Acerto de contas

Demissão por constar na lista da Serasa gera dano moral

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21 de abril de 2005, 7h36

A indenização por dano moral não representa o preço da dor sofrida pelo trabalhador lesado, mas deve atenuá-la. Com esse entendimento, a 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região manteve a condenação da Gelre Trabalho Temporário. Motivo: duas empregadas foram demitidas porque que tinham o nome inscrito na lista de empresas de restrição ao crédito.

As ex-empregadas — contratadas pela Gelre para trabalhar como operadoras de telemarketing — entraram com ação na 37ª Vara do Trabalho de São Paulo. A primeira instância condenou a empresa por dano moral.

De acordo com o processo, as empregadas foram dispensadas porque “ambas estavam com restrições de seus nomes junto à Serasa e ao SCPC”, o que, segundo a empresa, teria ferido “alguns dos valores mais sagrados do ser humano: sua moral, sua honra, sua idoneidade”. As ex-empregadas afirmam que a demissão foi presenciada por colegas de trabalho.

Inconformadas com o valor da indenização fixado pela primeira instância — R$ 2,5 mil para cada –, elas recorreram ao TRT paulista. A Gelre também recorreu por julgar a quantia elevada. Para o juiz Valdir Florindo, relator do Recurso Ordinário no TRT de São Paulo, o modo como as ex-empregadas foram demitidas foi ilícito.

De acordo com o relator, “a indenização em dinheiro, na reparação dos danos morais, é meramente compensatória, já que não se pode restituir a coisa ao seu status quo ante, por conseguinte, ao estado primitivo, como se faz na reparação do dano material. Assim, embora represente uma compensação à vítima, a reparação do dano moral deve, sobretudo, constituir uma pena, ou seja, uma sanção ao ofensor”.

O juiz observou que os contratos de trabalho das operadoras com a empresa eram temporários, vigorando apenas enquanto houvesse “necessidade transitória de acréscimo extraordinário de serviços”. Por isso, julgou “coerente e razoável” o valor arbitrado pela 37ª Vara do Trabalho. Segundo ele, a quantia é “suficiente para impedir a prática de novos atentados dessa ordem por parte das empregadoras, bem como para compensar a discriminação sofrida pelas empregadas”. A 6ª Turma acompanhou o voto do relator por unanimidade.

Leia o voto

PROCESSO N°: 02831.2002.037.02.00-1 6ª TURMA

RECORRENTES: SULAMITA DOS SANTOS E OUTRA e GELRE TRABALHO TEMPORÁRIO S/A

RECORRIDAS: AS MESMAS

37ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO

DANO MORAL. ARBITRAMENTO PELO JUÍZO. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO DO VALOR CORRESPONDENTE EM PECÚNIA.

A indenização por dano moral não significa o pretium doloris (preço da dor), porque essa verdadeiramente nenhum dinheiro paga, mas, por outro lado, pode perfeitamente atenuar a manifestação dolorosa e deprimente de que tenha sofrido o trabalhador lesado. Nesse sentido, a indenização em dinheiro, na reparação dos danos morais, é meramente compensatória, já que não se pode restituir a coisa ao seu status quo ante, por conseguinte, ao estado primitivo, como se faz na reparação do dano material. Assim, embora represente uma compensação à vítima, a reparação do dano moral deve, sobretudo, constituir uma pena, ou seja, uma sanção ao ofensor, especialmente num País capitalista em que vivemos, onde cintilam interesses econômicos.

In casu, coerente e “razoável” o valor arbitrado pelo MM Juízo de origem, o qual julgo suficiente para impedir a prática de novos atentados dessa ordem por parte das empregadoras, bem como para compensar a discriminação sofrida pelas empregadas.

RELATÓRIO

As reclamantes aduziram na exordial (fls. 03/11), que fazem jus a indenização a título de dano moral, já que dispensadas por apresentarem restrições de seus nomes junto ao SERASA e ao SPC.

Ambas as reclamadas não compareceram em audiência, tendo a segunda reclamada apresentado defesa às fls. 35/40.

Após instruído o feito, o MM Juízo de origem julgou procedente em parte a ação para condenar as reclamadas, solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais (fls. 50/52).

