Acidente aéreo

Piloto e co-piloto da Varig são responsáveis por mortes em acidente

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28 de outubro de 2004, 13h23

Cezar Augusto Pádula Garcez e Nilson de Souza Zille, piloto e o co-piloto da aeronave Boeing 737-200, da empresa Varig, são responsáveis pelas mortes de doze pessoas e lesão corporal grave em outras 29, em acidente aéreo na localidade de São José do Xingu, no Pantanal mato-grossense. O entendimento é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que mandou ambos cumprirem pena restritiva de direitos. O STJ também fixou multa.

De acordo com STJ, o acidente ocorreu em setembro de 1989. O Boeing 737-200 da Varig que partiu de Marabá com destino a Belém, no Pará, caiu na região de São José do Xingu, em Mato Grosso por “distração” do comandante. Segundo informações descritas pelos setores de aviação responsáveis pelo controle de acidentes aéreos, o comandante teria consultado o Plano de Vôo Computadorizado e inserido, por falha de percepção, a radial 270 no curso do HSI, quando a correta seria 027.

Em vez de tomar o rumo norte, o piloto foi na direção sudoeste. O co-piloto, ao retornar de inspeção externa, por imitação, também teria inserido a mesma proa observada no instrumento do comandante. O erro só teria sido percebido após 40 minutos de vôo, alguns minutos antes de aterrissar. Seis tripulantes e 36 passageiros sobreviveram ao acidente.

Piloto e co-piloto foram denunciados pois teriam agido com desatenção e imprudência ao percorrer o caminho errado. Quando foram corrigir o erro, não pensaram nas conseqüências, e desse erro resultou o desastre que causou a morte e o ferimento de várias pessoas.

Histórico

A Justiça Federal os condenou a quatro anos de detenção, convertidos em pena alternativa e pagamento de multas, mais honorários. Ambos apelaram, mas o Tribunal Regional Federal da 1ª Região afastou todas as alegações e transformou a condenação em uma pena restritiva mais multa em duas penas alternativas.

Ambos recorreram ao STJ. O piloto disse que a ação não poderia ter corrido na Justiça Federal de Mato Grosso sem a ratificação do Ministério Público, já que originalmente apresentada em uma vara federal de São Paulo, e que o TRF não poderia ter reformado a sentença condenatória em prejuízo dos réus se o Ministério Público não apelou.

O co-piloto, que teve seu recurso interno recusado no TRF-1, alegou que a decisão não se manifestou sobre a hierarquia e a responsabilidade exclusiva do comandante em relação à condução da nave, também recorreu ao STJ. Além das mesmas alegações feitas pela defesa do piloto, o co-piloto afirmou não poder ser responsabilizado pela condução da nave, principalmente quando teria agido em estrita obediência à ordem de superior hierárquico.

O ministro José Arnaldo da Fonseca, relator do caso no STJ, afastou a alegação de que a denúncia foi oferecida perante juiz incompetente e depois remetida à 3ª Vara da Seção Judiciária de Mato Grosso, onde não foi ratificada pelo Ministério Público de forma expressa. O relator considerou possível a ratificação implícita, conforme reconhecido pelo TRF, até porque não há lei que determine que a ratificação deva ser expressa.

No que diz respeito à alegada substituição pelo TRF-1, de ofício, da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, alterando a sentença condenatória nesse ponto, onde a substituição da pena privativa de liberdade se deu por uma restritiva de direitos e multa, o ministro — acompanhando entendimento da ministra Laurita Vaz — deu razão ao piloto.

“O acórdão recorrido realmente incorreu em reformatio in pejus, porque a pena restritiva de direitos é, sem dúvida, mais severa que a pena de multa, tendo em vista que o não-cumprimento da primeira, ao contrário do que ocorre com a segunda, poderá resultar na sua conversão em pena privativa de liberdade”, afirmou o ministro José Arnaldo. Lembra o relator que a proibição da reformatio in pejus (reforma para pior.) tem como fundamento o princípio de que o tribunal não pode piorar a situação processual do recorrente, retirando-lhe vantagem concedida pela sentença, sem pedido expresso da parte contrária.

Quanto ao argumento do co-piloto de que a responsabilidade é exclusiva do piloto, o entendimento da Quinta Turma é de que “a responsabilidade prevista no Código Brasileiro de Aeronáutica é de natureza administrativa, invocável para fim de ressarcimento do dano e possível ação regressiva contra o piloto. Não se confunde, todavia, com responsabilidade de natureza penal, cujos requisitos estão previstos no Código Penal Brasileiro, e que decorre de uma relação de causalidade dissociada das responsabilidades de origem administrativa”.

Ainda que assim não fosse, a discussão em torno da responsabilidade penal do co-piloto, reconhecida pelas instâncias ordinárias, acarreta a necessidade de revolvimento do conjunto de provas, o que não é possível em sede de recurso especial, conforme reza a Súmula 7 do STJ.

Agora a questão da responsabilidade do co-piloto voltou à discussão no âmbito da Quinta Turma. Nilson Zille apresentou embargos de declaração requerendo que a Turma reapreciasse o caso. Segundo ele, a decisão anterior dos ministros conteria uma contradição, pois, tendo reconhecido a subordinação hierárquica advinda do Código Brasileiro de Aeronáutica, haveria de reconhecer também a violação ao artigo 22 do Código Penal, segundo o qual “se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem”. Para Zille , há necessidade de modificar o julgado para retirar do co-piloto a responsabilidade pelo acidente.

Para os ministros da Quinta Turma, não houve nenhuma contradição na decisão tomada anteriormente. “A discussão relativa à aplicação do artigo 22 do Código Penal restou eficientemente definida pelo acórdão, tanto no voto do relator, quanto no da ministra Laurita Vaz”, afirma o ministro José Arnaldo em seu voto.

O ministro explicou que os embargos de declaração têm por objetivo responder a possível obscuridade, dúvida, contradição ou omissão, como no caso são inexistentes, é inviável a sua condução com o fim de substituir a decisão a qual ataca, sob a pretensão de modificá-la. A Quinta Turma manteve assim a decisão que determina que ambos são responsáveis pelo acidente, crime cuja condenação ficou fixada em pena restritiva de direitos e multa.

Resp 476.445

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