Sem parar

Empregado não tem de tentar conciliação prévia em ação trabalhista

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22 de setembro de 2004, 19h44

Os trabalhadores não estão obrigados a passar pelas Comissões de Conciliação Prévia antes de ingressar com reclamação na Justiça do Trabalho. O entendimento foi consolidado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região.

O entendimento foi reiterado pelos juízes da Seção Especializada em Dissídios Individuais do TRT de São Paulo no julgamento de Mandado de Segurança contra ato do juiz da 58ª Vara do Trabalho de São Paulo. O juiz extinguiu reclamação trabalhista sem julgamento do mérito, com o argumento de que o trabalhador não tentou conciliação prévia.

Instituídas pela Lei 9.958/2000, as comissões podem ser formadas por empresas e sindicatos, de composição paritária, com representantes dos empregados e dos empregadores. O objetivo é conciliar os conflitos individuais de trabalho sem que o funcionário precise entrar com ação trabalhista.

Em seu voto, o relator do recurso, juiz Nelson Nazar, classificou como “excessivo e injustificado o rigor com que foram avaliados os requisitos da propositura da ação”.

Segundo ele, não há “como estabelecer a obrigatoriedade de submeter o trabalhador à Comissão de Conciliação Prévia, na medida em que tal condicionamento afrontaria o princípio constitucional insculpido no artigo 5.º, XXXV, de que não há lesão ou ameaça a direito que possa ser suprimida da apreciação do Poder Judiciário”.

Leia o voto do relator

PROCESSO TRT/SP N.º 13298200300002008

MANDADO DE SEGURANÇA

IMPETRANTE: ARLINDO MIGUEL GOMES

IMPETRADO: ATO DO EXMO. SR. JUIZ DA MM. 58.ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO

LITISCONSORTE: DE CHAI INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE ROUPAS LTDA.

E M E N T A

MANDADO DE SEGURANÇA — INSURGÊNCIA CONTRA A OBRIGATORIEDADE DO RECLAMANTE-IMPETRANTE DE SE SUBMETER À COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA

Viola direito líquido e certo ato praticado pela MM. Vara de origem que extingue processo, sem julgamento de mérito, em razão de o reclamante não haver submetido sua pretensão à comissão de conciliação prévia.

O devido processo legal é um direito constitucional incondicionado. Não há, em nossa Carta Magna, qualquer respaldo que obrigue o reclamante a submeter-se à comissão de conciliação prévia, como pressuposto para a propositura da ação trabalhista.

Segurança que se concede.

MANDADO DE SEGURANÇA impetrado por ARLINDO MIGUEL GOMES, com pedido de liminar, contra ato do Exmo. Sr. Juiz da MM. 58.ª Vara do Trabalho de São Paulo, que extinguiu a reclamação trabalhista n.º 2.490/03-6, sem julgamento do mérito, sob o argumento de o impetrante não haver submetido sua pretensão à Comissão de Conciliação Prévia, de que trata a Lei n.º 9.958/00. Alega, em resumo, violado o art. 5.º, inciso XXXV, da Constituição Federal, requerendo, a final, a concessão da segurança, para que seja determinado o processamento da reclamação trabalhista.

Procuração e documentos às fls.06/17.

Distribuído o feito, a liminar foi deferida às fls. 20/21.

Informações da autoridade reputada coatora às fls. 26/27.

A litisconsorte necessário não apresentou manifestação.

Parecer do Ministério Público do Trabalho às fls. 49/54.

É o relatório.

VOTO

Preliminar de não cabimento do Mandado de Segurança

argüida pelo Ministério Público do Trabalho

Argúi o Ministério Público do Trabalho preliminar de não cabimento do presente mandado de segurança, alegando existir recurso próprio para atacar o ato impugnado.

Ainda que a decisão atacada comporte remédio processual próprio, o que inviabilizaria, em princípio, a utilização do remédio heróico, nos termos do art. 5.º, II, da Lei n.º 1.533/51, a plausibilidade da impetração encontra eco no fato de o impetrante necessitar de uma medida urgente e extrema para reparação do direito líquido e certo que entende violado (extinção da reclamação trabalhista ante a inobservância da Lei n.º 9.958/00), o que não ocorreria, de pronto, com a utilização do remédio apropriado.

