Percepções e promessas

O mundo não se impressionou com as escorregadas de Lula

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25 de outubro de 2004, 17h09

O Brasil “despencou” no ranking da corrupção da Transparência Internacional, do 48º para o 59º lugar. Isso é o que alguns jornalistas apressados noticiaram e os paladinos do PT estariam trombeteando se ainda estivessem na oposição.

Quem tiver paciência de olhar no site da Transparência vai ver que não é bem assim. A piora relativa se deve à inclusão de outros países no ranking. Em termos absolutos, o Brasil está na mesma desde 1998. Numa escala de 10 pontos, o índice do país foi 3,9 em 2003 e 2004, um décimo de ponto abaixo de 2002. Variação insignificante para um intervalo de confiança de 3,7 a 4,1.www.transparencia.org.br

Numa leitura política, mas não apressada nem enviesada, o que dá para dizer é que, com todo a discurseira petista sobre ética, as pessoas ouvidas para a elaboração do índice não notaram diferença com a chegada do PT ao governo em 2003. Em compensação, também não se abalaram com a temporada de escândalos inaugurada pelo caso Waldomiro em 2004. Sinal de que a percepção dessas pessoas — empresários e investidores, basicamente — é provavelmente mais fria do que a nossa própria em relação às nossas mazelas.

Fria ou cínica, como notou Rolf Kuntz outro dia no Estadão. Embora a Transparência, o Banco Mundial e outros bem pensantes enfatizem muito os riscos da corrupção para os investidores estrangeiros, nem por isso eles deixam de correr em massa para a China, por exemplo, colocada meio ponto abaixo do Brasil no índice de corrupção – mas sei lá quantos pontos acima no índice de crescimento do PIB. No fim quem absorve os prejuízos é mesmo o povo que não tem para onde correr nem para quem repassar a conta da corrupção.

Clique aqui para baixar a íntegra em inglês do relatório da Transparência. A Tabela comparativa dos países está nas páginas 4/5.

Mais saboroso politicamente do que o índice é, no fim, seguir os links do site da Transparência para os compromissos anticorrupção de Lula e do PT. Num documento apresentado pela Transparência, assinado por Lula em setembro de 2002, ele prometeu, entre outras coisas, padronizar e monitorar os processos de licitação e coibir o nepotismo e o empreguismo na administração federal.

O documento “Combate à corrupção — compromisso com a ética”, parte do programa de governo de Lula, inclui outras promessas: regulamentar o acesso da sociedade pela Internet ao Sistema Integrado de Administração Financeira da União (Siafi); fortalecer os conselhos sociais na definição, fiscalização e avaliação da eficácia na aplicação dos recursos de políticas públicas; partilhar com o Congresso Nacional uma atitude de combate intransigente a práticas de relações espúrias do Executivo com parlamentares, visando conquistar seus votos ou obter sua omissão na atividade fiscalizadora.www.transperencia.org.br

A introdução informa que o documento “incorpora todos os resultados consensuais da série de seminários que o Instituto Cidadania, coordenado por Lula, realizou em 1995 e 1996, sob a responsabilidade do deputado José Dirceu, para propor estratégias e ações eficazes para o combate à corrupção”. Coisa séria. Meses depois Dirceu virou chefe da Casa Civil e encarregou Waldomiro Diniz de zelar pela transparência das relações do Planalto com o Congresso.

*Artigo publicado no site e-agora

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