Crime de peculato

Francisco Lopes e Tereza Grossi são condenados por peculato

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4 de abril de 2005, 19h11

A juíza Ana Paula Vieira de Carvalho, da 6ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, condenou o ex-presidente do Banco Central, Francisco Lopes, a dez anos de prisão e 120 dias-multa, fixados em cinco salários mínimos por dia, por peculato. Hoje, o valor é de R$ 156 mil.

Na mesma sentença, foram condenados a ex-diretora do BC, Tereza Grossi, e o controlador do banco Marka, Salvatore Cacciola. Tereza foi condenada a seis anos de reclusão e 72 dias-multa, no valor unitário de três salários mínimos. Cacciola pegou 13 anos de prisão por peculato e gestão fraudulenta.

Na sentença, a juíza Ana Paula tachou a gestão de Cacciola à frente do banco Marka de irresponsável e desonesta. Francisco Lopes e Tereza são acusados pelo Ministério Público de favorecer os bancos Marka e FonteCindam às vésperas da desvalorização do real, em janeiro de 1999.

Foram condenados também Luiz Antonio Gonçalves e Roberto José Steinfeld, do banco FonteCindam, a dez anos de prisão cada. Cláudio Mauch, diretor de fiscalização do Banco Central à época, e Demóstenes Madureira do Pinho Neto, diretor de assuntos internacionais, também pegaram 10 anos de prisão. Outro condenado é Luiz Antonio Bragança, a cinco anos de prisão. A juíza acolheu em parte a denúncia do Ministério Público e absolveu os acusados de diversos outros crimes.

Todos podem recorrer da decisão em liberdade. Apenas Salvatore Cacciola, foragido na Itália, não tem esse direito. Já existe mandado de prisão contra o banqueiro. A Justiça italiana já negou pedido de extradição feito pelas autoridades brasileiras porque Cacciola é cidadão italiano.

Leia a decisão

99.0046981-0 21000 – ACOES PENAIS

Autuado em 17/05/1999 – Consulta Realizada em 04/04/2005 às 18:06

AUTOR: JUSTICA PÚBLICA

ADVOGADO: SEM ADVOGADO

RÉU: CINTHIA COSTA E SOUZA E OUTROS

ADVOGADO: SAMUEL AUDAY BUZAGLO E OUTROS

6 VF Criminal Rio de Janeiro

Juiz – Sentença: ANA PAULA VIEIRA DE CARVALHO

Objetos: CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL; LAVAGEM DE DINHEIRO

POR TODO O EXPOSTO, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO FORMULADO PELO PARQUET PARA:

1. reconhecer a inépcia da denúncia oferecida no processo n.º 990048111-9, com a conseqüente nulidade de todos os atos que lhe seguiram;

2. reconhecer a inépcia parcial da denúncia formulada nos processos 990046981-0 e 2000.5101509046-0, quanto às imputações mencionadas no item 1.2.1, referentes aos crimes previstos nos arts. 4o. caput e 10 da Lei 7492/86.

3. absolver os acusados FRANCISCO LOPES, SALVATORE CACCIOLA, LUIZ AUGUSTO BRAGANÇA e RUBEM NOVAES das imputações referentes aos crimes de corrupção ativa e passiva, com fulcro no art. 386,VI do CPP;

4. absolver os acusados ALEXANDRE PUNDEK, RUBEM NOVAES e CINTHIA COSTA E SOUZA da imputação de peculato, com fulcro no art. 386, IV (para o primeiro) e VI (para os demais) do CPP;

5. absolver a acusada CINTHIA COSTA E SOUZA da imputação de gestão fraudulenta, por força do art. 386, incs. III e IV do CPP;

6. absolver os réus FRANCISCO LOPES, CLÁUDIO MAUCH, DEMÓSTENES MADUREIRA DO PINHO NETO, TEREZA GROSSI e ALEXANDRE PUNDEK da imputação referente ao art. 23 da Lei 7492/86, com fulcro no art. 386, III do CPP;

7. absolver os réus SALVATORE CACCIOLA e CINTHIA COSTA E SOUZA da imputação referente ao art. 10 da Lei 7492/86, com fulcro no art. 386, incs. III do CPP;

