Fraude no seguro

MP entra na Justiça contra Porto Seguro e Marítima

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11 de abril de 2005, 16h16

O Ministério Público paulista entrou na Justiça com duas ações civis públicas contra seguradoras por supostas práticas abusivas contra o consumidor. As empresas são acusadas de evitar pagar indenizações sob a alegação de que os segurados teriam praticado fraude para receber o seguro.

As ações foram propostas pela Promotoria de Justiça do Consumidor de São Paulo. A primeira, contra a Porto Seguro e, a segunda, contra a Marítima Seguros. As ações são assinadas pelos promotores de Justiça Deborah Pierri e Gilberto Nonaka.

Em pedido de liminar, o Ministério Público requereu à Justiça que as seguradoras sejam obrigadas a pagar, imediatamente, o capital segurado, devidamente atualizado, naqueles casos em que não há prova inequívoca que justifique a negativa de indenização.

No mérito, o MP requereu que as ações sejam julgadas procedentes, que as seguradoras paguem o valor da indenização no prazo de 30 dias, contados da comunicação do sinistro e que as empresas sejam condenadas a se abster de induzir, obrigar, sugerir, constranger ou qualquer outra ação que implique renúncia ou desistência da parte do consumidor ao valor do capital segurado.

O Ministério Público pediu, ainda, que as duas seguradoras sejam condenadas a indenizar integralmente os consumidores pelos danos materiais e por danos morais.

O golpe

A ação movida contra a Porto Seguro é um complemento ao trabalho feito pelo Gecep — Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial –, que denunciou diretores da seguradora, delegados de polícia, advogado, escrivão de polícia e funcionários da empresa pela prática de formação de quadrilha, estelionato, falso testemunho, uso de documento falso e denunciação caluniosa.

Para comprovar a alegada prática abusiva da Marítima Seguros foi aberta investigação pelo promotor de Justiça Gilberto Nonaka. A ação contra a Porto Seguro foi distribuída à 28ª Vara Cível e a proposta contra a Marítima está com o juízo da 11ª Vara Cível.

As seguradoras teriam adotado práticas comerciais abusiva e ilícita, que consistia no não pagamento da indenização dos sinistros nos casos de furto e roubo de veículos.

A prática funcionava da seguinte maneira: ao acionar a seguradora, o cliente tinha o pedido de indenização negado. Era alegado que ele havia vendido o seu carro no Paraguai antes da comunicação do roubo ou furto.

Como provas eram apresentados documentos de compra e venda do veículo do segurado com registro em cartório paraguaio. Os documentos seriam falsos, segundo apuração da Abin (Agência Brasileira de Inteligência).

Com base nas provas obtidas no Paraguai, propunha-se ao segurado a desistência da indenização. Caso contrário, um inquérito policial de fraude e estelionato era instaurado na polícia.

Para os promotores de Justiça, o método usado pode ter prejudicado ainda mais os consumidores, pois muitos tiveram suas ações individuais julgadas improcedentes. Outros, ainda, deixaram decorrer o prazo de prescrição de um ano por causa da pressão que sofreram com a ameaça da responsabilidade criminal.

Ação criminal

No dia 21 de março, o Ministério Público denunciou dois diretores e um gerente jurídico da Porto Seguro de integrar um esquema de fraude para evitar que segurados recebam indenizações por veículos roubados. Além deles, a denúncia aponta três delegados e um escrivão da Polícia Civil, um advogado e três representantes da empresa WSN (prestadora de serviços encarregada de investigar sinistros).

Na última quinta-feira (7/4), a juíza Sônia Nazaré Fernandes Fraga, da 23ª Vara Criminal, aceitou a denúncia do MP. Os réus da Porto Seguro são o diretor do departamento jurídico, Luiz Paulo Horta de Siqueira, o diretor do departamento de sinistros, Nelson Peixoto, o gerente do departamento jurídico, Joel Rebelato de Mello e Sérgio Antonio Lopes.

Além deles, são réus os delegados Reinaldo Correia, Enjolras Rello de Araújo e Guaracy Moreira Filho, o escrivão Geraldo Picatiello Júnior, o advogado Carlos Alberto Manfredini e os empresários Nanci Concílio de Freitas, Marcos Concílio de Freitas e Karla Concílio de Freitas, donos da WSN.

Os réus são acusados de formação de quadrilha, estelionato, falso testemunho, uso de documento falso e denunciação caluniosa. O escrivão Picatiello e o gerente da Porto Seguro Rebelato de Mello tiveram a prisão preventiva decretada. Estão foragidos.

A denúncia foi apresentada à Justiça pelos promotores Marcia de Holanda Montenegro, Fabio José Bueno, Marcio Sérgio Christino e Rodrigo Frank de Araújo, do Grupo de Atuação Especial e Controle Externo da Atividade Policial — Gecep.

A Abin (Agência Brasileira de Inteligência), subordinada ao governo federal, teve participação importante nas investigações do Ministério Público sobre suposto esquema de fraudes envolvendo diretores da seguradora Porto Seguro, policiais civis e uma empresa prestadora de serviço.


Em investigação em cartórios do Paraguai, agentes da Abin, auxiliados por policiais paraguaios, constataram que seriam falsos alguns dos contratos de venda de veículos apresentados como prova pela Porto Seguro contra clientes acusados de fraude.

A Promotoria diz que o esquema existiu de 99 até 2004. Nesse período, cerca de 600 inquéritos suspeitos foram instaurados no 27º DP contra os segurados. Em cerca de 120 foram usados documentos alegadamente falsos do Paraguai. Os outros ainda tramitam na Justiça.

O MP diz ainda que clientes das seguradoras Hannover, Marítima, Finasa (hoje sob comando da Bradesco) e Unibanco AIG também foram vítimas do golpe, mas não houve participação dessas empresas na fraude. Nesses casos, as supostas fraudes teriam sido feita pelas empresas contratadas para averiguar solicitações de indenização.

Especialistas no assunto, contudo, afirmam que casos de fraude efetivamente cometidas por segurados estão misturados com os do escândalo, o que ficará claro com o decorrer das apurações.

Leia íntegra da ação contra a Porto Seguro

Excelentíssimo Juiz de Direito da ____ Vara Cível de São Paulo.

O Ministério Público do Estado de São Paulo, por meio da Promotoria de Justiça do Consumidor, vem perante Vossa Excelência, vem, perante Vossa Excelência , com supedâneo no art. 129, inc. II e III da Constituição Federal; nos arts. 81, 82, inc. I e 90, todos do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), e arts. 1º, 5º e 12º da Lei 7.347/85, ajuizar a presente ação civil pública com pedido liminar em face da empresa Porto Seguro – Companhia de Seguros Gerais, CNPJ no. 61.198.164.0001/60, domiciliada à Avenida Rio Branco, 1489, Campos Elíseos, CEP 01205-000, São Paulo, pelas razões de fato e de direito que seguem:

I – Dos Fatos:

O procedimento administrativo que acompanha a inicial, instaurado a partir do encaminhamento da denúncia criminal e outros documentos, revela que alguns indivíduos, dentre eles prepostos da ré(1) , foram denunciados por vários crimes (formação de quadrilha; estelionato), todos relacionados a um esquema de fraude contra os consumidores segurados, vítimas de sinistro (roubo ou furto).

A acusação relata que dentre as finalidades da empreita criminosa estava a de garantir que a seguradora ré afastasse sua obrigação, prevista em contrato, qual seja a de indenizar os segurados.

A fraude consistia na escolha, ao que se sabe de modo aleatório, de alguns consumidores (vítima de sinistro) para recusar-lhes a indenização.

O pretexto da seguradora ré era de que o consumidor havia praticado fraude para o recebimento de seguro, delito previsto no Código Penal (art. 171, § 2º, inc. VI)

Alguns consumidores nunca foram informados ao certo a razão da recusa, já que as declarações em anexo indicam que muitos dos segurados somente tomaram conhecimento dos motivos, quando já estavam indiciados ou respondendo a processo crime.(2)

Em alguns casos a ré recusava o pagamento com base em documento inidôneo, no qual era simulada compra e venda do veículo sinistrado em data anterior ao fato delituoso (roubo ou furto) sofrido pelo segurado.

O esquema sustentado pela ré envolvia a exibição de escrituras lavradas no Paraguai, nas quais estavam discriminados todos os dados do veículo sinistrado.

Embora o documento(3) formalmente nem ateste a veracidade da transação, conforme exemplo de fls. 102/109, o mesmo passou a ser utilizado pela ré, como meio de ameaças e constrangimentos.

Seu objetivo final era dar aparência de justa causa para a recusa à indenização pleiteada.(4)

A ré, contrariando toda a expectativa legítima de sua clientela, passou à prática abusiva apenas para furtar-se ao cumprimento de sua obrigação.

Se naquele país, diferentemente do exigido no Brasil, a transferência de veículo automotor é desprovida de maior formalidade, mais uma razão para concluirmos que a ré não agiu de modo ingênuo ao imputar aos seus segurados a prática de fraude para recebimento do seguro.

Aliás, as notícias revelam que muitas seguradoras agem da mesma maneira.

Esse não é somente um fato jornalístico, porquanto declarações de consumidores foram colhidas em inquérito policial e procedimento administrativo criminal (fls.25/ss), indicando a lamentável prática comercial de várias seguradoras.

Aliás, isso ensejou a instauração de inúmeros procedimentos na própria Promotoria de Justiça do Consumidor (fls 79/81).

Esse esquema fraudulento e iníquo usado pela ré, não era sustentado somente pela ação criminosa de seus prepostos, pois para tanto contava com parceria comercial de terceiros.

Com efeito, a ré associou-se à empresa WSN Comercial e Informações no Mercado Automotivo Ltda. para que essa lhe prestasse serviços de ‘investigação privada’ a respeito da regularidade dos sinistros.(5)


Entretanto, por si ou por outrem, a seguradora investindo-se do que o poder econômico pode ter de pior, passou a constranger e ameaçar o consumidor, induzindo-o a desistir de receber a indenização a que tinha direito.

Em muitos casos o consumidor era constrangido a pagar os honorários da empresa de investigação, contratada pela seguradora.

A resistência do consumidor implicava em instauração de inquéritos policiais(6) , também não foram poucos os consumidores que se viram processados criminalmente, arcando minimamente com custo de sua defesa.

Enfim, a prática omissiva ou comissiva da ré não pode ficar sem resposta e a postura da seguradora deve ser coibida, já que contrária aos valores e princípios constitucionais de proteção ao consumidor e às relações de consumo, porquanto não somente deixou de cumprir com suas obrigações contratuais, bem como, impôs aos consumidores constrangimento iníquo e indevido, contrariando as boas práticas corporativas e o verdadeiro sentido da função social da empresa, olvidando-se dos princípios e finalidades que cercam o contrato de seguro.(7)

Minimamente, pode-se imputar à seguradora conduta omissiva no que diz respeito ao esquema criado e desenvolvido em seus escaninhos, o que é absurdo, pois no ramo empresarial que desenvolvem as companhias de seguro a fraude é um dos temas recorrentes e alvo de preocupações constantes.

Sobre isso disse Antonio Penteado Mendonça:

“Uma das maiores preocupações das seguradoras, no mundo todo, são as fraudes. (…) Não faz muito tempo, uma pesquisa a respeito do tema mostrou que a fraude praticada por funcionários e prestadores de serviços das mais diversas empresas, nos mais diferentes campos de atuação, custa uma fortuna para o País como um todo porque encarece sobremaneira o preço final dos produtos. A atividade seguradora não é a exceção à regra. Pelo contrário, dadas suas características, é de se presumir que a fraude dentro das companhias encontra campo farto para se desenvolver, com todas as conseqüências adversas daí decorrentes. (…) Ações como estas precisam ser coibidas energicamente. Além de caras, elas desmoralizam o setor e expõem companhias sérias a vexames inomináveis, mas evitáveis, através da implantação de meia dúzia de providências de fiscalização e controle relativamente simples”.

II — Do Direito:

Da legitimidade ativa do Ministério Público:

A Constituição Federal, no art. 129 III prescreve que “são funções institucionais do Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”, nestes inseridos o direito do consumidor.

Do mesmo modo, o art. 103 VIII da Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo estatui que “são funções institucionais do Ministério Público… promover o inquérito civil e a ação civil pública, para proteção, a prevenção e a reparação dos danos causados ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, e a outros interesses difusos, coletivos, homogêneos e individuais indisponíveis”.

Ainda, a Lei n. 7.347/85 atribui legitimidade ao Parquet para a propositura de ação civil pública com objetivo de prevenção ou reparação dos danos causados ao consumidor, em decorrência de violação de interesses ou direitos difusos ou coletivos.

Também a Lei n. 8.078/90 (art. 82 I e art. 81, parágrafo único, I e II) legitima o Ministério Público para a defesa coletiva dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos dos consumidores.

A presente demanda visa preservar e reparar o direito de todos aqueles que mantenham ou que possam manter com a ré contrato de seguro de veículos, impedindo que cause novos danos decorrentes de prática comercial abusiva.

A ação judicial também almeja obter a condenação da ré em favor dos consumidores lesados, obrigando-a indenizar os prejuízos morais e materiais decorrentes da sua prática comercial contrária aos ditames do Código Civil e da Lei 8.087/90.

O contrato de seguro e o Código de Defesa do Consumidor:

O art. 757 do Código Civil(9) , conceitua o seguro como contrato no qual uma das partes (segurador) se obriga para com a outra (segurado), mediante o pagamento de um prêmio, a garantir-lhe interesse legítimo relativo à pessoa ou a coisa e a indenizá-la de prejuízo decorrente de riscos futuros previsto no contrato.

Os elementos do contrato de seguro são: os sujeitos (segurador e segurado), a previsão de um risco e de um pagamento de prêmio e, na hipótese de ocorrer o sinistro, o pagamento de indenização.

O prêmio ou mensalidade “é a quantia pecuniária que o segurado paga à seguradora para obter o direito a uma indenização se ocorrer o sinistro oriundo do risco garantido e previsto no contrato”.(10)


A ré não age como segurador, pois embora receba o prêmio não dá a sua paga que a de suportar o risco.

O risco referido consiste num acontecimento futuro e incerto, potencialmente prejudicial aos interesses do segurado.

Sobre essa característica observa Maria Helena Diniz:

“a noção de seguro supõe a de risco, isto é, o fato de estar o sujeito exposto à eventualidade de um dano à sua pessoa, ou ao seu patrimônio, motivado pelo acaso”.(11)

Vale lembrar, que os contratos de seguro privados (terrestres), podem ser de coisas ou de pessoas e quanto ao objeto que visam garantir, ainda podem ser classificados em patrimoniais, reais ou pessoais.

Seguro real é aquele que visa proteger o interesse que alguém possa apresentar em relação à determinada coisa.

Essa é a modalidade de contrato oferecido pela ré, já que se propõe garantir eventuais prejuízos ocasionados a veículos automotores, conforme as declarações que seguem anexas e a indicação constante na denúncia criminal oferecida contra alguns de seus empregados entre outros.

Inegavelmente o vínculo entre segurado e seguradora traduz numa relação de consumo (CDC, arts. 2º e 3º), daí porque, plenamente aplicável às regras contidas no Código de Defesa do Consumidor.(12)

Não é demais imaginar que o contrato de seguro é um contrato contínuo, no qual exige-se ainda maior lealdade e confiança entre os parceiros.(13)

Isso porque, diferentemente dos contratos descontínuos (v.g. compra e venda), caracterizados pela transação instantânea, completa, rápida e impessoal, os contratos contínuos ou relacionais criam relações jurídicas complexas, na qual o consumidor mantém vínculo de dependência com o fornecedor (v.g. seguros em geral, previdência privada, instituições financeiras e seguro-saúde).

Essa confiança e dependência não foram esquecidas pelo legislador, pois, de acordo com a política nacional das relações de consumo, devemos reconhecer, desde logo, a vulnerabilidade do consumidor (CDC, art.4, I), tendo em vista sua hipossuficiência.

Aliás, em todos os contratos contínuos a dependência se protrai por longos anos, sendo uma de suas principais características.

