Investigação criminal

Três ministros do STF já votaram a favor de investigação pelo MP

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1 de setembro de 2004, 16h28

Para três ministros do Supremo Tribunal Federal, o Ministério Público não pode presidir inquéritos policiais, mas tem o poder constitucional de realizar investigações criminais. Os ministros Joaquim Barbosa, Carlos Ayres Britto e Eros Grau entenderam que não é exclusividade da polícia a condução das investigações.

O julgamento foi adiado porque o ministro Cezar Peluso pediu vista do processo. Com a interrupção, o placar está 3 X 2 para o MP. Os dois ministros que votaram contra o poder investigatório criminal foram Marco Aurélio e Nelson Jobim.

A questão é discutida no Inquérito 1.968, que envolve denúncia apresentada contra o deputado Remi Trinta, acusado de fraudar o Sistema Único de Saúde, com base em investigações feitas pelo Ministério Público Federal.

Em sua defesa, o deputado alegou atipicidade da conduta, inépcia da denúncia e falta de justa causa para a ação penal, já que o MPF não teria competência para proceder a investigação de natureza criminal.

Ao MP caberia apenas requisitar diligências e a instauração de inquérito policial. O relator da questão, ministro Marco Aurélio, considerando que os elementos que serviram de base à denúncia foram obtidos exclusivamente com dados de investigação criminal feita pelo MP, votou no sentido de rejeitá-la.

Ele entendeu que o Ministério Público, embora titular da ação penal, não tem competência para investigar, diretamente, na esfera criminal, mas apenas para requisitá-las à autoridade policial. Na ocasião, o ministro Joaquim Barbosa pediu vista dos autos.

Nesta quarta-feira (1/9), Joaquim Barbosa trouxe seu voto para o julgamento. Ele explicou que, no caso concreto, a denúncia contra o deputado foi oferecida com base em procedimento administrativo instaurado a partir de notícia-crime do Ministério da Saúde. Segundo o ministro, somente após longa apuração dos delitos pelo próprio Ministério da Saúde é que o material coletado foi encaminhado ao Ministério Público.

“Ora, o que deve ser discutido é se a documentação levada ao conhecimento do Ministério Público, fruto de apuração integralmente conduzida pelo Ministério da Saúde, serve ou não serve como justa causa para a denúncia em exame. Mas, ainda que se considere como investigativa a atuação do Ministério Público, neste caso, creio que há fundamento constitucional sólido para embasá-la”, afirmou.

Para ele, a polícia tem o monopólio para presidir inquéritos policiais, mas a apuração de ilícitos não se esgota aí e, em muitos casos, o desencadeamento da ação punitiva do Estado prescinde da atuação polícia e depende de diversos órgãos administrativos.

“Daí a irrazoabilidade da tese que postula o condicionamento, o aprisionamento, da atuação do Ministério Público à atuação da polícia, o que sabidamente não condiz com a orientação da Constituição de 1988”, disse Joaquim Barbosa.

O ministro acrescentou, ainda, que se for vitoriosa a tese que postula a inviabilidade de investigação criminal por integrantes do MP, os procuradores passarão a ter papel meramente decorativo.

O relator do Inquérito, ministro Marco Aurélio, reafirmou seu voto pela rejeição da denúncia. Ele disse que o inquérito em questão foi formalizado no âmbito do MP, que chegou a realizar diligências investigatórias no caso. “É fato incontroverso que não houve a passagem do inquérito pela polícia. O inquérito em si foi formalizado no próprio Ministério Público”, sustentou.

Placar apertado

O juiz Marco Antônio Rodrigues Nahum, presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (Ibccrim), afirmou que os votos desta quarta-feira eram previstos, exceto no caso do ministro Eros Grau. “Não tínhamos parâmetros, qualquer opinião seria mera suposição”, disse.

Para Nahum, o resultado final do julgamento será apertado. “Pesa o problema político do momento, porque em relação à constitucionalidade a questão é tranqüila: o Ministério Público não tem poder para investigar”. O juiz diz acreditar que o caso em julgamento não é o ideal para ser o núcleo dessa discussão, que “caberia ao Poder Legislativo”.

O delegado Jair Cesário da Silva, presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo, comemorou a interrupção do julgamento. “Os três votos desta quarta defendem a possibilidade da investigação, mas essa possibilidade não tem base legal”.

Para o desembargador Celso Limongi, presidente da Associação Paulista de Magistrados, “o adiamento da votação do STF e o pedido de vista solicitado pelo ministro Cezar Peluso mostram que a questão está sendo bem debatida e julgada com critério. Isso é um bom sinal”.

Até o momento, os ministros Carlos Velloso, Gilmar Mendes e Ellen Gracie já se manifestaram em outras ocasiões contra o poder investigatório do MP. Se mantiverem a posição, haverá pelo menos cinco votos nesse sentido.

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