8. condenar os réus FRANCISCO LOPES, CLÁUDIO MAUCH, DEMÓSTENES MADUREIRA DO PINHO NETO, TEREZA GROSSI, SALVATORE CACCIOLA, LUIZ AUGUSTO BRAGANÇA, LUIZ ANTONIO GONÇALVES e ROBERTO JOSÉ STEINFELD nas penas do art. 312 do CP;

9. condenar o réu SALVATORE CACCIOLA nas penas do art. 4o, caput, da Lei 7.492/86;

10. condenar os réus LUIZ ANTONIO GONÇALVES e ROBERTO JOSÉ STEINFELD nas penas do art. 4o., p. único da Lei 7492/86.

Passo à individualização das penas.

Passo à individualização da pena de SALVATORE CACCIOLA.

Quanto ao crime previsto no art. 312 do CP, o réu é primário e não ostenta antecedentes. No que tange à culpabilidade, tem formação superior e perfeita consciência da gravidade da conduta perpetrada. Homem de personalidade controvertida, SALVATORE CACCIOLA demonstrou, ao longo desta ação penal, ser capaz de utilizar-se de quaisquer meios para a obtenção de vantagem nos negócios e na vida privada. Valendo-se de BRAGANÇA, amigo íntimo de LOPES, obteve uma ajuda ilícita de proporções monumentais para seu Banco. Contrariado com declarações de uma testemunha, não relutou em telefonar-lhe para proferir ameaças (fls. 805 do proc. desmembrado). Homem muito rico e indubitavelmente carismático, acreditava poder “resolver tudo com dinheiro”, como expressamente afirmou em um dos diálogos interceptados (fita 07, conversa 02 do apenso 28). Foi claramente impelido à prática do crime por motivação reprovável, consistente em cobiça e ambição desmedidas, com o intento de manter-se rico às custas do dinheiro público, mesmo quando seus prejuízos advinham de erros por ele levados a cabo. As circunstâncias e conseqüências do crime são-lhe também desfavoráveis, haja vista o descomunal volume de recursos públicos (cerca de novecentos milhões de reais) de que se teria beneficiado ilicitamente em proveito próprio, sem ressarcimento de qualquer tostão aos cofres públicos. Em sendo assim, atendendo à personalidade, motivos e circunstâncias do crime, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 8 anos de reclusão e noventa e seis dias-multa, que fixo no valor unitário de cinco salários mínimos, por se tratar de réu com excelente situação financeira, segundo atesta sua qualificação de fls 556/557, pena esta que torno definitiva na ausência de circunstâncias agravantes ou atenuantes e de causas de aumento ou diminuição.


Quanto ao crime previsto no art. 4o. da Lei 7492/86, deixo de repetir, por desnecessário, as circunstâncias de natureza subjetiva acima citadas. Quanto às circunstâncias e conseqüências do crime, parece-me especialmente reprovável a estupenda alavancagem do Banco MARKA no mercado de futuros em janeiro de 1999, de 20 vezes o valor do patrimônio líquido, claramente com o objetivo de obtenção de lucros astronômicos a qualquer preço. A ela acrescente-se a manobra com o Fundo Stock Máxima, através da qual optou por impactar o patrimônio do Banco, e posteriormente o erário, para salvar milhões de dólares de seu patrimônio pessoal. Em sendo assim, a gestão irresponsável e desonesta de SALVATORE ALBERTO CACCIOLA à frente do Banco MARKA está a merecer reprimenda acima do mínimo legal. Posto isto, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 5 anos de reclusão e sessenta dias-multa, que fixo no valor unitário de cinco salários mínimos, por se tratar de réu com excelente situação financeira, segundo atesta sua qualificação de fls. 556/557, pena esta que torno definitiva na ausência de circunstâncias agravantes ou atenuantes e de causas de aumento ou diminuição.

Os dois crimes estão, em meu sentir, em concurso material, haja vista que decorreram de ações distintas, separadas no tempo e no espaço. Em sendo assim, e seguindo os ditames do art. 69 do CP, procedo à soma de penas, obtendo assim a pena definitiva de treze anos de reclusão e cento e cinqüenta e seis dias-multa, no valor unitário de cinco salários mínimos.

O regime inicial de cumprimento de pena será o fechado.