Observa-se na descrição dos fatos, o quanto a ré aproveitou-se da vulnerabilidade dos consumidores, demonstrando extrema descuido com os consumidores.(14)

Grandes corporações com métodos mais estratégicos dos que o desenvolvido pela ré, sabem que o mercado brasileiro nunca esteve tão aberto aos contratos de longa duração.(15)

Entretanto, atualmente é a lógica das grandes corporações valorizarem sua clientela e produtos, não somente como resposta adequada e esperada pelos investidores, mas principalmente como garantia do desenvolvimento da ordem econômica.

A conduta da empresa deve beneficiar a nação como um todo, por isso deve transitar pelos princípios que informam a ordem econômica seja o da livre iniciativa, livre concorrência, mas sem esquecer a defesa dos consumidores. Esta é a responsabilidade social de qualquer empresa.(16)

Como já foi dito a conduta da ré não é isolada no mercado de seguro, o que bem demonstra a necessidade de se coibir tal prática socialmente inadequada e juridicamente indevida o que merece resposta adequada.

Aliás, a postura da empresa ré não condiz com a nova teoria contratual e nem tampouco a principiologia que inspira grandes corporações.

Claro que essas novas perspectivas não servem para afastar os mecanismos tradicionais de interpretação do direito; ao contrário servem de base ao intérprete para dar respostas mais claras e eqüitativas aos conflitos atuais.

Tem sido assim com os contratos de longa duração, atualmente entabulados de forma massificada. Aliás, lapidares são as lições de Cláudia Lima Marques, calcando-se na experiência havida no direito comparado, sobre os benefícios da teoria dos contratos relacionais:

“(…) Sendo assim, a mais importante contribuição destes estudos à nova teoria contratual brasileira é a criação de um modelo teórico contínuo que engloba as constantes renegociações e as novas promessas, bem destacando que a situação externa e interna de catividade e interdependência dos contratantes faz com que as revisões, novações ou renegociações contratuais naturalmente continuem ou perenizem a relação de consumo, não podendo estas, porém, autorizar abusos da posição contratual dominante e validar prejuízos sem causa ao contratante mais fraco ou superar deveres de cooperação, solidariedade e lealdade que integram a relação em toda a sua duração”(17) (grifo não original).

Com a mesma agudeza Ronaldo Porto Macedo Júnior sugere que o modelo relacional recomenda a revalorização dos princípios da boa-fé, justiça e equilíbrio contratual, pois potencializam o reconhecimento das circunstâncias fáticas concretas, permitindo ao intérprete examinar o contrato não simplesmente como um padrão fixo de aplicação inexorável.(18)


Se o contrato é relacional, se os contratantes têm a finalidade comum de ajudar o segurado a suportar os riscos futuros envolvendo seu interesse patrimonial, logicamente, princípios norteadores na interpretação dos contratos relacionais devem ser aplicados: boa-fé, equidade, solidariedade e cooperação.

Infelizmente não é assim que a ré se comporta, pois empresa de grande porte como é, surpreendeu a sociedade, reduzindo seu objeto social ao lucro desenfreado, aproveitando-se da vulnerabilidade de seus segurados.

Sua conduta ainda é mais patética, pois não se mostrou sensível á situação de seus clientes, mas somente deu importância à sua própria imagem, inserindo em seu sítio na Internet notas de solidariedade à sua honra.

Sua omissão e prática além de ilícita é igualmente abusiva, não condizente com os objetivos traçados pela política nacional de consumo.

A seguradora ré não supre as necessidades dos consumidores, desrespeita sua dignidade, não age com transparência, enfim, não atende suas expectativas legítimas (CDC, art. 4º).

A conduta da seguradora, o princípio da boa-fé e a da função social:

Na realidade, a ré, pelo que se nota nas ocorrências verificadas nas declarações prestadas ao GECEP – Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial, órgão vinculado ao Ministério Público do Estado de São Paulo, usualmente, para furtar-se ao cumprimento de sua obrigação (indenização do capital segurado), prestou-se, lamentavelmente, a tratar o consumidor como criminoso, submetendo-o a uma série de iniqüidades.

Sua atitude abusiva e ilícita gerou inúmeras conseqüências de ordem patrimonial e moral.

No campo patrimonial não foram poucos os prejuízos.

Além de negar a indenização a inúmeros segurados, utilizando-se da mesma metodologia, fez com que o consumidor tivesse despesas para buscar o valor da indenização, o que nem sempre deu resultado.

Com efeito, quantas ações foram consideradas prescritas, quantas tiveram julgamento de improcedência, provavelmente porque acolhida a tese fantasiosa da ré de que o consumidor teria agido de modo a fraudar o seguro .

Consumidores foram forçados a desistir de pleitear aquilo que era devido, contrariando o princípio da boa-fé objetiva e principalmente a finalidade do próprio contrato de seguro.

Aliás, o novo Código Civil é literal nesse aspecto, pois o contrato de seguro está sob o primado da boa-fé.(19)

Na verdade, esse princípio, pelo art. 765 do CC ao contrato de seguro, provém essencialmente do que dispõe o art. 422 do mesmo Diploma. Ao mesmo converge com o princípio da eticidade, pilar de toda construção jurídica fincada no novo Código Civil.

Lembra Jones Figueiredo Alves:

“Desse modo, exige-se do segurado e do segurador um comportamento adequado a inspirar legítima e razoável confiança para a validade do contrato, agindo com boa-fé, lealdade e veracidade; e uma atuação permanente de probidade no especial interesse de preservar o contrato em sua firmeza obrigacional. (…) Em atenção ao comentado no art. 422, e por identidade substancial com aquela norma, impõe-se o aperfeiçoamento do presente dispositivo, a considerar a probidade e a boa-fé em todo o sistema contratual, nele incluídas as fases preparatórias e pós-executória”.(20)

Com a mesma expressão lembra Maria Helena Diniz:

“(…) é um contrato de boa-fé (CC, arts. 765, 766 e parágrafo único), pois o contrato de seguro, por exigir uma conclusão rápida, requer que o segurado tenha uma conduta sincera e leal em suas declarações a respeito do seu conteúdo e dos riscos, sob pena de receber sanções se proceder com má-fé, em circunstâncias em que o segurador não pode fazer diligências recomendáveis à sua aferição (…) A boa-fé é exigida também do segurador (…) Todavia, a má-fé de ambos deverá ser comprovada”.(21)

No mesmo sentido estão os seguintes julgados:

“O contrato de seguro privado é uma relação de consumo na qual se presume a boa-fé do segurado. Por essa razão, incumbe à seguradora o ônus da prova da alegada má-fé do segurado ao contratar o seguro. Eventual dúvida deve ser resolvida em favor do segurado, nos termos do art. 47 da Lei 8.078/90”.(22) (g.n).

“O Código de Defesa do Consumidor trouxe importantes inovações no âmbito das relações contratuais, permitindo restabelecer igualdade e equilíbrio entre consumidor e fornecedor, uma vez que este dispõe de melhores condições técnicas, econômicas e intelectuais para o desempenho de sua atividade.A empresa que explora seguros de vida e admite associado sem prévio esclarecimento das condições de seu plano, e passa a receber as contribuições do segurado, não pode, ao ser chamada ao pagamento de sua contraprestação, recusar a pagá-lo sob a alegação de que o segurado prestara informações errôneas sobre seu estado civil.Além do mais, não é crível que a seguradora, indiscriminadamente, receba as prestações e, somente após, passe a exigir o estrito cumprimento do contrato para afastar sua obrigação de pagar o prêmio do segurado de vida.Para que se possa reconhecer a má-fé do segurado é necessário prova segura de que ele fora, efetivamente, informado e esclarecido de todo o conteúdo contratual, principalmente, a respeito das cláusulas de exclusão da responsabilidade contratual”.(23) (g.n).


A ré ao agir ou permitir que a fraude se instalasse nos seu negócio quebrou o preceito fundamental da boa-fé e mais esqueceu-se que o art. 766, do Código Civil exige a comprovação da má-fé do segurado para perda do direito indenizatório.

Na verdade, a ré não se mostrou minimamente respeitosa com o direito de informação.(24)

Longe não somente do entendimento da função social do contrato, a ré também se distanciou do conceito moderno denominado função social da empresa.

Com efeito, o progresso social de uma nação está intimamente ligado ao desenvolvimento das empresas e a sua relação com os consumidores.

Essa relação quase sempre é instrumentalizada em contratos. Na verdade o contrato é apenas um mecanismo para que a empresa alcance seus objetivos econômicos e também seja útil para o desenvolvimento da sociedade.

Se a empresa desempenha bem o seu papel ela é livre e deve ser prestigiada como propulsora da ordem econômica.

O anseio de todos é que essa liberdade seja auto-regrada, mas sem prejuízo da intervenção estatal, principalmente, se a empresa agir além dos limites da função social, isto é, pautar sua conduta em manifesta afronta aos valores fundamentais (dignidade e respeito aos consumidores).

Sua conduta é contrária ao emergente movimento mundial da responsabilidade e função social da empresa.

Como esclarece Maria Cristina Mattioli, o papel da empresa ou sua função vai muito além dos interesses econômicos e não envolve, exclusivamente, a proteção aos acionistas. A responsabilidade está intimamente ligada às obrigações que a empresa têm para com a sociedade na qual ela atua.

Vejamos:

“Mais recentemente introduzidas em instrumentos da Organização de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico, cuja definição pode ser extraída de seus princípios: relações entre a direção da companhia, seu conselho de administração, seus acionistas e seus participantes. No geral, estas relações dizem respeito ao lucro. Todavia, ao referir-se a participantes, referido instrumento introduz tópicos de responsabilidade social na medida em que esta expressão significa o grupo de pessoas interessadas na atuação da empresa, que não sejam investidores, mas, empregados, contratantes, sindicatos, consumidores, grupos de consumidores e o público em geral”.(25)

Evidentemente, não são somente negociais os interesses que ligam o consumidor à empresa.

Dada a importância que essas empresas têm no desenvolvimento dos povos, o seu vínculo com a sociedade deve estar comprometido com princípios da probidade, equidade, boa fé.

A liberdade empresarial total, o mito do lucro a qualquer preço, o dogma da autonomia da vontade são aspectos insustentáveis.(26)

Entretanto, os fatos trazidos pelas declarações dos consumidores aos Promotores de Justiça bem demonstram a forma de agir da ré.

Vejamos:

“(…) Não soube o porquê não ter recebido a indenização a que tinha direito, não tendo recebido nenhum documento que explicasse a razão do não pagamento. Somente soube que a Seguradora estava lhe imputando crime de estelionato quando chegou uma precatória para ser ouvido na cidade em que reside…”.(27)

“(…) Na Porto Seguro foi atendida por Sérgio Antonio que lhe disse que a declarante estava mentindo, que a versão por ela apresentada não coincidia com a de seu marido. Exigiram que a declarante assinasse a desistência da indenização sob pena de instalarem um inquérito policial contra ela. (….) Somente na Delegacia de Campinas, quando foi ouvida no inquérito, soube que a seguradora alegava que a declarante havia levado o veículo a outro país, o Paraguai.”(28)

Claro está que o ilícito e a prática abusiva da ré contrariam o propósito de sua própria finalidade, expondo o consumidor a humilhações e dissabores indevidos, tudo para justificar o não pagamento da indenização.

A responsabilidade da ré sobre o direito dos consumidores de serem devidamente informados e sobre os danos causados aos segurados:

A ré não respeita o direito do consumidor de ter informações claras e precisas a respeito de sua recusa.

Não é possível ao consumidor discutir a legitimidade da recusa se não há exibição de documento ou prova mínima da existência de motivo justo para a negativa.

O consumidor é hipossuficiente e vulnerável enquanto que as seguradoras contam, inclusive, com serviços de terceiros para que possam indenizar somente aqueles que tenham agido com lisura.

Dúvidas militam em favor do consumidor segurado e não ao contrário.

No ramo do seguro outra não pode ser a política empresarial .

O sistema é o da facilitação de sua defesa e isso, evidentemente, não exclui o direito das seguradoras de se prevenirem contra a fraude.


Entretanto, no exercício do seu direito a ré age de modo excessivo o que configura indiscutivelmente abuso de direito.

Com efeito, os direitos são conferidos para que alcancem determinada finalidade, do qual o seu titular não deve desviar-se, sob pena de responsabilização pessoal daquele que maneja o exercício do direito com vistas a lesionar direito de outrem.

Isto é, a responsabilização configura sanção àquele que faz indevidamente uso do direito.

A respeito do abuso de direito é necessário conferir-se o art. 187 do Código Civil:

“Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.

Aliás, sem precedente na codificação anterior, revelando a opção contemporânea do legislador em tomar como ato ilícito o mau uso do direito. (29)

A SUSEP (Superintendência de Seguros Privados), ao ser ouvida em audiência, mostrou a sua limitada atuação:

“A SUSEP, através da sua divisão de fiscalização, não procede a uma análise documental daquilo que foi fornecido pela seguradora e pelo segurado; não comparecem aos locais, não vão à fronteira do Brasil para verificação de saída de veículo, não pedem informações de órgãos do exterior. Tais investigações são feitas pelas seguradoras, cabendo apenas à SUSEP analisar os argumentos e documentos para decidir o mérito da negativa do pagamento da indenização.”(30)

Os consumidores não podem ser deixados à própria sorte, sem que haja intervenção na prática da seguradora ré, que fez mau uso de sua liberdade.

Na verdade, o que se pretende é que, no caso de negativa de indenização, a seguradora ré seja obrigada informar o consumidor de modo pormenorizado.

Absurdo ser diferente, especialmente pela falta de apreço aos interesses do consumidor demonstrado pela ré.

Necessário que a seguradora se veja obrigada a esclarecer o consumidor de modo pormenorizado as razões de sua recusa.

Impossível que simplesmente não cumpra com sua obrigação, mesmo quando não tenha adotado qualquer tipo de providência em face do segurado (civil ou criminal) e nem tampouco reveja a situação do segurado (inquéritos não instaurados ou arquivados).

Há notícias de que mesmo em casos de improcedência da ação penal a seguradora ré não adotou qualquer medida para satisfazer os interesses dos clientes, efetuando o pagamento da indenização.

Além disso, o caso concreto enseja a responsabilização da ré pelos danos causados aos consumidores.

A regra constitucional prevê o amplo direito à indenização, tenha o dano atingido o patrimônio material ou moral dos indivíduos (CF, art. 5º, V).

O tema também tem disciplina própria no Código civil (Título XI) e dentre os vários dispositivos invoca-se, desde logo, a responsabilidade civil daquele que por ato ilícito causa dano.

Vejamos.

“Artigo 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo Único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

Ao comentar o referido dispositivo lembra Regina Beatriz Tavares da Silva diz que:

“Em suma a responsabilidade civil é verdadeira tutela privada à dignidade da pessoa humana e a seus direitos da personalidade, inclusive na família, que é o centro de preservação do ser humano, antes mesmo de ser o núcleo essencial da nação. Conclui-se que a teoria da responsabilidade civil visa ao restabelecimento da ordem ou equilíbrio pessoal e social, inclusive em relações familiares, por meio da reparação dos danos morais e materiais oriundos da ação lesiva a interesse alheio, único meio de cumprir-se a própria finalidade do direito, que é viabilizar a vida em sociedade, dentro do conhecido ditame de neminem laedere”.(31)

A literalidade do dispositivo deixa claro, que em algumas situações a responsabilidade pela indenização independe da prova de culpa.

Interessa-nos nesse momento aludir ao disposto no art. 932, III do Código Civil (32) e art. 34 do Código de Defesa do Consumidor (33) , plenamente aplicáveis ao caso, pois alguns dos denunciados à Justiça Criminal são ou foram empregados ou prepostos da ré.

No entanto, a principal invocação é de que a ré deve indenizar todos os consumidores, que tenham sofrido danos materiais e morais, independentemente da prova de culpa, pois em relações de consumo a responsabilidade é objetiva.

