Falta de provas

Editora Globo se livra de indenizar por reportagem de Época

Autor

14 de abril de 2005, 17h06

A Editora Globo S/A está livre de reparar o casal Marcos Cará e Kátia Roberta de Souza Gomide por danos morais. O casal havia pedido, originalmente, uma indenização de R$ 2,1 milhões, mas esse valor foi impugnado e o juiz já havia reduzido o valor da causa pra R$ 20 mil. Eles pretendiam receber o dinheiro por causa de reportagem publicada na revista Época, de 5 de agosto de 2002. A decisão é da 22ª Vara Central de São Paulo, capital. Cabe recurso.

A notícia “Paulinho na corda bamba” contava que Marcos Cará, à época assessor do sindicato dos motoristas de ônibus (filiado à Força Sindical), intermediou uma proposta de suborno de R$ 3 milhões entre Paulo Pereira da Silva (Paulinho) e um antigo desafeto. Paulinho era candidato a vice-presidente da República na chapa de Ciro Gomes.

Marcos Cará e Kátia Roberta alegaram que prestavam assessoria administrativa, política e jurídica a diversas entidades sindicais, e depois da reportagem nunca mais foram contratados por nenhum sindicato. Sustentaram que se tratava de uma “notícia fantasiosa, motivada por fins políticos obscuros, com o objetivo de macular a candidatura de Paulinho”.

Afirmaram ainda que “matéria é sensacionalista, leviana e mentirosa, sem preocupar-se com a verdade dos fatos e com a imagem dos autores, que são pais de cinco filhos e cuja reputação deve permanecer transparente, pois indispensável ao trabalho que desenvolvem”.

A 22ª Vara Central de São Paulo negou o pedido do casal. Para o juiz, os autores da ação não comprovaram a culpa da Editora Globo. Além disso, um pedido de direito de resposta já havia sido negado “por entender que a matéria se insere nos limites do legítimo exercício do direito de informação jornalística”. A Editora Globo foi representada pela advogada Maria Angélica Vieira Steiner, do escritório Steiner Advogados Associados.

“Se os comentários se tornaram públicos, porque noticiados por vários órgãos da imprensa, não há como atribuir à ré a intenção de causar dano à imagem dos autores ou prejudicar-lhes, de qualquer forma, sua atividade profissional. Tanto mais que a simples leitura do texto, publicado pela revista, deixa patente seu caráter condicional, sem afirmações categóricas ou juízos de valor sobre a conduta dos autores”, considerou. A primeira instância condenou os autores da ação a arcar com as custas processuais e honorárias advocatícios da editora Globo.

Leia a íntegra da sentença

Varas Cíveis Centrais 22ª Vara Cível

Processo 011.02.023624-8 – Indenização (ordinário) – MARCOS CARÁ e outro – EDITORA GLOBO S/A – CONTROLE N 1405. FLS 170/175. Vistos. MARCOS CARÁ e KÁTIA ROBERTA DE SOUZA GOMIDE, qualificados nos autos, ajuizaram a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS contra EDITORA GLOBO S.A., responsável pela publicação da Revista Época.

Alegam que prestam assessoria administrativa, política e também jurídica (segunda autora) a diversas entidades sindicais, inclusive em pleitos eleitorais para renovação do mandato da Diretoria dos Sindicatos, tendo trânsito fluente e constante junto aos sindicatos.

A Revista Época, na edição de 5 de agosto de 2002, publicou, às páginas 74 e 75, matéria altamente ofensiva à reputação pessoal e profissional dos autores, caluniando-os, injuriando-os e difamando-os. Após transcrever o texto publicado, sustentam que se trata de estória fantasiosa, motivada por fins políticos escusos, com o objetivo de macular a candidatura de Paulo Pereira da Silva (Paulinho), na chapa de Ciro Gomes, a Vice-Presidente da República.

A matéria é sensacionalista, leviana e mentirosa, sem preocupar-se com a verdade dos fatos e com a imagem dos autores, que são pais de cinco filhos e cuja reputação deve permanecer transparente, pois indispensável ao trabalho que desenvolvem junto a diversas entidades sindicais. Assim, tecem considerações sobre a liberdade de expressão, responsabilidade civil, direitos da personalidade, direito à intimidade e à vida privada, liberdade de imprensa e seus limites, para concluir que houve culpa da ré pela publicação infamante, cabendo indenização por danos morais, no valor de 10.800 salários mínimos, e por danos materiais, pois os requerentes não mais foram contratados para assessoria de nenhuma entidade sindical, porque passaram a ser vistos de forma duvidosa, não mais tão confiável.