Passo à individualização da pena de LUIZ ANTONIO ANDRADE GONÇALVES.

Quanto ao crime previsto no art. 312 do CP, o réu é primário e não ostenta antecedentes. No que tange à culpabilidade, tem formação superior e perfeita consciência da gravidade da conduta perpetrada. Homem com estreitas relações com o poder à época e ex-ocupante de altos cargos no Poder Executivo, LUIZ ANTONIO se valeu de seu livre trânsito na autarquia, da qual era também ex-funcionário, para obter as benesses já analisadas no item 6 desta sentença. Neste aspecto, sua atuação bem retrata uma concepção distorcida das relações entre os setores público e privado, porque promíscua e divorciada do interesse público, infelizmente ainda dominante no Brasil. Considero que sua motivação para a prática do crime foi claramente reprovável, traduzida nesta visão equivocada do Estado e sua função, com o claro intento de transferir ao erário prejuízos inerentes às atividades por ele desenvolvidas no setor financeiro. As circunstâncias e conseqüências do crime são-lhe também desfavoráveis, haja vista o descomunal volume de recursos públicos (cerca de quinhentos e vinte dois milhões de reais) de que se teriam beneficiado ilicitamente o Banco que presidia e seus fundos. Em sendo assim, atendendo à personalidade, motivos, circunstâncias e conseqüências do crime, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 7 anos de reclusão e oitenta e quatro dias-multa, que fixo no valor unitário de cinco salários mínimos, por se tratar de réu com excelente situação financeira, segundo atesta sua qualificação de fls. 1049, pena esta que torno definitiva na ausência de circunstâncias agravantes ou atenuantes e de causas de aumento ou diminuição.

Quanto ao crime previsto no art. 4o. da Lei 7.492/86, deixo de repetir, por desnecessário, as circunstâncias de natureza subjetiva acima citadas. Quanto às circunstâncias e conseqüências do crime, considero merecedora de especial reprovabilidade a irresponsabilidade de continuar apostando alto na Bolsa de Mercadorias e Futuros no delicadíssimo contexto de janeiro de 1999, mesmo quando todos os indicadores apontavam para o perigo das apostas. Diretamente ligada a esta forma de atuação encontra-se uma motivação também reprovável, consistente na cobiça sem limites que o levou a procurar lucros desmedidos. Em sendo assim, a gestão irresponsável de LUIZ ANTONIO GONÇALVES à frente do Banco FONTECINDAM está a merecer reprimenda acima do mínimo legal. Posto isto, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 3 anos de reclusão e trinta e seis dias-multa, que fixo no valor unitário de cinco salários mínimos, por se tratar de réu com excelente situação financeira, segundo atesta sua qualificação de fls. 1049, pena esta que torno definitiva na ausência de circunstâncias agravantes ou atenuantes e de causas de aumento ou diminuição.

Os dois crimes estão, em meu sentir, em concurso material, haja vista que decorreram de ações distintas, separadas no tempo e no espaço. Em sendo assim, e seguindo os ditames do art. 69 do CP, procedo à soma de penas, obtendo assim a pena definitiva de dez anos de reclusão e cento e vinte dias-multa, no valor unitário de cinco salários mínimos.

O regime inicial de cumprimento de pena será o fechado.


Passo à individualização da pena de ROBERTO JOSÉ STEINFELD.

Quanto ao crime previsto no art. 312 do CP, o réu é primário e não ostenta antecedentes. No que tange à culpabilidade, tem formação superior e perfeita consciência da gravidade da conduta perpetrada. Homem de mercado, era o controlador do Banco FONTECINDAM e direto beneficiário da operação, assim como os cotistas dos fundos socorridos. Para fazer prevalecer seus interesses privados, socorreu-se de seu presidente, homem que, como dito, tinha livre trânsito no BACEN à época. Considero, assim como o fiz em relação a LUIZ ANTONIO, que sua motivação para a prática do crime foi claramente reprovável, traduzida em uma visão equivocada do Estado e sua função, com o intento de transferir ao erário prejuízos inerentes às atividades por ele desenvolvidas no setor financeiro. As circunstâncias e conseqüências do crime são-lhe também desfavoráveis, haja vista o descomunal volume de recursos públicos (cerca de quinhentos e vinte dois milhões de reais) de que se teria beneficiado ilicitamente, juntamente com os cotistas dos fundos por ele administrados. Em sendo assim, atendendo à personalidade, motivos e circunstâncias do crime, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 7 anos de reclusão e oitenta e quatro dias-multa, que fixo no valor unitário de cinco salários mínimos, por se tratar de réu com excelente situação financeira, segundo atesta sua qualificação de fls. 1065, pena esta que torno definitiva na ausência de circunstâncias agravantes ou atenuantes e de causas de aumento ou diminuição.