Confira-se:

“Como regra geral, a Lei nº 8.078/90 estabeleceu a responsabilidade objetiva do fornecedor, desconsiderando o elemento culpa, sejam os danos decorrentes de acidente de consumo, sejam decorrentes de vícios de qualidades dos produtos e serviços. Exceção expressa restou estipulada no caso de acidentes de consumo decorrentes de produtos ou serviços oferecidos no mercado de consumo pelos profissionais liberais (art. 12, p. 4º). Ao lado da responsabilidade objetiva, restou estabelecida a solidariedade passiva entre os participantes da cadeia produtiva e comercial (fabricante, produtor, construtor, importador e comerciante), de modo a facilitar o exercício da pretensão indenizatória pelo lesado. O modelo adotado pelo Código de Defesa do Consumidor é louvável, pois aproxima-se do ideal de plena indenização do lesado”.(34)

Não custa ressaltar que justificativa teórica para tal responsabilidade, é de que em algumas situações, exigir-se a prova da culpa equivale a negar o propalado direito constitucional a ampla à reparação.

Basta imaginar a difícil tarefa do consumidor (vítima) ter que provar a culpa ou dolo de um dos administradores da ré na fraude perpetrada contra seu patrimônio.

Cômico pensar que a opção por essa prática empresaria esteja escriturada em qualquer das atas de reuniões de diretoria ou das assembléias gerais, que pudessem ser requisitadas pelo Juízo.

Logicamente que a opção pelo ilícito não vai nunca ser informada por qualquer companhia de seguro, pois seu maior ativo é a confiança.

No entanto é pertinente a manifestação de Marcelo Carvalho Gomes, apontado como especialista em investigar fraudes corporativas, no sentido de que “nas investigações empresariais , quando as fraudes envolvem a diretoria da empresa, em geral, os controladores estão cientes das irregularidades”.(35)

Mais que natural que a responsabilidade objetiva seja aplicada, pois a desigualdade entre os consumidores e a seguradora é tamanha que dispensa qualquer busca ou pesquisa a respeito do subjetivo.

No mesmo sentido, confira-se:

“No direito positivo, a subsistência da teoria da culpa é uma realidade com a qual deve coexistir a teoria do risco, aplicada esta última nas hipóteses em que a desigualdade econômica ou social entre o agente e a vítima traz a necessidade de abolir qualquer indagação sobre a subjetividade do lesante. Ressalta-se que não há razão para que um conceito exclua o outro: a culpa e o risco se completam, na busca de seu objetivo comum – a reparação do dano”.(36)

Obviamente que a ré deve responder pelos danos causados, especialmente porque permitiu e expôs vários consumidores a inúmeras iniqüidades, o que no mínimo é omissão indesejável.

O descuido da ré com o interesse dos consumidores é perceptível, pois os documentos revelam que vários segurados, ouvidos pelos Promotores de Justiça Criminais, só tomaram conhecimento do motivo da recusa, muito tempo após terem solicitado o pagamento da indenização em razão do sinistro.

O dano indenizável:

Já dissemos que a conduta da ré trouxe aos consumidores dissabores de toda ordem.

Com efeito, além de não terem recebido o valor do seguro, muitos foram tratados de forma truculenta e indigna.

É bem possível que muitos dos consumidores, ao cobrarem judicialmente a indenização da ré, tenham malogrado em suas pretensões, dado que a farsa para negar a indenização somente foi esclarecida recentemente.

Em outras palavras, o julgamento de improcedência de muitas ações pode ter sido fruto de indução maliciosa da ré, o que coloca o consumidor em posição ainda mais desvantajosa.

Devemos considerar ainda, embora salutar e necessária, que a responsabilização penal é insuficiente, tendo em vista a pressão psicológica e ameaça sofrida pelos consumidores, muitos dos quais nem ao menos perceberam o exíguo prazo prescricional referido no art.206 do Código Civil.

De qualquer forma, a conduta ilícita e abusiva da ré provocou danos patrimoniais e morais, cujo montante somente será apurado após o reconhecimento de que a ré tem obrigação de indenizar.

Não é somente o capital segurado que deve ser pago, mas sim aquilo que os consumidores deixaram de receber pela falta de recomposição do seu patrimônio.(37)

Além disso, todos os consumidores têm direitos à reparação do dano moral.

Com efeito, a caracterização do dano moral é mais do que evidente.

Aflições, constrangimentos, transtornos, honra abalada com indiciamento em inquérito policial por crime não cometido, foram algumas das situações vividas pelos consumidores.

Conduta empresarial iníqua e disseminada em companhias de seguro(38) serviu aos propósitos da ré.

Livre iniciativa e não dirigismo estatal são premissas que servem aos que, de fato, dominam o sentido real da responsabilidade social ou que sabem exatamente a consistência da função social da empresa, buscando o seu desenvolvimento sem prejudicar seus clientes.

A ré coagiu e menosprezou a liberdade pessoal e intelectual dos consumidores, aproveitou-se, enfim, de sua vulnerabilidade.

Promoveu máculas irreparáveis à imagem e honra dos consumidores

Não esqueçamos do indevido indiciamento de vários consumidores em inquéritos policiais.

Contudo são inimagináveis os sentimentos de repulsa, medo e constrangimento que cercaram os consumidores, bem diferente daquela expectativa de conforto passada pela seguradora no momento da contratação.

A indenização por dano moral também tem sido reconhecida nas relações contratuais, como bem apontou Yussef Cahali(39)

“Também em termos gerais, escreveu o saudoso Prof. Carlos Alberto Bittar: a ruptura injusta de um contrato pode acarretar diminuição patrimonial pela fala de ingresso de numerário; perda de eventual negócio outro encetado; sensação de desconforto por impossibilidade de pagamento de dívida existente; constrangimento pessoal; situação vexatória pela inadimplência; e necessidade de contratação de empréstimo, para satisfação de juros, para adimplir outra obrigação. Fernando Fueyo Lenari indica como dano moral reparável segundo os tribunais argentinos ‘la gran demora del empresário en entregar la vivienda cuya constrcción se le habia encomendado, lapso durante el cual el propietario debió habitar um ambiente lastimoso y em condiciones innhumanas; el derecho a la vivienda, com mayor razón si es própria, ha sufrido agravio y , menoscabo, com el agregado de interrumpir la vida normalmente tranqüila”.

Aliás, algo bem mais simples do que o vivenciado pelos consumidores no presente caso já foi reconhecido como causa de dano moral indenizável.

Vejamos:.

“Ementa: INDENIZAÇÃO. PERDAS E DANOS. DANO MORAL.

Se o veículo de um representante comercial é furtado e a seguradora só providencia a quitação do seguro após decorridos mais de um ano do sinistro, a queda das vendas deve ser compensada com o pagamento de uma indenização por perdas e danos.A moral individual sintetiza a honra da pessoa, o bom nome, a boa fama e a reputação que integram a vida humana como dimensão imaterial”(40).

“Ementa: SEGURO. FURTO. PERDA TOTAL. ALEGAÇÃO DE FRAUDE. ÔNUS DA PROVA. INDENIZAÇÃO DEVIDA. A prova da alegada fraude visando à obtenção da indenização cabia à seguradora, ônus do qual não se desincumbiu. Não basta demonstrar que o veículo saiu do país dias antes do furto, se o autor justifica, se forma convincente e amparado por prova testemunhal, a razão da viagem ao Paraguai. Por outro lado, a alegação de venda do veículo em outro país deve vir demonstrada por prova documental, o que não ocorreu. Apelo improvido”.(41)

A indenização como se sabe não pode ser exagerada, mas também não pode ser diminuta, dado o seu caráter educativo e preventivo. Isto é, a indenização deve ser de tal porte que desestimule novos abusos.

Na integralidade almejada deve-se levar em conta não somente todos os prejuízos materiais sofridos pelos consumidores, mas também os danos morais, que no mínimo devem ser iguais ao valor do capital segurado, devidamente atualizado desde os 30 dias após a comunicação do sinistro.

Justificável a adoção desse patamar mínimo, pois muitos já tiveram seu direito ao seguro negado pela sentença de mérito transitada em julgado.

O Código de Defesa do Consumidor não tem regra específica para a fixação dos danos morais, mas o seu quantum deve ser estipulado segundo os princípios informadores da liquidação do dano moral em geral.(42)

Lembremos da equidade, indicada no art.953 do CC nos casos de ofensa contra a honra.(43)

Também como parâmetro leve-se em conta que a fixação do valor dano moral deve ser educativo, para que a ré não se sinta estimulada à novas práticas indevidas e aja de modo condizente com a sua posição de fornecedora responsável e parceira do consumidor.

Essa é a razão de chegarmos ao valor mínimo da indenização pelos danos morais, considerando que o valor deve ser suficiente para que apague em definitivo os dissabores sofridos pelos consumidores, o que minimamente corresponde ao valor da prestação a que teriam direito.

III – Da Liminar:

Os requisitos da liminar referida no artigo 12 da Lei 7.347/85 encontram-se presentes.

Como já dissemos os serviços securitários submetem-se à disciplina do Código de Defesa do Consumidor (art.3, § 2º).

Assim, não podemos deixar de invocar, para que seja reconhecido o fumus boni juris o fato de que a vulnerabilidade do consumidor (CDC, art. 4º, I), incentiva o Ministério Público a pedir, desde o limiar do debate, que o Poder Judiciário reconheça a desproporção de forças entre o consumidor e a seguradora ré.

Também em reforço da plausibilidade do direito lembramos que o consumidor é titular do direito básico de ter facilitada sua defesa (CDC, art. 6º, VIII) e que o sistema jurídico de consumo prevê como abusiva qualquer cláusula ou pacto que inverta o ônus da prova em favor do fornecedor (CDC art. 51, VI).

Se houvesse cláusula impondo ao consumidor a comprovação de sua inocência sobre o suposto crime de fraude para recebimento de seguro, essa cláusula seria nula de pleno direito.

Então, não devemos esperar até o final do processo nos casos em que essa presunção de inocência esteja mais do que confirmada.

Imagine-se caso em que a ré, tenha negado a indenização ao sinistro por suspeita de fraude e que não tenha representado à autoridade policial, ou não tenha sido instaurado o procedimento investigatório contra segurado.

Aprofundando a iniqüidade praticada pela ré, imagine-se a hipótese em que o segurado tenha o inquérito policial instaurado contra si arquivado; ou pior que o réu não tenha sido condenado em ação penal e a decisão já tenha transitado em julgado.

Obviamente que nessas hipóteses a seguradora ré não poderá sustentar a recusa da indenização. Logo não há qualquer razão para que se aguarde o resultado final dessa ação coletiva.

Enfim, mesmo para seguradoras sérias nas suas atitudes, o ônus não pode ser invertido de tal modo a exigir do consumidor que prove a sua inocência quando a seguradora lhe imputa conduta fraudulenta.

Imagine o caso do segurado consumidor que desde a comunicação do sinistro deveria gozar do benefício da dúvida, isto é, na dúvida a seguradora deve pagar a indenização.

Mas, o Poder Judiciário não pode prestigiar a seguradora ré quando há provas contundentes de que seus prepostos e, lamentavelmente, com a participação de agentes públicos, criaram uma grande farsa apenas para afastar a obrigação prevista em contrato.

Não é possível que a obrigação de indenizar somente seja imposta ao final, exatamente naquelas hipóteses onde o poder público (em alguns casos o próprio Poder Judiciário) tenha concluído pela inexistência de indício ou prova da participação do consumidor no suposto crime inventado por obra da seguradora.

Enfim, se o inquérito nada resultou contra o consumidor e se a ação penal findou-se sem a respectiva condenação, porque a seguradora não cumpre com sua obrigação que ao menos é a de pagar o capital segurado no moldes contratados.

Se a dúvida já milita em favor do consumidor (CDC, arts. 6º, VIII e 51, VI) imagine-se a verossimilhança na alegação do consumidor de que tem direito à indenização contratada.

É descabida a imposição ao consumidor, agora que a fraude já foi descoberta, especialmente nos casos em que o inquérito esteja arquivado, inexista ou o consumidor não tenha sido condenado, de ter que provar que tem direito a indenização, ingressando com ação judicial para tanto.

A não concessão da liminar é contrário ao principio da razoabilidade e afronta o CDC, pois estaria sendo invertido o ônus da prova, mas em proveito do fornecedor o que não é compatível com o próprio sistema.

Por fim, além do fumus boni juris considere-se que não obrigar a seguradora ao pagamento imediato do capital nessas hipóteses colocaria ainda mais em risco o direito dos consumidores.

Com efeito, a eventual ocorrência e o reconhecimento da prescrição ainda que equivocada, somente aumentaria as despesas do consumidor e elevaria desnecessariamente o custo social de milhares de ações.

Outro fato que deve ser considerado para demonstrar o cabimento da liminar é reconhecimento do periculum in mora, isto diz respeito ao tempo necessário para o desenvolvimento da presente ação e a ampliação dos riscos ao consumidor.

Voltamos a realçar que se não há comprovação da fraude, o que se presume pelo arquivamento do inquérito ou sentença que não seja condenatória, obviamente não haverá risco de irreversibilidade na afetação do patrimônio da ré, uma vez que cessou a suposta justa causa para a recusa à indenização.

Apenas para que se apure o poder econômico da ré, verifique-se as demonstrações financeiras da seguradora publicado pelo SES – Sistema de Estatísticas da SUSEP, relativamente aos meses de novembro e dezembro de 2004 e janeiro de 2005 e não é difícil imaginar que a ré é considerada como a terceira maior seguradora do país.

Em outras palavras a concessão da liminar nada mais será do que obrigá-la de imediato ao cumprimento da lei, sem que isso afete a continuidade de seus negócios.

Outro aspecto pretendido com a concessão da liminar é a obrigação de fazer, isto é, para evitar que outros consumidores fiquem nas mãos da seguradora e não adotem as providências necessárias, necessário que a ré seja obrigada a informar os consumidores e lhe dê acesso ao prontuário que tenha concluído pela recusa por suposição de fraude ou o motivo que seja.

O direito à informação e o acesso aos documentos que, eventualmente, possam dar base à negativa de indenização aos segurados, é o fumus boni juris necessário na concessão da medida liminar.

A conduta da seguradora não pode ser reprimida apenas no campo penal, pois é rotina que as seguradoras neguem aos segurados a indenização com base em simples suspeitas de fraude para o recebimento do seguro, mas deixam de informar de modo transparente e preciso o motivo para tanto.

O longo tempo, que a seguradora ré pode adotar para resolver os casos que reputa como suspeito de fraude, em muitos casos, poderá implicar em irreversibilidade na proteção aos interesses dos consumidores.

Não podemos deixar de lembrar que o lapso de tempo da prescrição é pequeno e isso poderá dificultar ainda mais vida de inúmeros consumidores.(44)

É verdade, que o prazo somente começaria a contar a partir do momento em que haja comunicação da recusa, mas os dissabores a que submete os segurados é razão justa para o Poder Judiciário intervir em favor da plena informação dos consumidores.

O periculum in mora está justificado.

Isso porque, obrigar a seguradora a ser transparente no motivo da recusa é dar garantia ao consumidor para a defesa de seus interesses; é não permitir que a seguradora ou alguém por ela sugira ou constranja o consumidor a desistir ou renunciar ao seguro; é impedir que a seguradora ré use de artifícios inescrupulosos.

Vale lembrar que se a ré não for obrigada por esse Juízo não o fará de modo espontâneo, pois a ré, mesmo após todas as denúncias que foram imputadas aos seus prepostos, não se propôs incontinenti a abrir um canal de comunicação massivo e célere para que os consumidores tenham seus interesses protegidos.

Basta imaginar que uma organização, com responsabilidade e ciente do sentido real da função social da empresa, de modo imediato proporia aos segurados que tivessem com a absolvição reconhecida por sentença penal transitada em julgado o comparecimento em seus quadros.(45)

Esse não é o caso da ré, que senão for impedida continuará sem informar com presteza e robustez o motivo da recusa, tornando o consumidor ainda mais vulnerável facilitando que o consumidor, por medo e constrangimento renuncie ou desista de seus interesses.

IV – Do Pedido:

Ante ao exposto, fundado no artigo 12 da Lei 7.347/85, requer-se seja concedida a liminar inaudita altera pars a fim de que:

1. A ré seja obrigada a dar ao consumidor o valor equivalente ao capital segurado, devidamente corrigido, em todos os casos em que a suposta fraude tenha sido o motivo para a recusa e não tenha resultado em inquérito policial; o referido caderno investigatório tenha sido arquivado; ou a eventual ação penal não tenha resultado em condenação, sob pena de multa;

2. A ré seja obrigada a comunicar ao consumidor, por escrito e no prazo de 30 dias, o motivo da recusa à indenização do capital segurado, franqueando-lhe o acesso aos documentos que sustentam a negativa, tudo sob pena de multa.