As reclamantes recorrem ordinariamente às fls. 56/59, postulando seja arbitrada a indenização por danos morais em valor não inferior a R$ 12.000,00.

A reclamada Gelre Trabalho Temporário S/A também recorre às fls. 60/63, aduzindo que a inicial é clara ao dispor que os atos discriminatórios foram praticados pela tomadora de serviços, e, portanto, apenas esta deve ser condenada ao pagamento de indenização por danos morais. Pretende, ainda, seja rearbitrado o valor da indenização, eis que encontra-se em valor acima “do razoável”. Preparo às fls. 64/65

Contra-razões apresentadas às fls. 68/70, 85/87, 94/96 e 97/99.

O Ministério Público do Trabalho opina à fl. 88 dos autos.

É o relatório, em síntese.

V O T O

1. Conheço dos apelos ordinários, eis que presentes os pressupostos legais. E, em face das matérias neles argüidas, ambos serão apreciados em conjunto.

2. Da responsabilidade da reclamada Gelre Trabalho Temporário S/A:

Não há falar em inexistência da responsabilidade da ora recorrente, já que não obstante os atos discriminatórios noticiados na exordial tenham sido praticados pelos prepostos da reclamada IBI, a empresa Gelre Trabalho Temporário S/A era a real empregadora das recorridas e, portanto, responde solidariamente pelas obrigações oriundas do contrato de trabalho firmado com as trabalhadoras. Nada a reformar.

3. Do valor a ser arbitrado a título de indenização por danos morais:

As autoras afirmam em seu apelo ordinário, que o valor de R$ 5.000,00, arbitrado pelo MM Juízo de origem, sendo R$ 2.500,00 para cada uma, está aquém dos danos causados pelas reclamadas.

Já a reclamada Gelre postula seja arbitrado em valor inferior, por considerá-lo acima “do razoável” (sic).

Razão não assiste a nenhuma das recorrentes. Vejamos. A indenização por dano moral não significa o pretium doloris (preço da dor), porque essa verdadeiramente nenhum dinheiro paga, mas, por outro lado, pode perfeitamente atenuar a manifestação dolorosa e deprimente de que tenha sofrido o trabalhador lesado. Nesse sentido, a indenização em dinheiro, na reparação dos danos morais, é meramente compensatória, já que não se pode restituir a coisa ao seu status quo ante, por conseguinte, ao estado primitivo, como se faz na reparação do dano material. Assim, embora represente uma compensação à vítima, a reparação do dano moral deve, sobretudo, constituir uma pena, ou seja, uma sanção ao ofensor, especialmente num País capitalista em que vivemos, onde cintilam interesses econômicos.

In casu, e conforme os fatos narrados na exordial, considerados verdadeiros pelo juízo em face da pena de confissão aplicada às reclamadas, tem-se que as reclamantes, contratadas pela segunda reclamada para exercer misteres de operadoras de telemarketing na primeira reclamada, através de contrato de trabalho temporário, foram arbitrariamente dispensadas porque “ambas estavam com restrições de seus nomes junto ao SERASA e ao SCPC”, o que teria ferido “alguns dos valores mais sagrados do ser humano: sua moral, sua honra, sua idoneidade” (fl. 04), fatos estes que teriam sido presenciados pelos demais funcionários das rés.

Pois bem. Não obstante tenha restado configurado no processado o ilícito perpetrado pelas reclamadas, não se pode olvidar que os contratos de trabalho das autoras era temporário e, portanto, apenas vigoraria enquanto houvesse necessidade transitória de “acréscimo extraordinário de serviços” (vide contratos de fls. 15 e 19).

Logo, coerente e “razoável” o valor de R$ 5.000,00 arbitrado pelo MM Juízo de origem, o qual julgo suficiente para impedir a prática de novos atentados dessa ordem por parte das empregadoras, bem como para compensar a discriminação sofrida pelas empregadas. Mantenho.

C O N C L U S Ã O

Diante do exposto, admito ambos os apelos ordinários e, no mérito, nego-lhes provimento para manter incólume a r. decisão de origem, nos termos da fundamentação.

É como voto.

VALDIR FLORINDO

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