Quanto ao crime previsto no art. 4o. da Lei 7.492/86, deixo de repetir, por desnecessário, as circunstâncias de natureza subjetiva acima citadas. Quanto às circunstâncias e conseqüências do crime, considero merecedora de especial reprovabilidade a irresponsabilidade de continuar apostando alto na Bolsa de Mercadorias e Futuros no delicadíssimo contexto de janeiro de 1999, mesmo quando todos os indicadores apontavam para o perigo das apostas. Diretamente ligada a esta forma de atuação encontra-se uma motivação também reprovável, consistente na cobiça sem limites que o levou a procurar lucros desmedidos. Em sendo assim, a gestão irresponsável de ROBERTO JOSÉ STEINFELD à frente do Banco FONTECINDAM está a merecer reprimenda acima do mínimo legal. Posto isto, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 3 anos de reclusão e trinta e seis dias-multa, que fixo no valor unitário de cinco salários mínimos, por se tratar de réu com excelente situação financeira, segundo atesta sua qualificação de fls. 1065, pena esta que torno definitiva na ausência de circunstâncias agravantes ou atenuantes e de causas de aumento ou diminuição.

Os dois crimes estão, em meu sentir, em concurso material, haja vista que decorreram de ações distintas, separadas no tempo e no espaço. Em sendo assim, e seguindo os ditames do art. 69 do CP, procedo à soma de penas, obtendo assim a pena definitiva de dez anos de reclusão e cento e vinte dias-multa, no valor unitário de cinco salários mínimos.

O regime inicial de cumprimento de pena será o fechado.

Passo à individualização da pena de LUIZ AUGUSTO BRAGANÇA.

Quanto ao crime previsto no art. 312 do CP, o réu é primário e não ostenta antecedentes. No que tange à culpabilidade, tem formação superior e perfeita consciência da gravidade da conduta perpetrada. Homem com formação acadêmica consistente, LUIZ AUGUSTO tem personalidade instável, é dado à ingestão excessiva de bebidas alcoólicas (dep. fls. 1355 e documento de fls. 703, do vol 3 do IPL) e, pelo que se pode perceber dos bilhetes trazidos aos autos por sua ex-namorada (fls. 23 e segs. do proc. no. 990048060-0), deixa-se deslumbrar por riquezas materiais. Contra ele pesa o enorme volume de recursos públicos desviados em benefício de SALVATORE CACCIOLA (cerca de novecentos milhões de reais), sem qualquer contrapartida e, inclusive, com sobra de patrimônio líquido do Banco. Serviu, como já se salientou nos itens 7 e 10.4, de intermediário entre CACCIOLA e LOPES, tendo como função repassar as pretensões do primeiro, valendo-se de sua amizade íntima com o economista. Muito embora considere que esta atividade não seja, propriamente, uma “participação de menor importância”, tal qual prevista no art. 29, p. 1o do CP, em vista da natureza escassa e especialíssima da contribuição prestada, parece-me que sua condição de mero partícipe, sem o domínio funcional do fato, está a merecer um tratamento diferenciado daquele dispensado aos demais autores do peculato denunciado. Em sendo assim, atenta à personalidade, circunstâncias e conseqüências do crime, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 5 anos de reclusão e sessenta dias-multa, que fixo no valor unitário de três salários mínimos, por se tratar de réu com boa situação financeira, segundo atesta sua qualificação de fls. 627/628, pena esta que torno definitiva na ausência de circunstâncias agravantes ou atenuantes e de causas de aumento ou diminuição.


O regime inicial de cumprimento de pena será o semi-aberto.

Passo à individualização da pena de FRANCISCO LOPES.