3. seja determinada a publicação do edital a que alude o art. 94 do Código de Defesa do Consumidor, a fim de que os interessados possam intervir no feito como litisconsortes;

4. seja determinada a citação da empresa ré, na pessoa de seu representante legal, pelo correio, a fim de que, advertida da sujeição aos efeitos da revelia, a teor do artigo 285, última parte, do Código de Processo Civil, apresente, querendo, resposta ao pedido ora deduzido, no prazo de 15 (quinze) dias;

5. no mérito, seja a presente ação julgada procedente, tornando-se definitiva a medida liminar e proferindo-se sentença em desfavor da ré, a fim de que:

5.1. seja a ré condenada na obrigação de dar, consistente em indenizar o consumidor no valor equivalente ao capital segurado, devidamente corrigido, em todos os casos em que a suposta fraude tenha sido o motivo para a recusa e não tenha resultado em inquérito policial; o referido caderno investigatório tenha sido arquivado; ou a eventual ação penal não tenha resultado em condenação, sob pena do pagamento de multa;

5.2. seja a ré condenada à obrigação de fazer, consistente em no o prazo de 30 dias, contados da comunicação do sinistro, providenciar, de modo imediato, o pagamento do capital segurado ou, no mesmo prazo, providenciar a notificação por escrito do consumidor, explicitando as razões de sua negativa; franqueando-lhe acesso aos documentos que deram motivo à recusa da indenização e, em caso de suspeita de fraude, a comprovação da comunicação à autoridade pública competente (sem prejuízo de responder por eventual crime de denunciação caluniosa), sob pena do pagamento de multa;

5.3. seja a seguradora ré condenada na obrigação de não fazer consistente em abster-se de induzir, obrigar, sugerir, constranger ou qualquer outra ação que implique em renúncia ou desistência por parte do consumidor ao valor do capital segurado;

5.4. seja condenada, genericamente, para posterior liquidação de sentença (CDC, art. 95), a:

5.4.1. indenizar integralmente pelos danos materiais causados a todos os consumidores segurados, que tiveram o pagamento da indenização do seguro recusado por motivo de “suspeita de fraude”, sem que tenha havido a instauração de inquérito policial; ou este tenha sido arquivado; ou, ainda, a ação penal instaurada não tenha resultado em condenação;

5.4.2. ressarcir os danos morais causados a todos os consumidores segurados, que tiveram o pagamento da indenização do seguro recusado por motivo de “fraude”, sem que tenha havido a instauração de inquérito policial, ou este tenha sido arquivado, ou, ainda, a ação penal instaurada não tenha resultado em condenação, fixando-se valor indenizatório em quantia não inferior ao da indenização a que o consumidor teria direito, atualizada até a data do efetivo pagamento, acrescida de juros de mora e outros consectários;

5.5. seja compelida a ré a publicar, após o trânsito em julgado, a r. sentença condenatória, para o conhecimento geral, em jornais de grande circulação, como o “Estado de São Paulo” e a “Folha de São Paulo”;

Requer também:

6. que para assegurar o cumprimento das obrigações descritas, seja fixada a pena de multa no valor equivalente ao dobro do capital segurado, cujo valor deverá ser atualizado por ocasião do pagamento e recolhido ao Fundo de Reparação de Interesses Difusos Lesados, previsto no art. 13 da Lei nº 7.347/85 e regulamentado pela Lei Estadual nº 6.536/89, sem prejuízo da execução específica da mesma obrigação e crime de desobediência.

7. a condenação da ré ao pagamento das custas processuais;

8. a dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros encargos, desde logo, a teor do artigo 18 da Lei nº 7.347/85 e do artigo 87 da Lei nº 8.078/90;

9. sejam as intimações do autor feitas pessoalmente, mediante entrega dos autos, com vista, na Promotoria de Justiça do Consumidor, situada na Rua Riachuelo nº 115, 1º andar, São Paulo/SP, em face do disposto no artigo 236, § 2º, do Código de Processo Civil, e no artigo 224, inciso XI, da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo).

Protesta provar o alegado por todos os meios de prova admitidos em direito, especialmente pela produção de prova testemunhal e pericial e, caso necessário, pela juntada de documentos e por tudo o mais que se fizer necessário e indispensável à cabal demonstração dos fatos articulados na presente inicial, bem ainda pelo benefício previsto no art. 6º, inc. VIII, do Código de Defesa do Consumidor, no que tange à inversão do ônus da prova, em favor da coletividade de consumidores substituída pelo autor.

Acompanham a inicial os documentos que compõe o procedimento administrativo no. 43.161.268/05-1 com 189 folhas rubricadas.

Atribui-se à causa, para fins de alçada, o valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais).

Nestes termos, pede deferimento.

São Paulo, 07 de abril de 2005.

Deborah Pierri

2º Promotora de Justiça do Consumidor

Gilberto Nonaka

Promotor de Justiça do Consumidor Designado

Nathan Glina

Estagiário do Ministério Público

Notas de rodapé

1- JOEL REBELATO DE MELLO (gerente do Departamento Jurídico da Porto Seguro), LUIZ PAULO HORTA SIQUEIRA (diretor do Departamento Jurídico da Porto Seguro); NELSON PEIXOTO, (diretor do Departamento de Sinistros da Porto Seguro); CARLOS ALBERTO MANFREDINI (advogado contratado para prestar serviços à Porto Seguro) foram denunciados em concurso com policiais civis (fls. 02/24).

2- Confira-se fls. 30 “Somente soube que a Seguradora estava lhe imputando crime de estelionato quando chegou uma precatória para ser ouvido na cidade em que reside”. Também fls. 39: Nesse telefonema foi ameaçado: ‘Se não assinasse uma carta abrindo mãos de meus direitos, eu seria processado criminalmente’. ….Disse também que: ‘ se você não assinar a carta você vai ficar sabendo o porquê está sendo processado no processo”.

3- O próprio cartorário no documento aduz que não há qualquer prova ou autenticação da veracidade do conteúdo. Vejamos o exemplo da escritura de Contrato de Compra e Venda de Veículo tipo GM/Ômega CD, celebrado entre duas pessoas físicas de nacionalidade paraguaia, registrado no Colégio de Escribanos del Paraguay, de forma simples e com a ressalva de que: “o presente contrato não autentica a veracidade dos termos do presente contrato (…)” (fls. 102/109)

4- O esquema e funcionamento da fraude foi bem demonstrada não somente na denúncia, mas também na publicação feita no jornal “Folha de São Paulo”, Caderno Cotidiano , COMO FUNCIONAVA A SUPOSTA FRAUDE, 29/03/05, p.C1 (fls. 113)

5- A contratação de empresas especializadas para análise e investigação sobre a regularidade de sinistros não é vedada pelas regras estabelecidas pela SUSEP. Atualmente, é a Circular no. 269 de 30/09/04 que dispõe sobre a estruturação mínima das condições contratuais e das notas atuariais dos contratos de seguros de automóvel. (fls. 83ss)

6- Na denúncia há fatos que são imputados a agentes públicos dentre eles três delegados de polícia.

7- Os dados revelam que muitos segurados foram lesados pela conduta da ré e de seus prepostos, havendo indicativos de que pelos menos 600 (seiscentos) segurados tiveram inquéritos policiais instaurados nessas circunstâncias.

8- Professor do Curso de Especialização em Seguros da FIA?FEA-USP Opinião – jornal O Estado de São Paulo, dia 05/04/2005.

9- O art. 1432 do Código Civil de 1916 considerava contrato de seguro “aquele pelo qual uma das partes se obriga para com a outra, mediante a paga de um prêmio, a indenizá-la do prejuízo resultante de riscos futuros, previstos no contrato” Logo, também havia a proteção de um interesse e as demais características do contrato de seguro: presença do segurador e do segurado, previsão de um risco, pagamento de um prêmio e, na hipótese de ocorrer o sinistro, pagamento de indenização.

10- Maria Helena Diniz, Tratado Teórico e Prático dos Contratos, 2002, Saraiva, p. 437.

11- Idem, p. 439.

12- “São os contratos agora denominados de consumo, sejam eles de compra e venda, de locação, de depósito, de abertura de conta corrente, de prestação de serviços profissionais, de empréstimo, de financiamento ou de alienação fiduciária, de transporte, de seguro, de seguro saúde, só para citar os mais comuns”, Cláudia Lima Marques, Contratos no CDC, 4ª ed., RT, p. 163.

13- Na linguagem especializada e de fácil compreensão: “Seguro é um produto de entrega futura e aleatória, portanto a boa-fé de ser um dos princípios fundamentais deste instituto, porque sem ela não há como o contrato se manter por um longo período, no qual o sinistro pode ou não acontecer”. Opinião, O Estado de São Paulo, 05/04/05, Antonio Penteado Mendonça.

14- Embora a ré em notas de esclarecimentos pretenda convencer o contrário: “A Companhia não tem interesse em negar indenizações, pois seu trabalho se sustenta na credibilidade que nela depositam corretores e segurados. Somente no ano de 2004, foram indenizados 99,75% dos 249.495 sinistros reclamados na empresa, o que representou R$ 838.781.866,71. Apenas 0,25% do número total deixou de ser pago em função de irregularidades comprovadas. Por mês, a companhia paga, em média, R$ 80 milhões em indenizações a segurados de automóveis.Os números atestam que os custos para apurar fraudes são significativamente superiores para a empresa, se comparados com os valores eventualmente não indenizados. A necessidade de coibir fraudes é parte do trabalho das seguradoras e deve ser objeto da cooperação de todos, cidadãos e empresas, para que os honestos não paguem pelos desonestos.” – In : Portoseguro.com.br, acesso em 29/03/05.

15- A empresa ré, segundo dados fornecidos em seu sítio na Internet, atua a mais de 50 anos no mercado de seguros, informando dados econômicos financeiros que impressionam não somente os investidores como também os consumidores que contam com a solidez das companhias as quais se manterão vinculados por longos anos. (Idem, Números da nossa empresa).

16- CF, art. 170, V. Confira-se o estudo feito por Maria Cristina Mattioli em torno da responsabilidade social da empresa. Para ela a questão não envolve exclusivamente a proteção aos acionistas, mas está intimamente ligado às obrigações, que a empresa tem para com a sociedade na qual ela atua. No texto faz referência ao relatório elaborado pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) – Social Responsability. 2001 – no qual fica bem explícito as várias obrigações: obrigações com o desenvolvimento, sócio-política, respeito aos direitos humanos, ética na administração e negócios, proteção ao consumidor e normas de governança corporativa. Sobre essa última, diz a autora: ‘Mais recentemente introduzidas em instrumentos da Organização de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico, cuja definição pode ser extraída de seus princípios: relações entre a direção da companhia, seu conselho de administração, seus acionistas e seus participantes. No geral, estas relações dizem respeito ao lucro. Todavia, ao referir-se a participantes, referido instrumento introduz tópicos de responsabilidade social na medida em que esta expressão significa o grupo de pessoas interessadas na atuação da empresa, que não sejam investidores, mas, empregados, contratantes, sindicatos, consumidores, grupos de consumidores e o público em geral”. (Cf. Responsabilidade Social da Empresa, w.mundojuridico.adv.br/html/artigos/documentos/texto270.) acesso em 29/3/05.

17- Contratos no CDC, RT. 4ª ed., p. 82/83.

18- Vejamos sua proposta: “Por outro lado, o modelo relacional tem também um caráter normativo e prescritivo. Assim é que ele recomenda uma revalorização e ampliação do uso do princípio da boa-fé, justiça e equilíbrio contratual como princípios capazes de orientar os agentes contratuais e operadores do direito na direção do reconhecimento das circunstâncias fáticas concretas. A boa-fé serve como princípio mediador entre o formalismo do direito e o reconhecimento da plasticidade das relações e funções econômicas de troca e pressupostos de racionalidade e premissas valorativas. Por outro lado, o reconhecimento da natureza relacional dos contratos aponta para a importância dos princípios de cooperação e solidariedade”. In – Contratos relacionais e defesa do consumidor, Max Limonad, 1998, p. 365.(destaque nosso).

19- Assim dispõe o art. 765 do Código Civil : “O segurado e o segurados são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes”.

20- Novo Código Civil Comentado, org. Ricardo Fiúza, Saraiva, 2ª ed., p. 702.

21- Tratado teórico e prático dos contratos, v. 4, 2002, Saraiva, p. 441. Sílvio Rodrigues também elenca como condição do contrato de seguro a boa-fé das partes, in Direito Civil dos Contratos, 1997, Saraiva, p.351. Confira-se também o discurso de Claudia Lima Marques:“Deve presumir a boa-fé subjetiva dos consumidores e se impor deveres de boa-fé objetiva (informação cooperação e cuidado) para os fornecedores, especialmente tendo em conta o modo coletivo de contratação e por adesão. O valor pago pelo seguro deve ser aquele especificado na oferta, o qual despertou a confiança do consumidor e sobre o qual pagou suas contribuições” (grifos não originais).

22- 2º TACivSP, Ap c/ rev. n. 610.516-00/0, 10ª Câmara, rel. Juiz Gomes Varjão.

23- TAMG, Ap. Cível n. 294.318-4, 6ª Câmara Cível, rel Juiz Belizário de Lacerda, v.u 17.02.2000.

24- CC, Art. 766 Se o segurado, por si ou por seu representante, fizer declarações inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa do prêmio, perderá o direito à garantia, além de ficar obrigado ao prêmio vencido. Parágrafo único. Se a inexatidão ou omissão nas declarações não resultar de má-fé do segurado, o segurador terá direito a resolver o contrato, ou a cobrar, mesmo após o sinistro, a diferença do prêmio. Sobre isso, confira-se o seguinte julgado: “SEGURO. VEÍCULO. DANOS MATERIAIS. Negativa da seguradora no pagamento da cobertura sob a alegação que o motorista do veículo sinistrado não estava citado como condutor habitual quando do preenchimento do Formulário Perfil do Condutor pelo segurado. Má-fé incomprovada. Sentença de procedência da ação mantida”. (TJRS, Ap.C n. 70002651735, 5ª Câmara Cível, Rel. Des. Sérgio Pilla da Silva, 13.06.01).

25- No texto a autora faz referência ao relatório elaborado pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) – Social Responsability. 2001 – , esclarecendo que o pensamento sintético dos representantes mundiais de vários segmentos econômicos, agrupam as obrigações das empresas em: obrigações com o desenvolvimento, sócio-política, respeito aos direitoshumanos, ética na administração e negócios, proteção ao consumidor e normas de governança corporativa. Cf. Maria Cristina Mattiolli. Responsabilidade Social da Empresa, In – w.mundojuridico.adv.br/html/artigos/documentos/texto270, (acesso em 29/3/05).

26- Sobre isso, confiram-se os comentários aos arts. 421 e 422 do CC., feitos por Carlos Santos Oliveira: “Nessa parte o Código Civil brasileiro sofreu uma grande e significativa alteração, talvez a mais significativa de todas, ao inserir em seu texto os princípios da função sócia e de probidade e boa-fé. A inserção desses princípios, que em realidade de traduzem em cláusulas gerais, teve o condão de promover a alteração da teoria contratual, dando ensejo a uma nova teoria dos contratos, permeada pela exigência de uma conduta proba, reta, honesta das partes contratantes e também pela exigência da observância de uma função social, como razão e limite ao exercício da liberdade contratual. De se destacar que no direito anterior não existia qualquer menção aos princípios da função social do contrato, de probidade e boa-fé objetiva, o que efetivamente caracteriza a inovação do novo estatuto privado de direito. A boa-fé mencionada no Código Civil anterior, quando mesmo tratava da posse e do usucapião, por exemplo, era a subjetiva, enquanto que a boa-fé objetiva apenas vinha mencionada no art. 1443, do antigo diploma civil, ao dispor a respeito das disposições gerais atinentes aos contratos de seguro. Portanto, pela primeira vez o princípio da boa-fé objetiva vem insculpido como cláusula geral, permeando todas as relações contratuais na órbita civil” (O novo Código Civil comentado, Freitas Bastos, vol. 1, p.319).

