Taxa mensal

Extinção de tarifa básica de telefone pode causar retrocesso social

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14 de setembro de 2004, 14h52

Atualmente tem se discutido muito a respeito da legalidade da cobrança de tarifa de assinatura de linha telefônica fixa, no âmbito do Direito do Consumidor. Existem, inclusive, diversas ações judiciais em trâmite debatendo a matéria.

As posições favoráveis à extinção da tarifa de assinatura de linha telefônica fixa são fundamentadas em dispositivos isolados do Código de Defesa do Consumidor (CDC), interpretados de forma literal e singela, sem a devida atenção aos princípios norteadores do próprio Código, nem ao

desenvolvimento econômico e social do país, objetivados na Constituição Federal.

A melhor interpretação da lei na solução de um conflito de interesses é a interpretação sistemática, com vistas à harmonização de toda a legislação, atendendo aos princípios de Direito. E com essa exegese, a manutenção da tarifa de assinatura acaba prevalecendo.

Não há dúvida quanto à constitucionalidade da Lei Geral de Telecomunicações, nem quanto à legalidade de seus regulamentos ou demais normas editadas pela Anatel. Além disso, nenhuma destas normas é incompatível com as disposições do CDC.

A legislação dá mais subsídios para a defesa da tarifa do que para as idéias tendentes a extingui-la, razão pela qual esses conflitos têm encontrado decisões divergentes nos tribunais. Certamente a questão será pacificada somente no Superior Tribunal de Justiça (STJ), após muitos litígios.

No entanto, interpretadas e aplicadas harmoniosamente, as leis sobre o tema apontam para a legitimidade e plena legalidade da cobrança da tarifa de assinatura de linha telefônica fixa, quiçá, a obrigatoriedade desta cobrança.

Mas, além da análise jurídica, existem questões de enorme importância no tema, que infelizmente são ignoradas quando se discute o assunto. E essa importância se justifica por serem questões de interesse público, que devem ser colocadas em primeiro plano e analisadas com o cuidado necessário para que não fiquem prejudicadas pela aplicação fria da lei, ou

melhor, de um único e isolado dispositivo legal.

É notório que o sistema de telefonia em nosso país passou por enormes e drásticas mudanças a partir da viabilidade legal e constitucional das privatizações, visando a melhoria e o desenvolvimento do sistema de telecomunicações.

Nos últimos dez anos, o avanço tecnológico foi gigantesco, permitindo que o serviço de telefonia, antes restrito às classes sociais “A” e “B”, chegasse às camadas mais desfavoráveis da sociedade. E este era um dos principais e mais nobres objetivos da mudança do sistema, contribuindo para a necessária missão que cabe ao país e a cada um de nós: diminuir a desigualdade social.

Ocorre que não é dada a devida importância a essa questão, e é por isso que muitos não percebem que o desenvolvimento tecnológico que proporcionou a ampliação do sistema, atingindo as classes mais desfavorecidas da sociedade, foi decorrente de um planejamento de custos bem elaborado pela Anatel, órgão competente, entre outras funções, para estabelecer a estrutura tarifária para cada uma das

modalidades de serviço telefônico prestadas.

Desenvolvimento tecnológico gera custos e esse desenvolvimento foi viabilizado pelo equilíbrio tarifário que foi criado.

Juntamente com a concessão do serviço de telefonia, as empresas telefônicas receberam a incumbência de cumprir metas de universalização dos serviços, levando o serviço telefônico para todas as partes do país, para todas as camadas sociais e ampliando o serviço de telefones públicos.

Para cumprir esse objetivo e manter os custos de um telefone fixo, as empresas telefônicas necessitam de uma receita em torno de R$ 45,00 (sem impostos) por usuário. No entanto, em 2003, somente a metade dos usuários de telefones fixos tinha uma conta mensal líquida superior a R$ 45,00.

Para que a outra metade não gerasse prejuízos, foi adotado um sistema misto, de modo que a conta é composta por uma parte fixa mais reduzida (em torno de R$ 24,00) e outra parte paga por pulso. Assim, quem utiliza mais o telefone, acaba pagando mais, o que é mais justo, respeitando o princípio da proporcionalidade.

Se a tarifa telefônica fosse composta somente por um valor fixo, ela seria superior aos mencionados R$ 45,00, inviabilizando o serviço telefônico para grande parte da população.

E, finalmente, se a tarifa telefônica fosse composta somente pelas chamadas realizadas, como pretendem aqueles que discutem a legitimidade da tarifa de assinatura, seria necessário um grande aumento no preço dos pulsos, estimado em 150%, para que houvesse a preservação do equilíbrio econômico-financeiro das concessões. E isso fatalmente ocorrerá se prevalecer o entendimento contra a tarifa de assinatura.

A extinção dessa tarifa torna economicamente inviável a manutenção das metas de universalização impostas às concessionárias de telefonia. Além do mais, a conta de uma linha telefônica de pouco uso não teria o valor necessário para suprir os custos de manutenção dessa mesma linha,

prejudicando os usuários de baixa renda, que teriam perda de qualidade na prestação do serviço.

Em médio prazo, seria inviável a prestação do serviço aos usuários menos favorecidos, de forma que a extinção da tarifa de assinatura será a causa para um indesejável retrocesso social, além de ser responsável pela estagnação do desenvolvimento tecnológico.

Em linhas gerais, é possível se afirmar com propriedade, ao contrário do que pregam alguns, que a extinção da tarifa de assinatura telefônica contraria as normas e princípios do CDC.

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