Quanto ao crime previsto no art. 312 do CP, o réu é primário e não ostenta antecedentes. Cuida-se de homem de notável capacidade intelectual, cujos ensinamentos têm, segundo a prova dos autos, muito influenciado o pensamento econômico brasileiro nas últimas décadas. Tendo ocupado cargos públicos relevantíssimos, dele se poderia esperar, haja vista sua capacidade e as oportunidades de formação profissional e acadêmica que a vida lhe deu, uma especial preocupação com valores éticos e morais que cercam o exercício da função pública. Muito embora sua atuação, em relação ao Banco MARKA, pudesse inicialmente ser justificada para a evitação de um risco sistêmico, a forma imoral de intervenção bem demonstra sua concepção distorcida das relações entre o Estado e a iniciativa privada. O mesmo se diga quanto à operação com o FONTECINDAM, para o qual sequer existia o citado risco e cuja realização se deveu, de forma precípua, a relações promíscuas entre a autarquia e ex-funcionário ocupante de alto cargo no banco socorrido. Na qualidade de Presidente do Banco Central à época, tem especial responsabilidade pelo ocorrido, em decorrência do total domínio final do fato. As circunstâncias e conseqüências do crime são-lhe também desfavoráveis, haja vista o descomunal volume de recursos públicos (cerca de um bilhão e meio de reais) de que se teriam beneficiado ilicitamente os particulares envolvidos, sem ressarcimento aos cofres públicos. Em sendo assim, atendendo à personalidade, motivos e circunstâncias do crime, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 10 anos de reclusão e cento e vinte dias multa, que fixo no valor unitário de cinco salários mínimos, por se tratar de réu com excelente situação financeira, segundo atesta sua qualificação de fls. 1010, pena esta que torno definitiva na ausência de circunstâncias agravantes ou atenuantes e de causas de aumento ou diminuição.

O regime inicial de cumprimento de pena será o fechado.

Passo a individualizar a pena de CLÁUDIO NESS MAUCH.

Quanto ao crime previsto no art. 312 do CP, o réu é primário e não ostenta antecedentes. Formado em contabilidade, é funcionário de carreira do Banco Central, tendo exercido cargos de Direção na autarquia a partir de 1993 até sua aposentadoria, em 1999. Ocupava, na época, a Diretoria de Fiscalização, tendo tido participação intensa tanto no socorro ao Banco MARKA, quanto naquele ofertado ao Banco FONTECINDAM. Sua atuação no episódio é especialmente reprovável porque, na qualidade de Diretor de Fiscalização, cabia-lhe verificar e reprimir condutas ilícitas cometidas pelos gestores das instituições por ele fiscalizadas, tendo, ao revés, compactuado com a ilícita remessa de milhões de dólares por CACCIOLA ao exterior, bem como com a premiação à gestão temerária levada a cabo por LUIZ ANTONIO e ROBERTO JOSÉ no FONTECINDAM. As circunstâncias e conseqüências do crime são-lhe também desfavoráveis, haja vista o descomunal volume de recursos públicos (cerca de um bilhão e meio de reais) de que se teriam beneficiado ilicitamente os particulares envolvidos, sem ressarcimento aos cofres públicos. Em sendo assim, atendendo à personalidade, motivos e circunstâncias do crime, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 10 anos de reclusão e cento e vinte dias-multa , que fixo no valor unitário de três salários mínimos, por se tratar de réu com boa situação financeira, segundo atesta sua qualificação de fls. 1021, pena esta que torno definitiva na ausência de circunstâncias agravantes ou atenuantes e de causas de aumento ou diminuição.

O regime inicial de cumprimento de pena será o fechado.

Passo a individualizar a pena de DEMÓSTENES MADUREIRA DO PINHO NETO.