27- Veja as declarações de MCHS, vítima de roubo de seu veículo ômega e que até outubro de 2004, data em que prestou as declarações não havia recebido o valor da indenização. (fls.30)

28- Confiram-se as declarações de ISE, que teve furtado seu veículo Monza, ano 1993 e foi constrangida pelo preposto da ré de nome Sergio Antonio Lopes, um dos denunciados à Justiça criminal. (fls. 35)

29- Aliás, na mesma trilha do legislador português, consoante se vê no esclarecimento prestado no acórdão do Tribunal de Lisboa:

“O abuso de direito está previsto no art. 334 do Cód. Civil e consiste no exercício de um direito existente, de forma em que o titular do mesmo exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito. Agir de boa fé e de acordo com os bons costumes é actuar com diligência, zelo e lealdade face aos interesses da contraparte, é ter uma conduta honesta e conscienciosa, numa linha de correcção e probidade, visando não prejudicar os legítimos interesses da outra parte, é proceder de modo a não procurar nem alcançar resultados opostos aos que uma consciência razoável poderia tolerar. Por outro lado, exceder o fim social ou económico do direito é utilizá-lo para satisfação de interesses estranhos aos que a lei visou proteger com o referido direito”. Agravo no. 3117/01 Rel. João Moreira Camilo, j. 29-03-2001, http://www.trl.pt/jurisp/3117-01cam.html.

30- Confiram-se as declarações de Paulo Roberto de Barros Monteiro (fls. @@@ dos autos)

31- Regina Beatriz Tavares da Silva Novo Código Civil Comentado. 2ª ed. Coord. Ricardo Fiuza, 2004, Saraiva, pg. 836.

32- CC, art. 932. São também responsáveis pela reparação civil. III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.

33- CDC, art. 34. O fornecedor do produto ou serviço é solidariamente responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos.

34- Leonardo Roscoe Bessa, Responsabilidade objetiva e o CDC.(w.ufsm.br/direito/artigos/consumidor/responsabilidade) acesso em 31/03/05.

35- É seguro?, reportagem publicada Istoé Dinheiro, (w.terra.com.br/istoedinheiro/394/seudinheiro/seguro), acesso em 7/04/05.

36- Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil, (revisão Carlos Alberto Dabus Maluf e outros), 34ª ed. São Paulo, Saraiva, 2003, V. 5.

37- CC – Art. 402 Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.

38- Curioso como o tema já foi apreciado em repetidas ações. Nesse sentido: Ementa: “Apelação Cível. Seguro de veículo. Pedido de cobertura por alegação de furto. Negativa de cobertura por haver fraude. Impossível ter ocorrido o sinistro se três dias antes da data do furto do veículo afirmada pelo segurado o bem foi vendido no Paraguai, consoante escritura de compra e venda apresentada pela seguradora. Inexistindo o sinistro, descabe a indenização contratada. Apelo desprovido”. (Ap. C. nº 70006519037, 6ª. CC, TJRS, j. 02/03/2005).

39- Dano Moral . 2ª ed., 2ª tir., RT, 1998, p. 530. Nesse trecho do livro o autor cita a obra de Bittar com a indicação Reparação civil por danos morais, RT, 1992, p. 5 e de Lenari – La resarciboilidad de daño extrapatrimonial o moral como tutela de la persona y los bienes y derechos de la personalidad., p.26

40- Ap.C. 35028-1-MG, rel. Juiz Saldanha da Fonseca, 4ª.CC, j. 08/05/02.

41- Ap.C. 70005259049, 5ª.CCTJ/RS, j. 18/12/2003.

42- Cf. “Para a fixação de verba indenizatória decorrente de dano moral (constrangimento sofrido por freguês de estabelecimento comercial, revistado por suspeita de furto), deve-se aplicar o sistema de liquidação das obrigações resultantes de atos ilícitos, incidindo a regra do art. 1547 do CC e seu par. único, c/c art. 49 do CP” (RT 743/341).

43- CC art. 953. A indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido. Parágrafo único. Se o ofendido não puder provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, eqüitativamente, o valor da indenização, na conformidade das circunstâncias do caso.

44- Ementa do RESP nº 237.836 julgado pelo STJ em 22/10/2002: “Seguro. Furto de veículo. Recusa da seguradora em solver a indenização. Prescrição. Aplicação do Código Civil e não do “CDC”. Prescrição ânua, todavia, inocorrente, uma vez não efetuada a comunicação da recusa ao segurado. -Na hipótese de recusa da companhia seguradora ao pagamento da indenização, o prazo prescricional da ação que a reclama é de um ano, nos termos do art. 178, § 6º, II, do Código Civil. Precedente da 2ª Seção. – Permanece suspenso o prazo prescricional entre o aviso de sinistro (ou a entrega da documentação) e a comunicação da seguradora ao segurado acerca da recusa ao pagamento da indenização. Prescrição ânua inocorrente, à falta da comunicação a cargo da empresa de seguros. Recurso Especial conhecido, mas não provido.” (Grifos nossos)

45- A seguradora diante da acusação de vários de seus prepostos não se propôs a chamar os segurados para revisão de sua negativa de indenização, mas ao contrário prefere publicar manifestações de sua perplexidade com a “injusta” acusação ou pontuar números percentuais de indenizações anuais.

Ação contra Marítima

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da __ Vara Cível do Foro Central da comarca de São Paulo.

Ministério Público do Estado de São Paulo, por meio da Promotoria de Justiça do Consumidor da capital, vem perante Vossa Excelência, com supedâneo no art. 129, incisos II e III da Constituição Federal; nos arts. 81, 82, inc. I e 90, todos do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) e arts. 1º, 5º e 12 da Lei 7.347/85, propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com pedido liminar, em face da empresa, MARÍTIMA SEGUROS S.A., CNPJ n° 61.383.493/0001-80, com sede na Rua Cel. Xavier de Toledo n° 114, 10° andar, nesta capital, CEP 01048-100, pelas razões de fato e de direito que seguem:

I — Dos Fatos.

Segundo apuração levada a efeito no incluso procedimento administrativo, a ré, juntamente com outras empresas de seguros, visando o não pagamento da indenização aos segurados, passaram a alegar contra eles a prática de crime de estelionato na modalidade de “fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro” (Código Penal, art. 171, § 2°, inc. V).

E com base em supostas “apurações” levadas a efeito pela própria seguradora ou por “empresas de investigações privadas” contratadas, logravam conseguir certidões da Polícia Militar de Cáceres, Estado de Mato Grosso (como a encartada a fls. 19) ou “contrato privado” celebrado no Paraguai, em Ciudad Del Este (fls. 166), vindo a alegar ocorrência de fraude e recusar o pagamento da devida indenização.

Há sérios indícios de que a aludida “certidão” da Polícia Militar de Cáceres seja falsa, pois como é sabido, não existe um efetivo controle dos veículos que passam pela fronteira entre o Brasil e a Bolívia.

Ademais, o Policial Militar de Mato Grosso do Sul, Sd. PM. Wando Ferreira Brasil, que elaborava certidões semelhantes acabou sendo processado criminalmente pela prática dos crimes militares de falsidade ideológica e chantagem, perpetrados contra 15 (quinze) vítimas, sendo uma delas o Deputado Estadual, Flávio Esgaib Kayatt (a cópia da denúncia foi juntada a fls. 193/199).

De outro lado, o “contrato privado” celebrado em cartório no Paraguai, na Ciudad Del Este (fls. 166), não possui qualquer valor probatório, tanto que o escrivão expressamente afirma que “el presente contrato no auténtica la veracidad de los términos del presente contrato certificando así las firmas” (o presente contrato não autentica a veracidade dos termos do presente contrato, certificando assim as firmas) (fls. 166 verso e 169).

Conforme apuração feita pelo Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial do Ministério Público de São Paulo (GECEP), com o auxílio da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), para a elaboração de tais documentos, os contratantes não precisavam exibir o bem ou demonstrar a sua existência. Portanto, o veículo, objeto do contrato, em tese poderia estar em qualquer lugar do país, que não o Paraguai (fls. 99).

Assim, na posse de tais documentos falsos, um representante da empresa ré procurava pelo consumidor segurado e passava a intimidá-lo, alegando a prática de crime de fraude contra seguro, e dizendo que se não desistisse da indenização, acabaria sendo preso e processado criminalmente.

Nos casos em que o consumidor não desistia do recebimento da indenização, a empresa ré, procurando sempre o mesmo Distrito Policial, ante o envolvimento de policiais civis (fls. 84/106), apresentava o documento falso, requerendo a instauração do inquérito policial.

Há prova de que a ré induzia o consumidor a pensar que a conclusão do inquérito policial, se favorável a este, resultaria no pagamento da indenização do seguro, sem a necessidade de ajuizamento de qualquer demanda individual.

Mas a real intenção da demandada, com a recusa de tal pagamento pela suposta fraude, era fazer com que ultrapassasse o prazo de 01 (um) ano e se atingisse a prescrição, nos termos do inc. II do art. 206 do Código Civil.

E a prática desenvolvida pela demandada é tão nociva que, mesmo não havendo a instauração do inquérito policial, ou este sendo arquivado, ou, ainda, a ação penal resultando em absolvição do consumidor, a indenização jamais será paga.

Neste aspecto, é importante ressaltar que no mercado de consumo o vulnerável é o consumidor. E assim sendo, mesmo que houvesse dúvida sobre a ocorrência da fraude, o valor do seguro deveria ser pago.

Analisando o incluso procedimento administrativo, constatam-se os seguintes abusos praticados, em que a ré negou o pagamento da indenização a que teriam direito os consumidores, além de constrangê-los a desistirem de tal pagamento:

1. A representação inicial, formulada pelo consumidor, Almir Basso e que deu início ao aludido procedimento relata que este, na data de 26 de março de 1996, por volta de 12:30 horas, teve seu veículo, marca Chevrolet, modelo camioneta S-10, ano 1995, cor vermelha, placas BRH 0080-SP, furtado na travessa da avenida 13 de maio, na Vila Galvão, na cidade de Guarulhos.

Ocorre que, ao pleitear junto à empresa ré a indenização do seguro a que teria direito, esta passou a recusar o pagamento, alegando que o veículo do segurado havia passado por uma barreira Policial Militar de Mato Grosso, sentido Brasil — Bolívia, na data de 15 de abril de 1996, sem retornar até 26 de abril de 1996 (certidão da Polícia Militar de Mato Grosso de fls. 19).

A falta de idoneidade do documento levou ao arquivamento da investigação e, mesmo tendo sido arquivado o inquérito policial instaurado junto ao 3º Distrito Policial da capital para apurar a suposta fraude (fls. 27/29 e 30), a seguradora continuou se recusando a pagar a indenização.

2. O consumidor, Cláudio Cafarchio, foi vítima de extorsão mediante seqüestro, tendo sido levado, pelos meliantes, o seu veículo marca Chevrolet, modelo Blazer, placas CIO 3353, isto na data de 05 de dezembro de 2001.

A empresa ré negou o pagamento da indenização, alegando que o veículo do consumidor fora visto em outro país.

Na sede do 3º Distrito Policial da capital foi indiciado, porque “o advogado da seguradora era o Dr. Manfredini” (fls. 110). O referido advogado, envolvido no esquema da simulação de fraude, foi denunciado pela prática de crimes como o de formação de quadrilha (fls. 84/106).

3. O consumidor, Antônio Gomes de Souza, na data de 20 de março de 2002, por volta de 20:15 horas, na avenida Prestes Maia, na cidade de Osasco, teve seu veículo marca Volkswagen, modelo Gol, ano 1999, placas CXZ 4505 furtado.

Não houve o pagamento da indenização, porque a empresa ré alegou que o veículo não fora furtado, pois se encontrava no Paraguai.

O consumidor acabou sendo indiciado em inquérito policial instaurado no 3º Distrito Policial da capital (fls. 115/116).

4. O consumidor, Francisco Liandro Dantas, no dia 16 de abril de 2003, por volta de 16:30 horas, na Avenida Goiás, altura do nº 3000, na cidade de São Caetano do Sul, teve seu veículo, marca Chevrolet, modelo Blazer, ano 1997, placas COJ 3901 roubado.

A ré negou o pagamento da indenização, alegando que teria vendido seu veículo no Paraguai, sendo certo que o inquérito policial instaurado acabou sendo arquivado (fls. 138).

5. O consumidor, Mario Malandrin Andrijic Neto, em data não precisada do ano de 2002, por volta de 23:30 horas, teve seu veículo BMW 318, ano 1992, placas CPR 0001, roubado.

Não houve o pagamento da indenização a que teria direito, porque a ré alegou que o automóvel teria passado pela fronteira entre Brasil e Bolívia.

O inquérito policial instaurado para apurar a suposta fraude acabou sendo arquivado (fls. 143/144).

6. O consumidor, Edson Moreno, na data de 16 de agosto de 2000, por volta de 17 horas, nas proximidades da avenida Santa Catarina, bairro Aeroporto, teve seu veículo marca Mitsubishi, modelo Lancer, ano 1995 roubado.

A ré negou o pagamento da indenização, alegando que seu veículo havia sido vendido no Paraguai.

O referido consumidor acabou sendo absolvido no processo-crime instaurado, mas ainda não recebeu a indenização (fls. 145/146).

7. O consumidor, Robson Donizeti Atanázio, em data não precisada, por volta de 22 horas, na avenida Angélica, altura do nº 35, nesta capital, teve seu veículo Twingo, ano 1994, placas DWD 4004 furtado.

Não recebeu a indenização, porque a empresa ré alegou que seu automóvel havia sido encontrado no Paraguai na sexta-feira anterior ao furto, dizendo que “só pagaria o seguro quando o inquérito policial fosse encerrado”.

Acontece que o inquérito policial acabou sendo arquivado, mas, mesmo assim, a ré não pagou a indenização a que teria direito (fls. 147).

8. O consumidor, José Antonio Vieira Ferreira, na data de 29 de maio de 2001, por volta de 08 horas, num canteiro de obras da avenida dos Bandeirantes, nesta capital, teve sua retroescavadeira roubada.

A ré negou o pagamento da indenização, alegando que o roubo não havia ocorrido (fls. 156).

9. O consumidor, Antônio Gomes de Souza, em data não precisada, do mês de março de 2002, teve seu veículo marca Volkswagen, modelo Gol, ano 1999, placas CXZ 4505, na avenida Prestes Maia, na cidade de Osasco, roubado.

Não houve o pagamento da indenização, porque a empresa ré alegou que o veículo teria cruzado a fronte do Brasil com o Paraguai.

O inquérito policial foi instaurado junto ao 3º Distrito Policial da capital, sob a alegação de que “havia uma rede de criminosos agindo em todo o Brasil para fraudar seguradoras” (fls. 157/158).

10. Na apuração desenvolvida pelo GECEP (fls. 84/106), constatou-se que o esquema de fraude, levado a efeito pelas seguradoras, consistia na escolha de alguns dos consumidores (vítimas de sinistro), para recusar-lhes o pagamento da indenização, sob o pretexto de que o aludido sinistro não havia ocorrido de fato, mas era o meio para a prática de fraude no recebimento do seguro.

Muitos dos consumidores acabavam não entendendo, ao certo, a razão da recusa, somente descobrindo o motivo quando já estavam indiciados e alguns processados criminalmente pela prática do delito previsto no art. 171, § 2º, inc. VI do Código Penal.

Assim sendo, a ré, em total desrespeito aos consumidores, além de não fornecer informações precisas aos seus segurados, invocava em defesa judicial a ocorrência de fraude, procedendo juntada de documento que não possui qualquer credibilidade.

Nota-se, dessarte, que a empresa ré, contrariando toda a expectativa legítima de seus clientes, passou a desenvolver a prática abusiva mencionada, apenas para se furtar ao cumprimento de sua única obrigação, que é a de indenizar o eventual prejuízo sofrido por eles.

Em resumo, a demandada não apenas recusava ao segurado o direito à indenização, como também o constrangia com representação criminal pela prática de crime de estelionato na modalidade de fraude para recebimento de indenização e valor de seguro (Código Penal, art. 171, § 2º, inc. V).

