Rito revisto

Deputado propõe novas regras para aprovação de MPs no Congresso

Autor

  • José Levi Mello do Amaral Júnior

    é professor associado de Direito Constitucional da USP professor do mestrado e do doutorado em Direito do Ceub livre-docente doutor e mestre em Direito do Estado procurador da Fazenda Nacional cedido ao TSE e secretário-geral da Presidência do TSE.

13 de abril de 2005, 11h53

Circula na Câmara dos Deputados minuta de relatório do deputado Sigmaringa Seixas sobre um novo rito de tramitação para as medidas provisórias.

A primeira modificação é relativa ao parágrafo 3º do artigo 62 da Constituição, predefinindo prazos parciais máximos de tramitação para as medidas provisórias em cada casa do Congresso Nacional. Passaria a haver prazo de sessenta dias para a Câmara, outro de quarenta e cinco dias para o Senado e um de quinze dias para a casa iniciadora deliberar acerca de eventuais emendas da casa revisora.

A segunda modificação é quanto ao regime de urgência na tramitação das medidas provisórias (alteração do parágrafo 6º do artigo 62 da Constituição). Haveria dupla contagem de prazos para o início do regime de urgência. Após quarenta e cinco dias sem votação na Câmara, a pauta dessa seria sobrestada; após trinta dias sem votação no Senado, a pauta desse seria sobrestada.

Note-se: as medidas provisórias não mais ingressariam no Senado trancando-lhe a pauta. Este efeito somente ocorreria após uma segunda contagem de prazo específica ao Senado (trinta dias). Hoje, as medidas provisórias com prazo “estourado” na Câmara já ingressam no Senado trancando-lhe a pauta (o que constrange o Senado a deliberar com maior brevidade).

Ademais (terceira modificação), a discussão e a votação das medidas provisórias seriam iniciadas, alternadamente, na Câmara e no Senado (alteração do parágrafo 8º do artigo 62 da Constituição).

Ora, é da tradição do processo legislativo brasileiro fazer da Câmara a casa iniciadora dos projetos — e, portanto, das medidas provisórias — de iniciativa do Presidente da República. Isso confere à Câmara vantagem sobre o Senado quando do retorno de um projeto para o fim de manter ou não eventuais emendas feitas pela casa revisora. É bom que assim seja, porque a Câmara é a casa de representação do povo, enquanto o Senado o é dos Estados e do Distrito Federal (artigos 45 e 46 da Constituição).

Há outra dificuldade para esta modificação. Frustrado o prazo de votação da casa iniciadora, a proposta determina o encaminhamento da matéria à casa revisora. Não fica claro se a casa revisora poderia ou não — no modelo proposto — deliberar antes da casa iniciadora em caso de essa não observar o prazo que lhe é imposto. No modelo atual não pode. No modelo proposto, parece que sim, dada a redação pretendida para o parágrafo 6º do artigo 62 (ora, em havendo, no limite, possibilidade de trancamento concomitante de ambas as pautas, qualquer uma das casas poderia votar).

A proposta também não evidencia a indispensabilidade da manifestação da casa iniciadora, ainda que fora de prazo. Ora, certamente não é objetivo da proposta abrir exceção ao bicameralismo.

Também é preocupante o fato de a redação proposta para o parágrafo 4º do artigo 62 da Constituição não mais definir o termo inicial de contagem dos prazos parciais. O parágrafo 4º atual o indica claramente: a publicação da medida provisória. Por outro lado, o prazo total de cento e vinte dias continua com o respectivo termo inicial claro: aquela mesma publicação (parágrafo 3º do artigo 62 da Constituição).

Há, ainda, o acréscimo de um parágrafo 13 ao artigo 62 da Constituição, obrigando que as medidas provisórias sejam tematicamente homogêneas. Aqui, sim, ter-se-ia avanço significativo em benefício da boa técnica legislativa, impedindo as “caronas” que ensejaram, na doutrina italiana, a expressão “decreti omnibus” (vide, a propósito, AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Medida provisória e a sua conversão em lei. A Emenda Constitucional no 32 e o papel do Congresso Nacional, São Paulo: RT, 2004, p. 166).

A homogeneidade temática já é recomendada pelo Direito brasileiro (inciso II do artigo 7º da Lei Complementar no 95, de 1998), mas não em nível constitucional. Posta de modo cogente na Constituição, passaria a parâmetro de controle da constitucionalidade. A sua não observância implicaria inconstitucionalidade formal das medidas provisórias heterogêneas (op. cit., p. 281 e 282).

Enfim, é importante que qualquer modificação em estudo preserve a maior virtude da Emenda no 32: prazos inexoráveis que impõem decisão acerca da medida provisória em prazo máximo de aproximadamente duzentos dias (considerada eventual suspensão por força de recesso), conforme já enfatizado alhures (op. cit., p. 266).

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!