Pediram a justiça gratuita, deram à causa o valor de R$ 2.160.000,00 e instruíram a inicial com os documentos de fls. 29/65. A ré contestou (fls. 85/97), afirmando que a ação é improcedente, porque agiu no seu direito constitucional de informar, rigorosamente dentro dos critérios que norteiam a atividade da imprensa. Não houve intenção de denegrir a honra dos autores e seus jornalistas apenas exerceram a crítica inspirada pelo interesse público, legalmente reputada não abusiva (art. 27, VIII da Lei de Imprensa).

Prossegue a ré, alegando que agiu dentro dos padrões éticos, informando aos leitores que tudo não passava de suposições, pois era a palavra de um contra o outro (Wagner Cinchetto contra Marcos Cará). Ademais, a ré nada mais fez do que divulgar fato já extensamente explorado pela imprensa brasileira, conforme publicações das revistas Istoé e Veja, e do jornal O Estado de S. Paulo.

Assim, não cabe a indenização pretendida, que por sinal não observa os limites indenizatórios da Lei de Imprensa, devendo a ação ser julgada improcedente, nos termos de precedentes de doutrina e jurisprudência trazidos à colação. Com a contestação, foram juntados os documentos de fls. 98/118. Mais documentos juntados pela ré a fls. 121/133. Não houve réplica (fls. 136) e. por atraso na devolução dos autos, os autores foram penalizados com a proibição de retirada dos autos (fls. 135 e 137).

Frustrada a conciliação (fls. 157), a ré concordou com o julgamento antecipado; os autores silenciaram (fls. 163, 168 e 169). Em apenso, os autos da Exceção de Incompetência, acolhida pelo Juízo da Terceira Vara Cível do Foro Regional XI Pinheiros, que os remeteu ao Foro Central (fls. 68/69).

Também apensos os autos da impugnação ao pedido de assistência judiciária, que foi acolhida (fls. 09), o que importou no recolhimento das custas por parte dos autores, nos autos principais (fls. 141/144). E, por fim, apensos os autos da impugnação ao valor da causa, igualmente acolhida, para reduzi-lo a R$ 20.000,00 (fls.12). É o relatório. Decido. A ação é improcedente. Os autores não lograram provar que houve culpa, dolo ou má-fé por parte da ré, ao divulgar comentários, ou suposições, a respeito de fatos que toda a imprensa vinha relatando, por ocasião de renhida disputa eleitoral de âmbito nacional.

Com efeito, a publicação da revista Época é de 5 de agosto de 2002. Mas, anteriormente, já a revista Istoé, em 2 de agosto de 2002, e o jornal O Estado de S. Paulo, edição de 3 de agosto de 2002, haviam denunciado os mesmos fatos ou comentários, também divulgados logo em seguida pela revista Veja, na edição de 7 de agosto de 2002 (fls. 32/34, 99/102, 103/104, 105/114 e 115). Note-se que o Procurador-Geral Eleitoral opinou pela improcedência da representação, formulado pelo candidato Paulo Pereira da Silva contra a ré, indeferindo-se o pedido de direito de resposta por entender que a matéria se insere nos limites do legítimo exercício do direito de informação jornalística (fls. 116/118).

Em suma, se os comentários se tornaram públicos, porque noticiados por vários órgãos da imprensa, não há como atribuir à ré a intenção de causar dano à imagem dos autores ou prejudicar-lhes, de qualquer forma, sua atividade profissional. Tanto mais que a simples leitura do texto, publicado pela revista, deixa patente seu caráter condicional, sem afirmações categóricas ou juízos de valor sobre a conduta dos autores. Estes, por sinal, nada provaram a respeito dos pretensos danos materiais que alegam ter sofrido, tanto assim que se desinteressaram da produção de provas, como se verifica pelo silêncio nos autos, quando intimados para dizer se concordavam com o julgamento antecipado (fls. 169).

Isto posto, julgo improcedente a ação e condeno os autores ao pagamento das custas processuais, bem como honorários advocatícios da ré, que arbitro moderadamente em dez por cento do valor fixado para a causa (cfr. fls. 12, dos autos em apenso). P. R. Int. CUSTAS DE PREPARO TOTALIZAM R$ 502,62 E O VALOR DA DESPESA COM PORTE DE REMESSA E DE RETORNO PERFAZ, ATÉ A PRESENTE DATA, R$ 17,78. ADV; MARIA ANGÉLICA VIEIRA STEINER, OAB 208.424/SP.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!