Constrangido e ameaçado, o consumidor era pressionado pelo poder econômico da ré, apenas para que desistisse de receber a indenização a que tinha direito.

A não aceitação, pelo consumidor, implicava instauração de inquéritos policiais e, em alguns casos, no ajuizamento de ações criminais, obrigando-o a arcar com o ônus da contratação de advogados para sua defesa. Enquanto se defendia na área penal (com a demorada tramitação do inquérito policial ou da ação penal), era induzido a pensar que se nada fosse comprovado, o valor da indenização lhe seria pago normalmente.

Ocorre que, mesmo sendo inocente, acabava não recebendo a indenização, quer porque a demandada continuava a recusar o pagamento, ou quer porque a pretensão acabava sendo alcançada pela prescrição.

Desta forma, a empresa ré atuou e poderá continuar atuando de modo contrário aos valores e princípios constitucionais de proteção ao consumidor e às relações de consumo, porquanto não apenas deixou de cumprir com suas obrigações contratuais, como também impôs aos consumidores constrangimento iníquo e indevido, contrariando as boas práticas corporativas e o verdadeiro sentido da função social da empresa, olvidando-se dos princípios e finalidades que cercam o contrato de seguro.

II — Do Direito.

a) Da legitimidade ativa do Ministério Público.

A Constituição Federal, no art. 129, inc. III estabelece como funções institucionais do Ministério Público o de “promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”, nestes inseridos o direito do consumidor.

No mesmo sentido, o art. 103, inc. VIII, da Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo estatui que “são funções institucionais do Ministério Público… promover o inquérito civil e a ação civil pública, para proteção, a prevenção e a reparação dos danos causados ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, e a outros interesses difusos, coletivos, homogêneos e individuais indisponíveis”.

Também a Lei n. 7.347/85 atribui legitimidade ao Parquet para a propositura de ação civil pública com objetivo de prevenção ou reparação dos danos causados ao consumidor, em decorrência de violação de interesses ou direitos difusos ou coletivos.

Por fim, a Lei n. 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), em seus arts. 82, inc. I e 81, parágrafo único, incisos I e II legitima o Ministério Público para a defesa coletiva dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos dos consumidores.

A presente demanda visa preservar e reparar o direito de todos aqueles que mantenham ou que possam manter com a empresa ré contrato de seguro de veículos, impedindo e responsabilizando-a pelos danos causados como conseqüência de prática comercial abusiva.

Ela também almeja obter a condenação da ré a indenizar os prejuízos morais e materiais causados aos consumidores, em decorrência da prática comercial desenvolvida, que se mostra contrária aos ditames do Código Civil e da Lei 8.078/90.

É pacífico o entendimento no E. Superior Tribunal de Justiça de que o Ministério Público possui legitimidade para ingressar com ação civil pública envolvendo seguro, verbis:

“Ação civil pública. Ministério Público. Legitimidade. Leasing. Seguro. O Ministério Público tem legitimidade para promover ação civil pública para exame da validade de cláusula sobre seguro inserta em contrato de adesão para arrendamento mercantil (leasing). Precedentes. Recurso conhecido e provido”.(1)

“Recurso especial. Processual Civil e Civil. Ministério Público. Legitimidade. Ação Civil Pública. Contratos de Seguro-Saúde. Prêmio. Reajustamento de Valores. Ato administrativo. Desconformidade com as regras pertinentes.

(…)

O debate sobre a legitimidade do Ministério Público para ajuizar ação civil pública em favor dos consumidores do serviço de saúde prejudicados pela majoração ilegal dos prêmios de seguro-saúde situa-se no campo do Direito Privado.

É cabível ação civil pública para requerer a suspensão de cobrança a maior de prêmios de seguro-saúde. Em tal caso, o interesse a ser defendido não é de natureza individual, mas de todos os consumidores lesados que pactuaram com as empresas de seguro-saúde.

O Ministério Público Estadual tem legitimidade para propor a ação porquanto se refere à defesa de interesses coletivos ou individuais homogêneos, em que se configura interesse social relevante, relacionados com o acesso à saúde”.(2)

Destarte, objetivando a defesa de direitos e interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, o Ministério Público Estadual é parte legítima para o ajuizamento da presente ação civil pública.

b) O contrato de seguro e o Código de Defesa do Consumido.

O art. 757 do Código Civil(3) conceitua o seguro como contrato no qual uma das partes (segurador) se obriga para com a outra (segurado), mediante o pagamento de um prêmio, a garantir-lhe interesse legítimo relativo à pessoa ou a coisa e a indenizá-la de prejuízo decorrente de riscos futuros previsto no contrato.

Carlos Santos de Oliveira(4) conceitua contrato de seguro como sendo “o negócio jurídico onde ocorre uma operação pela qual uma das partes, o segurado, mediante o pagamento de um valor, denominado prêmio, tem a garantia para si ou para outrem, denominado beneficiário, do cumprimento de uma prestação, que vem na forma de indenização, pela outra parte — denominada seguradora, na hipótese da ocorrência de um determinado evento preestabelecido, risco, que poderá acontecer ou não.

Os elementos do contrato de seguro são: os sujeitos (segurador e segurado), a previsão de um risco e de um pagamento de prêmio e, na hipótese de ocorrer o sinistro, o pagamento de indenização.

E o prêmio ou mensalidade “é a quantia pecuniária que o segurado paga à seguradora para obter o direito a uma indenização se ocorrer o sinistro oriundo do risco garantido e previsto no contrato”.(5)

Assim sendo, o contrato de seguro se apresenta como um contrato bilateral, oneroso, de adesão, típico, de boa-fé.(6)

Com a conduta nociva desenvolvida, a empresa ré acaba não agindo como seguradora, pois embora receba o valor do prêmio, não cumpre com sua parte no contrato, que é o de suportar o risco, que consiste num acontecimento futuro e incerto, potencialmente prejudicial aos interesses do segurado.

A esse respeito, leciona Maria Helena Diniz: “a noção de seguro supõe a de risco, isto é, o fato de estar o sujeito exposto à eventualidade de um dano à sua pessoa, ou ao seu patrimônio, motivado pelo acaso”.(7)

Os contratos de seguro privados (terrestres) podem ser de coisas ou de pessoas e, quanto ao objeto que visam garantir, ser classificados em patrimoniais, reais ou pessoais.

Seguro real é aquele que visa proteger o interesse que alguém possa apresentar em relação à determinada coisa.

E é essa, a priori, a modalidade de contrato oferecido pela ré, já que se propõe garantir eventuais prejuízos ocasionados a veículos automotores.

Assim sendo, o vínculo entre segurado e seguradora se apresenta como típica relação de consumo (CDC, arts. 2º e 3º). Daí porque, plenamente aplicável às regras contidas no Código de Defesa do Consumidor.(8)

O contrato de seguro é um contrato contínuo, exigindo-se maior lealdade e confiança entre os parceiros.

Isso porque, diferentemente dos contratos que não são contínuos (v.g., compra e venda), caracterizados pela transação instantânea, completa, rápida e impessoal, os contratos contínuos, também chamados de relacionais, criam relações jurídicas complexas, na qual o consumidor mantém vínculo de dependência com o fornecedor (ad exemplum, seguros em geral, previdência privada, instituições financeiras e seguro-saúde).

Essa confiança e dependência não passaram despercebidas do legislador, pois de acordo com a política nacional das relações de consumo devemos reconhecer, desde logo, a vulnerabilidade do consumidor (CDC, art.4º, inc. I), tendo em vista sua hipossuficiência.

Aliás, em todos os contratos contínuos a dependência se protrai no tempo, sendo uma de suas principais características.

Observa-se na descrição dos fatos, o quanto a ré se aproveitou da vulnerabilidade dos consumidores, demonstrando extrema deslealdade para com eles.

Maria Cristina Mattioli(9), tratando da responsabilidade social da empresa, explica que a questão não envolve exclusivamente a proteção aos acionistas, mas está intimamente ligada às obrigações que a empresa têm para com a sociedade na qual ela atua. Ela faz referência ao relatório elaborado pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) — Social Responsability 2001 — em que fica bem explicitado que as obrigações das empresas se agrupam em: obrigações com o desenvolvimento, sócio-política, respeito aos direitos humanos, ética na administração e negócios, proteção ao consumidor e normas de governança corporativa. Sobre esta última obrigação afirma: “Mais recentemente introduzidas em instrumentos da Organização de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico, cuja definição pode ser extraída de seus princípios: relações entre a direção da companhia, seu conselho de administração, seus acionistas e seus participantes. No geral, estas relações dizem respeito ao lucro. Todavia, ao referir-se a participantes, referido instrumento introduz tópicos de responsabilidade social na medida em que esta expressão significa o grupo de pessoas interessadas na atuação da empresa, que não sejam investidores, mas, empregados, contratantes, sindicatos, consumidores, grupos de consumidores e o público em geral”.

Como já explicitado, a conduta nociva desenvolvida pela ré não é isolada no mercado de seguro, devendo ser imediatamente repelida. E a resposta deve ser dada a partir da nova realidade que afeta as corporações e a nova teoria contratual.

Mas essa nova teoria não serve para afastar os instrumentos tradicionais do direito; ao contrário, deve servir de base ao intérprete para dar respostas mais claras e eqüitativas aos conflitos atuais.

A esse respeito, explica Cláudia Lima Marques, calcando-se na experiência havida no direito comparado:

“Observe-se que o realismo norte-americano denominou de contratos relacionais (relational contracts), destacando os elementos sociológicos que condicionam o nascimento e a estabilidade dos contratos complexos de longa duração. A contribuição desses estudos, que remontam a 1974, foi grande, pois, observando-se as relações não contratuais, as projeções de troca dos empresários e a sua organização em networks, baseadas mais na confiança, solidariedade e cooperação do que em vínculos contratuais expressos, desenvolveu a noção de um contrato aberto, de uma relação contínua, duradoura ao mesmo tempo em que modificável pelos usos e costumes ali desenvolvidos e pelas atuais necessidades das partes. (…) Sendo assim, a mais importante contribuição destes estudos à nova teoria contratual brasileira é a criação de um modelo teórico contínuo que engloba as constantes renegociações e as novas promessas, bem destacando que a situação externa e interna de catividade e interdependência dos contratantes faz com que as revisões, novações ou renegociações contratuais naturalmente continuem ou perenizem a relação de consumo, não podendo estas, porém, autorizar abusos da posição contratual dominante e validar prejuízos sem causa ao contratante mais fraco ou superar deveres de cooperação, solidariedade e lealdade que integram a relação em toda a sua duração”.(10)

Se o contrato é relacional e a contratada tem como finalidade ajudar o segurado a suportar os riscos futuros envolvendo seu interesse patrimonial, por certo os princípios norteadores de tal contrato devem ser aplicados: boa-fé, equidade, solidariedade e cooperação.

Infelizmente não é assim que a ré se comporta, pois sendo empresa de grande porte, surpreendeu a sociedade reduzindo seu objeto social ao lucro desenfreado, aproveitando-se da vulnerabilidade de seus segurados.

Sua prática é abusiva e ilícita e deve ser reprimida, pois muito embora faça parte da cadeia de consumo na posição de fornecedora, não atende aos objetivos traçados pela política nacional das relações de consumo. Não atende às necessidades dos consumidores, desrespeita sua dignidade, não age com transparência, enfim, não atende suas expectativas legítimas (CDC, art. 4º).

c) A conduta da seguradora, o princípio da boa-fé e a função social.

A ré, pelo que ficou demonstrado na descrição fática, para se furtar ao cumprimento de sua obrigação contratual (indenização do capital segurado), prestou-se, lamentavelmente, a tratar os consumidores como criminosos, submetendo-os a uma série de iniqüidades.

Sua atitude abusiva e ilícita gerou inúmeras conseqüências de ordem patrimonial e extrapatrimonial.

No campo patrimonial, além de negar a indenização a inúmeros segurados, utilizando-se do mesmo modus operandi, fez com que o consumidor tivesse despesas para buscar o valor da indenização, o que nem sempre foi possível.

Com efeito, quantas ações foram consideradas prescritas, ou quantas não tiveram julgamento de improcedência, talvez acolhendo a defesa fantasiosa da ré?

Muitos dos consumidores foram forçados a desistir de pleitear aquilo que era devido, contrariando a ré a finalidade do próprio contrato de seguro, contrariando o princípio da boa-fé objetiva.

Aliás, o novo Código Civil é literal nesse aspecto, pois caracteriza o contrato de seguro como de boa-fé.(11)

Segundo Jones Figueiredo Alves(12), “desse modo, exige-se do segurado e do segurador um comportamento adequado a inspirar legítima e razoável confiança para a validade do contrato, agindo com boa-fé, lealdade e veracidade; e uma atuação permanente de probidade no especial interesse de preservar o contrato em sua firmeza obrigacional. (…) Em atenção ao comentado no art. 422, e por identidade substancial com aquela norma, impõe-se o aperfeiçoamento do presente dispositivo, a considerar a probidade e a boa-fé em todo o sistema contratual, nele incluídas as fases preparatória e pós-executória”.

No mesmo sentido, afirma Maria Helena Diniz(13): “(…) é um contrato de boa-fé (CC, arts. 765, 766 e parágrafo único), pois o contrato de seguro, por exigir uma conclusão rápida, requer que o segurado tenha uma conduta sincera e leal em suas declarações a respeito do seu conteúdo e dos riscos, sob pena de receber sanções se proceder com má-fé, em circunstâncias em que o segurador não pode fazer diligências recomendáveis à sua aferição (…) A boa-fé é exigida também do segurador (…) Todavia, a má-fé de ambos deverá ser comprovada”.

Também a jurisprudência, além de entender que o contrato de seguro é regido pelo Código de Defesa do Consumidor, exige a observância da boa-fé, verbis:

“O contrato de seguro privado é uma relação de consumo na qual se presume a boa-fé do segurado. Por essa razão, incumbe à seguradora o ônus da prova da alegada má-fé do segurado ao contratar o seguro. Eventual dúvida deve ser resolvida em favor do segurado, nos termos do art. 47 da Lei 8.078/90”.(14)

“O Código de Defesa do Consumidor trouxe importantes inovações no âmbito das relações contratuais, permitindo restabelecer igualdade e equilíbrio entre consumidor e fornecedor, uma vez que este dispõe de melhores condições técnicas, econômicas e intelectuais para o desempenho de sua atividade. A empresa que explora seguros de vida e admite associado sem prévio esclarecimento das condições de seu plano, e passa a receber as contribuições do segurado, não pode, ao ser chamada ao pagamento de sua contraprestação, recusar a pagá-lo sob a alegação de que o segurado prestara informações errôneas sobre seu estado civil.Além do mais, não é crível que a seguradora, indiscriminadamente, receba as prestações e, somente após, passe a exigir o estrito cumprimento do contrato para afastar sua obrigação de pagar o prêmio do segurado de vida.Para que se possa reconhecer a má-fé do segurado é necessário prova segura de que ele fora, efetivamente, informado e esclarecido de todo o conteúdo contratual, principalmente, a respeito das cláusulas de exclusão da responsabilidade contratual”.(15)

A ré olvidou-se do que dispõe o art. 766 do Código Civil, que exige a comprovação da má-fé do segurado para perda do direito indenizatório, pois sequer respeitou o direito de informação que este possui.(16)

Desta forma, a ré distanciou-se da chamada função social do contrato e também da função social da empresa, aspectos intimamente ligados à função social da propriedade, prevista na Constituição Federal.

Com efeito, tanto o contrato quanto a empresa representam importantes aspectos do progresso social.

Aliás, o contrato é apenas um mecanismo para que a empresa alcance seus objetivos econômicos e também seja útil para o desenvolvimento da sociedade.

Se a empresa desempenha bem o seu papel, ela é livre e deve ser prestigiada como propulsora da ordem econômica.

Essa liberdade deve ser auto-regrada, sem prejuízo da intervenção estatal, principalmente se tal empresa agir além dos limites da função social, pautando sua conduta com manifesta afronta a valores fundamentais como a dignidade e o respeito aos consumidores.