Rejeito a preliminar.

MÉRITO

Trata-se de mandado de segurança impetrado por ARLINDO MIGUEL GOMES, com pedido de liminar, contra ato do Exmo. Sr. Juiz da MM. 58.ª Vara do Trabalho de São Paulo, que extinguiu a reclamação trabalhista n.º 2.490/03-6, sem julgamento do mérito, sob o argumento de o impetrante não haver submetido sua pretensão à Comissão de Conciliação Prévia, de que trata a Lei n.º 9.958/00. Alega, em resumo, violado o art. 5.º, inciso XXXV, da Constituição Federal, requerendo, a final, a concessão da segurança, para que seja determinado o processamento da reclamação trabalhista.

Razão assiste ao impetrante.

Analisados os elementos acostados aos autos, verifica-se que a autoridade reputada coatora violou direito líquido e certo do impetrante ao extinguir a reclamação trabalhista, sem julgamento do mérito, ante a inobservância da Lei n.º 9.958/00.

Com efeito, afigura-se excessivo e injustificado o rigor com que foram avaliados os requisitos da propositura da ação. Não há, ao contrário do entendimento esposado pela autoridade impetrada, como estabelecer a obrigatoriedade de submeter o trabalhador à Comissão de Conciliação Prévia, na medida em que tal condicionamento afrontaria o princípio constitucional insculpido no artigo 5.º, XXXV, de que não há lesão ou ameaça a direito que possa ser suprimida da apreciação do Poder Judiciário.

Aliás, nesse sentido, os fundamentos que ensejaram a concessão da limiar de fls. 20/23:

Ao contrário do entendimento esposado pela autoridade reputada coatora, não há como estabelecer a obrigatoriedade de submeter o ora impetrante à Comissão de Conciliação Prévia, eis que tal requisito viola vários dispositivos constitucionais que informam princípios comezinhos de direito instrumental, a saber: princípio da inafastabilidade da jurisdição (“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, inciso XXXV do art. 5.º da CF) e princípio do juiz natural (“não haverá juízo ou tribunal de exceção” e “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”, incisos XXXVII e LIII, respectivamente, do art. 5.º da CF).

Algumas Varas do Trabalho – bem poucas, diga-se de passagem – têm incorrido no equívoco de extinguir os feitos em que o reclamante não haja se submetido à Comissão de Conciliação Prévia, o que tem sido prontamente corrigido por esta Seção Especializada.

Registre-se que este Regional adotou a Súmula n.º 02, firmando posicionamento contrário acerca da necessidade de submeter o trabalhador à Comissão de Conciliação Prévia, como pressuposto processual para o ingresso da reclamatória trabalhista.

SÚMULA N.º 2

COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. EXTINÇÃO DE PROCESSO

(Resolução Administrativa n.º 08/2002 – DJE 12/11/2002, 19/11/2002, 10/12/2002 e 13/12/2002)

“O comparecimento perante a Comissão de Conciliação Prévia é uma faculdade assegurada ao obreiro, objetivando a obtenção de um título executivo extrajudicial, conforme previsto no art. 625-E, parágrafo único, da CLT, mas não constitui condição da ação, nem tampouco pressuposto processual na reclamatória trabalhista, diante do comando emergente do artigo 5.º, XXXV, da Constituição Federal”.

O ato impetrado, como se vê, violou princípios de direito, vedando o amplo acesso à Justiça por parte do impetrante, o que impõe a pronta reparação pela via mandamental.

Em vista do exposto, rejeito a preliminar argüida pelo Ministério Público do Trabalho e CONCEDO A SEGURANÇA para, tornando definitiva a liminar de fls. 20/21, determinar o prosseguimento da reclamação trabalhista n.º 2.490/03-6, em trâmite perante o MM. Juízo da 58. Vara do Trabalho de São Paulo, nos termos da fundamentação supra.

NELSON NAZAR

Juiz Relator

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