em vista da eventual cobrança abusiva do aumento ora pretendido pela Seguradora;

c) a condenação da ré à obrigação de publicar, no prazo de quinze dias após o trânsito em julgado da sentença, às suas custas, nos jornais Zero Hora, O Sul e Correio do Povo, em quatro dias intercalados, sem exclusão do domingo, em tamanho mínimo de 20 cm X 20 cm, em uma das dez primeiras páginas de todos os jornais, a parte dispositiva de eventual sentença condenatória, a fim de que os consumidores tomem ciência da sentença, que deverá ser introduzida pela seguinte informação:

“Acolhendo pedido veiculado em ação coletiva de consumo ajuizada pela Promotoria de Justiça Especializada de Defesa do Consumidor do Ministério Público Estadual, o juízo da [__]ª Vara Cível condenou SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE S/A nos seguintes termos: [__]”.

Esse pedido, além de servir para recompor o dano moral coletivo sofrido pelos consumidores e por toda a sociedade, também tem como objetivo restabelecer a harmonia e a confiança no mercado de consumo.

d) Por derradeiro, a imposição de multa diária correspondente a R$ 1.000,00 (hum mil reais), corrigidos pelo IGP-M, para o caso de descumprimento da obrigação contida no pedido de letra “c” , importância também a ser recolhida ao Fundo de Reconstituição de Bens Lesados de que trata o art. 13 da Lei n.º 7.347/85.

6. DOS REQUERIMENTOS FINAIS:

a) a citação da ré para que, querendo, conteste a ação, sob pena de revelia e confissão;

b) a publicação do edital a que alude o art. 94 do CDC;

c) a condenação da demandada ao pagamento das custas e demais despesas processuais decorrentes da sucumbência, exceto honorários advocatícios; e,

d) a produção de todos os meios de prova em direito admitidos, inclusive o depoimento pessoal do representante legal da requerida, a oitiva de testemunhas, prova pericial e a juntada de novos documentos.

Requer, desde logo, o reconhecimento e declaração de inversão do ônus da prova, na forma do art. 6º, VIII, do CDC.

Dá-se à causa o valor de alçada.

Porto Alegre, 15 de julho de 2004.

Rossano Biazus,

Promotor de Justiça.

Alcindo Luz Bastos da Silva Filho,

Promotor de Justiça.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!