Dessarte, as relações das empresas com terceiros não se resumem a simples negócios, mas dada sua importância, os contratos estão comprometidos com a função social, isto é, cercados pelos princípios da probidade, equidade, boa fé e menos influenciados pelo dogma da autonomia da vontade.

No caso vertente, a conduta nociva desenvolvida pela ré e trazida pelas declarações dos consumidores, mencionadas na parte concernente aos fatos, bem demonstra a forma de agir da empresa ré.

Como esclarece o especialista em seguros da FIA/FEA-USP, Antonio Penteado Mendonça(17), “seguro, em qualquer lugar do mundo, pressupõe a mais estrita boa-fé. Boa-fé que é exigida no Brasil, por força de lei, tanto da seguradora, como do segurado, sob risco de sanções que podem chegar ao não pagamento da indenização em caso de sinistro. E é lógico ser assim. Seguro é um produto de entrega futura e aleatória, portanto, a boa-fé tem de ser um dos princípios fundamentais deste instituto, porque sem ela não há como o contrato se manter por um longo período, no qual o sinistro pode ou não acontecer”.

A fraude, explica o referido autor, “é a quebra deliberada deste preceito. É a ação destinada a dar uma vantagem indevida para o seu praticante. É por isso que a primeira idéia que nos vem é de que ela deve ser praticada pelo segurado e não por funcionário da seguradora, com ou sem a participação da empresa. Todavia, a realidade tem mostrado ao longo do tempo que a fraude também pode ser praticada como política empresarial, destinada a passar a perna no segurado, que normalmente, nestes casos, fica sem receber a indenização, porque a seguradora não é uma empresa séria” (grifo nosso).

E finaliza dizendo que “ações como estas precisam ser coibidas energicamente. Além de caras, elas desmoralizam o setor e expõem companhias sérias a vexames inomináveis, mas evitáveis, através da implantação de meia dúzia de providências de fiscalização e controle relativamente simples”.

d) A responsabilidade da ré sobre o direito dos consumidores de serem devidamente informados e sobre os danos causados aos segurados.

A ré não respeita o direito do consumidor de ter informações claras e precisas a respeito de sua recusa.

Não é possível ao consumidor discutir a legitimidade da recusa se não há exibição de documento ou prova mínima de que há motivo justo para a recusa.

O consumidor é hipossuficiente e vulnerável enquanto que as seguradoras contam, inclusive, com serviços de terceiros para que possam indenizar somente aqueles que tenham agido com lisura.

A dúvida milita em favor do consumidor e não ao contrário.

O sistema é o de facilitação de sua defesa e isso, evidentemente, não exclui o direito das seguradoras de se prevenirem contra a fraude.

Entretanto, o seu direito não pode ser excessivo, configurando-se em abuso.

Pontes de Miranda(18) esclarece que os exercícios dos direitos topam uns nos outros. Cruzam-se. Molestam-se. Têm crises de lutas e hostilidades. Exercendo o meu direito, posso lesar a outro, ainda se não saio do meu direito, isto é, da linha imaginária que é o meu direito. Há limites aos direitos e há abusos sem traspassar limites. Não se confunda limitação aos direitos e reação ao abuso do exercício do direito, ou melhor, o exercício lesivo. Quando o legislador percebe que o contorno de um direito é demasiado, ou que a força, ou intensidade, com que se exerce, é nociva, ou perigosa a extensão em que se lança, concebe as regras jurídicas que o limitem, que lhe ponham menos avançados ou marcos, que lhe tirem um pouco da violência ou do espaço que conquista.

Desta forma, os direitos são conferidos para que alcancem determinada finalidade que seja lícita, do qual o seu titular não deve desviar-se, sob pena de se responsabilizado pelo abuso.

O art. 187 do novo Código Civil(19), sem precedente na codificação anterior, revelou a opção do legislador em tomar como ato ilícito o mau uso do direito.

Logo, mostra-se necessário que a seguradora ré não se limite a não pagar o seguro se houver indício de fraude ou prática de ilícito pelo consumidor, mas que informe o consumidor a respeito de sua negativa e que adote as providências necessárias para dar transparência à sua opção de não pagar.

Mais uma vez é importante enfatizar que a dúvida milita em favor dos consumidores.

Tanto isso é verdade que o legislador “reconheceu a vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo” (CDC, art. 4°, inc. I); estabeleceu “a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova a seu favor” (CDC, art. 6°, inc. VIII); e considerou como nula de pleno direito as cláusulas contratuais que “estabeleçam a inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor” (CDC, art. 51, inc. VI).

No caso vertente, a conduta nociva que vem sendo desenvolvida pela empresa ré enseja a sua responsabilização pelos danos causados aos consumidores.

A Carta Política prevê o amplo direito à indenização, tenha o dano atingido o patrimônio material ou moral dos indivíduos (CF, art. 5º, inc. V).

Também o novo Código Civil, em seu art. 927, estabelece que “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. E seu parágrafo único dispõe: “haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

Ao tratar do assunto, Regina Beatriz Tavares da Silva(20) afirma: “em suma a responsabilidade civil é verdadeira tutela privada à dignidade da pessoa humana e a seus direitos da personalidade, inclusive na família, que é o centro de preservação do ser humano, antes mesmo de ser o núcleo essencial da nação. Conclui-se que a teoria da responsabilidade civil visa ao restabelecimento da ordem ou equilíbrio pessoal e social, inclusive em relações familiares, por meio da reparação dos danos morais e materiais oriundos da ação lesiva a interesse alheio, único meio de cumprir-se a própria finalidade do direito, que é viabilizar a vida em sociedade, dentro do conhecido ditame de neminem laedere”.

Assim sendo, a ré deve indenizar todos os consumidores que tenham sofrido danos materiais e morais, independentemente da prova de culpa, pois em relações de consumo a culpa é objetiva.

Neste sentido, afirma Leonardo Roscoe Bessa(21) que “como regra geral, a Lei nº 8.078/90 estabeleceu a responsabilidade objetiva do fornecedor, desconsiderando o elemento culpa, sejam os danos decorrentes de acidente de consumo, sejam decorrentes de vícios de qualidades dos produtos e serviços. Exceção expressa restou estipulada no caso de acidentes de consumo decorrentes de produtos ou serviços oferecidos no mercado de consumo pelos profissionais liberais (art. 12, § 4º). Ao lado da responsabilidade objetiva, restou estabelecida a solidariedade passiva entre os participantes da cadeia produtiva e comercial (fabricante, produtor, construtor, importador e comerciante), de modo a facilitar o exercício da pretensão indenizatória pelo lesado. O modelo adotado pelo Código de Defesa do Consumidor é louvável pois aproxima-se do ideal de plena indenização do lesado”.

Assim sendo, a ré deve responder objetivamente pelos danos causados, ante as situações absurdas, já narradas, a que submeteu os consumidores, seus clientes.

e) O dano indenizável.

A conduta abusiva desenvolvida pela ré trouxe aos consumidores dissabores de toda ordem.

Com efeito, além de não terem recebido o valor do seguro, o que faz presumir o prejuízo de todos os consumidores, o esquema de fraude mergulhou os segurados em situação indesejável, pois muitos foram tratados como criminosos, de forma truculenta e indigna .

É bem possível que muitos dos consumidores, ao cobrarem judicialmente a indenização da ré, tenham malogrado, com sentenças de improcedência, dado que a farsa para negar a indenização somente foi esclarecida recentemente.

Aliás, ante o induzimento por parte da empresa ré, de que a indenização só seria paga se não fosse procedente o inquérito policial ou a ação penal, ou mesmo a pressão psicológica e a ameaça desenvolvidas não permitiram que os consumidores pudessem observar o exíguo prazo prescricional de um ano, referido no art. 206 do Código Civil.

De qualquer forma, a conduta ilícita e abusiva desenvolvida pela ré provocou danos patrimoniais, cujo montante somente será apurado em sede de liquidação de sentença condenatória, inclusive os danos emergentes e os lucros.(22)

Não é somente o capital segurado que deve ser pago, mas também aquilo que os consumidores deixaram de receber pela falta de recomposição do seu patrimônio.

Entretanto, não é somente a recomposição do patrimônio dos consumidores que interessa ao autor coletivo, pois todos os consumidores têm direito à reparação do dano moral.

E a caracterização do dano moral é mais do que evidente. Aflições, constrangimentos, transtornos, honra abalada com indiciamento em inquérito policial pela prática de crime inventado, foram algumas das situações vividas pelos consumidores.

Todas essas práticas, disseminadas em muitas companhias de seguro(23), serviram aos propósitos da empresa ré.

Empresas que dominam o sentido real da responsabilidade social ou que sabem exatamente a consistência da função social da empresa não esquecem de seus parceiros.

Há diversos casos em que os consumidores foram coagidos, tiveram sua liberdade pessoal e intelectual atingida pela pressão exercida pela ré, que os menosprezou, aproveitando-se de suas vulnerabilidades.

Já outros segurados foram indevidamente indiciados em inquéritos policiais, tendo assim, maculada a sua imagem, honra, sofrendo com o medo, a raiva, a indignação e a repulsa, sendo a eles imputada, injustamente, a autoria de crime de estelionato.

A indenização por dano moral também tem sido reconhecida nas relações contratuais, como bem apontou Yussef Cahali(24), verbis: “também em termos gerais, escreveu o saudoso Prof. Carlos Alberto Bittar: a ruptura injusta de um contrato pode acarretar diminuição patrimonial pela falta de ingresso de numerário; perda de eventual negócio outro encetado; sensação de desconforto por impossibilidade de pagamento de dívida existente; constrangimento pessoal ; situação vexatória pela inadimplência; e necessidade de contratação de empréstimo, para satisfação de juros, para adimplir outra obrigação. Fernando Fueyo Lenari indica como dano moral reparável segundo os tribunais argentinos la gran demora del empresário en entregar la vivienda cuya construcción se le habia encomendado, lapso durante el cual el propietario debió habitar um ambiente lastimoso y em condiciones innhumanas; el derecho a la vivienda, com mayor razón si es própria, ha sufrido agravio y , menoscabo, com el agregado de interrumpir la vida normalmente tranqüila”.

O não cumprimento de obrigação, prevista em contrato de seguro, já foi reconhecido como dano moral indenizável, verbis:

“Ementa: INDENIZAÇÃO. PERDAS E DANOS. DANO MORAL. Se o veículo de um representante comercial é furtado e a seguradora só providencia a quitação do seguro após decorridos mais de um ano do sinistro, a queda das vendas deve ser compensada com o pagamento de uma indenização por perdas e danos. A moral individual sintetiza a honra da pessoa, o bom nome, a boa fama e a reputação que integram a vida humana como dimensão imaterial”.(25)

“Ementa: SEGURO. FURTO. PERDA TOTAL. ALEGAÇÃO DE FRAUDE. ÔNUS DA PROVA. INDENIZAÇÃO DEVIDA. A prova da alegada fraude visando à obtenção da indenização cabia à seguradora, ônus do qual não se desincumbiu. Não basta demonstrar que o veículo saiu do país dias antes do furto, se o autor justifica, de forma convincente e amparado por prova testemunhal, a razão da viagem ao Paraguai. Por outro lado, a alegação de venda do veículo em outro país deve vir demonstrada por prova documental, o que não ocorreu. Apelo improvido”.(26)

De outro lado a indenização por dano moral não pode ser diminuta, pois seu caráter também deve ser educativo, no sentido de que novos abusos não ocorram contra os consumidores.

A integralidade da indenização deve levar em conta não apenas os prejuízos materiais sofridos pelos consumidores, mas também os morais, que no mínimo devem ser iguais ao valor do capital segurado, devidamente atualizado.

Necessário que esse seja o valor mínimo, pois muitos já tiveram seu direito ao seguro negado pela sentença de mérito transitada em julgado.

Com isso, o Poder Judiciário estará demonstrando que “o crime e o ilícito não compensam”.

Importante anotar que o Código de Defesa do Consumidor não possui regra específica para a fixação dos danos morais, daí porque o seu quantum deve ser estipulado segundo os princípios informadores da liquidação do dano moral em geral.(27)

Neste particular, invoca-se a eqüidade indicada no art. 953 do Código Civil, nos casos de ofensa contra a honra(28), salientando-se que o valor do dano moral não pode ser desprezível, pois isso não estimulará a ré a agir de modo condizente com a sua posição de fornecedora responsável e parceira do consumidor.

Logo, o valor do dano moral não pode ser exagerado, a ponto de tornar inviável a atividade econômica, mas também não pode ser irrisório, sob pena de estimular o desenvolvimento da prática abusiva. Ele deve, assim, ser fixado em valor que apague em definitivo os dissabores sofridos pelos consumidores, o que minimamente corresponde ao valor da prestação a que teria jus, não fosse a manobra da ré.

III – Da Liminar.

Os requisitos da liminar referida no artigo 12 da Lei 7.347/85 encontram-se presentes.

Como restou assentado, é fato incontroverso que os serviços securitários se submetem à disciplina do Código de Defesa do Consumidor (art. 3º, § 2º).

E a regra é a de que os contrato sejam cumpridos, sendo que no contrato de seguro a obrigação do consumidor é a de pagar o prêmio, ao passo que o fornecedor tem o dever de indenizar, se ocorrer o sinistro, cujo risco assumiu com a contratação.

Assim, não podemos deixar de invocar, para que seja reconhecido o fumus boni juris, o fato de que a vulnerabilidade do consumidor (CDC, art. 4º, I) incentiva o autor coletivo a pedir, desde o limiar do debate, que o Poder Judiciário reconheça a desproporção de forças entre o consumidor e a seguradora ré.

Também em reforço da plausibilidade do direito lembramos que o consumidor é titular do direito básico de ter facilitada sua defesa (CDC, art. 6º, VIII) e que o sistema jurídico de consumo prevê como abusiva qualquer cláusula ou pacto que inverta o ônus da prova em favor do fornecedor (CDC art. 51, VI).

Se houvesse cláusula impondo ao consumidor a comprovação de sua inocência sobre o suposto crime de fraude para recebimento de seguro, essa cláusula seria nula de pleno direito.

Então, não devemos esperar até o final do processo nos casos em que essa presunção de inocência esteja mais do que confirmada.

Imagine-se o caso em que a ré tenha negado a indenização ao sinistro por suspeita de fraude e que não tenha representado à autoridade policial ou não tenha sido instaurado o procedimento investigatório contra segurado.

Aprofundando a iniqüidade praticada pela ré, imagine-se a hipótese em que o segurado tenha o inquérito policial instaurado contra si arquivado; ou pior, que o consumidor não tenha sido condenado em ação penal e a decisão já tenha transitado em julgado.

Obviamente que em tais hipóteses a seguradora ré não poderá sustentar a recusa da indenização. Logo não há qualquer razão para que se aguarde o resultado final dessa ação coletiva.

Enfim, mesmo para seguradoras sérias nas suas atitudes, o ônus não pode ser invertido de tal modo a exigir do consumidor que prove a sua inocência, quando a seguradora, que é a fornecedora do produto, lhe imputa conduta fraudulenta.

Isto porque, como exaustivamente afirmado, é o segurado consumidor que, desde a comunicação do sinistro, deveria gozar do benefício da dúvida. Assim, na dúvida a seguradora deve pagar a indenização.

Mas o Poder Judiciário não pode prestigiar a conduta da empresa ré, porque as provas dos autos são contundentes em demonstrar que a sua única intenção é a de se livrar do cumprimento da sua parte no contrato, que é a de pagar a indenização na eventualidade de ocorrer o sinistro.

Não é possível que a obrigação de indenizar apenas seja imposta ao final, exatamente naquelas hipóteses onde o poder público (em alguns casos o próprio Poder Judiciário) tenha concluído pela inexistência de indício ou prova da participação do consumidor no suposto crime inventado por obra da seguradora.

Enfim, se não houve instauração de inquérito policial, ou o caderno investigatório nada apurou contra o consumidor, ou ainda se a ação penal findou-se sem a respectiva condenação, porque a seguradora não cumpre com sua obrigação que é a de pagar o capital segurado no moldes contratados?

Se a dúvida milita em favor do consumidor (CDC, arts. 6º, VIII e 51, VI), resta evidente a verossimilhança de sua alegação, tendo direito ao recebimento da indenização contratada.