Quanto ao crime previsto no art. 312 do CP, o réu é primário e não ostenta antecedentes. Homem com formação acadêmica consistente e experiência profissional, foi ocupante de alto cargo no Ministério da Fazenda, quando Ministro o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, tendo em 1997 assumido a Diretoria de Assuntos Internacionais do Banco Central, onde permaneceu até a saída de FRANCISCO LOPES da Presidência, em fevereiro de 1999. Participou das decisões envolvendo tanto o Banco MARKA, quanto o FONTECINDAM, sendo certo que conhecia os contornos ilícitos de ambas as operações, como salientei no item 10.8. Muito embora sua atuação, em relação ao Banco MARKA, pudesse inicialmente ser justificada para a evitação de um risco sistêmico, a forma imoral de intervenção indica uma concepção distorcida das relações entre o Estado e a iniciativa privada, como já apontei anteriormente em relação aos demais réus. A especial reprovabilidade de sua atuação decorre do domínio que detinha sobre a realização delitiva, haja vista o poder de decisão que lhe era conferido pelo cargo ocupado. As circunstâncias e conseqüências do crime são-lhe também desfavoráveis, por força do descomunal volume de recursos públicos (cerca de um bilhão e meio de reais) de que se teriam beneficiado ilicitamente os particulares envolvidos, sem ressarcimento aos cofres públicos. Em sendo assim, atendendo à personalidade, motivos e circunstâncias do crime, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 10 anos de reclusão e cento e vinte dias-multa, que fixo no valor unitário de cinco salários mínimos, por se tratar de réu com excelente situação financeira, segundo atesta sua qualificação de fls. 1055, pena esta que torno definitiva na ausência de circunstâncias agravantes ou atenuantes e de causas de aumento ou diminuição.

O regime inicial de cumprimento de pena será o fechado.

Passo à individualização da pena de TEREZA GROSSI.

Quanto ao crime previsto no art. 312 do CP, a ré é primária e não ostenta antecedentes. No que tange à culpabilidade, porém, tem formação superior e perfeita consciência da gravidade da conduta perpetrada. Funcionária de carreira do Banco Central, sempre atuou na área de fiscalização, de forma que tinha perfeita ciência da intensidade das irregularidades cometidas na gestão do Banco MARKA, com as quais a autarquia estaria compactuando. Contra ela pesa o enorme volume de recursos públicos desviados em benefício de SALVATORE CACCIOLA (cerca de novecentos milhões de reais), sem qualquer contrapartida e, inclusive, com sobra de patrimônio líquido do Banco. Serviu, segundo já se salientou no item 10.9, como executora das decisões tomadas pela Diretoria em relação ao MARKA, sendo de salientar a importância que o exercício lícito de sua função (Chefe de Fiscalização) teria tido para a evitação e persecução das fraudes perpetradas por CACCIOLA à frente de seu banco. Tendo operacionalizado o desvio, não pode ser considerada uma mera partícipe, mas sim co-autora do delito perpetrado. Sua posição hierárquica, todavia, localizada abaixo dos Diretores “a quem efetivamente coube a decisão da operação e seus contornos”, permite um tratamento diferenciado daquele a eles dispensado. Em sendo assim, atenta à personalidade, circunstâncias e conseqüências do crime, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 6 anos de reclusão e setenta e dois dias-multa, que fixo no valor unitário de .três salários mínimos, por se tratar de ré com boa situação financeira, segundo atesta sua qualificação de fls. 1110, pena esta que torno definitiva na ausência de circunstâncias agravantes ou atenuantes e de causas de aumento ou diminuição.

O regime inicial de cumprimento de pena será o semi-aberto.

Concedo-lhes o direito de apelar em liberdade, à exceção de SALVATORE CACCIOLA, atualmente foragido, eis que persistem as razões para a custódia anteriormente decretada.

Os acusados TEREZA GROSSI e CLÁUDIO MAUCH praticaram o crime em manifesta violação aos deveres inerentes aos cargos por eles ocupados, sendo que a imoralidade do socorro ao MARKA (do qual ambos participaram), e ainda o favorecimento claro ao FONTECINDAM (de responsabilidade de Mauch), aliados ao volume de recursos desviados, torna imperativa a conclusão de absoluta incompatibilidade entre o reconhecimento de autoria em tão grave delito e a permanência nos quadros do serviço público. Em sendo assim, valendo-me do art. 92, I “a” do CP, decreto a perda do cargo público por ambos ocupado.

Condeno os réus, ainda, ao pagamento das custas, pro-rata.

Com o trânsito em julgado, proceda-se na forma do provimento 001/01 da Egrégia Corregedoria do TRF.

P.R.I.

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