É descabida a imposição, ao consumidor, nas situações mencionadas, da obrigação de ingressar com ação de cobrança contra a seguradora, visando o recebimento da indenização a que tem direito.

De outro lado, a não concessão da liminar, ordenando que nesses casos a seguradora pague de imediato o valor da indenização a que tem direito o consumidor, é contrária ao principio da razoabilidade e afronta a principiologia do Código de Defesa do Consumidor, pois estaria sendo invertido o ônus prova em proveito do fornecedor.

Por fim, além do fumus boni juris considere-se que não obrigar a seguradora ao pagamento imediato do capital, nas hipóteses mencionadas, colocaria ainda mais em risco o direito dos consumidores.

Com efeito, a eventual ocorrência e o reconhecimento da prescrição, ainda que equivocada, somente aumentaria as despesas do consumidor e elevaria desnecessariamente o custo social de milhares de ações individuais.

Outro fato que deve ser considerado para demonstrar o cabimento da liminar é o reconhecimento do periculum in mora, demonstrado pelo tempo necessário para o julgamento definitivo da presente ação coletiva e a ampliação dos riscos ao consumidor.

Voltamos a realçar que se não há comprovação da fraude, o que se presume pela não instauração do caderno investigatório, pelo arquivamento do inquérito policial ou pela sentença penal que não seja condenatória, não haverá risco de irreversibilidade na afetação do patrimônio da ré, uma vez que cessou a suposta justa causa para a recusa do pagamento da indenização ao consumidor segurado.

Em outros termos, a concessão da liminar nada mais será do que obrigar a empresa ré a cumprir imediatamente a lei.

Outro aspecto pretendido com a concessão da liminar é a obrigação de fazer, isto é, para evitar que outros consumidores fiquem nas mãos da seguradora e não adotem as providências necessárias, necessário que a ré seja obrigada a informar os consumidores e lhe dê acesso ao prontuário que tenha concluído pela recusa por suposição de fraude ou outro motivo que seja.

O direito à informação e o acesso aos documentos que, eventualmente, possam dar base à negativa de indenização aos segurados, é o fumus boni juris necessário na concessão da medida liminar.

A conduta da seguradora não pode ser reprimida apenas no campo penal, pois é rotina que as seguradoras neguem aos segurados a indenização com base em simples suspeitas de fraude para o recebimento do seguro, mas deixam de informar, de modo transparente e preciso, o motivo para tanto.

O longo tempo que a seguradora ré pode adotar para resolver os casos que reputa como suspeito de fraude, a princípio, poderá implicar em irreversibilidade na proteção aos interesses dos consumidores.

Não podemos deixar de lembrar que o lapso de tempo da prescrição é pequeno e isso poderá dificultar ainda mais vida de inúmeros consumidores.(29)

É verdade que o prazo somente começaria a contar a partir do momento em que haja comunicação da recusa, mas os dissabores a que submete os segurados é razão justa para o Poder Judiciário intervir em favor da plena informação dos consumidores.

O periculum in mora está justificado.

Isso porque, obrigar a seguradora a ser transparente no motivo da recusa é dar garantia ao consumidor para a defesa de seus interesses; é não permitir que a seguradora ou alguém por ela sugira ou constranja o consumidor a desistir ou renunciar ao seguro; é impedir que a seguradora ré use de artifícios inescrupulosos.

Aliás, uma organização, com responsabilidade e ciente do sentido real da função social da empresa, de modo imediato proporia aos segurados que tivessem, v.g., com a absolvição reconhecida por sentença penal transitada em julgado o comparecimento em seus quadros, visando o pagamento da indenização.(30)

Esse não é o caso da ré, que se não for impedida, continuará sem informar com presteza e robustez o motivo da recusa, tornando o consumidor ainda mais vulnerável, facilitando que o consumidor, por medo e constrangimento, renuncie ou desista de seus interesses.

V — DO PEDIDO.

Ante ao exposto, fundado no artigo 12 da Lei 7.347/85, requer-se seja concedida a liminar inaudita altera parte, a fim de que:

1. A ré seja obrigada a dar ao consumidor o valor equivalente ao capital segurado, devidamente corrigido, em todos os casos em que a suposta fraude tenha sido o motivo para a recusa e não tenha resultado em inquérito policial; o referido caderno investigatório tenha sido arquivado; ou a eventual ação penal não tenha resultado em condenação, sob pena de multa;

2. A ré seja obrigada a comunicar ao consumidor, por escrito e no prazo de 30 dias, o motivo da recusa à indenização do capital segurado, franqueando-lhe o acesso aos documentos que sustentam a negativa, tudo sob pena de multa.

3. seja determinada a publicação do edital a que alude o art. 94 do Código de Defesa do Consumidor, a fim de que os interessados possam intervir no feito como litisconsortes;

4. seja determinada a citação da empresa ré, na pessoa de seu representante legal, pelo correio, a fim de que, advertida da sujeição aos efeitos da revelia, a teor do artigo 285, última parte, do Código de Processo Civil, apresente, querendo, resposta ao pedido ora deduzido, no prazo de 15 (quinze) dias;

5. no mérito, seja a presente ação julgada procedente, tornando-se definitiva a medida liminar e proferindo-se sentença em desfavor da ré, a fim de que:

5.1. seja a ré condenada na obrigação de dar, consistente em indenizar o consumidor no valor equivalente ao capital segurado, devidamente corrigido, em todos os casos em que a suposta fraude tenha sido o motivo para a recusa e não tenha resultado em inquérito policial; o referido caderno investigatório tenha sido arquivado; ou a eventual ação penal não tenha resultado em condenação, sob pena do pagamento de multa;

5.2. seja a ré condenada à obrigação de fazer, consistente em no o prazo de 30 dias, contados da comunicação do sinistro, providenciar, de modo imediato, o pagamento do capital segurado ou, no mesmo prazo, providenciar a notificação por escrito do consumidor, explicitando as razões de sua negativa; franqueando-lhe acesso aos documentos que deram motivo à recusa da indenização e, em caso de suspeita de fraude, a comprovação da comunicação à autoridade pública competente (sem prejuízo de responder por eventual crime de denunciação caluniosa), sob pena do pagamento de multa;

5.3. seja a seguradora ré condenada na obrigação de não fazer consistente em abster-se de induzir, obrigar, sugerir, constranger ou qualquer outra ação que implique em renúncia ou desistência por parte do consumidor ao valor do capital segurado;

5.4. seja condenada, genericamente, para posterior liquidação de sentença (CDC, art. 95), a:

5.4.1. indenizar integralmente pelos danos materiais causados a todos os consumidores segurados, que tiveram o pagamento da indenização do seguro recusado por motivo de “suspeita de fraude”, sem que tenha havido a instauração de inquérito policial; ou este tenha sido arquivado; ou, ainda, a ação penal instaurada não tenha resultado em condenação;

5.4.2. ressarcir os danos morais causados a todos os consumidores segurados, que tiveram o pagamento da indenização do seguro recusado por motivo de “fraude”, sem que tenha havido a instauração de inquérito policial, ou este tenha sido arquivado, ou, ainda, a ação penal instaurada não tenha resultado em condenação, fixando-se valor indenizatório em quantia não inferior ao da indenização a que o consumidor teria direito, atualizada até a data do efetivo pagamento, acrescida de juros de mora e outros consectários;

5.5. seja compelida a ré a publicar, após o trânsito em julgado, a r. sentença condenatória, para o conhecimento geral, em jornais de grande circulação, como o “Estado de São Paulo” e a “Folha de São Paulo”;

Requer também:

6. que para assegurar o cumprimento das obrigações descritas, seja fixada a pena de multa no valor equivalente ao dobro do capital segurado, cujo valor deverá ser atualizado por ocasião do pagamento e recolhido ao Fundo de Reparação de Interesses Difusos Lesados, previsto no art. 13 da Lei nº 7.347/85 e regulamentado pela Lei Estadual nº 6.536/89, sem prejuízo da execução específica da mesma obrigação e crime de desobediência.

7) a condenação da ré ao pagamento das custas processuais;

8) a dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros encargos, desde logo, a teor do artigo 18 da Lei nº 7.347/85 e do artigo 87 da Lei nº 8.078/90;

9) sejam as intimações do autor feitas pessoalmente, mediante entrega dos autos, com vista, na Promotoria de Justiça do Consumidor, situada na Rua Riachuelo nº 115, 1º andar, São Paulo/SP, em face do disposto no artigo 236, § 2º, do Código de Processo Civil, e no artigo 224, inciso XI, da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo).

Protesta provar o alegado por todos os meios de prova admitidos em direito, especialmente pela produção de prova testemunhal e pericial e, caso necessário, pela juntada de documentos e por tudo o mais que se fizer necessário e indispensável à cabal demonstração dos fatos articulados na presente inicial, bem ainda pelo benefício previsto no art. 6º, inc. VIII, do Código de Defesa do Consumidor, no que tange à inversão do ônus da prova, em favor da coletividade de consumidores substituída pelo autor.

Acompanham esta petição inicial os autos do PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO nº 43.161.0000890/04.7, em único volume, contendo 234 (duzentas e trinta e quatro) folhas numeradas.

Dá à causa, para fins de alçada, o valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais).

Termos em que,

p. deferimento.

São Paulo, 07 de abril de 2005.

GILBERTO NONAKA

PROMOTOR DE JUSTIÇA DO CONSUMIDOR

– designado –

Deborah Pierri

2º Promotora de Justiça do Consumidor

Notas de rodapé

1- STJ, REsp nº 457.579-DF, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, 4ª Turma, j. 19/11/2002, v.u., DJ de 10/02/2003, p. 222.

2- STJ, REsp 286.732-RJ, rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 09/10/2001, v.u., DJ de 12/11/2001, p. 152.

3- O art. 1432 do Código Civil de 1916 considerava contrato de seguro “aquele pelo qual uma das partes se obriga para com a outra, mediante a paga de um prêmio, a indenizá-la do prejuízo resultante de riscos futuros, previstos no contrato” Logo, também havia a proteção de um interesse e as demais características do contrato de seguro: presença do segurador e do segurado, previsão de um risco, pagamento de um prêmio e, na hipótese de ocorrer o sinistro, pagamento de indenização.

4- O novo código civil comentado. Rio de Janeiro: Freitas Bastos Editores, 2002, p. 613.

5- Maria Helena Diniz. Tratado teórico e prático dos contratos, 2002, Saraiva, p. 437.

6- Carlos Santos de Oliveira. O novo código civil comentado, p. 612.

7- Idem, p. 439.

8- “São os contratos agora denominados de consumo, sejam eles de compra e venda, de locação, de depósito, de abertura de conta corrente, de prestação de serviços profissionais, de empréstimo, de financiamento ou de alienação fiduciária, de transporte, de seguro, de seguro saúde, só para citar os mais comuns” (Cláudia Lima Marques. Contratos no código de defesa do consumidor, 4ª edição, RT, p. 163).

9- Responsabilidade Social da Empresa, in www.mundojuridico.adv.br/html/artigos/documentos/texto270, acesso em 29/03/2005.

10- Contratos no código de defesa do consumidor, RT. 4ª edição, p. 82/83.

11- Assim dispõe o art. 765 do Código Civil : “O segurado e o segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes”.

12- Novo Código Civil Comentado, org. Ricardo Fiúza, Saraiva, 2ª edição, p. 702.

13- Tratado teórico e prático dos contratos, v. 4, 2002, Saraiva, p. 441. Sílvio Rodrigues também elenca como condição do contrato de seguro a boa-fé das partes, in Direito Civil dos Contratos, 1997, Saraiva, p.351. Confira-se também o discurso de Claudia Lima Marques: “Deve presumir a boa-fé subjetiva dos consumidores e se impor deveres de boa-fé objetiva (informação, cooperação e cuidado) para os fornecedores, especialmente tendo em conta o modo coletivo de contratação e por adesão. O valor pago pelo seguro deve ser aquele especificado na oferta, o qual despertou a confiança do consumidor e sobre o qual pagou suas contribuições”.

14- 2º TACivSP, Ap c/ rev. n° 610.516-00/0, 10ª Câmara, rel. Juiz Gomes Varjão.

15- TAMG, AC n° 294.318-4, 6ª Câmara Cível, rel. Juiz Belizário de Lacerda, v.u., 17.02.2000.

16- CC, Art. 766. Se o segurado, por si ou por seu representante, fizer declarações inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa do prêmio, perderá o direito à garantia, além de ficar obrigado ao prêmio vencido. Parágrafo único. Se a inexatidão ou omissão nas declarações não resultar de má-fé do segurado, o segurador terá direito a resolver o contrato, ou a cobrar, mesmo após o sinistro, a diferença do prêmio. A esse respeito, confira-se o seguinte julgado: “SEGURO. VEÍCULO. DANOS MATERIAIS. Negativa da seguradora no pagamento da cobertura sob a alegação que o motorista do veículo sinistrado não estava citado como condutor habitual quando do preenchimento do Formulário Perfil do Condutor pelo segurado. Má-fé incomprovada. Sentença de procedência da ação mantida” (TJRS, AC n° 70002651735, 5ª Câmara Cível, rel. Des. Sérgio Pilla da Silva, j. 13.06.01).

17- Matéria publicada no jornal “O Estado de São Paulo”, edição de 04 de abril de 2005, Caderno de Economia, p. B6 (juntada a fls. 173 do procedimento administrativo).

18- Comentários ao código de processo civil. Tomo I. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2ª edição, 1974, p. 378.

19- CC, art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

20- Novo código civil comentado, 2ª edição, Coord. Ricardo Fiuza, 2004, Saraiva, p. 836.

21- Responsabilidade objetiva e o código de defesa do consumidor, in www.ufsm.br/direito/artigos/consumidor/responsabilidade, acesso em 31/03/05.

22- CC, art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.

23- Nesse sentido: “Apelação Cível. Seguro de veículo. Pedido de cobertura por alegação de furto. Negativa de cobertura por haver fraude. Impossível ter ocorrido o sinistro, se três dias antes da data do furto do veículo afirmado pelo segurado o bem foi vendido no Paraguai, consoante escritura de compra e venda apresentada pela seguradora. Inexistindo o sinistro, descabe a indenização contratada. Apelo desprovido” (TJRS, AC nº 70006519037, 6ª CC, j. 02/03/2005).

24- Dano Moral. 2ª edição, 2ª tiragem, RT, 1998, p. 530.

25- AC n° 35028-1-MG, rel. Juiz Saldanha da Fonseca, 4ª CC, j. 08/05/02.

26- AC n° 70005259049, 5ª CCTJ/RS, j. 18/12/2003.

27- Cf. “Para a fixação de verba indenizatória decorrente de dano moral (constrangimento sofrido por freguês de estabelecimento comercial, revistado por suspeita de furto), deve-se aplicar o sistema de liquidação das obrigações resultantes de atos ilícitos, incidindo a regra do art. 1547 do CC e seu parágrafo único, c.c. art. 49 do CP” (RT 743/341).

28- CC, art. 953. A indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido. Parágrafo único. Se o ofendido não puder provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, eqüitativamente, o valor da indenização, na conformidade das circunstâncias do caso.

29- Ementa do RESP nº 237.836 julgado pelo STJ em 22/10/2002: “Seguro. Furto de veículo. Recusa da seguradora em solver a indenização. Prescrição. Aplicação do Código Civil e não do CDC. Prescrição ânua, todavia, inocorrente, uma vez não efetuada a comunicação da recusa ao segurado. -Na hipótese de recusa da companhia seguradora ao pagamento da indenização, o prazo prescricional da ação que a reclama é de um ano, nos termos do art. 178, § 6º, II, do Código Civil. Precedente da 2ª Seção. – Permanece suspenso o prazo prescricional entre o aviso de sinistro (ou a entrega da documentação) e a comunicação da seguradora ao segurado acerca da recusa ao pagamento da indenização. Prescrição anua inocorrente, à falta da comunicação a cargo da empresa de seguros. Recurso Especial conhecido, mas não provido”.

30- A seguradora diante da acusação de vários de seus prepostos não se propôs a chamar os segurados para revisão de sua negativa de indenização, mas ao contrário prefere publicar manifestações de sua perplexidade com a “injusta” acusação ou pontuar números percentuais de indenizações anuais.

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